O jornalista Rolf Kuntz escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto

Opinião|Dois anos bons, dois perigosos


Se Haddad conseguir muito menos do que pretende, e a gastança prevalecer, a segunda metade do atual governo poderá ser desastrosa

Por Rolf Kuntz

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva completa dois anos de mandato com desemprego baixo e economia ainda vigorosa, mas com inflação longe da meta, insegurança nas contas públicas, juros altos, mercado financeiro inquieto e perspectiva de crédito caro nos próximos anos. Em Brasília, nem a aproximação do Natal abrandou as preocupações com a economia. O Congresso avançou no exame de propostas do Executivo para arrumação das finanças federais. Retardou o recesso, cooperou com o ministro da Fazenda e contribuiu para a criação, neste fim de ano, de um ambiente incomum de entendimento político. Passadas as festas, no entanto, será preciso cuidar dos desajustes apontados nas projeções do mercado e do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC).

Dólar nas alturas tem sido um dos efeitos da insegurança alardeada no mercado financeiro. Na quinta-feira a moeda americana chegou a R$ 6,30 e só recuou depois de mais uma intervenção do BC. Nessas intervenções a autoridade monetária teve de leiloar US$ 20 bilhões, em operações facilitadas pela acumulação de reservas cambiais. Essa acumulação tem sido rotineira no último quarto de século, proporcionando ao País uma segurança preciosa durante crises nacionais ou internacionais. Neste caso, a instabilidade do câmbio refletiu problemas tanto internos quanto globais.

Desajustes locais são suficientes, no Brasil de hoje, para sustentar o risco de inflação elevada e manter a inquietação no setor financeiro. O diagnóstico mais severo já foi enunciado na última reunião do Copom, quando a taxa básica de juros, a Selic, foi elevada de 11,25% para 12,25%. Mais dois prováveis aumentos foram anunciados pelo comitê. Se ocorrerem, a taxa poderá atingir 14,25% na reunião de março. No mercado, já há quem fale em juros de 15% em 2025. Essa hipótese pode parecer exagerada, neste momento, mas de nenhum modo absurda, quando se veem, tanto no Executivo quanto no Congresso, autoridades com indisfarçável propensão à gastança.

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Se a insegurança das contas públicas for mantida, dificilmente se poderá evitar a elevação dos juros. A perspectiva de inflação bem acima da meta de 3% vem sendo mantida em projeções do mercado financeiro e de grandes entidades empresariais.

Em suas perspectivas para a economia brasileira, recém-publicadas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) inclui inflação de 4,2% em 2025, pouco abaixo do limite de tolerância de 4,5%. As projeções coletadas na pesquisa Focus, do Banco Central, apontam aumentos anuais de preços ao consumidor de 4,6% em 2025, 4% em 2026 e 3,66% em 2027. Em todas essas estimativas, o avanço contra a inflação é lento e insuficiente para chegar bem perto do centro do alvo. Todas as projeções indicam também a persistência, nos próximos anos, de contas públicas deficitárias.

Otimistas poderão entender esses desajustes como custos dificilmente evitáveis do crescimento econômico. Pensariam de forma diferente, no entanto, se dessem mais atenção aos dados internacionais. A economia brasileira crescerá cerca de 2% ao ano, a partir de 2025, segundo as estimativas captadas na pesquisa Focus. Muitos outros emergentes têm crescido em ritmo igual ou superior a 3%, de acordo com entidades multilaterais. Na média, os países do G-20, formado pelas maiores economias do mundo, devem crescer 3,3% neste ano, 3,3% no próximo e 3,2% em 2026. A diferença em relação ao desempenho estimado para o Brasil pode parecer pequena, mas é muito mais visível quando se trata de alguns grandes emergentes, como Índia, Indonésia e Turquia. Incluir China e Rússia entre os emergentes, nesta altura, é um claro abuso conceitual.

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O baixo crescimento brasileiro, raramente fora da faixa de 2% a 3%, pode parecer surpreendente depois dos ajustes e reformas a partir do Plano Real. Mas alguns legados desse período foram deformados ou destruídos temporariamente.

Desprezada e anulada durante o governo da presidente Dilma Rousseff, a independência do Banco Central foi reconstituída nos anos seguintes, mas o custo daquele desvio foi muito alto. O presidente Michel Temer empreendeu a recuperação, abrindo caminho para um controle mais eficiente da inflação. Além disso, conseguiu restabelecer a limitação legal do aumento dos gastos públicos, eventualmente contornada, nos anos seguintes, com artifícios administrativos. Os atuais conflitos entre partidários da gastança e defensores da austeridade fiscal, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, são uma continuação dessa disputa. O ministro Fernando Haddad lidera – nem sempre com o necessário engajamento presidencial – a defesa da austeridade.

Se Haddad conseguir muito menos do que pretende, e a gastança prevalecer, a segunda metade do atual governo poderá ser desastrosa. O ministro é hoje apoiado pelos presidentes da Câmara e do Senado, mas, se esse apoio sumir ou se enfraquecer, as finanças públicas serão gravemente ameaçadas. Um feliz ano novo para os irresponsáveis de Brasília poderá ser terrivelmente custoso para os demais cidadãos, os anônimos trabalhadores e pagadores de impostos.

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JORNALISTA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva completa dois anos de mandato com desemprego baixo e economia ainda vigorosa, mas com inflação longe da meta, insegurança nas contas públicas, juros altos, mercado financeiro inquieto e perspectiva de crédito caro nos próximos anos. Em Brasília, nem a aproximação do Natal abrandou as preocupações com a economia. O Congresso avançou no exame de propostas do Executivo para arrumação das finanças federais. Retardou o recesso, cooperou com o ministro da Fazenda e contribuiu para a criação, neste fim de ano, de um ambiente incomum de entendimento político. Passadas as festas, no entanto, será preciso cuidar dos desajustes apontados nas projeções do mercado e do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC).

Dólar nas alturas tem sido um dos efeitos da insegurança alardeada no mercado financeiro. Na quinta-feira a moeda americana chegou a R$ 6,30 e só recuou depois de mais uma intervenção do BC. Nessas intervenções a autoridade monetária teve de leiloar US$ 20 bilhões, em operações facilitadas pela acumulação de reservas cambiais. Essa acumulação tem sido rotineira no último quarto de século, proporcionando ao País uma segurança preciosa durante crises nacionais ou internacionais. Neste caso, a instabilidade do câmbio refletiu problemas tanto internos quanto globais.

Desajustes locais são suficientes, no Brasil de hoje, para sustentar o risco de inflação elevada e manter a inquietação no setor financeiro. O diagnóstico mais severo já foi enunciado na última reunião do Copom, quando a taxa básica de juros, a Selic, foi elevada de 11,25% para 12,25%. Mais dois prováveis aumentos foram anunciados pelo comitê. Se ocorrerem, a taxa poderá atingir 14,25% na reunião de março. No mercado, já há quem fale em juros de 15% em 2025. Essa hipótese pode parecer exagerada, neste momento, mas de nenhum modo absurda, quando se veem, tanto no Executivo quanto no Congresso, autoridades com indisfarçável propensão à gastança.

Se a insegurança das contas públicas for mantida, dificilmente se poderá evitar a elevação dos juros. A perspectiva de inflação bem acima da meta de 3% vem sendo mantida em projeções do mercado financeiro e de grandes entidades empresariais.

Em suas perspectivas para a economia brasileira, recém-publicadas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) inclui inflação de 4,2% em 2025, pouco abaixo do limite de tolerância de 4,5%. As projeções coletadas na pesquisa Focus, do Banco Central, apontam aumentos anuais de preços ao consumidor de 4,6% em 2025, 4% em 2026 e 3,66% em 2027. Em todas essas estimativas, o avanço contra a inflação é lento e insuficiente para chegar bem perto do centro do alvo. Todas as projeções indicam também a persistência, nos próximos anos, de contas públicas deficitárias.

Otimistas poderão entender esses desajustes como custos dificilmente evitáveis do crescimento econômico. Pensariam de forma diferente, no entanto, se dessem mais atenção aos dados internacionais. A economia brasileira crescerá cerca de 2% ao ano, a partir de 2025, segundo as estimativas captadas na pesquisa Focus. Muitos outros emergentes têm crescido em ritmo igual ou superior a 3%, de acordo com entidades multilaterais. Na média, os países do G-20, formado pelas maiores economias do mundo, devem crescer 3,3% neste ano, 3,3% no próximo e 3,2% em 2026. A diferença em relação ao desempenho estimado para o Brasil pode parecer pequena, mas é muito mais visível quando se trata de alguns grandes emergentes, como Índia, Indonésia e Turquia. Incluir China e Rússia entre os emergentes, nesta altura, é um claro abuso conceitual.

O baixo crescimento brasileiro, raramente fora da faixa de 2% a 3%, pode parecer surpreendente depois dos ajustes e reformas a partir do Plano Real. Mas alguns legados desse período foram deformados ou destruídos temporariamente.

Desprezada e anulada durante o governo da presidente Dilma Rousseff, a independência do Banco Central foi reconstituída nos anos seguintes, mas o custo daquele desvio foi muito alto. O presidente Michel Temer empreendeu a recuperação, abrindo caminho para um controle mais eficiente da inflação. Além disso, conseguiu restabelecer a limitação legal do aumento dos gastos públicos, eventualmente contornada, nos anos seguintes, com artifícios administrativos. Os atuais conflitos entre partidários da gastança e defensores da austeridade fiscal, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, são uma continuação dessa disputa. O ministro Fernando Haddad lidera – nem sempre com o necessário engajamento presidencial – a defesa da austeridade.

Se Haddad conseguir muito menos do que pretende, e a gastança prevalecer, a segunda metade do atual governo poderá ser desastrosa. O ministro é hoje apoiado pelos presidentes da Câmara e do Senado, mas, se esse apoio sumir ou se enfraquecer, as finanças públicas serão gravemente ameaçadas. Um feliz ano novo para os irresponsáveis de Brasília poderá ser terrivelmente custoso para os demais cidadãos, os anônimos trabalhadores e pagadores de impostos.

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O presidente Luiz Inácio Lula da Silva completa dois anos de mandato com desemprego baixo e economia ainda vigorosa, mas com inflação longe da meta, insegurança nas contas públicas, juros altos, mercado financeiro inquieto e perspectiva de crédito caro nos próximos anos. Em Brasília, nem a aproximação do Natal abrandou as preocupações com a economia. O Congresso avançou no exame de propostas do Executivo para arrumação das finanças federais. Retardou o recesso, cooperou com o ministro da Fazenda e contribuiu para a criação, neste fim de ano, de um ambiente incomum de entendimento político. Passadas as festas, no entanto, será preciso cuidar dos desajustes apontados nas projeções do mercado e do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC).

Dólar nas alturas tem sido um dos efeitos da insegurança alardeada no mercado financeiro. Na quinta-feira a moeda americana chegou a R$ 6,30 e só recuou depois de mais uma intervenção do BC. Nessas intervenções a autoridade monetária teve de leiloar US$ 20 bilhões, em operações facilitadas pela acumulação de reservas cambiais. Essa acumulação tem sido rotineira no último quarto de século, proporcionando ao País uma segurança preciosa durante crises nacionais ou internacionais. Neste caso, a instabilidade do câmbio refletiu problemas tanto internos quanto globais.

Desajustes locais são suficientes, no Brasil de hoje, para sustentar o risco de inflação elevada e manter a inquietação no setor financeiro. O diagnóstico mais severo já foi enunciado na última reunião do Copom, quando a taxa básica de juros, a Selic, foi elevada de 11,25% para 12,25%. Mais dois prováveis aumentos foram anunciados pelo comitê. Se ocorrerem, a taxa poderá atingir 14,25% na reunião de março. No mercado, já há quem fale em juros de 15% em 2025. Essa hipótese pode parecer exagerada, neste momento, mas de nenhum modo absurda, quando se veem, tanto no Executivo quanto no Congresso, autoridades com indisfarçável propensão à gastança.

Se a insegurança das contas públicas for mantida, dificilmente se poderá evitar a elevação dos juros. A perspectiva de inflação bem acima da meta de 3% vem sendo mantida em projeções do mercado financeiro e de grandes entidades empresariais.

Em suas perspectivas para a economia brasileira, recém-publicadas, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) inclui inflação de 4,2% em 2025, pouco abaixo do limite de tolerância de 4,5%. As projeções coletadas na pesquisa Focus, do Banco Central, apontam aumentos anuais de preços ao consumidor de 4,6% em 2025, 4% em 2026 e 3,66% em 2027. Em todas essas estimativas, o avanço contra a inflação é lento e insuficiente para chegar bem perto do centro do alvo. Todas as projeções indicam também a persistência, nos próximos anos, de contas públicas deficitárias.

Otimistas poderão entender esses desajustes como custos dificilmente evitáveis do crescimento econômico. Pensariam de forma diferente, no entanto, se dessem mais atenção aos dados internacionais. A economia brasileira crescerá cerca de 2% ao ano, a partir de 2025, segundo as estimativas captadas na pesquisa Focus. Muitos outros emergentes têm crescido em ritmo igual ou superior a 3%, de acordo com entidades multilaterais. Na média, os países do G-20, formado pelas maiores economias do mundo, devem crescer 3,3% neste ano, 3,3% no próximo e 3,2% em 2026. A diferença em relação ao desempenho estimado para o Brasil pode parecer pequena, mas é muito mais visível quando se trata de alguns grandes emergentes, como Índia, Indonésia e Turquia. Incluir China e Rússia entre os emergentes, nesta altura, é um claro abuso conceitual.

O baixo crescimento brasileiro, raramente fora da faixa de 2% a 3%, pode parecer surpreendente depois dos ajustes e reformas a partir do Plano Real. Mas alguns legados desse período foram deformados ou destruídos temporariamente.

Desprezada e anulada durante o governo da presidente Dilma Rousseff, a independência do Banco Central foi reconstituída nos anos seguintes, mas o custo daquele desvio foi muito alto. O presidente Michel Temer empreendeu a recuperação, abrindo caminho para um controle mais eficiente da inflação. Além disso, conseguiu restabelecer a limitação legal do aumento dos gastos públicos, eventualmente contornada, nos anos seguintes, com artifícios administrativos. Os atuais conflitos entre partidários da gastança e defensores da austeridade fiscal, no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, são uma continuação dessa disputa. O ministro Fernando Haddad lidera – nem sempre com o necessário engajamento presidencial – a defesa da austeridade.

Se Haddad conseguir muito menos do que pretende, e a gastança prevalecer, a segunda metade do atual governo poderá ser desastrosa. O ministro é hoje apoiado pelos presidentes da Câmara e do Senado, mas, se esse apoio sumir ou se enfraquecer, as finanças públicas serão gravemente ameaçadas. Um feliz ano novo para os irresponsáveis de Brasília poderá ser terrivelmente custoso para os demais cidadãos, os anônimos trabalhadores e pagadores de impostos.

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