Cumaru, puxuri, pacová: especiarias brasileiras ganham espaço na confeitaria


Confeiteiros brasileiros estão trocando as especiarias clássicas como cravo e canela por sementes, favas e até raízes nacionais aromáticas

Por Nana Tucci
Atualização:

Especial para o Estado

Os confeiteiros brasileiros andam às voltas com especiarias nacionais. São frutos aromáticos que já estavam por aqui quando os portugueses chegaram – estão espalhados pela região amazônica, pela Mata Atlântica, pelo Nordeste e pelo Cerrado –, mas só nos últimos dez anos, quando começou-se a falar mais a sério em uma gastronomia brasileira envolvendo diferentes biomas, eles começaram a aparecer nas cozinhas profissionais e agora já marcam presença na doçaria. 

A baunilha do Cerrado foi a primeira a fazer fama. Hoje, outras sementes, favas e raízes estão perfumando nossos doces e ganhando espaço também nos boxes dos mercados municipais e pequenos empórios.

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Pudim de leite com aridan, receita do chef-confeiteiro Rodrigo Ribeiro Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O arroz-doce do chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro leva cumaru, puxuri, amburana e pacová. A lista de ingredientes de seu brigadeiro inclui cumaru e o caramelo do pudim de leite tem uma especiaria poderosa, a fava de aridan. São todas nativas, com exceção da fava, que já é naturalizada brasileira, mas veio da África.

Também consultor e professor, Rodrigo, que comandou por dois anos a confeitaria do restaurante Petí, anda empenhado em usar especiarias nativas para transformar sobremesas de avó, aquelas que estão na memória afetiva dos brasileiros – como o pudim de leite, o arroz-doce e o brigadeiro que preparou para esta reportagem. 

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As especiarias nacionais, curiosamente, são mais conhecidas nos rituais religiosos de Candomblé do que na cozinha – são usadas em banhos de proteção, então, não estranhe no pé da página a casa Rei dos Orixás como ponto de venda da fava de aridan: é só lá que você vai achar esse ingrediente que transforma as sobremesas com seu aroma de banana-passa, fazendo um par especial com o doce de leite.

Geralmente, esses produtos são encontrados em barracas de ervas medicinais nos mercados. Bel Coelho descobriu as especiarias nacionais em 2005, numa viagem a Belém com o premiado confeiteiro Jordi Rocca, do El Celler de Can Rocca. “O Jordi estava olhando as ervas medicinais na barraca Cheirosinha, no mercado de Belém, e percebeu o potencial aromatizador delas na cozinha”, conta a chef. 

O arroz-doce do chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro leva cumaru, puxuri, amburana e pacová Foto: Daniel Teixeira/Estadão
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Com a descoberta, o catalão fez um doce com priprioca e a chef do Clandestino não parou mais de testar sementes nativas. Sua sobremesa Zona da Mata leva 13 frutas nativas e cinco especiarias: puxuri, amburana, cumaru, pimenta-de-macaco e fava de aridan. “Se for usá-la em um caramelo, o sabor é mais intenso, misturada ao leite é mais sutil.”

No Maní, Helena Rizzo usou puxuri em uma sobremesa chamada ninho de ovos de mandioquinha. “O puxuri me traz a memória de cheiro de armário e o ninho de ovos é minha sobremesa favorita da infância. Juntei as duas lembranças.”

Sócio do novo Fat Cow, no Itaim Bibi, o chef Luiz Filipe Souza apostou em um sundae feito com caramelo de cumaru. “O sorvete da casa tinha que ter uma identidade e eu queria muito fugir da baunilha”, conta.

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A pesquisadora e colunista do Paladar Neide Rigo soca no pilão as sementinhas de pacová com um pouquinho de açúcar e polvilha em biscoitos, substituindo as raspas de limão. Ou salpica por cima do abacaxi. “Eu ralo amburana e cumaru e uso no leite, para fazer mingau ou cremes.”

Brigadeiro de cumaru, especiaria da região amazônica que tem sabor adocicado, com notas de coco e baunilha Foto: Daniel Teixeira/Estadão

É difícil uma receita exata com especiarias, pois seu uso talvez seja o mais intuitivo entre tudo o que se faz na cozinha. “Ela fala com a intuição, senti que a pimenta-de- macaco ficava legal com a manga e deu certo”, conta a banqueteira Márcia Micheli.

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As especiarias concentram a essência da planta, do solo, do ar e até do entorno cultural. Parecem mero detalhe, mas tente cozinhar sem elas... 

+ Conheça as especiarias brasileiras e saiba como usar cada uma delas

Mais que uma especiaria

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Na Bahia, fava de aridan não é especiaria, é a fava do encantamento, sagrada no Candomblé. A chef e confeiteira Lisiane Arouca, do restaurante Origem, em Salvador, conta que pediu permissão para os religiosos antes de usá-la em sua cozinha em que reinterpreta receitas antigas. Ela também usa amburana e diz que já viu chefs mandarem buscar cumaru na Amazônia, em vez de ir à Feira de São Joaquim.

Puxuri. Especiaria da região amazônica, que lembra o cardamomo e a noz-moscada, mas com sabor mais mentolado Foto: Daniel Teixeira/Estadão

No restaurante Dona Mariquita, também na capital baiana, a chef Leila Carrero rala a fava de aridan e põe no leite e na calda do pudim. “Minha cozinha é um resgate de ancestralidade”, afirma Leila. “Quando falo com os confeiteiros que estão começando agora, recomendo que busquem o sabor que fez ou faz parte da vida deles e tentem achar um equilíbrio, em vez de reproduzir sabores de outras culturas”, sugere Lisiane. 

Só na Bahia, há três dos seis ecossistemas brasileiros: Mata Atlântica, Caatinga e Cerrado. Com tanta variedade, é impossível falar em falta de sabor por ali.

O patchouli de Belém

Tem Patchouli no Brasil? Vem de Belém do Pará essa raiz nativa da Ásia, popularmente conhecida como sândalo. Com aroma marcante, está deixando de ser exclusividade de banhos de cheiro e das estantes de perfumaria e flertando também com a gastronomia.

Em Fortaleza, um jovem confeiteiro que já trabalhou com Diego Lozano tem chamado a atenção pelo pioneirismo em usar patchouli em sobremesas autorais. "Já fiz um bombom com ganache de chocolate branco e patchouli, geleia de framboesa e marshmallow de limão para um evento.

Patchouli,popularmente conhecida como sândalo, também está entrando nasreceitas dos confeiteiros Foto: Roberto Seba/Estadão

"O sabor do patchouli lembra o da menta", conta Felipe Cicconato, que trabalha na doceria Sablé Diamant. Ele usa o patchouli em uma infusão no leite ou no creme de leite. Para que libere melhor seu aroma, antes de levar ao fogo, deixa a raiz no que chama de uma infusão a frio, por seis horas. 

 

Conheça as especiarias brasileiras

Cumaru, puxuri, amburana, aridan, impiriba, priprioca e pacová. A esta altura, os nomes você já conhece. Agora, quer saber mais sobre cada uma dessas sementes, favas e raízes nacionais, que sabores casa uma tem, como combiná-las? Veja aqui o glossário completo com dicas de uso e receitas

Onde comprar 

Instituto ATÁ - Mercado de Pinheiros - R. Pedro Cristi, 89, Pinheiros, 3032-0875 Box Amazônia e Mata Atlântica: Cumaru (R$ 18, pacote de 100g) e puxuri (R$ 55, pacote de 100g). Tem também geleia de priprioca (R$ 22, 130g). Box Cerrado: pimenta-de-macaco (R$ 30, 15g).

Empório Don Grano - R. Fradique Coutinho, 285, Pinheiros, 4563-0001 Tem cumaru para pronta-entrega (R$ 14,90, 40g), outras especiarias nativas (amburana, pacová, puxuri e pimenta-de-macaco) sob encomenda, a um prazo de sete dias úteis.

Rei dos Orixás - R. John Harrison, 91, Lapa Para comprar fava de aridan e cumaru. 

Mercado da Lapa - R. Herbart, 47, Box 33, Lapa Especiarias variadas, exceto fava de aridan e cumaru.

Empório Poitara - Encomendas pelo telefone 97310-5024 Tem todas as especiarias. 

Especial para o Estado

Os confeiteiros brasileiros andam às voltas com especiarias nacionais. São frutos aromáticos que já estavam por aqui quando os portugueses chegaram – estão espalhados pela região amazônica, pela Mata Atlântica, pelo Nordeste e pelo Cerrado –, mas só nos últimos dez anos, quando começou-se a falar mais a sério em uma gastronomia brasileira envolvendo diferentes biomas, eles começaram a aparecer nas cozinhas profissionais e agora já marcam presença na doçaria. 

A baunilha do Cerrado foi a primeira a fazer fama. Hoje, outras sementes, favas e raízes estão perfumando nossos doces e ganhando espaço também nos boxes dos mercados municipais e pequenos empórios.

Pudim de leite com aridan, receita do chef-confeiteiro Rodrigo Ribeiro Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O arroz-doce do chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro leva cumaru, puxuri, amburana e pacová. A lista de ingredientes de seu brigadeiro inclui cumaru e o caramelo do pudim de leite tem uma especiaria poderosa, a fava de aridan. São todas nativas, com exceção da fava, que já é naturalizada brasileira, mas veio da África.

Também consultor e professor, Rodrigo, que comandou por dois anos a confeitaria do restaurante Petí, anda empenhado em usar especiarias nativas para transformar sobremesas de avó, aquelas que estão na memória afetiva dos brasileiros – como o pudim de leite, o arroz-doce e o brigadeiro que preparou para esta reportagem. 

As especiarias nacionais, curiosamente, são mais conhecidas nos rituais religiosos de Candomblé do que na cozinha – são usadas em banhos de proteção, então, não estranhe no pé da página a casa Rei dos Orixás como ponto de venda da fava de aridan: é só lá que você vai achar esse ingrediente que transforma as sobremesas com seu aroma de banana-passa, fazendo um par especial com o doce de leite.

Geralmente, esses produtos são encontrados em barracas de ervas medicinais nos mercados. Bel Coelho descobriu as especiarias nacionais em 2005, numa viagem a Belém com o premiado confeiteiro Jordi Rocca, do El Celler de Can Rocca. “O Jordi estava olhando as ervas medicinais na barraca Cheirosinha, no mercado de Belém, e percebeu o potencial aromatizador delas na cozinha”, conta a chef. 

O arroz-doce do chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro leva cumaru, puxuri, amburana e pacová Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Com a descoberta, o catalão fez um doce com priprioca e a chef do Clandestino não parou mais de testar sementes nativas. Sua sobremesa Zona da Mata leva 13 frutas nativas e cinco especiarias: puxuri, amburana, cumaru, pimenta-de-macaco e fava de aridan. “Se for usá-la em um caramelo, o sabor é mais intenso, misturada ao leite é mais sutil.”

No Maní, Helena Rizzo usou puxuri em uma sobremesa chamada ninho de ovos de mandioquinha. “O puxuri me traz a memória de cheiro de armário e o ninho de ovos é minha sobremesa favorita da infância. Juntei as duas lembranças.”

Sócio do novo Fat Cow, no Itaim Bibi, o chef Luiz Filipe Souza apostou em um sundae feito com caramelo de cumaru. “O sorvete da casa tinha que ter uma identidade e eu queria muito fugir da baunilha”, conta.

A pesquisadora e colunista do Paladar Neide Rigo soca no pilão as sementinhas de pacová com um pouquinho de açúcar e polvilha em biscoitos, substituindo as raspas de limão. Ou salpica por cima do abacaxi. “Eu ralo amburana e cumaru e uso no leite, para fazer mingau ou cremes.”

Brigadeiro de cumaru, especiaria da região amazônica que tem sabor adocicado, com notas de coco e baunilha Foto: Daniel Teixeira/Estadão

É difícil uma receita exata com especiarias, pois seu uso talvez seja o mais intuitivo entre tudo o que se faz na cozinha. “Ela fala com a intuição, senti que a pimenta-de- macaco ficava legal com a manga e deu certo”, conta a banqueteira Márcia Micheli.

As especiarias concentram a essência da planta, do solo, do ar e até do entorno cultural. Parecem mero detalhe, mas tente cozinhar sem elas... 

+ Conheça as especiarias brasileiras e saiba como usar cada uma delas

Mais que uma especiaria

Na Bahia, fava de aridan não é especiaria, é a fava do encantamento, sagrada no Candomblé. A chef e confeiteira Lisiane Arouca, do restaurante Origem, em Salvador, conta que pediu permissão para os religiosos antes de usá-la em sua cozinha em que reinterpreta receitas antigas. Ela também usa amburana e diz que já viu chefs mandarem buscar cumaru na Amazônia, em vez de ir à Feira de São Joaquim.

Puxuri. Especiaria da região amazônica, que lembra o cardamomo e a noz-moscada, mas com sabor mais mentolado Foto: Daniel Teixeira/Estadão

No restaurante Dona Mariquita, também na capital baiana, a chef Leila Carrero rala a fava de aridan e põe no leite e na calda do pudim. “Minha cozinha é um resgate de ancestralidade”, afirma Leila. “Quando falo com os confeiteiros que estão começando agora, recomendo que busquem o sabor que fez ou faz parte da vida deles e tentem achar um equilíbrio, em vez de reproduzir sabores de outras culturas”, sugere Lisiane. 

Só na Bahia, há três dos seis ecossistemas brasileiros: Mata Atlântica, Caatinga e Cerrado. Com tanta variedade, é impossível falar em falta de sabor por ali.

O patchouli de Belém

Tem Patchouli no Brasil? Vem de Belém do Pará essa raiz nativa da Ásia, popularmente conhecida como sândalo. Com aroma marcante, está deixando de ser exclusividade de banhos de cheiro e das estantes de perfumaria e flertando também com a gastronomia.

Em Fortaleza, um jovem confeiteiro que já trabalhou com Diego Lozano tem chamado a atenção pelo pioneirismo em usar patchouli em sobremesas autorais. "Já fiz um bombom com ganache de chocolate branco e patchouli, geleia de framboesa e marshmallow de limão para um evento.

Patchouli,popularmente conhecida como sândalo, também está entrando nasreceitas dos confeiteiros Foto: Roberto Seba/Estadão

"O sabor do patchouli lembra o da menta", conta Felipe Cicconato, que trabalha na doceria Sablé Diamant. Ele usa o patchouli em uma infusão no leite ou no creme de leite. Para que libere melhor seu aroma, antes de levar ao fogo, deixa a raiz no que chama de uma infusão a frio, por seis horas. 

 

Conheça as especiarias brasileiras

Cumaru, puxuri, amburana, aridan, impiriba, priprioca e pacová. A esta altura, os nomes você já conhece. Agora, quer saber mais sobre cada uma dessas sementes, favas e raízes nacionais, que sabores casa uma tem, como combiná-las? Veja aqui o glossário completo com dicas de uso e receitas

Onde comprar 

Instituto ATÁ - Mercado de Pinheiros - R. Pedro Cristi, 89, Pinheiros, 3032-0875 Box Amazônia e Mata Atlântica: Cumaru (R$ 18, pacote de 100g) e puxuri (R$ 55, pacote de 100g). Tem também geleia de priprioca (R$ 22, 130g). Box Cerrado: pimenta-de-macaco (R$ 30, 15g).

Empório Don Grano - R. Fradique Coutinho, 285, Pinheiros, 4563-0001 Tem cumaru para pronta-entrega (R$ 14,90, 40g), outras especiarias nativas (amburana, pacová, puxuri e pimenta-de-macaco) sob encomenda, a um prazo de sete dias úteis.

Rei dos Orixás - R. John Harrison, 91, Lapa Para comprar fava de aridan e cumaru. 

Mercado da Lapa - R. Herbart, 47, Box 33, Lapa Especiarias variadas, exceto fava de aridan e cumaru.

Empório Poitara - Encomendas pelo telefone 97310-5024 Tem todas as especiarias. 

Especial para o Estado

Os confeiteiros brasileiros andam às voltas com especiarias nacionais. São frutos aromáticos que já estavam por aqui quando os portugueses chegaram – estão espalhados pela região amazônica, pela Mata Atlântica, pelo Nordeste e pelo Cerrado –, mas só nos últimos dez anos, quando começou-se a falar mais a sério em uma gastronomia brasileira envolvendo diferentes biomas, eles começaram a aparecer nas cozinhas profissionais e agora já marcam presença na doçaria. 

A baunilha do Cerrado foi a primeira a fazer fama. Hoje, outras sementes, favas e raízes estão perfumando nossos doces e ganhando espaço também nos boxes dos mercados municipais e pequenos empórios.

Pudim de leite com aridan, receita do chef-confeiteiro Rodrigo Ribeiro Foto: Daniel Teixeira/Estadão

O arroz-doce do chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro leva cumaru, puxuri, amburana e pacová. A lista de ingredientes de seu brigadeiro inclui cumaru e o caramelo do pudim de leite tem uma especiaria poderosa, a fava de aridan. São todas nativas, com exceção da fava, que já é naturalizada brasileira, mas veio da África.

Também consultor e professor, Rodrigo, que comandou por dois anos a confeitaria do restaurante Petí, anda empenhado em usar especiarias nativas para transformar sobremesas de avó, aquelas que estão na memória afetiva dos brasileiros – como o pudim de leite, o arroz-doce e o brigadeiro que preparou para esta reportagem. 

As especiarias nacionais, curiosamente, são mais conhecidas nos rituais religiosos de Candomblé do que na cozinha – são usadas em banhos de proteção, então, não estranhe no pé da página a casa Rei dos Orixás como ponto de venda da fava de aridan: é só lá que você vai achar esse ingrediente que transforma as sobremesas com seu aroma de banana-passa, fazendo um par especial com o doce de leite.

Geralmente, esses produtos são encontrados em barracas de ervas medicinais nos mercados. Bel Coelho descobriu as especiarias nacionais em 2005, numa viagem a Belém com o premiado confeiteiro Jordi Rocca, do El Celler de Can Rocca. “O Jordi estava olhando as ervas medicinais na barraca Cheirosinha, no mercado de Belém, e percebeu o potencial aromatizador delas na cozinha”, conta a chef. 

O arroz-doce do chef confeiteiro Rodrigo Ribeiro leva cumaru, puxuri, amburana e pacová Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Com a descoberta, o catalão fez um doce com priprioca e a chef do Clandestino não parou mais de testar sementes nativas. Sua sobremesa Zona da Mata leva 13 frutas nativas e cinco especiarias: puxuri, amburana, cumaru, pimenta-de-macaco e fava de aridan. “Se for usá-la em um caramelo, o sabor é mais intenso, misturada ao leite é mais sutil.”

No Maní, Helena Rizzo usou puxuri em uma sobremesa chamada ninho de ovos de mandioquinha. “O puxuri me traz a memória de cheiro de armário e o ninho de ovos é minha sobremesa favorita da infância. Juntei as duas lembranças.”

Sócio do novo Fat Cow, no Itaim Bibi, o chef Luiz Filipe Souza apostou em um sundae feito com caramelo de cumaru. “O sorvete da casa tinha que ter uma identidade e eu queria muito fugir da baunilha”, conta.

A pesquisadora e colunista do Paladar Neide Rigo soca no pilão as sementinhas de pacová com um pouquinho de açúcar e polvilha em biscoitos, substituindo as raspas de limão. Ou salpica por cima do abacaxi. “Eu ralo amburana e cumaru e uso no leite, para fazer mingau ou cremes.”

Brigadeiro de cumaru, especiaria da região amazônica que tem sabor adocicado, com notas de coco e baunilha Foto: Daniel Teixeira/Estadão

É difícil uma receita exata com especiarias, pois seu uso talvez seja o mais intuitivo entre tudo o que se faz na cozinha. “Ela fala com a intuição, senti que a pimenta-de- macaco ficava legal com a manga e deu certo”, conta a banqueteira Márcia Micheli.

As especiarias concentram a essência da planta, do solo, do ar e até do entorno cultural. Parecem mero detalhe, mas tente cozinhar sem elas... 

+ Conheça as especiarias brasileiras e saiba como usar cada uma delas

Mais que uma especiaria

Na Bahia, fava de aridan não é especiaria, é a fava do encantamento, sagrada no Candomblé. A chef e confeiteira Lisiane Arouca, do restaurante Origem, em Salvador, conta que pediu permissão para os religiosos antes de usá-la em sua cozinha em que reinterpreta receitas antigas. Ela também usa amburana e diz que já viu chefs mandarem buscar cumaru na Amazônia, em vez de ir à Feira de São Joaquim.

Puxuri. Especiaria da região amazônica, que lembra o cardamomo e a noz-moscada, mas com sabor mais mentolado Foto: Daniel Teixeira/Estadão

No restaurante Dona Mariquita, também na capital baiana, a chef Leila Carrero rala a fava de aridan e põe no leite e na calda do pudim. “Minha cozinha é um resgate de ancestralidade”, afirma Leila. “Quando falo com os confeiteiros que estão começando agora, recomendo que busquem o sabor que fez ou faz parte da vida deles e tentem achar um equilíbrio, em vez de reproduzir sabores de outras culturas”, sugere Lisiane. 

Só na Bahia, há três dos seis ecossistemas brasileiros: Mata Atlântica, Caatinga e Cerrado. Com tanta variedade, é impossível falar em falta de sabor por ali.

O patchouli de Belém

Tem Patchouli no Brasil? Vem de Belém do Pará essa raiz nativa da Ásia, popularmente conhecida como sândalo. Com aroma marcante, está deixando de ser exclusividade de banhos de cheiro e das estantes de perfumaria e flertando também com a gastronomia.

Em Fortaleza, um jovem confeiteiro que já trabalhou com Diego Lozano tem chamado a atenção pelo pioneirismo em usar patchouli em sobremesas autorais. "Já fiz um bombom com ganache de chocolate branco e patchouli, geleia de framboesa e marshmallow de limão para um evento.

Patchouli,popularmente conhecida como sândalo, também está entrando nasreceitas dos confeiteiros Foto: Roberto Seba/Estadão

"O sabor do patchouli lembra o da menta", conta Felipe Cicconato, que trabalha na doceria Sablé Diamant. Ele usa o patchouli em uma infusão no leite ou no creme de leite. Para que libere melhor seu aroma, antes de levar ao fogo, deixa a raiz no que chama de uma infusão a frio, por seis horas. 

 

Conheça as especiarias brasileiras

Cumaru, puxuri, amburana, aridan, impiriba, priprioca e pacová. A esta altura, os nomes você já conhece. Agora, quer saber mais sobre cada uma dessas sementes, favas e raízes nacionais, que sabores casa uma tem, como combiná-las? Veja aqui o glossário completo com dicas de uso e receitas

Onde comprar 

Instituto ATÁ - Mercado de Pinheiros - R. Pedro Cristi, 89, Pinheiros, 3032-0875 Box Amazônia e Mata Atlântica: Cumaru (R$ 18, pacote de 100g) e puxuri (R$ 55, pacote de 100g). Tem também geleia de priprioca (R$ 22, 130g). Box Cerrado: pimenta-de-macaco (R$ 30, 15g).

Empório Don Grano - R. Fradique Coutinho, 285, Pinheiros, 4563-0001 Tem cumaru para pronta-entrega (R$ 14,90, 40g), outras especiarias nativas (amburana, pacová, puxuri e pimenta-de-macaco) sob encomenda, a um prazo de sete dias úteis.

Rei dos Orixás - R. John Harrison, 91, Lapa Para comprar fava de aridan e cumaru. 

Mercado da Lapa - R. Herbart, 47, Box 33, Lapa Especiarias variadas, exceto fava de aridan e cumaru.

Empório Poitara - Encomendas pelo telefone 97310-5024 Tem todas as especiarias. 

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