Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostrou que a reforma tributária sobre o consumo trará benefícios para a maioria dos Estados e municípios. De acordo com esse trabalho, 82% dos 5.568 municípios brasileiros passarão a arrecadar mais após a aprovação e promulgação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2019. Entre os Estados, 18 deles, além do Distrito Federal, terão aumento de receitas.
O incremento na arrecadação se dará pela redistribuição dos recursos entre os entes federativos. Alguns fatores explicam esse comportamento, como a base mais ampla do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o aumento da população dos municípios, que terá impacto na redistribuição da cota-parte do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Mas a principal razão é a mudança na cobrança do ICMS, que deixará de incidir na origem e passará a ser cobrado no destino, ou seja, onde os bens e serviços são efetivamente consumidos.
Segundo o estudo, no ano passado, Estados e municípios arrecadaram R$ 801 bilhões em ICMS e ISS. Sob o ponto de vista das receitas estaduais, a reforma, de acordo com o texto aprovado pela Câmara, mexeria em 7% do total; R$ 54 bilhões iriam para Estados de menor renda, que concentram 70% da população. Para os municípios, o efeito redistributivo é ainda maior; 21% das receitas municipais, ou R$ 50 bilhões, trocariam de mãos e iriam para outras cidades com menor renda per capita, onde vivem 67% dos brasileiros.
Além de dar fim definitivo à guerra fiscal entre os Estados, a reforma ajudará a reduzir as desigualdades sociais e a contribuir diretamente com as finanças dos governos regionais. Segundo o estudo, a diferença de receita per capita entre a cidade mais rica e o município mais pobre de Goiás cairia para quatro vezes – hoje, é de 127 vezes.
Mesmo os poucos Estados e municípios prejudicados pelas novas regras da reforma serão recompensados. A proposta prevê uma regra de transição gradual, com duração de 50 anos. Para ter uma ideia, nos cinco primeiros anos após a aprovação da proposta, 90% das receitas ainda serão distribuídas conforme os critérios antigos; em 25 anos, esse porcentual cairia para 50%.
Ainda assim, Estados e municípios que tiverem prejuízos com a reforma serão restituídos por um fundo com recursos da União. Se o Produto Interno Bruto (PIB) voltar a crescer de forma mais vigorosa, como é esperado em razão dos ganhos de produtividade que a reforma deve proporcionar à economia, o risco de perdas é praticamente nulo, afirma o Ipea.
As cidades-dormitório, por exemplo, serão muito beneficiadas pela redistribuição das receitas, o que pode reduzir os gastos majorados que as capitais têm para suprir as deficiências dos municípios vizinhos em saúde e educação. Neste caso, ganham todos – a capital, que terá os serviços desafogados, e as cidades-dormitório, cujos moradores não precisarão se deslocar para serem atendidos.
“Se o imposto incide sobre o consumo e é pago pelos consumidores, nada mais justo e natural que esse imposto retorne para o local em que vivem as pessoas que pagaram por ele”, afirmou Sergio Gobetti, um dos autores do trabalho, ao lado da economista Priscila Monteiro.
O estudo explicita mais um dos aspectos positivos da reforma para os entes federativos. No dia seguinte à divulgação do estudo, o Senado realizou uma sessão para debater a proposta com os governadores. Mas, enquanto os presentes puderam apresentar ponderações ao texto, a ausência dos principais governadores de oposição foi bastante simbólica – alguns nem sequer mandaram representantes para substituí-los. Cada vez é mais nítido: as críticas à reforma se dão mais por razões políticas do que pelo conteúdo em si da proposta.
O trabalho do Ipea é mais uma evidência de que Estados e municípios não têm motivos para temer a reforma tributária. Ela respeita o pacto federativo, preserva a autonomia dos Estados e municípios e favorece a redução das desigualdades regionais e sociais. Mais constitucional, impossível.