The Washington Post De Maryland, EUA
Fanáticos do vinho, que não só gostam de beber, mas de falar, debater, ler, blogar e postar sobre ele, queixam-se do que chamam de "globalização" ou "homogenização". Segundo eles, um Cabernet Sauvignon, por exemplo, mesmo feito nos mais diferentes lugares, acaba tendo o mesmo sabor.
Mas a globalização também tem seu lado positivo. Na famosa degustação às cegas de 1976 em Paris, juízes consideraram alguns vinhos da Califórnia melhores que os franceses, o que golpeou de morte o monopólio do vinho do Velho Mundo. A modernização da viticultura e da enologia que se seguiu, embalada pelo aumento do número de democracias e pelo crescimento do livre comércio, resultou em novos e deliciosos vinhos feitos fora da Europa. Hoje, podemos saborear rótulos excelentes de regiões que talvez só venhamos a conhecer pelo portal virtual de uma rolha.
Minha mais recente descoberta na rota do vinho é a Bolívia. Olhando no mapa, o país dá continuidade ao arco norte dos Andes e às terras vinícolas das regiões argentinas de Mendoza, La Rioja e Salta. Além disso, como a Argentina e o Chile, a Bolívia tem pé histórico na Espanha. Quando os conquistadores espanhóis chegaram ao que é hoje a Bolívia, no século 16, plantaram videiras – uva Mission para vinhos tintos e Moscatel de Alexandria para brancos.
A Moscatel de Alexandria, variação da Moscatel, é também a base da aguardente nacional boliviana, o singani. Semelhante à grappa italiana, o singani é um digestivo aromático e delicioso.
Foi o singani que pôs o americano Ramon Escobar no rumo do vinho boliviano. Funcionário do departamento de Serviços Estrangeiros dos EUA e filho de imigrantes bolivianos, Escobar começou importando singani para os EUA quatro anos atrás, em parte para manter os laços da família com a pátria após a morte da avó. No ano passado, a empresa de Escobar, Chufly Imports, baseada em Arlington, na Virgínia, incorporou duas vinícolas bolivianas a seu portfólio. Outras duas deverão ser acrescentadas ainda neste ano.
Estive recentemente com Escobar para um café da manhã à base de salteñas, empanadas de carne avantajadas e suculentas, típicas da Bolívia. "Para cada dez hectares de videiras, dez famílias saem da pobreza extrema", conta ele. "Podemos ajudar uma região inteira do país mais pobre da América do Sul a mudar de vida."
E como são os vinhos bolivianos? A Bolívia tem apenas três mil hectares de vinhedos, quase todos em altitudes quase extremas. A altitude proporciona um clima semiárido, com forte insolação e noites frias que mantêm os vinhos frescos.
A Tannat é a uva que domina entre os tintos bolivianos e produz rótulos vibrantes e sofisticados, de uma complexidade admirável.
A Aranjuez é uma das maiores vinícolas do país. Seu Tannat tem grande estilo, no sentido clássico, e se beneficia de passar seis meses em tonéis de carvalho. Outra vinícola que merece ser conhecida é a Uvairenda, que tem uma linha chamada 1750 por causa da altitude de 1.750 metros em que as videiras estão plantadas. Seu Tannat, que não passa por carvalho, expressa melhor o terroir e é ágil e vibrante. São dois vinhos deliciosos e de sabor semelhante, mas dramaticamente diferentes em estilo. As duas vinícolas produzem também brancos frescos e aromáticos, com base na uva Torrontés.
/ TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ