Pressionada pelo governo Lula da Silva, a Eletrobras deve aumentar o número de vagas reservadas à União em seu Conselho de Administração. Segundo o Estadão, a companhia estaria disposta a ceder 3 assentos ao governo, que hoje conta com apenas 1, e elevar o número de membros dos atuais 9 para 10 ou 11.
O acordo seria a forma que a Eletrobras encontrou para encerrar uma pendenga judicial iniciada por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF). Nela, a Advocacia-Geral da União (AGU) questiona trechos da lei que permitiu a privatização da estatal e cobra o restabelecimento do poder de voto da União, uma vez que continua a ser a principal acionista da companhia.
A tese é inacreditável. De maneira marota, o governo não enfrenta a privatização em si nem a aprovação da proposta pela Câmara e pelo Senado. Contrapõe-se, entretanto, a um dos pilares do modelo escolhido para capitalizar a Eletrobras.
Tudo foi feito para garantir que a Eletrobras se tornaria uma corporation, ou seja, uma companhia sem dono, com o controle pulverizado entre vários acionistas. Para assegurar a perenidade do modelo, o poder de voto de cada acionista foi limitado em 10%, independentemente da quantidade de ações detidas – condição definida expressamente na lei.
Com o limite de voto, a companhia estaria protegida de uma eventual oferta de um concorrente privado que tentasse assumir o controle da companhia para formar um oligopólio. Também não estaria mais sujeita à mão pesada do Executivo. Caso um governo eleito após a capitalização tentasse reassumir a companhia, ele teria de pagar o triplo do valor das ações para reestatizá-la, conforme o estatuto.
Não se trata de uma invenção brasileira, mas de um modelo consagrado e adotado por algumas das principais empresas do mundo. Mas, como diria o ex-ministro da Fazenda Pedro Malan, no Brasil até o passado é incerto, e a lei que garantiu a privatização da Eletrobras, proposta pelo Executivo e aprovada pelo Congresso, parece que já não vale mais.
Isso porque o STF, em vez de rejeitar de pronto a ação da AGU, aceitou a sugestão da Procuradoria-Geral da União (PGU) e encaminhou o caso à Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal (CCAF) para que União e Eletrobras tentassem chegar a um acordo. O caso, agora, se encaminha para uma solução evidentemente controversa.
Em maio de 2023, por meio de fato relevante, a Eletrobras sustentava que o processo de privatização havia sido conduzido em conformidade com a lei e a Constituição. Por isso, não ofertaria vagas no Conselho de Administração a qualquer acionista, inclusive o governo, mesmo porque seu estatuto não permitia.
No espaço de pouco mais de um ano, a companhia mudou radicalmente de ideia. Não se sabe o que teria acontecido nesse período, mas se desconfia, haja vista a pressão desmedida que o governo tem exercido sobre a Vale.
Afinal, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, nem disfarça sua intenção de influenciar no processo de sucessão da presidência da mineradora. Na semana passada, Silveira disse que não descarta aplicar medidas e sanções mais duras para combater o que ele considera ser uma “arrogância” por parte da empresa.
Não é coincidência que Vale e Eletrobras estejam na mira do governo. Ambas estão entre as maiores empresas do País, ambas são corporation e ambas já foram companhias controladas pela União. E, embora não sejam mais estatais, as duas dependem de decisões governamentais, de atos de agências reguladoras e da manutenção de marcos regulatórios estáveis para tocar seus negócios. Ceder às pressões do governo pode ser o caminho mais fácil, pois o governo sabe como pode atrapalhar – e muito.
O mais absurdo é que essa investida se dá sobre empresas genuinamente brasileiras, que acumulam décadas de atuação no País e que são líderes nos mercados em que operam. É por essas e outras que a imagem do Brasil perante investidores estrangeiros é tão ruim.