A cultura pop no pote


Lámen sempre foi popular no Japão, vendido a preço baixo em milhares de casas especializadas. Aí foi parar nos Estados Unidos e, pelas mãos de chefs, virou pop

Por José Orenstein

Há em Tóquio, supostamente, mais de 5.000 restaurantes especializados em lámen, nada além de lámen. No Japão seriam 40 mil, no total. Não sei se o número é confiável, mas é indício de um fato: lámen é popular no Japão, nos dois sentidos – é comida do dia a dia e é, também, pop. E, mesmo quando é meio ruim, é bom; superfácil de comer; barato (como a pizza deveria ser); e, quanto mais simples, melhor.

  Foto: Tiago Queiroz|Estadão

Em Tóquio, é bastante comum uma curiosa forma de ramen-ya, os restaurantes especializados: são portinhas. Você entra – ou às vezes até do lado de fora – e escolhe o lámen numa máquina, como aquelas de refrigerante. Você faz a seleção, se quiser acrescenta ingredientes, um ovo a mais, de repente, e paga. A máquina cospe uma ficha, geralmente emitindo sons fofos e palavras de agradecimento, japoneses são pródigos nisso. Você vai até o fim do corredor – são sempre corredores – entrega a ficha na janelica que dá para cozinha e recebe, em troca, um bowl fumegante. Em pé mesmo, aboletado no balcão, tem a obrigação tácita de, em poucos minutos, sorver ruidosamente os fios da massa afogados no caldo restaurador. 

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Em dias quentes ou frios, come-se lámen. É um prazer intenso e fugaz – que custa em torno de 500 yenes (R$ 16). Uma comida rápida na hora do almoço.

Há também as casas um pouco maiores em que você pode se sentar e onde o chef varia o caldo e os complementos. Tem até ramen-ya com estrela Michelin em Tóquio. Mas, no geral, é coisa popular – e nem por isso pouco sofisticada no sabor.

Hit pop. Do outro lado do Pacífico, nos Estados Unidos, é que o lámen – o ramen, como dizem os americanos, com o “r” retroflexo – realizou plenamente sua vocação pop. Em meados dos anos 2000, começaram a abrir restaurantes especializados em Los Angeles e Nova York. O lámen, enfim, fez a América. Claro, uma forma muito particular dele, o macarrão instantâneo, o cup noodles de microondas, já era consumido ali. Mas com a abertura de casas como o Momofuku Noodle Bar, em Nova York, em 2004, ou a chegada da rede japonesa Ippudo à cidade, em 2008, que o lámen, feito com massa fresca e caldo apurado, que ramen-yas viraram moda.

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A ramenmania foi tão longe que o próprio David Chang, que a propulsionou com o Momofuku, decretou no ano passado em sua revista, a Lucky Peach, que o “lámen está morto”. Segundo o chef-empresário, “o lámen está em todo lugar, e é igual em todo lugar”.

Não há inovação, e a qualidade do que se come, ao menos nos EUA, é baixa. Ele escreve até que o seu próprio lámen, no Momofuku, é superestimado. 

Exageros à parte, vale visitar as casas de Ivan Orkin e o Ramen Lab, aberto no ano passado no SoHo, casa minúscula, onde se come em pé ótimos lámens – o lugar pertence à fábrica de massa Sun Noodles e foi aberto para “educar o americano sobre a cultura do lámen japonesa”. Longas filas na porta do restaurante mostram que a fome estadunidense por lámen está longe de ser saciada.

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Po aqui, casas especializadas em lámen, incorporando o respeito com os ingredientes da tradição japonesa e a embalagem pop americana, começam a aparecer fora do tradicional circuito da Liberdade. ‘O melhor lámen da minha vida’

Eu tinha um dia para conhecer Fukuoka, cidade industrial, a mais populosa da ilha de Kyushu, ao sul do Japão. Seria só um pit-stop antes de passar uns dias mergulhado feito lámen nas águas sulfurosas no Monte Aso, ali nas proximidades.

Resolvi passear no mercado da cidade, era quase meio-dia, a fome apertava. Eu não falo japonês, os comerciantes não falavam português nem inglês, mas com palavras-chave – “lámen” – e gestos – “¯\_(*-*)_/¯” – entendi que o que eu procurava ficava a poucas quadras dali. 

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Fukuoka é o berço do lámen estilo Hakata (outro nome dado à região e que batiza também a estação de trem da cidade). É dos lámens mais populares do mundo, o tonkotsu ramen, feito com um caldo de porco denso, viscoso e opaco – entre cinza e marrom.

Depois de umas erradas, cheguei no que seria o melhor da cidade. Esperava um restaurante portentoso, mas era só uma portinha, numa microrrua, com uma fila de operários do lado fora. 

Um a um fomos entrando, silenciosamente, e ocupando os seis lugares do balcão. Do outro lado, dois cozinheiros e enormes caldeirões. Numa bonita coreografia, eles cozinhavam a massa e a escorriam com uma mão, para então montar as cumbucas de lámen hakata. A acidez do caldo excitava a língua, a massa bem amarela era, a um só tempo, elástica e esponjosa. A fatia de carne de porco desmanchava à dentada, a cebolinha superfresca coloria e abria o sabor do prato. Sluuuurp. 

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Fazia calor, suei à beça e comi um dos melhores lámens da vida. Sem ter tomado nada de álcool, saí meio que bêbado pelas ruas sem nome, voltei ao mercado para agradecer a indicação. Esqueci de anotar como se chamava o restaurante. Mas, se você quiser ir lá, é só perguntar, ou gesticular, pelo melhor lámen da cidade no mercado de Yanagibashi, em Fukuoka. 

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Thiago Bañares,do Tan Tan Noodles Bar,ensina os segredos para não se perderna tigela

Há em Tóquio, supostamente, mais de 5.000 restaurantes especializados em lámen, nada além de lámen. No Japão seriam 40 mil, no total. Não sei se o número é confiável, mas é indício de um fato: lámen é popular no Japão, nos dois sentidos – é comida do dia a dia e é, também, pop. E, mesmo quando é meio ruim, é bom; superfácil de comer; barato (como a pizza deveria ser); e, quanto mais simples, melhor.

  Foto: Tiago Queiroz|Estadão

Em Tóquio, é bastante comum uma curiosa forma de ramen-ya, os restaurantes especializados: são portinhas. Você entra – ou às vezes até do lado de fora – e escolhe o lámen numa máquina, como aquelas de refrigerante. Você faz a seleção, se quiser acrescenta ingredientes, um ovo a mais, de repente, e paga. A máquina cospe uma ficha, geralmente emitindo sons fofos e palavras de agradecimento, japoneses são pródigos nisso. Você vai até o fim do corredor – são sempre corredores – entrega a ficha na janelica que dá para cozinha e recebe, em troca, um bowl fumegante. Em pé mesmo, aboletado no balcão, tem a obrigação tácita de, em poucos minutos, sorver ruidosamente os fios da massa afogados no caldo restaurador. 

Em dias quentes ou frios, come-se lámen. É um prazer intenso e fugaz – que custa em torno de 500 yenes (R$ 16). Uma comida rápida na hora do almoço.

Há também as casas um pouco maiores em que você pode se sentar e onde o chef varia o caldo e os complementos. Tem até ramen-ya com estrela Michelin em Tóquio. Mas, no geral, é coisa popular – e nem por isso pouco sofisticada no sabor.

Hit pop. Do outro lado do Pacífico, nos Estados Unidos, é que o lámen – o ramen, como dizem os americanos, com o “r” retroflexo – realizou plenamente sua vocação pop. Em meados dos anos 2000, começaram a abrir restaurantes especializados em Los Angeles e Nova York. O lámen, enfim, fez a América. Claro, uma forma muito particular dele, o macarrão instantâneo, o cup noodles de microondas, já era consumido ali. Mas com a abertura de casas como o Momofuku Noodle Bar, em Nova York, em 2004, ou a chegada da rede japonesa Ippudo à cidade, em 2008, que o lámen, feito com massa fresca e caldo apurado, que ramen-yas viraram moda.

A ramenmania foi tão longe que o próprio David Chang, que a propulsionou com o Momofuku, decretou no ano passado em sua revista, a Lucky Peach, que o “lámen está morto”. Segundo o chef-empresário, “o lámen está em todo lugar, e é igual em todo lugar”.

Não há inovação, e a qualidade do que se come, ao menos nos EUA, é baixa. Ele escreve até que o seu próprio lámen, no Momofuku, é superestimado. 

Exageros à parte, vale visitar as casas de Ivan Orkin e o Ramen Lab, aberto no ano passado no SoHo, casa minúscula, onde se come em pé ótimos lámens – o lugar pertence à fábrica de massa Sun Noodles e foi aberto para “educar o americano sobre a cultura do lámen japonesa”. Longas filas na porta do restaurante mostram que a fome estadunidense por lámen está longe de ser saciada.

Po aqui, casas especializadas em lámen, incorporando o respeito com os ingredientes da tradição japonesa e a embalagem pop americana, começam a aparecer fora do tradicional circuito da Liberdade. ‘O melhor lámen da minha vida’

Eu tinha um dia para conhecer Fukuoka, cidade industrial, a mais populosa da ilha de Kyushu, ao sul do Japão. Seria só um pit-stop antes de passar uns dias mergulhado feito lámen nas águas sulfurosas no Monte Aso, ali nas proximidades.

Resolvi passear no mercado da cidade, era quase meio-dia, a fome apertava. Eu não falo japonês, os comerciantes não falavam português nem inglês, mas com palavras-chave – “lámen” – e gestos – “¯\_(*-*)_/¯” – entendi que o que eu procurava ficava a poucas quadras dali. 

Fukuoka é o berço do lámen estilo Hakata (outro nome dado à região e que batiza também a estação de trem da cidade). É dos lámens mais populares do mundo, o tonkotsu ramen, feito com um caldo de porco denso, viscoso e opaco – entre cinza e marrom.

Depois de umas erradas, cheguei no que seria o melhor da cidade. Esperava um restaurante portentoso, mas era só uma portinha, numa microrrua, com uma fila de operários do lado fora. 

Um a um fomos entrando, silenciosamente, e ocupando os seis lugares do balcão. Do outro lado, dois cozinheiros e enormes caldeirões. Numa bonita coreografia, eles cozinhavam a massa e a escorriam com uma mão, para então montar as cumbucas de lámen hakata. A acidez do caldo excitava a língua, a massa bem amarela era, a um só tempo, elástica e esponjosa. A fatia de carne de porco desmanchava à dentada, a cebolinha superfresca coloria e abria o sabor do prato. Sluuuurp. 

Fazia calor, suei à beça e comi um dos melhores lámens da vida. Sem ter tomado nada de álcool, saí meio que bêbado pelas ruas sem nome, voltei ao mercado para agradecer a indicação. Esqueci de anotar como se chamava o restaurante. Mas, se você quiser ir lá, é só perguntar, ou gesticular, pelo melhor lámen da cidade no mercado de Yanagibashi, em Fukuoka. 

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Thiago Bañares,do Tan Tan Noodles Bar,ensina os segredos para não se perderna tigela

Há em Tóquio, supostamente, mais de 5.000 restaurantes especializados em lámen, nada além de lámen. No Japão seriam 40 mil, no total. Não sei se o número é confiável, mas é indício de um fato: lámen é popular no Japão, nos dois sentidos – é comida do dia a dia e é, também, pop. E, mesmo quando é meio ruim, é bom; superfácil de comer; barato (como a pizza deveria ser); e, quanto mais simples, melhor.

  Foto: Tiago Queiroz|Estadão

Em Tóquio, é bastante comum uma curiosa forma de ramen-ya, os restaurantes especializados: são portinhas. Você entra – ou às vezes até do lado de fora – e escolhe o lámen numa máquina, como aquelas de refrigerante. Você faz a seleção, se quiser acrescenta ingredientes, um ovo a mais, de repente, e paga. A máquina cospe uma ficha, geralmente emitindo sons fofos e palavras de agradecimento, japoneses são pródigos nisso. Você vai até o fim do corredor – são sempre corredores – entrega a ficha na janelica que dá para cozinha e recebe, em troca, um bowl fumegante. Em pé mesmo, aboletado no balcão, tem a obrigação tácita de, em poucos minutos, sorver ruidosamente os fios da massa afogados no caldo restaurador. 

Em dias quentes ou frios, come-se lámen. É um prazer intenso e fugaz – que custa em torno de 500 yenes (R$ 16). Uma comida rápida na hora do almoço.

Há também as casas um pouco maiores em que você pode se sentar e onde o chef varia o caldo e os complementos. Tem até ramen-ya com estrela Michelin em Tóquio. Mas, no geral, é coisa popular – e nem por isso pouco sofisticada no sabor.

Hit pop. Do outro lado do Pacífico, nos Estados Unidos, é que o lámen – o ramen, como dizem os americanos, com o “r” retroflexo – realizou plenamente sua vocação pop. Em meados dos anos 2000, começaram a abrir restaurantes especializados em Los Angeles e Nova York. O lámen, enfim, fez a América. Claro, uma forma muito particular dele, o macarrão instantâneo, o cup noodles de microondas, já era consumido ali. Mas com a abertura de casas como o Momofuku Noodle Bar, em Nova York, em 2004, ou a chegada da rede japonesa Ippudo à cidade, em 2008, que o lámen, feito com massa fresca e caldo apurado, que ramen-yas viraram moda.

A ramenmania foi tão longe que o próprio David Chang, que a propulsionou com o Momofuku, decretou no ano passado em sua revista, a Lucky Peach, que o “lámen está morto”. Segundo o chef-empresário, “o lámen está em todo lugar, e é igual em todo lugar”.

Não há inovação, e a qualidade do que se come, ao menos nos EUA, é baixa. Ele escreve até que o seu próprio lámen, no Momofuku, é superestimado. 

Exageros à parte, vale visitar as casas de Ivan Orkin e o Ramen Lab, aberto no ano passado no SoHo, casa minúscula, onde se come em pé ótimos lámens – o lugar pertence à fábrica de massa Sun Noodles e foi aberto para “educar o americano sobre a cultura do lámen japonesa”. Longas filas na porta do restaurante mostram que a fome estadunidense por lámen está longe de ser saciada.

Po aqui, casas especializadas em lámen, incorporando o respeito com os ingredientes da tradição japonesa e a embalagem pop americana, começam a aparecer fora do tradicional circuito da Liberdade. ‘O melhor lámen da minha vida’

Eu tinha um dia para conhecer Fukuoka, cidade industrial, a mais populosa da ilha de Kyushu, ao sul do Japão. Seria só um pit-stop antes de passar uns dias mergulhado feito lámen nas águas sulfurosas no Monte Aso, ali nas proximidades.

Resolvi passear no mercado da cidade, era quase meio-dia, a fome apertava. Eu não falo japonês, os comerciantes não falavam português nem inglês, mas com palavras-chave – “lámen” – e gestos – “¯\_(*-*)_/¯” – entendi que o que eu procurava ficava a poucas quadras dali. 

Fukuoka é o berço do lámen estilo Hakata (outro nome dado à região e que batiza também a estação de trem da cidade). É dos lámens mais populares do mundo, o tonkotsu ramen, feito com um caldo de porco denso, viscoso e opaco – entre cinza e marrom.

Depois de umas erradas, cheguei no que seria o melhor da cidade. Esperava um restaurante portentoso, mas era só uma portinha, numa microrrua, com uma fila de operários do lado fora. 

Um a um fomos entrando, silenciosamente, e ocupando os seis lugares do balcão. Do outro lado, dois cozinheiros e enormes caldeirões. Numa bonita coreografia, eles cozinhavam a massa e a escorriam com uma mão, para então montar as cumbucas de lámen hakata. A acidez do caldo excitava a língua, a massa bem amarela era, a um só tempo, elástica e esponjosa. A fatia de carne de porco desmanchava à dentada, a cebolinha superfresca coloria e abria o sabor do prato. Sluuuurp. 

Fazia calor, suei à beça e comi um dos melhores lámens da vida. Sem ter tomado nada de álcool, saí meio que bêbado pelas ruas sem nome, voltei ao mercado para agradecer a indicação. Esqueci de anotar como se chamava o restaurante. Mas, se você quiser ir lá, é só perguntar, ou gesticular, pelo melhor lámen da cidade no mercado de Yanagibashi, em Fukuoka. 

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Thiago Bañares,do Tan Tan Noodles Bar,ensina os segredos para não se perderna tigela

Há em Tóquio, supostamente, mais de 5.000 restaurantes especializados em lámen, nada além de lámen. No Japão seriam 40 mil, no total. Não sei se o número é confiável, mas é indício de um fato: lámen é popular no Japão, nos dois sentidos – é comida do dia a dia e é, também, pop. E, mesmo quando é meio ruim, é bom; superfácil de comer; barato (como a pizza deveria ser); e, quanto mais simples, melhor.

  Foto: Tiago Queiroz|Estadão

Em Tóquio, é bastante comum uma curiosa forma de ramen-ya, os restaurantes especializados: são portinhas. Você entra – ou às vezes até do lado de fora – e escolhe o lámen numa máquina, como aquelas de refrigerante. Você faz a seleção, se quiser acrescenta ingredientes, um ovo a mais, de repente, e paga. A máquina cospe uma ficha, geralmente emitindo sons fofos e palavras de agradecimento, japoneses são pródigos nisso. Você vai até o fim do corredor – são sempre corredores – entrega a ficha na janelica que dá para cozinha e recebe, em troca, um bowl fumegante. Em pé mesmo, aboletado no balcão, tem a obrigação tácita de, em poucos minutos, sorver ruidosamente os fios da massa afogados no caldo restaurador. 

Em dias quentes ou frios, come-se lámen. É um prazer intenso e fugaz – que custa em torno de 500 yenes (R$ 16). Uma comida rápida na hora do almoço.

Há também as casas um pouco maiores em que você pode se sentar e onde o chef varia o caldo e os complementos. Tem até ramen-ya com estrela Michelin em Tóquio. Mas, no geral, é coisa popular – e nem por isso pouco sofisticada no sabor.

Hit pop. Do outro lado do Pacífico, nos Estados Unidos, é que o lámen – o ramen, como dizem os americanos, com o “r” retroflexo – realizou plenamente sua vocação pop. Em meados dos anos 2000, começaram a abrir restaurantes especializados em Los Angeles e Nova York. O lámen, enfim, fez a América. Claro, uma forma muito particular dele, o macarrão instantâneo, o cup noodles de microondas, já era consumido ali. Mas com a abertura de casas como o Momofuku Noodle Bar, em Nova York, em 2004, ou a chegada da rede japonesa Ippudo à cidade, em 2008, que o lámen, feito com massa fresca e caldo apurado, que ramen-yas viraram moda.

A ramenmania foi tão longe que o próprio David Chang, que a propulsionou com o Momofuku, decretou no ano passado em sua revista, a Lucky Peach, que o “lámen está morto”. Segundo o chef-empresário, “o lámen está em todo lugar, e é igual em todo lugar”.

Não há inovação, e a qualidade do que se come, ao menos nos EUA, é baixa. Ele escreve até que o seu próprio lámen, no Momofuku, é superestimado. 

Exageros à parte, vale visitar as casas de Ivan Orkin e o Ramen Lab, aberto no ano passado no SoHo, casa minúscula, onde se come em pé ótimos lámens – o lugar pertence à fábrica de massa Sun Noodles e foi aberto para “educar o americano sobre a cultura do lámen japonesa”. Longas filas na porta do restaurante mostram que a fome estadunidense por lámen está longe de ser saciada.

Po aqui, casas especializadas em lámen, incorporando o respeito com os ingredientes da tradição japonesa e a embalagem pop americana, começam a aparecer fora do tradicional circuito da Liberdade. ‘O melhor lámen da minha vida’

Eu tinha um dia para conhecer Fukuoka, cidade industrial, a mais populosa da ilha de Kyushu, ao sul do Japão. Seria só um pit-stop antes de passar uns dias mergulhado feito lámen nas águas sulfurosas no Monte Aso, ali nas proximidades.

Resolvi passear no mercado da cidade, era quase meio-dia, a fome apertava. Eu não falo japonês, os comerciantes não falavam português nem inglês, mas com palavras-chave – “lámen” – e gestos – “¯\_(*-*)_/¯” – entendi que o que eu procurava ficava a poucas quadras dali. 

Fukuoka é o berço do lámen estilo Hakata (outro nome dado à região e que batiza também a estação de trem da cidade). É dos lámens mais populares do mundo, o tonkotsu ramen, feito com um caldo de porco denso, viscoso e opaco – entre cinza e marrom.

Depois de umas erradas, cheguei no que seria o melhor da cidade. Esperava um restaurante portentoso, mas era só uma portinha, numa microrrua, com uma fila de operários do lado fora. 

Um a um fomos entrando, silenciosamente, e ocupando os seis lugares do balcão. Do outro lado, dois cozinheiros e enormes caldeirões. Numa bonita coreografia, eles cozinhavam a massa e a escorriam com uma mão, para então montar as cumbucas de lámen hakata. A acidez do caldo excitava a língua, a massa bem amarela era, a um só tempo, elástica e esponjosa. A fatia de carne de porco desmanchava à dentada, a cebolinha superfresca coloria e abria o sabor do prato. Sluuuurp. 

Fazia calor, suei à beça e comi um dos melhores lámens da vida. Sem ter tomado nada de álcool, saí meio que bêbado pelas ruas sem nome, voltei ao mercado para agradecer a indicação. Esqueci de anotar como se chamava o restaurante. Mas, se você quiser ir lá, é só perguntar, ou gesticular, pelo melhor lámen da cidade no mercado de Yanagibashi, em Fukuoka. 

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Thiago Bañares,do Tan Tan Noodles Bar,ensina os segredos para não se perderna tigela

Há em Tóquio, supostamente, mais de 5.000 restaurantes especializados em lámen, nada além de lámen. No Japão seriam 40 mil, no total. Não sei se o número é confiável, mas é indício de um fato: lámen é popular no Japão, nos dois sentidos – é comida do dia a dia e é, também, pop. E, mesmo quando é meio ruim, é bom; superfácil de comer; barato (como a pizza deveria ser); e, quanto mais simples, melhor.

  Foto: Tiago Queiroz|Estadão

Em Tóquio, é bastante comum uma curiosa forma de ramen-ya, os restaurantes especializados: são portinhas. Você entra – ou às vezes até do lado de fora – e escolhe o lámen numa máquina, como aquelas de refrigerante. Você faz a seleção, se quiser acrescenta ingredientes, um ovo a mais, de repente, e paga. A máquina cospe uma ficha, geralmente emitindo sons fofos e palavras de agradecimento, japoneses são pródigos nisso. Você vai até o fim do corredor – são sempre corredores – entrega a ficha na janelica que dá para cozinha e recebe, em troca, um bowl fumegante. Em pé mesmo, aboletado no balcão, tem a obrigação tácita de, em poucos minutos, sorver ruidosamente os fios da massa afogados no caldo restaurador. 

Em dias quentes ou frios, come-se lámen. É um prazer intenso e fugaz – que custa em torno de 500 yenes (R$ 16). Uma comida rápida na hora do almoço.

Há também as casas um pouco maiores em que você pode se sentar e onde o chef varia o caldo e os complementos. Tem até ramen-ya com estrela Michelin em Tóquio. Mas, no geral, é coisa popular – e nem por isso pouco sofisticada no sabor.

Hit pop. Do outro lado do Pacífico, nos Estados Unidos, é que o lámen – o ramen, como dizem os americanos, com o “r” retroflexo – realizou plenamente sua vocação pop. Em meados dos anos 2000, começaram a abrir restaurantes especializados em Los Angeles e Nova York. O lámen, enfim, fez a América. Claro, uma forma muito particular dele, o macarrão instantâneo, o cup noodles de microondas, já era consumido ali. Mas com a abertura de casas como o Momofuku Noodle Bar, em Nova York, em 2004, ou a chegada da rede japonesa Ippudo à cidade, em 2008, que o lámen, feito com massa fresca e caldo apurado, que ramen-yas viraram moda.

A ramenmania foi tão longe que o próprio David Chang, que a propulsionou com o Momofuku, decretou no ano passado em sua revista, a Lucky Peach, que o “lámen está morto”. Segundo o chef-empresário, “o lámen está em todo lugar, e é igual em todo lugar”.

Não há inovação, e a qualidade do que se come, ao menos nos EUA, é baixa. Ele escreve até que o seu próprio lámen, no Momofuku, é superestimado. 

Exageros à parte, vale visitar as casas de Ivan Orkin e o Ramen Lab, aberto no ano passado no SoHo, casa minúscula, onde se come em pé ótimos lámens – o lugar pertence à fábrica de massa Sun Noodles e foi aberto para “educar o americano sobre a cultura do lámen japonesa”. Longas filas na porta do restaurante mostram que a fome estadunidense por lámen está longe de ser saciada.

Po aqui, casas especializadas em lámen, incorporando o respeito com os ingredientes da tradição japonesa e a embalagem pop americana, começam a aparecer fora do tradicional circuito da Liberdade. ‘O melhor lámen da minha vida’

Eu tinha um dia para conhecer Fukuoka, cidade industrial, a mais populosa da ilha de Kyushu, ao sul do Japão. Seria só um pit-stop antes de passar uns dias mergulhado feito lámen nas águas sulfurosas no Monte Aso, ali nas proximidades.

Resolvi passear no mercado da cidade, era quase meio-dia, a fome apertava. Eu não falo japonês, os comerciantes não falavam português nem inglês, mas com palavras-chave – “lámen” – e gestos – “¯\_(*-*)_/¯” – entendi que o que eu procurava ficava a poucas quadras dali. 

Fukuoka é o berço do lámen estilo Hakata (outro nome dado à região e que batiza também a estação de trem da cidade). É dos lámens mais populares do mundo, o tonkotsu ramen, feito com um caldo de porco denso, viscoso e opaco – entre cinza e marrom.

Depois de umas erradas, cheguei no que seria o melhor da cidade. Esperava um restaurante portentoso, mas era só uma portinha, numa microrrua, com uma fila de operários do lado fora. 

Um a um fomos entrando, silenciosamente, e ocupando os seis lugares do balcão. Do outro lado, dois cozinheiros e enormes caldeirões. Numa bonita coreografia, eles cozinhavam a massa e a escorriam com uma mão, para então montar as cumbucas de lámen hakata. A acidez do caldo excitava a língua, a massa bem amarela era, a um só tempo, elástica e esponjosa. A fatia de carne de porco desmanchava à dentada, a cebolinha superfresca coloria e abria o sabor do prato. Sluuuurp. 

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