Novos caçadores de grãos (de café)


Em plena onda cafeeira, com a evolução do paladar do consumidor surge uma nova geração de especialistas cujo trabalho vai da lavoura à extração da bebida

Por Matheus Pradp
Atualização:

ESPECIAL PARA O ESTADO

O Brasil dormiu por anos, mas acordou a tempo de tomar um bom café. Cafeterias, torrefações e lojas online não param de brotar nos grandes centros, especialmente nos últimos cinco anos, enquanto no interior produtores se capacitam e descobrem maneiras de valorizar seu produto. E é exatamente nesse cenário que entram em ação os novos caçadores de grãos, profissionais que além de garimpar cafés excepcionais (como faziam os antigos caçadores) se envolvem também em todos os aspectos da produção: identificam os grãos com potencial, de preferência com perfil específico e bem distinto dos encontrados no mercado, trabalham junto com o produtor para oferecer as melhores condições no campo, vendem as sacas e se envolvem também com a torra e com os métodos de extração. Tudo para produzir uma bebida de qualidade ímpar.

Caçadores acompanham toda cadeia produtiva do café Foto: Fernando Sciarra|Estadão
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O termo

coffee hunter

surgiu nos Estados Unidos há pelo menos 20 anos, quando começaram a aparecer microtorrefações por lá e a ordem era se diferenciar. Em pouco tempo, a expressão chegou ao Brasil, mas por anos, esses profissionais ficaram “escondidos” em grandes empresas, basicamente identificando bons cafés para exportação. Não se dava atenção ao mercado local e muito menos ao que seria feito com os grãos depois de colhidos e vendidos. Por ironia, o maior produtor mundial de café demorou para aquecer seu mercado interno, o que vem acontecendo nos últimos anos com o aumento do interesse do público por grãos de qualidade, o aprimoramento do paladar nacional e, muito importante também, a melhoria das técnicas de torrefação e extração. 

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Conhecer café e saber escolher não basta. Um bom

coffee hunter

tem de entender o que torna cada grão bom ou ruim e qual a maneira de extrair dele o que tem de melhor. Precisa combinar ousadia para descobrir novidades e entender o perfil do produto para determinar o grau de torra e até o tipo de extração mais indicado para o lote em questão. Como explica o especialista Ensei Neto, blogueiro do

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Paladar

, é preciso saber ler o grão. “Um

coffee hunter

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tem de conhecer o terroir, entender de colheita, secagem, preparo”. Joaquim Sertório Neto foi o primeiro

Q-Grader

certificado do Brasil – é assim que se chama o profissional que prova o café e dá a pontuação. Para ele, a procura por grãos de qualidade ganhou notoriedade nos últimos anos porque as pessoas passaram a se interessar pela origem do café que bebem.

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+ 15 lugares para comprar café em São Paulo

+ Com croissants, baguetes e palmiers, Deli Garage é pedacinho da França na Vila Madalena

Na Semana Internacional do Café, feira anual realizada em Belo Horizonte, no fim de outubro, não faltaram ótimos exemplos dessa parceria. O evento promove o encontro de dois mundos no universo do café, como explica seu organizador e diretor de planejamento da Café Editora, Caio Fontes: “Reunimos o velho produtor, que nunca teve a oportunidade de sair da roça e essa nova geração de torrefadores e baristas que vê tendências e está buscando descobrir mais cafés de qualidade no Brasil”.

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Conheça três caçadores de grãos da nova geração que estão em alta e atuam lado a lado com os produtores: Léo Moço, Eystein Veflingstad e Hugo Wolff.

Bons grãos com boas histórias

Dono da torrefação Café do Moço, em Curitiba, Léo Moço está sempre atrás de bons cafés não somente para abastecer seu negócio, mas também para levar às competições de baristas em que é assíduo. O carioca radicado na capital paranaense é tricampeão brasileiro e acabou de voltar da Coreia do Sul, onde participou pela terceira vez do Campeonato Mundial. A 31ª colocação conquistada na prova, historicamente dominada por europeus e norte-americanos e com recente insurgência dos asiáticos, pode ser bastante comemorada, já que o Brasil está engatinhando na área e ainda existe um grande preconceito com baristas de países produtores.

O barista Léo Moço, tricampeão brasileiro da modalidade Foto: Priscilla Fiedler

Para os campeonatos, Léo precisa encontrar grãos que além do ótimo sabor, tenham boas histórias. A nova joia de sua coleção ele achou em Carmo de Minas, interior de Minas Gerais: uma plantação de café dentro de uma mata nativa. O dono da Fazenda Santuário Sul, Luiz Paulo Ferreira, conta que descobriram o cafezal por acaso, quando procuravam uma égua perdida. A plantação tem milhares de pés de café com cerca de 12 metros de altura. O empresário diz que o mais provável é que esse “café selvagem” tenha relação com uma cultura escondida de escravos que trabalhavam na região, próxima a um antigo quilombo.  O barista e seu treinador japonês, contratado para prepará-lo para a competição, exploraram o grão até chegar ao ideal, uma bebida feita com o café “descansado”. Ainda congelaram os grãos com nitrogênio líquido em busca de “homogeneidade”.+ A febre da torrada com abacate+ Nova leva de cafeterias reforça 'terceira onda' do café na cidade Léo deu dicas para consolidar a secagem e desenvolver a torra ideal para o produto, que deve ser vendido em pequena escala para que se mantenha selvagem. 

‘Nunca compro um lote sem conhecer o produtor’

Representante das torrefações urbanas, Hugo Wolff começou vendendo seus cafés para cafeterias da moda e hoje já possui uma loja online que anda causando furor em São Paulo, a Wolff Café. Ele considera que a parte mais importante do seu trabalho é a valorização dos grãos dos produtores com quem trabalha, como por exemplo mulheres que vêm buscando espaço num mercado tão machista. Para isso, tem investido na exportação de uma parte desses grãos especiais, pois acha que a venda de alguns lotes para outros países pode dar o suporte necessário para que os produtores consigam crescer. O sucesso da operação de Hugo também depende do contato direto com os produtores parceiros. “Nunca compro um lote sem conhecer o produtor”, garante. E foi saindo da toca que seu negócio deslanchou. A produtora de Piatã, na Bahia, Brígida Salgado conheceu o caçador de grãos por acaso em Brasília. Ela faz parte da Cooperativa de Produtores Orgânicos e Biodinâmicos da Chapada Diamantina (Cooperbio), que reúne produtores de cafés especiais orgânicos da região, e entregou amostras de seu café a Wolff.  Dias depois, lá estava ele na Bahia, reunido com os produtores. Hoje se comunicam por e-mail e o produto é enviado até ele. “Mandamos amostras e ele liga explicando o que precisamos mudar”, conta a produtora.

Hugo Wolff vem fazendo barulho em São Paulo com sua linha de singles Foto: Márcio Fernandes|Estadão

A empresária Cecília Nakao auxilia Hugo em suas buscas na região do Caparaó (ES). Quando o torrefador viaja até lá, os produtores se reúnem para conversas e palestras que têm como grande objetivo fortalecer suas marcas. Para ela, a parte mais gratificante do trabalho que realizam é “diminuir o vão que existe entre as cadeias do café”.  Hugo afirma que seu trabalho foi inspirado por duas mulheres fortes que trabalham no mundo do café, um local ainda fortemente masculino. Sua mãe, produtora do grão, e Isabela Raposeiras, do Coffee Lab. E até hoje continua se cercando delas. Brígida, que já foi presidente da Aliança Internacional das Mulheres do Café (IWCA – Brasil), afirma que o meio é muito machista e que já foi muito desrespeitada, mas segue conquistando seu espaço diariamente. 

Longe das áreas tradicionais

O norueguês Eystein Veflingstad é torrador de café há dezoito anos, mas desde que se mudou para o Brasil com a mulher, em 2014, se embrenhou pelas regiões cafeeiras e virou coffee hunter. Foi fazendo pesquisas, buscando novos grãos, descobrindo tendências e abriu a Terceira Onda Consultoria em Café. Hoje trabalha com cinco produtores, que se ajudam mutuamente. O norueguês faz um diagnóstico da produção nacional e chama a atenção para áreas sem tradição cafeeira. “Precisamos nos ligar do que acontece no País, temos bons cafés em lugares não-tradicionais, como Araponga (MG)”, avalia. “Mas é tudo em escala reduzida.” 

O norueguês Eystein, que ajuda a desbravar plantações de café pelo Brasil Foto: Matheus Prado|Estadão

O produtor Deneval Vieira, do café Cordilheiras do Caparaó, no Espírito Santo, trabalha com Eystein. Ele conta que se interessou pela produção de cafés especiais em 2010, mas só encontrou a receita correta para sua fazenda, que está localizada em Iúna, cidade próxima da Serra do Caparaó, uma área difícil para o café, com a ajuda do consultor. “Ele dá assistência, mostra as qualidades do produto e o que precisa melhorar”, diz o produtor. O caçador de grãos afirma que a família manteve a autenticidade e faz ótimos cafés. Os filhos de Deneval estão investindo em conhecimento e aprendendo a torrar o grão que produzem.

ESPECIAL PARA O ESTADO

O Brasil dormiu por anos, mas acordou a tempo de tomar um bom café. Cafeterias, torrefações e lojas online não param de brotar nos grandes centros, especialmente nos últimos cinco anos, enquanto no interior produtores se capacitam e descobrem maneiras de valorizar seu produto. E é exatamente nesse cenário que entram em ação os novos caçadores de grãos, profissionais que além de garimpar cafés excepcionais (como faziam os antigos caçadores) se envolvem também em todos os aspectos da produção: identificam os grãos com potencial, de preferência com perfil específico e bem distinto dos encontrados no mercado, trabalham junto com o produtor para oferecer as melhores condições no campo, vendem as sacas e se envolvem também com a torra e com os métodos de extração. Tudo para produzir uma bebida de qualidade ímpar.

Caçadores acompanham toda cadeia produtiva do café Foto: Fernando Sciarra|Estadão

O termo

coffee hunter

surgiu nos Estados Unidos há pelo menos 20 anos, quando começaram a aparecer microtorrefações por lá e a ordem era se diferenciar. Em pouco tempo, a expressão chegou ao Brasil, mas por anos, esses profissionais ficaram “escondidos” em grandes empresas, basicamente identificando bons cafés para exportação. Não se dava atenção ao mercado local e muito menos ao que seria feito com os grãos depois de colhidos e vendidos. Por ironia, o maior produtor mundial de café demorou para aquecer seu mercado interno, o que vem acontecendo nos últimos anos com o aumento do interesse do público por grãos de qualidade, o aprimoramento do paladar nacional e, muito importante também, a melhoria das técnicas de torrefação e extração. 

Conhecer café e saber escolher não basta. Um bom

coffee hunter

tem de entender o que torna cada grão bom ou ruim e qual a maneira de extrair dele o que tem de melhor. Precisa combinar ousadia para descobrir novidades e entender o perfil do produto para determinar o grau de torra e até o tipo de extração mais indicado para o lote em questão. Como explica o especialista Ensei Neto, blogueiro do

Paladar

, é preciso saber ler o grão. “Um

coffee hunter

tem de conhecer o terroir, entender de colheita, secagem, preparo”. Joaquim Sertório Neto foi o primeiro

Q-Grader

certificado do Brasil – é assim que se chama o profissional que prova o café e dá a pontuação. Para ele, a procura por grãos de qualidade ganhou notoriedade nos últimos anos porque as pessoas passaram a se interessar pela origem do café que bebem.

+ 15 lugares para comprar café em São Paulo

+ Com croissants, baguetes e palmiers, Deli Garage é pedacinho da França na Vila Madalena

Na Semana Internacional do Café, feira anual realizada em Belo Horizonte, no fim de outubro, não faltaram ótimos exemplos dessa parceria. O evento promove o encontro de dois mundos no universo do café, como explica seu organizador e diretor de planejamento da Café Editora, Caio Fontes: “Reunimos o velho produtor, que nunca teve a oportunidade de sair da roça e essa nova geração de torrefadores e baristas que vê tendências e está buscando descobrir mais cafés de qualidade no Brasil”.

Conheça três caçadores de grãos da nova geração que estão em alta e atuam lado a lado com os produtores: Léo Moço, Eystein Veflingstad e Hugo Wolff.

Bons grãos com boas histórias

Dono da torrefação Café do Moço, em Curitiba, Léo Moço está sempre atrás de bons cafés não somente para abastecer seu negócio, mas também para levar às competições de baristas em que é assíduo. O carioca radicado na capital paranaense é tricampeão brasileiro e acabou de voltar da Coreia do Sul, onde participou pela terceira vez do Campeonato Mundial. A 31ª colocação conquistada na prova, historicamente dominada por europeus e norte-americanos e com recente insurgência dos asiáticos, pode ser bastante comemorada, já que o Brasil está engatinhando na área e ainda existe um grande preconceito com baristas de países produtores.

O barista Léo Moço, tricampeão brasileiro da modalidade Foto: Priscilla Fiedler

Para os campeonatos, Léo precisa encontrar grãos que além do ótimo sabor, tenham boas histórias. A nova joia de sua coleção ele achou em Carmo de Minas, interior de Minas Gerais: uma plantação de café dentro de uma mata nativa. O dono da Fazenda Santuário Sul, Luiz Paulo Ferreira, conta que descobriram o cafezal por acaso, quando procuravam uma égua perdida. A plantação tem milhares de pés de café com cerca de 12 metros de altura. O empresário diz que o mais provável é que esse “café selvagem” tenha relação com uma cultura escondida de escravos que trabalhavam na região, próxima a um antigo quilombo.  O barista e seu treinador japonês, contratado para prepará-lo para a competição, exploraram o grão até chegar ao ideal, uma bebida feita com o café “descansado”. Ainda congelaram os grãos com nitrogênio líquido em busca de “homogeneidade”.+ A febre da torrada com abacate+ Nova leva de cafeterias reforça 'terceira onda' do café na cidade Léo deu dicas para consolidar a secagem e desenvolver a torra ideal para o produto, que deve ser vendido em pequena escala para que se mantenha selvagem. 

‘Nunca compro um lote sem conhecer o produtor’

Representante das torrefações urbanas, Hugo Wolff começou vendendo seus cafés para cafeterias da moda e hoje já possui uma loja online que anda causando furor em São Paulo, a Wolff Café. Ele considera que a parte mais importante do seu trabalho é a valorização dos grãos dos produtores com quem trabalha, como por exemplo mulheres que vêm buscando espaço num mercado tão machista. Para isso, tem investido na exportação de uma parte desses grãos especiais, pois acha que a venda de alguns lotes para outros países pode dar o suporte necessário para que os produtores consigam crescer. O sucesso da operação de Hugo também depende do contato direto com os produtores parceiros. “Nunca compro um lote sem conhecer o produtor”, garante. E foi saindo da toca que seu negócio deslanchou. A produtora de Piatã, na Bahia, Brígida Salgado conheceu o caçador de grãos por acaso em Brasília. Ela faz parte da Cooperativa de Produtores Orgânicos e Biodinâmicos da Chapada Diamantina (Cooperbio), que reúne produtores de cafés especiais orgânicos da região, e entregou amostras de seu café a Wolff.  Dias depois, lá estava ele na Bahia, reunido com os produtores. Hoje se comunicam por e-mail e o produto é enviado até ele. “Mandamos amostras e ele liga explicando o que precisamos mudar”, conta a produtora.

Hugo Wolff vem fazendo barulho em São Paulo com sua linha de singles Foto: Márcio Fernandes|Estadão

A empresária Cecília Nakao auxilia Hugo em suas buscas na região do Caparaó (ES). Quando o torrefador viaja até lá, os produtores se reúnem para conversas e palestras que têm como grande objetivo fortalecer suas marcas. Para ela, a parte mais gratificante do trabalho que realizam é “diminuir o vão que existe entre as cadeias do café”.  Hugo afirma que seu trabalho foi inspirado por duas mulheres fortes que trabalham no mundo do café, um local ainda fortemente masculino. Sua mãe, produtora do grão, e Isabela Raposeiras, do Coffee Lab. E até hoje continua se cercando delas. Brígida, que já foi presidente da Aliança Internacional das Mulheres do Café (IWCA – Brasil), afirma que o meio é muito machista e que já foi muito desrespeitada, mas segue conquistando seu espaço diariamente. 

Longe das áreas tradicionais

O norueguês Eystein Veflingstad é torrador de café há dezoito anos, mas desde que se mudou para o Brasil com a mulher, em 2014, se embrenhou pelas regiões cafeeiras e virou coffee hunter. Foi fazendo pesquisas, buscando novos grãos, descobrindo tendências e abriu a Terceira Onda Consultoria em Café. Hoje trabalha com cinco produtores, que se ajudam mutuamente. O norueguês faz um diagnóstico da produção nacional e chama a atenção para áreas sem tradição cafeeira. “Precisamos nos ligar do que acontece no País, temos bons cafés em lugares não-tradicionais, como Araponga (MG)”, avalia. “Mas é tudo em escala reduzida.” 

O norueguês Eystein, que ajuda a desbravar plantações de café pelo Brasil Foto: Matheus Prado|Estadão

O produtor Deneval Vieira, do café Cordilheiras do Caparaó, no Espírito Santo, trabalha com Eystein. Ele conta que se interessou pela produção de cafés especiais em 2010, mas só encontrou a receita correta para sua fazenda, que está localizada em Iúna, cidade próxima da Serra do Caparaó, uma área difícil para o café, com a ajuda do consultor. “Ele dá assistência, mostra as qualidades do produto e o que precisa melhorar”, diz o produtor. O caçador de grãos afirma que a família manteve a autenticidade e faz ótimos cafés. Os filhos de Deneval estão investindo em conhecimento e aprendendo a torrar o grão que produzem.

ESPECIAL PARA O ESTADO

O Brasil dormiu por anos, mas acordou a tempo de tomar um bom café. Cafeterias, torrefações e lojas online não param de brotar nos grandes centros, especialmente nos últimos cinco anos, enquanto no interior produtores se capacitam e descobrem maneiras de valorizar seu produto. E é exatamente nesse cenário que entram em ação os novos caçadores de grãos, profissionais que além de garimpar cafés excepcionais (como faziam os antigos caçadores) se envolvem também em todos os aspectos da produção: identificam os grãos com potencial, de preferência com perfil específico e bem distinto dos encontrados no mercado, trabalham junto com o produtor para oferecer as melhores condições no campo, vendem as sacas e se envolvem também com a torra e com os métodos de extração. Tudo para produzir uma bebida de qualidade ímpar.

Caçadores acompanham toda cadeia produtiva do café Foto: Fernando Sciarra|Estadão

O termo

coffee hunter

surgiu nos Estados Unidos há pelo menos 20 anos, quando começaram a aparecer microtorrefações por lá e a ordem era se diferenciar. Em pouco tempo, a expressão chegou ao Brasil, mas por anos, esses profissionais ficaram “escondidos” em grandes empresas, basicamente identificando bons cafés para exportação. Não se dava atenção ao mercado local e muito menos ao que seria feito com os grãos depois de colhidos e vendidos. Por ironia, o maior produtor mundial de café demorou para aquecer seu mercado interno, o que vem acontecendo nos últimos anos com o aumento do interesse do público por grãos de qualidade, o aprimoramento do paladar nacional e, muito importante também, a melhoria das técnicas de torrefação e extração. 

Conhecer café e saber escolher não basta. Um bom

coffee hunter

tem de entender o que torna cada grão bom ou ruim e qual a maneira de extrair dele o que tem de melhor. Precisa combinar ousadia para descobrir novidades e entender o perfil do produto para determinar o grau de torra e até o tipo de extração mais indicado para o lote em questão. Como explica o especialista Ensei Neto, blogueiro do

Paladar

, é preciso saber ler o grão. “Um

coffee hunter

tem de conhecer o terroir, entender de colheita, secagem, preparo”. Joaquim Sertório Neto foi o primeiro

Q-Grader

certificado do Brasil – é assim que se chama o profissional que prova o café e dá a pontuação. Para ele, a procura por grãos de qualidade ganhou notoriedade nos últimos anos porque as pessoas passaram a se interessar pela origem do café que bebem.

+ 15 lugares para comprar café em São Paulo

+ Com croissants, baguetes e palmiers, Deli Garage é pedacinho da França na Vila Madalena

Na Semana Internacional do Café, feira anual realizada em Belo Horizonte, no fim de outubro, não faltaram ótimos exemplos dessa parceria. O evento promove o encontro de dois mundos no universo do café, como explica seu organizador e diretor de planejamento da Café Editora, Caio Fontes: “Reunimos o velho produtor, que nunca teve a oportunidade de sair da roça e essa nova geração de torrefadores e baristas que vê tendências e está buscando descobrir mais cafés de qualidade no Brasil”.

Conheça três caçadores de grãos da nova geração que estão em alta e atuam lado a lado com os produtores: Léo Moço, Eystein Veflingstad e Hugo Wolff.

Bons grãos com boas histórias

Dono da torrefação Café do Moço, em Curitiba, Léo Moço está sempre atrás de bons cafés não somente para abastecer seu negócio, mas também para levar às competições de baristas em que é assíduo. O carioca radicado na capital paranaense é tricampeão brasileiro e acabou de voltar da Coreia do Sul, onde participou pela terceira vez do Campeonato Mundial. A 31ª colocação conquistada na prova, historicamente dominada por europeus e norte-americanos e com recente insurgência dos asiáticos, pode ser bastante comemorada, já que o Brasil está engatinhando na área e ainda existe um grande preconceito com baristas de países produtores.

O barista Léo Moço, tricampeão brasileiro da modalidade Foto: Priscilla Fiedler

Para os campeonatos, Léo precisa encontrar grãos que além do ótimo sabor, tenham boas histórias. A nova joia de sua coleção ele achou em Carmo de Minas, interior de Minas Gerais: uma plantação de café dentro de uma mata nativa. O dono da Fazenda Santuário Sul, Luiz Paulo Ferreira, conta que descobriram o cafezal por acaso, quando procuravam uma égua perdida. A plantação tem milhares de pés de café com cerca de 12 metros de altura. O empresário diz que o mais provável é que esse “café selvagem” tenha relação com uma cultura escondida de escravos que trabalhavam na região, próxima a um antigo quilombo.  O barista e seu treinador japonês, contratado para prepará-lo para a competição, exploraram o grão até chegar ao ideal, uma bebida feita com o café “descansado”. Ainda congelaram os grãos com nitrogênio líquido em busca de “homogeneidade”.+ A febre da torrada com abacate+ Nova leva de cafeterias reforça 'terceira onda' do café na cidade Léo deu dicas para consolidar a secagem e desenvolver a torra ideal para o produto, que deve ser vendido em pequena escala para que se mantenha selvagem. 

‘Nunca compro um lote sem conhecer o produtor’

Representante das torrefações urbanas, Hugo Wolff começou vendendo seus cafés para cafeterias da moda e hoje já possui uma loja online que anda causando furor em São Paulo, a Wolff Café. Ele considera que a parte mais importante do seu trabalho é a valorização dos grãos dos produtores com quem trabalha, como por exemplo mulheres que vêm buscando espaço num mercado tão machista. Para isso, tem investido na exportação de uma parte desses grãos especiais, pois acha que a venda de alguns lotes para outros países pode dar o suporte necessário para que os produtores consigam crescer. O sucesso da operação de Hugo também depende do contato direto com os produtores parceiros. “Nunca compro um lote sem conhecer o produtor”, garante. E foi saindo da toca que seu negócio deslanchou. A produtora de Piatã, na Bahia, Brígida Salgado conheceu o caçador de grãos por acaso em Brasília. Ela faz parte da Cooperativa de Produtores Orgânicos e Biodinâmicos da Chapada Diamantina (Cooperbio), que reúne produtores de cafés especiais orgânicos da região, e entregou amostras de seu café a Wolff.  Dias depois, lá estava ele na Bahia, reunido com os produtores. Hoje se comunicam por e-mail e o produto é enviado até ele. “Mandamos amostras e ele liga explicando o que precisamos mudar”, conta a produtora.

Hugo Wolff vem fazendo barulho em São Paulo com sua linha de singles Foto: Márcio Fernandes|Estadão

A empresária Cecília Nakao auxilia Hugo em suas buscas na região do Caparaó (ES). Quando o torrefador viaja até lá, os produtores se reúnem para conversas e palestras que têm como grande objetivo fortalecer suas marcas. Para ela, a parte mais gratificante do trabalho que realizam é “diminuir o vão que existe entre as cadeias do café”.  Hugo afirma que seu trabalho foi inspirado por duas mulheres fortes que trabalham no mundo do café, um local ainda fortemente masculino. Sua mãe, produtora do grão, e Isabela Raposeiras, do Coffee Lab. E até hoje continua se cercando delas. Brígida, que já foi presidente da Aliança Internacional das Mulheres do Café (IWCA – Brasil), afirma que o meio é muito machista e que já foi muito desrespeitada, mas segue conquistando seu espaço diariamente. 

Longe das áreas tradicionais

O norueguês Eystein Veflingstad é torrador de café há dezoito anos, mas desde que se mudou para o Brasil com a mulher, em 2014, se embrenhou pelas regiões cafeeiras e virou coffee hunter. Foi fazendo pesquisas, buscando novos grãos, descobrindo tendências e abriu a Terceira Onda Consultoria em Café. Hoje trabalha com cinco produtores, que se ajudam mutuamente. O norueguês faz um diagnóstico da produção nacional e chama a atenção para áreas sem tradição cafeeira. “Precisamos nos ligar do que acontece no País, temos bons cafés em lugares não-tradicionais, como Araponga (MG)”, avalia. “Mas é tudo em escala reduzida.” 

O norueguês Eystein, que ajuda a desbravar plantações de café pelo Brasil Foto: Matheus Prado|Estadão

O produtor Deneval Vieira, do café Cordilheiras do Caparaó, no Espírito Santo, trabalha com Eystein. Ele conta que se interessou pela produção de cafés especiais em 2010, mas só encontrou a receita correta para sua fazenda, que está localizada em Iúna, cidade próxima da Serra do Caparaó, uma área difícil para o café, com a ajuda do consultor. “Ele dá assistência, mostra as qualidades do produto e o que precisa melhorar”, diz o produtor. O caçador de grãos afirma que a família manteve a autenticidade e faz ótimos cafés. Os filhos de Deneval estão investindo em conhecimento e aprendendo a torrar o grão que produzem.

ESPECIAL PARA O ESTADO

O Brasil dormiu por anos, mas acordou a tempo de tomar um bom café. Cafeterias, torrefações e lojas online não param de brotar nos grandes centros, especialmente nos últimos cinco anos, enquanto no interior produtores se capacitam e descobrem maneiras de valorizar seu produto. E é exatamente nesse cenário que entram em ação os novos caçadores de grãos, profissionais que além de garimpar cafés excepcionais (como faziam os antigos caçadores) se envolvem também em todos os aspectos da produção: identificam os grãos com potencial, de preferência com perfil específico e bem distinto dos encontrados no mercado, trabalham junto com o produtor para oferecer as melhores condições no campo, vendem as sacas e se envolvem também com a torra e com os métodos de extração. Tudo para produzir uma bebida de qualidade ímpar.

Caçadores acompanham toda cadeia produtiva do café Foto: Fernando Sciarra|Estadão

O termo

coffee hunter

surgiu nos Estados Unidos há pelo menos 20 anos, quando começaram a aparecer microtorrefações por lá e a ordem era se diferenciar. Em pouco tempo, a expressão chegou ao Brasil, mas por anos, esses profissionais ficaram “escondidos” em grandes empresas, basicamente identificando bons cafés para exportação. Não se dava atenção ao mercado local e muito menos ao que seria feito com os grãos depois de colhidos e vendidos. Por ironia, o maior produtor mundial de café demorou para aquecer seu mercado interno, o que vem acontecendo nos últimos anos com o aumento do interesse do público por grãos de qualidade, o aprimoramento do paladar nacional e, muito importante também, a melhoria das técnicas de torrefação e extração. 

Conhecer café e saber escolher não basta. Um bom

coffee hunter

tem de entender o que torna cada grão bom ou ruim e qual a maneira de extrair dele o que tem de melhor. Precisa combinar ousadia para descobrir novidades e entender o perfil do produto para determinar o grau de torra e até o tipo de extração mais indicado para o lote em questão. Como explica o especialista Ensei Neto, blogueiro do

Paladar

, é preciso saber ler o grão. “Um

coffee hunter

tem de conhecer o terroir, entender de colheita, secagem, preparo”. Joaquim Sertório Neto foi o primeiro

Q-Grader

certificado do Brasil – é assim que se chama o profissional que prova o café e dá a pontuação. Para ele, a procura por grãos de qualidade ganhou notoriedade nos últimos anos porque as pessoas passaram a se interessar pela origem do café que bebem.

+ 15 lugares para comprar café em São Paulo

+ Com croissants, baguetes e palmiers, Deli Garage é pedacinho da França na Vila Madalena

Na Semana Internacional do Café, feira anual realizada em Belo Horizonte, no fim de outubro, não faltaram ótimos exemplos dessa parceria. O evento promove o encontro de dois mundos no universo do café, como explica seu organizador e diretor de planejamento da Café Editora, Caio Fontes: “Reunimos o velho produtor, que nunca teve a oportunidade de sair da roça e essa nova geração de torrefadores e baristas que vê tendências e está buscando descobrir mais cafés de qualidade no Brasil”.

Conheça três caçadores de grãos da nova geração que estão em alta e atuam lado a lado com os produtores: Léo Moço, Eystein Veflingstad e Hugo Wolff.

Bons grãos com boas histórias

Dono da torrefação Café do Moço, em Curitiba, Léo Moço está sempre atrás de bons cafés não somente para abastecer seu negócio, mas também para levar às competições de baristas em que é assíduo. O carioca radicado na capital paranaense é tricampeão brasileiro e acabou de voltar da Coreia do Sul, onde participou pela terceira vez do Campeonato Mundial. A 31ª colocação conquistada na prova, historicamente dominada por europeus e norte-americanos e com recente insurgência dos asiáticos, pode ser bastante comemorada, já que o Brasil está engatinhando na área e ainda existe um grande preconceito com baristas de países produtores.

O barista Léo Moço, tricampeão brasileiro da modalidade Foto: Priscilla Fiedler

Para os campeonatos, Léo precisa encontrar grãos que além do ótimo sabor, tenham boas histórias. A nova joia de sua coleção ele achou em Carmo de Minas, interior de Minas Gerais: uma plantação de café dentro de uma mata nativa. O dono da Fazenda Santuário Sul, Luiz Paulo Ferreira, conta que descobriram o cafezal por acaso, quando procuravam uma égua perdida. A plantação tem milhares de pés de café com cerca de 12 metros de altura. O empresário diz que o mais provável é que esse “café selvagem” tenha relação com uma cultura escondida de escravos que trabalhavam na região, próxima a um antigo quilombo.  O barista e seu treinador japonês, contratado para prepará-lo para a competição, exploraram o grão até chegar ao ideal, uma bebida feita com o café “descansado”. Ainda congelaram os grãos com nitrogênio líquido em busca de “homogeneidade”.+ A febre da torrada com abacate+ Nova leva de cafeterias reforça 'terceira onda' do café na cidade Léo deu dicas para consolidar a secagem e desenvolver a torra ideal para o produto, que deve ser vendido em pequena escala para que se mantenha selvagem. 

‘Nunca compro um lote sem conhecer o produtor’

Representante das torrefações urbanas, Hugo Wolff começou vendendo seus cafés para cafeterias da moda e hoje já possui uma loja online que anda causando furor em São Paulo, a Wolff Café. Ele considera que a parte mais importante do seu trabalho é a valorização dos grãos dos produtores com quem trabalha, como por exemplo mulheres que vêm buscando espaço num mercado tão machista. Para isso, tem investido na exportação de uma parte desses grãos especiais, pois acha que a venda de alguns lotes para outros países pode dar o suporte necessário para que os produtores consigam crescer. O sucesso da operação de Hugo também depende do contato direto com os produtores parceiros. “Nunca compro um lote sem conhecer o produtor”, garante. E foi saindo da toca que seu negócio deslanchou. A produtora de Piatã, na Bahia, Brígida Salgado conheceu o caçador de grãos por acaso em Brasília. Ela faz parte da Cooperativa de Produtores Orgânicos e Biodinâmicos da Chapada Diamantina (Cooperbio), que reúne produtores de cafés especiais orgânicos da região, e entregou amostras de seu café a Wolff.  Dias depois, lá estava ele na Bahia, reunido com os produtores. Hoje se comunicam por e-mail e o produto é enviado até ele. “Mandamos amostras e ele liga explicando o que precisamos mudar”, conta a produtora.

Hugo Wolff vem fazendo barulho em São Paulo com sua linha de singles Foto: Márcio Fernandes|Estadão

A empresária Cecília Nakao auxilia Hugo em suas buscas na região do Caparaó (ES). Quando o torrefador viaja até lá, os produtores se reúnem para conversas e palestras que têm como grande objetivo fortalecer suas marcas. Para ela, a parte mais gratificante do trabalho que realizam é “diminuir o vão que existe entre as cadeias do café”.  Hugo afirma que seu trabalho foi inspirado por duas mulheres fortes que trabalham no mundo do café, um local ainda fortemente masculino. Sua mãe, produtora do grão, e Isabela Raposeiras, do Coffee Lab. E até hoje continua se cercando delas. Brígida, que já foi presidente da Aliança Internacional das Mulheres do Café (IWCA – Brasil), afirma que o meio é muito machista e que já foi muito desrespeitada, mas segue conquistando seu espaço diariamente. 

Longe das áreas tradicionais

O norueguês Eystein Veflingstad é torrador de café há dezoito anos, mas desde que se mudou para o Brasil com a mulher, em 2014, se embrenhou pelas regiões cafeeiras e virou coffee hunter. Foi fazendo pesquisas, buscando novos grãos, descobrindo tendências e abriu a Terceira Onda Consultoria em Café. Hoje trabalha com cinco produtores, que se ajudam mutuamente. O norueguês faz um diagnóstico da produção nacional e chama a atenção para áreas sem tradição cafeeira. “Precisamos nos ligar do que acontece no País, temos bons cafés em lugares não-tradicionais, como Araponga (MG)”, avalia. “Mas é tudo em escala reduzida.” 

O norueguês Eystein, que ajuda a desbravar plantações de café pelo Brasil Foto: Matheus Prado|Estadão

O produtor Deneval Vieira, do café Cordilheiras do Caparaó, no Espírito Santo, trabalha com Eystein. Ele conta que se interessou pela produção de cafés especiais em 2010, mas só encontrou a receita correta para sua fazenda, que está localizada em Iúna, cidade próxima da Serra do Caparaó, uma área difícil para o café, com a ajuda do consultor. “Ele dá assistência, mostra as qualidades do produto e o que precisa melhorar”, diz o produtor. O caçador de grãos afirma que a família manteve a autenticidade e faz ótimos cafés. Os filhos de Deneval estão investindo em conhecimento e aprendendo a torrar o grão que produzem.

ESPECIAL PARA O ESTADO

O Brasil dormiu por anos, mas acordou a tempo de tomar um bom café. Cafeterias, torrefações e lojas online não param de brotar nos grandes centros, especialmente nos últimos cinco anos, enquanto no interior produtores se capacitam e descobrem maneiras de valorizar seu produto. E é exatamente nesse cenário que entram em ação os novos caçadores de grãos, profissionais que além de garimpar cafés excepcionais (como faziam os antigos caçadores) se envolvem também em todos os aspectos da produção: identificam os grãos com potencial, de preferência com perfil específico e bem distinto dos encontrados no mercado, trabalham junto com o produtor para oferecer as melhores condições no campo, vendem as sacas e se envolvem também com a torra e com os métodos de extração. Tudo para produzir uma bebida de qualidade ímpar.

Caçadores acompanham toda cadeia produtiva do café Foto: Fernando Sciarra|Estadão

O termo

coffee hunter

surgiu nos Estados Unidos há pelo menos 20 anos, quando começaram a aparecer microtorrefações por lá e a ordem era se diferenciar. Em pouco tempo, a expressão chegou ao Brasil, mas por anos, esses profissionais ficaram “escondidos” em grandes empresas, basicamente identificando bons cafés para exportação. Não se dava atenção ao mercado local e muito menos ao que seria feito com os grãos depois de colhidos e vendidos. Por ironia, o maior produtor mundial de café demorou para aquecer seu mercado interno, o que vem acontecendo nos últimos anos com o aumento do interesse do público por grãos de qualidade, o aprimoramento do paladar nacional e, muito importante também, a melhoria das técnicas de torrefação e extração. 

Conhecer café e saber escolher não basta. Um bom

coffee hunter

tem de entender o que torna cada grão bom ou ruim e qual a maneira de extrair dele o que tem de melhor. Precisa combinar ousadia para descobrir novidades e entender o perfil do produto para determinar o grau de torra e até o tipo de extração mais indicado para o lote em questão. Como explica o especialista Ensei Neto, blogueiro do

Paladar

, é preciso saber ler o grão. “Um

coffee hunter

tem de conhecer o terroir, entender de colheita, secagem, preparo”. Joaquim Sertório Neto foi o primeiro

Q-Grader

certificado do Brasil – é assim que se chama o profissional que prova o café e dá a pontuação. Para ele, a procura por grãos de qualidade ganhou notoriedade nos últimos anos porque as pessoas passaram a se interessar pela origem do café que bebem.

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Na Semana Internacional do Café, feira anual realizada em Belo Horizonte, no fim de outubro, não faltaram ótimos exemplos dessa parceria. O evento promove o encontro de dois mundos no universo do café, como explica seu organizador e diretor de planejamento da Café Editora, Caio Fontes: “Reunimos o velho produtor, que nunca teve a oportunidade de sair da roça e essa nova geração de torrefadores e baristas que vê tendências e está buscando descobrir mais cafés de qualidade no Brasil”.

Conheça três caçadores de grãos da nova geração que estão em alta e atuam lado a lado com os produtores: Léo Moço, Eystein Veflingstad e Hugo Wolff.

Bons grãos com boas histórias

Dono da torrefação Café do Moço, em Curitiba, Léo Moço está sempre atrás de bons cafés não somente para abastecer seu negócio, mas também para levar às competições de baristas em que é assíduo. O carioca radicado na capital paranaense é tricampeão brasileiro e acabou de voltar da Coreia do Sul, onde participou pela terceira vez do Campeonato Mundial. A 31ª colocação conquistada na prova, historicamente dominada por europeus e norte-americanos e com recente insurgência dos asiáticos, pode ser bastante comemorada, já que o Brasil está engatinhando na área e ainda existe um grande preconceito com baristas de países produtores.

O barista Léo Moço, tricampeão brasileiro da modalidade Foto: Priscilla Fiedler

Para os campeonatos, Léo precisa encontrar grãos que além do ótimo sabor, tenham boas histórias. A nova joia de sua coleção ele achou em Carmo de Minas, interior de Minas Gerais: uma plantação de café dentro de uma mata nativa. O dono da Fazenda Santuário Sul, Luiz Paulo Ferreira, conta que descobriram o cafezal por acaso, quando procuravam uma égua perdida. A plantação tem milhares de pés de café com cerca de 12 metros de altura. O empresário diz que o mais provável é que esse “café selvagem” tenha relação com uma cultura escondida de escravos que trabalhavam na região, próxima a um antigo quilombo.  O barista e seu treinador japonês, contratado para prepará-lo para a competição, exploraram o grão até chegar ao ideal, uma bebida feita com o café “descansado”. Ainda congelaram os grãos com nitrogênio líquido em busca de “homogeneidade”.+ A febre da torrada com abacate+ Nova leva de cafeterias reforça 'terceira onda' do café na cidade Léo deu dicas para consolidar a secagem e desenvolver a torra ideal para o produto, que deve ser vendido em pequena escala para que se mantenha selvagem. 

‘Nunca compro um lote sem conhecer o produtor’

Representante das torrefações urbanas, Hugo Wolff começou vendendo seus cafés para cafeterias da moda e hoje já possui uma loja online que anda causando furor em São Paulo, a Wolff Café. Ele considera que a parte mais importante do seu trabalho é a valorização dos grãos dos produtores com quem trabalha, como por exemplo mulheres que vêm buscando espaço num mercado tão machista. Para isso, tem investido na exportação de uma parte desses grãos especiais, pois acha que a venda de alguns lotes para outros países pode dar o suporte necessário para que os produtores consigam crescer. O sucesso da operação de Hugo também depende do contato direto com os produtores parceiros. “Nunca compro um lote sem conhecer o produtor”, garante. E foi saindo da toca que seu negócio deslanchou. A produtora de Piatã, na Bahia, Brígida Salgado conheceu o caçador de grãos por acaso em Brasília. Ela faz parte da Cooperativa de Produtores Orgânicos e Biodinâmicos da Chapada Diamantina (Cooperbio), que reúne produtores de cafés especiais orgânicos da região, e entregou amostras de seu café a Wolff.  Dias depois, lá estava ele na Bahia, reunido com os produtores. Hoje se comunicam por e-mail e o produto é enviado até ele. “Mandamos amostras e ele liga explicando o que precisamos mudar”, conta a produtora.

Hugo Wolff vem fazendo barulho em São Paulo com sua linha de singles Foto: Márcio Fernandes|Estadão

A empresária Cecília Nakao auxilia Hugo em suas buscas na região do Caparaó (ES). Quando o torrefador viaja até lá, os produtores se reúnem para conversas e palestras que têm como grande objetivo fortalecer suas marcas. Para ela, a parte mais gratificante do trabalho que realizam é “diminuir o vão que existe entre as cadeias do café”.  Hugo afirma que seu trabalho foi inspirado por duas mulheres fortes que trabalham no mundo do café, um local ainda fortemente masculino. Sua mãe, produtora do grão, e Isabela Raposeiras, do Coffee Lab. E até hoje continua se cercando delas. Brígida, que já foi presidente da Aliança Internacional das Mulheres do Café (IWCA – Brasil), afirma que o meio é muito machista e que já foi muito desrespeitada, mas segue conquistando seu espaço diariamente. 

Longe das áreas tradicionais

O norueguês Eystein Veflingstad é torrador de café há dezoito anos, mas desde que se mudou para o Brasil com a mulher, em 2014, se embrenhou pelas regiões cafeeiras e virou coffee hunter. Foi fazendo pesquisas, buscando novos grãos, descobrindo tendências e abriu a Terceira Onda Consultoria em Café. Hoje trabalha com cinco produtores, que se ajudam mutuamente. O norueguês faz um diagnóstico da produção nacional e chama a atenção para áreas sem tradição cafeeira. “Precisamos nos ligar do que acontece no País, temos bons cafés em lugares não-tradicionais, como Araponga (MG)”, avalia. “Mas é tudo em escala reduzida.” 

O norueguês Eystein, que ajuda a desbravar plantações de café pelo Brasil Foto: Matheus Prado|Estadão

O produtor Deneval Vieira, do café Cordilheiras do Caparaó, no Espírito Santo, trabalha com Eystein. Ele conta que se interessou pela produção de cafés especiais em 2010, mas só encontrou a receita correta para sua fazenda, que está localizada em Iúna, cidade próxima da Serra do Caparaó, uma área difícil para o café, com a ajuda do consultor. “Ele dá assistência, mostra as qualidades do produto e o que precisa melhorar”, diz o produtor. O caçador de grãos afirma que a família manteve a autenticidade e faz ótimos cafés. Os filhos de Deneval estão investindo em conhecimento e aprendendo a torrar o grão que produzem.

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