Na campanha eleitoral de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro prometeu uma nova política e uma nova ética pública. Além de acabar com a corrupção e o mau uso do dinheiro público, o seu governo iria promover uma rigorosa aplicação da lei. De acordo com o tom das promessas, a impunidade teria seus dias contados.
Agora, três anos depois, todo esse discurso soa não apenas muito distante, como ele parece ser a exata antítese do que vem ocorrendo. Em vez de promover o cumprimento da lei, o governo de Jair Bolsonaro vê-se envolto em novas suspeitas de desrespeito à lei. A cada dia surgem novas investigações sobre o comportamento do próprio governo federal.
Em primeiro lugar, há a investigação promovida pelo Senado, por meio da CPI da Pandemia. Vale ressaltar que a comissão não investiga um aspecto por assim dizer secundário do governo, como ocorreu em outras comissões parlamentares de inquérito. A atual CPI investiga as ações e as omissões do governo federal no enfrentamento do principal desafio da atualidade. E têm surgido suspeitas de mau uso do dinheiro público na negociação e compra de vacinas anticovid, precisamente o item mais decisivo para vencer a pandemia.
As investigações relativas à área da saúde no âmbito federal não se restringem ao Senado. Por exemplo, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), foi aberto um inquérito para investigar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de prevaricação no episódio da compra da vacina indiana Covaxin.
Mais recentemente, o Tribunal de Contas da União (TCU) pediu esclarecimentos aos Ministérios da Defesa e da Economia a respeito do uso de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) em corriqueiros gastos militares. Há suspeitas de irregularidades na descentralização de recursos do Ministério da Saúde, ocorrida no ano passado, envolvendo a execução de ações de saúde pelo Ministério da Defesa.
Além disso, o poder público precisou abrir investigações em áreas de especial atuação do bolsonarismo, como a difusão de fake news e a promoção de atos antidemocráticos. No mínimo, é um tanto estranho. Aquele que prometeu um rigoroso cumprimento da lei tem seguidores que demandam continuamente a atuação dos órgãos de investigação.
E não são seguidores distantes. Num dos inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF), os três filhos mais velhos do presidente – Flávio, Carlos e Eduardo – são mencionados na condição de arrolados pela Polícia Federal como possíveis integrantes de organização criminosa destinada a atacar a democracia.
De toda forma, o mais estranho – absurdamente contraditório – é que o próprio Jair Bolsonaro assumiu como sua prioridade uma campanha que é rigorosamente ilegal. De forma contínua e insistente, o presidente Bolsonaro tem desautorizado o sistema de votação vigente, difundindo inverdades e propagando desconfiança sobre o elemento central de um regime democrático – o respeito à vontade do eleitor manifestada nas urnas.
Tal é a situação que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se viu obrigado a agir. Por unanimidade, o tribunal decidiu abrir um inquérito administrativo envolvendo o presidente Jair Bolsonaro, em razão de suas declarações infundadas de fraude no sistema eletrônico de votação e de suas ameaças às eleições de 2022.
Além disso, a partir de uma notícia-crime enviada pelo TSE, o STF incluiu Jair Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news. Também chegaram ao Supremo pedidos para que o ministro da Defesa, Walter Braga Netto, seja investigado a respeito de ameaça feita no mês passado contra as eleições de 2022.
Como se pode ver, as investigações não são casos isolados, tampouco afetam integrantes menos importantes do governo. É o próprio Jair Bolsonaro e o grupo mais íntimo do governo que reclamam a atenção dos órgãos de apuração e investigação, em temas especialmente caros ao bolsonarismo. Que tudo seja devidamente investigado. No Estado Democrático de Direito, não há espaço para ameaça às eleições ou para exercício do poder fora da lei.