Novos conselhos de Daniel Boulud a jovens chefs


O estrelado francês e multi-empresário Daniel Boulud traz dos EUA a experiência de treinar (e financiar) jovens cozinheiros para o Bocuse D’Or

Por Ana Paula Boni

Daniel Boulud procura no celular fotos do Natal passado. Quer mostrar os últimos registros ao lado de Paul Bocuse, morto em janeiro aos 91 anos. Nas fotos, os dois chefs franceses estão cercados por filhos e netos sentados à mesa, aos sorrisos. Mostram intimidade entre as famílias de mestre e pupilo. O mestre, um dos representantes da nouvelle cuisine, foi quem criou, há 30 anos, o concurso Bocuse D’Or e influenciou gerações. O pupilo, há muito tempo tornado mestre de outros chefs, agora está no Brasil como presidente de honra da etapa nacional da competição, considerada a Copa da gastronomia e que será disputada nesta sexta-feira dentro da feira de negócios Sirha, em São Paulo.

A figura de Boulud, 62 anos, não foi escolhida pelo comitê nacional por acaso. Sua biografia conta a favor como cozinheiro experiente (começou na cozinha aos 14 anos) e empresário de sucesso (à frente de 19 empreendimentos em três continentes), mas não só. Há dez anos, chamado por Monsieur Paul a ajudar a fomentar o Bocuse D’Or nos Estados Unidos, onde está radicado desde os 27 anos, Boulud se juntou ao chef Thomas Keller (The French Laundry, Per Se) para criar a fundação Ment’Or. A entidade vive de doações, como US$ 3.000 a cada dois anos de cerca de 50 chefs, e devolve isso na formação de jovens cozinheiros. “Não há como envolver as pessoas se você não for solidário.”

Chef veio ao Brasil para o Bocuse D'Or Foto: Maritza Caneca
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O resultado mais impressionante desse investimento foi o troféu de ouro que o time dos EUA levou no último Bocuse D’Or mundial, em Lyon, em 2017. Até então, nenhum cozinheiro das Américas havia conseguido qualquer lugar no pódio, nem mesmo o terceiro lugar. “Leva-se muito tempo, tem de ser paciente”, diz ele, no lobby do hotel onde está hospedado, depois de ter arrastado as poltronas ele mesmo, sem muita frescura. “A Espanha fez um trabalho impressionante há tempos, eles são muito unidos. A Escandinávia já treinava cozinheiros na França há 40 anos. Quando eu era jovem, muitos japoneses iam estagiar na França.”

Na América Latina, ele cita o peruano Gaston Acurio como protagonista, e diz que países de língua espanhola das Américas se beneficiaram mundialmente por conta do idioma depois de a nueva cocina, capitaneada por Ferran Adrià, ter quebrados paradigmas. No Brasil, cita Alex Atala com uma boa reputação internacional e vê os mais jovens com criatividade para usar um número sem-fim de ingredientes nativos. “Não é fácil olhar para Alex Atala se você é jovem no Brasil, mas é interessante fazer isso. Tem de se trabalhar duro. O trabalho numa cozinha é estressante e, se você for lento, você não vai sobreviver”, diz ele, adentrando em orientações comuns ao seu livro Conselhos a Um Jovem Chef, publicado há 15 anos.

Hoje, os programas de TV e a internacionalização de cozinhas produziram novas revoluções, diz. “Mas nem toda oportunidade faz de você um grande chef, mesmo que você seja famoso. Você tem que ter o intelecto, uma boa base. A TV mostra um mundo legal, mas quando a vida começa tudo é diferente.” Daniel assinala que os principais conselhos do livro (escolha bem o seu mentor, tenha paixão pelo ofício) se mantêm, mas atualiza: aprenda a entender seu negócio como empresa.

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Se hoje os jovens cozinheiros estão mais ávidos por ter o seu metro quadrado ao sol, eles devem saber como gerenciar o dinheiro, mas o dinheiro não chega por acaso. “O importante quando se é jovem é construir uma reputação para alguém acreditar em você e te dar dinheiro.” E eles vão crescendo, inspirando outros cozinheiros e criando uma nova geração de talentos. “Hoje tem muita gente no Brasil treinada por Claude Troisgros, Laurent Suaudeau. Thomas (filho de Claude) já é fruto dessa mistura com o Brasil.” Também elogia a cozinha de Felipe Bronze, onde comeu há cinco anos e “foi muito bom”, e se derrete pela Casa do Porco, de Jefferson Rueda, que conheceu na última terça-feira, quando chegou a São Paulo. “Existe ali um sabor brasileiro, é muito interessante. Comi um snack de feijoada (uma linguiça recheada de feijoada, que Rueda criou há menos de um mês) e muitas caipirinhas”, diverte-se, mas mostrando que o sorriso está mais ligado a uma simpatia inerente que ao grau de álcool ingerido antes da entrevista.

  Foto: Gil Cohen|Reuters

Aproveita para se derreter um pouco pelo Brasil – mais pelo Rio do que por São Paulo – e conta que até já cozinhou moqueca, um de seus pratos preferidos (ao lado de feijoada), para 800 pessoas. Era um jantar em Nova York, há cerca de dois anos, num evento que homenageava Vik Muniz, seu amigo. “Havia muitos brasileiros lá e eles me disseram que era a melhor moqueca que já tinham comido”, brinca. E o bom humor se mantém até quando fala da terceira estrela retirada pelo Michelin do seu restaurante Daniel recentemente. “Quando o Michelin chegou a Nova York, o Daniel já existia. Deu estrela, tirou estrela. Claro que dói um pouco, mas no fim do dia o cliente é o juiz. Agora, eu digo ao meu time: é um orgulho ser o melhor dois estrelas que Nova York já teve.” Termina uma hora de conversa às gargalhadas.

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Chefs que admira

Grant Achatz  (americano, do Alinea, Chicago) “Muito criativo, muito persistente. Incansável, ele não para. Tem ótima formação de base. Sua cozinha tem uma festa teatral, claro, mas o teatro funciona.”

Massimo Bottura (italiano, da Osteria Francescana, em Modena) “Conquistou o mundo com grandes ideias. É inacreditável o que ele fez no Rio com o ReffetoRio (ao lado da Gastromotiva). Escolho ele por ter sido capaz de unir coletivamente tanta gente.”

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Michel Troisgros (francês, do Le Bois sans Feuilles, em Ouches) “Tem uma constante ambição de reinventar o mundo, o mundo próprio dele. É muito criativo e tem uma formação muito sólida ao mesmo tempo.”

Bocuse D'Or escolhe finalista

A 3ª edição do Bocuse D’Or no Brasil será realizada nesta sexta, na feira Sirha, que ocorre desde ontem na São Paulo Expo. Serão quatro competidores, escolhidos na semifinal de 2016: Luiz Filipe Souza, Marcelo Milani, Daniel Nakamura e Ricardo Dornelles. Após a prova de 5h35, em que apresentarão dois pratos (com salmão selvagem e com porco magalitsa), um irá à final latina, no México, em abril. Do México sairão os eleitos para a final mundial em Lyon, em 2019. l Onde. São Paulo Expo. Rodovia dos Imigrantes, km 1,5.

Daniel Boulud procura no celular fotos do Natal passado. Quer mostrar os últimos registros ao lado de Paul Bocuse, morto em janeiro aos 91 anos. Nas fotos, os dois chefs franceses estão cercados por filhos e netos sentados à mesa, aos sorrisos. Mostram intimidade entre as famílias de mestre e pupilo. O mestre, um dos representantes da nouvelle cuisine, foi quem criou, há 30 anos, o concurso Bocuse D’Or e influenciou gerações. O pupilo, há muito tempo tornado mestre de outros chefs, agora está no Brasil como presidente de honra da etapa nacional da competição, considerada a Copa da gastronomia e que será disputada nesta sexta-feira dentro da feira de negócios Sirha, em São Paulo.

A figura de Boulud, 62 anos, não foi escolhida pelo comitê nacional por acaso. Sua biografia conta a favor como cozinheiro experiente (começou na cozinha aos 14 anos) e empresário de sucesso (à frente de 19 empreendimentos em três continentes), mas não só. Há dez anos, chamado por Monsieur Paul a ajudar a fomentar o Bocuse D’Or nos Estados Unidos, onde está radicado desde os 27 anos, Boulud se juntou ao chef Thomas Keller (The French Laundry, Per Se) para criar a fundação Ment’Or. A entidade vive de doações, como US$ 3.000 a cada dois anos de cerca de 50 chefs, e devolve isso na formação de jovens cozinheiros. “Não há como envolver as pessoas se você não for solidário.”

Chef veio ao Brasil para o Bocuse D'Or Foto: Maritza Caneca

O resultado mais impressionante desse investimento foi o troféu de ouro que o time dos EUA levou no último Bocuse D’Or mundial, em Lyon, em 2017. Até então, nenhum cozinheiro das Américas havia conseguido qualquer lugar no pódio, nem mesmo o terceiro lugar. “Leva-se muito tempo, tem de ser paciente”, diz ele, no lobby do hotel onde está hospedado, depois de ter arrastado as poltronas ele mesmo, sem muita frescura. “A Espanha fez um trabalho impressionante há tempos, eles são muito unidos. A Escandinávia já treinava cozinheiros na França há 40 anos. Quando eu era jovem, muitos japoneses iam estagiar na França.”

Na América Latina, ele cita o peruano Gaston Acurio como protagonista, e diz que países de língua espanhola das Américas se beneficiaram mundialmente por conta do idioma depois de a nueva cocina, capitaneada por Ferran Adrià, ter quebrados paradigmas. No Brasil, cita Alex Atala com uma boa reputação internacional e vê os mais jovens com criatividade para usar um número sem-fim de ingredientes nativos. “Não é fácil olhar para Alex Atala se você é jovem no Brasil, mas é interessante fazer isso. Tem de se trabalhar duro. O trabalho numa cozinha é estressante e, se você for lento, você não vai sobreviver”, diz ele, adentrando em orientações comuns ao seu livro Conselhos a Um Jovem Chef, publicado há 15 anos.

Hoje, os programas de TV e a internacionalização de cozinhas produziram novas revoluções, diz. “Mas nem toda oportunidade faz de você um grande chef, mesmo que você seja famoso. Você tem que ter o intelecto, uma boa base. A TV mostra um mundo legal, mas quando a vida começa tudo é diferente.” Daniel assinala que os principais conselhos do livro (escolha bem o seu mentor, tenha paixão pelo ofício) se mantêm, mas atualiza: aprenda a entender seu negócio como empresa.

Se hoje os jovens cozinheiros estão mais ávidos por ter o seu metro quadrado ao sol, eles devem saber como gerenciar o dinheiro, mas o dinheiro não chega por acaso. “O importante quando se é jovem é construir uma reputação para alguém acreditar em você e te dar dinheiro.” E eles vão crescendo, inspirando outros cozinheiros e criando uma nova geração de talentos. “Hoje tem muita gente no Brasil treinada por Claude Troisgros, Laurent Suaudeau. Thomas (filho de Claude) já é fruto dessa mistura com o Brasil.” Também elogia a cozinha de Felipe Bronze, onde comeu há cinco anos e “foi muito bom”, e se derrete pela Casa do Porco, de Jefferson Rueda, que conheceu na última terça-feira, quando chegou a São Paulo. “Existe ali um sabor brasileiro, é muito interessante. Comi um snack de feijoada (uma linguiça recheada de feijoada, que Rueda criou há menos de um mês) e muitas caipirinhas”, diverte-se, mas mostrando que o sorriso está mais ligado a uma simpatia inerente que ao grau de álcool ingerido antes da entrevista.

  Foto: Gil Cohen|Reuters

Aproveita para se derreter um pouco pelo Brasil – mais pelo Rio do que por São Paulo – e conta que até já cozinhou moqueca, um de seus pratos preferidos (ao lado de feijoada), para 800 pessoas. Era um jantar em Nova York, há cerca de dois anos, num evento que homenageava Vik Muniz, seu amigo. “Havia muitos brasileiros lá e eles me disseram que era a melhor moqueca que já tinham comido”, brinca. E o bom humor se mantém até quando fala da terceira estrela retirada pelo Michelin do seu restaurante Daniel recentemente. “Quando o Michelin chegou a Nova York, o Daniel já existia. Deu estrela, tirou estrela. Claro que dói um pouco, mas no fim do dia o cliente é o juiz. Agora, eu digo ao meu time: é um orgulho ser o melhor dois estrelas que Nova York já teve.” Termina uma hora de conversa às gargalhadas.

Chefs que admira

Grant Achatz  (americano, do Alinea, Chicago) “Muito criativo, muito persistente. Incansável, ele não para. Tem ótima formação de base. Sua cozinha tem uma festa teatral, claro, mas o teatro funciona.”

Massimo Bottura (italiano, da Osteria Francescana, em Modena) “Conquistou o mundo com grandes ideias. É inacreditável o que ele fez no Rio com o ReffetoRio (ao lado da Gastromotiva). Escolho ele por ter sido capaz de unir coletivamente tanta gente.”

Michel Troisgros (francês, do Le Bois sans Feuilles, em Ouches) “Tem uma constante ambição de reinventar o mundo, o mundo próprio dele. É muito criativo e tem uma formação muito sólida ao mesmo tempo.”

Bocuse D'Or escolhe finalista

A 3ª edição do Bocuse D’Or no Brasil será realizada nesta sexta, na feira Sirha, que ocorre desde ontem na São Paulo Expo. Serão quatro competidores, escolhidos na semifinal de 2016: Luiz Filipe Souza, Marcelo Milani, Daniel Nakamura e Ricardo Dornelles. Após a prova de 5h35, em que apresentarão dois pratos (com salmão selvagem e com porco magalitsa), um irá à final latina, no México, em abril. Do México sairão os eleitos para a final mundial em Lyon, em 2019. l Onde. São Paulo Expo. Rodovia dos Imigrantes, km 1,5.

Daniel Boulud procura no celular fotos do Natal passado. Quer mostrar os últimos registros ao lado de Paul Bocuse, morto em janeiro aos 91 anos. Nas fotos, os dois chefs franceses estão cercados por filhos e netos sentados à mesa, aos sorrisos. Mostram intimidade entre as famílias de mestre e pupilo. O mestre, um dos representantes da nouvelle cuisine, foi quem criou, há 30 anos, o concurso Bocuse D’Or e influenciou gerações. O pupilo, há muito tempo tornado mestre de outros chefs, agora está no Brasil como presidente de honra da etapa nacional da competição, considerada a Copa da gastronomia e que será disputada nesta sexta-feira dentro da feira de negócios Sirha, em São Paulo.

A figura de Boulud, 62 anos, não foi escolhida pelo comitê nacional por acaso. Sua biografia conta a favor como cozinheiro experiente (começou na cozinha aos 14 anos) e empresário de sucesso (à frente de 19 empreendimentos em três continentes), mas não só. Há dez anos, chamado por Monsieur Paul a ajudar a fomentar o Bocuse D’Or nos Estados Unidos, onde está radicado desde os 27 anos, Boulud se juntou ao chef Thomas Keller (The French Laundry, Per Se) para criar a fundação Ment’Or. A entidade vive de doações, como US$ 3.000 a cada dois anos de cerca de 50 chefs, e devolve isso na formação de jovens cozinheiros. “Não há como envolver as pessoas se você não for solidário.”

Chef veio ao Brasil para o Bocuse D'Or Foto: Maritza Caneca

O resultado mais impressionante desse investimento foi o troféu de ouro que o time dos EUA levou no último Bocuse D’Or mundial, em Lyon, em 2017. Até então, nenhum cozinheiro das Américas havia conseguido qualquer lugar no pódio, nem mesmo o terceiro lugar. “Leva-se muito tempo, tem de ser paciente”, diz ele, no lobby do hotel onde está hospedado, depois de ter arrastado as poltronas ele mesmo, sem muita frescura. “A Espanha fez um trabalho impressionante há tempos, eles são muito unidos. A Escandinávia já treinava cozinheiros na França há 40 anos. Quando eu era jovem, muitos japoneses iam estagiar na França.”

Na América Latina, ele cita o peruano Gaston Acurio como protagonista, e diz que países de língua espanhola das Américas se beneficiaram mundialmente por conta do idioma depois de a nueva cocina, capitaneada por Ferran Adrià, ter quebrados paradigmas. No Brasil, cita Alex Atala com uma boa reputação internacional e vê os mais jovens com criatividade para usar um número sem-fim de ingredientes nativos. “Não é fácil olhar para Alex Atala se você é jovem no Brasil, mas é interessante fazer isso. Tem de se trabalhar duro. O trabalho numa cozinha é estressante e, se você for lento, você não vai sobreviver”, diz ele, adentrando em orientações comuns ao seu livro Conselhos a Um Jovem Chef, publicado há 15 anos.

Hoje, os programas de TV e a internacionalização de cozinhas produziram novas revoluções, diz. “Mas nem toda oportunidade faz de você um grande chef, mesmo que você seja famoso. Você tem que ter o intelecto, uma boa base. A TV mostra um mundo legal, mas quando a vida começa tudo é diferente.” Daniel assinala que os principais conselhos do livro (escolha bem o seu mentor, tenha paixão pelo ofício) se mantêm, mas atualiza: aprenda a entender seu negócio como empresa.

Se hoje os jovens cozinheiros estão mais ávidos por ter o seu metro quadrado ao sol, eles devem saber como gerenciar o dinheiro, mas o dinheiro não chega por acaso. “O importante quando se é jovem é construir uma reputação para alguém acreditar em você e te dar dinheiro.” E eles vão crescendo, inspirando outros cozinheiros e criando uma nova geração de talentos. “Hoje tem muita gente no Brasil treinada por Claude Troisgros, Laurent Suaudeau. Thomas (filho de Claude) já é fruto dessa mistura com o Brasil.” Também elogia a cozinha de Felipe Bronze, onde comeu há cinco anos e “foi muito bom”, e se derrete pela Casa do Porco, de Jefferson Rueda, que conheceu na última terça-feira, quando chegou a São Paulo. “Existe ali um sabor brasileiro, é muito interessante. Comi um snack de feijoada (uma linguiça recheada de feijoada, que Rueda criou há menos de um mês) e muitas caipirinhas”, diverte-se, mas mostrando que o sorriso está mais ligado a uma simpatia inerente que ao grau de álcool ingerido antes da entrevista.

  Foto: Gil Cohen|Reuters

Aproveita para se derreter um pouco pelo Brasil – mais pelo Rio do que por São Paulo – e conta que até já cozinhou moqueca, um de seus pratos preferidos (ao lado de feijoada), para 800 pessoas. Era um jantar em Nova York, há cerca de dois anos, num evento que homenageava Vik Muniz, seu amigo. “Havia muitos brasileiros lá e eles me disseram que era a melhor moqueca que já tinham comido”, brinca. E o bom humor se mantém até quando fala da terceira estrela retirada pelo Michelin do seu restaurante Daniel recentemente. “Quando o Michelin chegou a Nova York, o Daniel já existia. Deu estrela, tirou estrela. Claro que dói um pouco, mas no fim do dia o cliente é o juiz. Agora, eu digo ao meu time: é um orgulho ser o melhor dois estrelas que Nova York já teve.” Termina uma hora de conversa às gargalhadas.

Chefs que admira

Grant Achatz  (americano, do Alinea, Chicago) “Muito criativo, muito persistente. Incansável, ele não para. Tem ótima formação de base. Sua cozinha tem uma festa teatral, claro, mas o teatro funciona.”

Massimo Bottura (italiano, da Osteria Francescana, em Modena) “Conquistou o mundo com grandes ideias. É inacreditável o que ele fez no Rio com o ReffetoRio (ao lado da Gastromotiva). Escolho ele por ter sido capaz de unir coletivamente tanta gente.”

Michel Troisgros (francês, do Le Bois sans Feuilles, em Ouches) “Tem uma constante ambição de reinventar o mundo, o mundo próprio dele. É muito criativo e tem uma formação muito sólida ao mesmo tempo.”

Bocuse D'Or escolhe finalista

A 3ª edição do Bocuse D’Or no Brasil será realizada nesta sexta, na feira Sirha, que ocorre desde ontem na São Paulo Expo. Serão quatro competidores, escolhidos na semifinal de 2016: Luiz Filipe Souza, Marcelo Milani, Daniel Nakamura e Ricardo Dornelles. Após a prova de 5h35, em que apresentarão dois pratos (com salmão selvagem e com porco magalitsa), um irá à final latina, no México, em abril. Do México sairão os eleitos para a final mundial em Lyon, em 2019. l Onde. São Paulo Expo. Rodovia dos Imigrantes, km 1,5.

Daniel Boulud procura no celular fotos do Natal passado. Quer mostrar os últimos registros ao lado de Paul Bocuse, morto em janeiro aos 91 anos. Nas fotos, os dois chefs franceses estão cercados por filhos e netos sentados à mesa, aos sorrisos. Mostram intimidade entre as famílias de mestre e pupilo. O mestre, um dos representantes da nouvelle cuisine, foi quem criou, há 30 anos, o concurso Bocuse D’Or e influenciou gerações. O pupilo, há muito tempo tornado mestre de outros chefs, agora está no Brasil como presidente de honra da etapa nacional da competição, considerada a Copa da gastronomia e que será disputada nesta sexta-feira dentro da feira de negócios Sirha, em São Paulo.

A figura de Boulud, 62 anos, não foi escolhida pelo comitê nacional por acaso. Sua biografia conta a favor como cozinheiro experiente (começou na cozinha aos 14 anos) e empresário de sucesso (à frente de 19 empreendimentos em três continentes), mas não só. Há dez anos, chamado por Monsieur Paul a ajudar a fomentar o Bocuse D’Or nos Estados Unidos, onde está radicado desde os 27 anos, Boulud se juntou ao chef Thomas Keller (The French Laundry, Per Se) para criar a fundação Ment’Or. A entidade vive de doações, como US$ 3.000 a cada dois anos de cerca de 50 chefs, e devolve isso na formação de jovens cozinheiros. “Não há como envolver as pessoas se você não for solidário.”

Chef veio ao Brasil para o Bocuse D'Or Foto: Maritza Caneca

O resultado mais impressionante desse investimento foi o troféu de ouro que o time dos EUA levou no último Bocuse D’Or mundial, em Lyon, em 2017. Até então, nenhum cozinheiro das Américas havia conseguido qualquer lugar no pódio, nem mesmo o terceiro lugar. “Leva-se muito tempo, tem de ser paciente”, diz ele, no lobby do hotel onde está hospedado, depois de ter arrastado as poltronas ele mesmo, sem muita frescura. “A Espanha fez um trabalho impressionante há tempos, eles são muito unidos. A Escandinávia já treinava cozinheiros na França há 40 anos. Quando eu era jovem, muitos japoneses iam estagiar na França.”

Na América Latina, ele cita o peruano Gaston Acurio como protagonista, e diz que países de língua espanhola das Américas se beneficiaram mundialmente por conta do idioma depois de a nueva cocina, capitaneada por Ferran Adrià, ter quebrados paradigmas. No Brasil, cita Alex Atala com uma boa reputação internacional e vê os mais jovens com criatividade para usar um número sem-fim de ingredientes nativos. “Não é fácil olhar para Alex Atala se você é jovem no Brasil, mas é interessante fazer isso. Tem de se trabalhar duro. O trabalho numa cozinha é estressante e, se você for lento, você não vai sobreviver”, diz ele, adentrando em orientações comuns ao seu livro Conselhos a Um Jovem Chef, publicado há 15 anos.

Hoje, os programas de TV e a internacionalização de cozinhas produziram novas revoluções, diz. “Mas nem toda oportunidade faz de você um grande chef, mesmo que você seja famoso. Você tem que ter o intelecto, uma boa base. A TV mostra um mundo legal, mas quando a vida começa tudo é diferente.” Daniel assinala que os principais conselhos do livro (escolha bem o seu mentor, tenha paixão pelo ofício) se mantêm, mas atualiza: aprenda a entender seu negócio como empresa.

Se hoje os jovens cozinheiros estão mais ávidos por ter o seu metro quadrado ao sol, eles devem saber como gerenciar o dinheiro, mas o dinheiro não chega por acaso. “O importante quando se é jovem é construir uma reputação para alguém acreditar em você e te dar dinheiro.” E eles vão crescendo, inspirando outros cozinheiros e criando uma nova geração de talentos. “Hoje tem muita gente no Brasil treinada por Claude Troisgros, Laurent Suaudeau. Thomas (filho de Claude) já é fruto dessa mistura com o Brasil.” Também elogia a cozinha de Felipe Bronze, onde comeu há cinco anos e “foi muito bom”, e se derrete pela Casa do Porco, de Jefferson Rueda, que conheceu na última terça-feira, quando chegou a São Paulo. “Existe ali um sabor brasileiro, é muito interessante. Comi um snack de feijoada (uma linguiça recheada de feijoada, que Rueda criou há menos de um mês) e muitas caipirinhas”, diverte-se, mas mostrando que o sorriso está mais ligado a uma simpatia inerente que ao grau de álcool ingerido antes da entrevista.

  Foto: Gil Cohen|Reuters

Aproveita para se derreter um pouco pelo Brasil – mais pelo Rio do que por São Paulo – e conta que até já cozinhou moqueca, um de seus pratos preferidos (ao lado de feijoada), para 800 pessoas. Era um jantar em Nova York, há cerca de dois anos, num evento que homenageava Vik Muniz, seu amigo. “Havia muitos brasileiros lá e eles me disseram que era a melhor moqueca que já tinham comido”, brinca. E o bom humor se mantém até quando fala da terceira estrela retirada pelo Michelin do seu restaurante Daniel recentemente. “Quando o Michelin chegou a Nova York, o Daniel já existia. Deu estrela, tirou estrela. Claro que dói um pouco, mas no fim do dia o cliente é o juiz. Agora, eu digo ao meu time: é um orgulho ser o melhor dois estrelas que Nova York já teve.” Termina uma hora de conversa às gargalhadas.

Chefs que admira

Grant Achatz  (americano, do Alinea, Chicago) “Muito criativo, muito persistente. Incansável, ele não para. Tem ótima formação de base. Sua cozinha tem uma festa teatral, claro, mas o teatro funciona.”

Massimo Bottura (italiano, da Osteria Francescana, em Modena) “Conquistou o mundo com grandes ideias. É inacreditável o que ele fez no Rio com o ReffetoRio (ao lado da Gastromotiva). Escolho ele por ter sido capaz de unir coletivamente tanta gente.”

Michel Troisgros (francês, do Le Bois sans Feuilles, em Ouches) “Tem uma constante ambição de reinventar o mundo, o mundo próprio dele. É muito criativo e tem uma formação muito sólida ao mesmo tempo.”

Bocuse D'Or escolhe finalista

A 3ª edição do Bocuse D’Or no Brasil será realizada nesta sexta, na feira Sirha, que ocorre desde ontem na São Paulo Expo. Serão quatro competidores, escolhidos na semifinal de 2016: Luiz Filipe Souza, Marcelo Milani, Daniel Nakamura e Ricardo Dornelles. Após a prova de 5h35, em que apresentarão dois pratos (com salmão selvagem e com porco magalitsa), um irá à final latina, no México, em abril. Do México sairão os eleitos para a final mundial em Lyon, em 2019. l Onde. São Paulo Expo. Rodovia dos Imigrantes, km 1,5.

Daniel Boulud procura no celular fotos do Natal passado. Quer mostrar os últimos registros ao lado de Paul Bocuse, morto em janeiro aos 91 anos. Nas fotos, os dois chefs franceses estão cercados por filhos e netos sentados à mesa, aos sorrisos. Mostram intimidade entre as famílias de mestre e pupilo. O mestre, um dos representantes da nouvelle cuisine, foi quem criou, há 30 anos, o concurso Bocuse D’Or e influenciou gerações. O pupilo, há muito tempo tornado mestre de outros chefs, agora está no Brasil como presidente de honra da etapa nacional da competição, considerada a Copa da gastronomia e que será disputada nesta sexta-feira dentro da feira de negócios Sirha, em São Paulo.

A figura de Boulud, 62 anos, não foi escolhida pelo comitê nacional por acaso. Sua biografia conta a favor como cozinheiro experiente (começou na cozinha aos 14 anos) e empresário de sucesso (à frente de 19 empreendimentos em três continentes), mas não só. Há dez anos, chamado por Monsieur Paul a ajudar a fomentar o Bocuse D’Or nos Estados Unidos, onde está radicado desde os 27 anos, Boulud se juntou ao chef Thomas Keller (The French Laundry, Per Se) para criar a fundação Ment’Or. A entidade vive de doações, como US$ 3.000 a cada dois anos de cerca de 50 chefs, e devolve isso na formação de jovens cozinheiros. “Não há como envolver as pessoas se você não for solidário.”

Chef veio ao Brasil para o Bocuse D'Or Foto: Maritza Caneca

O resultado mais impressionante desse investimento foi o troféu de ouro que o time dos EUA levou no último Bocuse D’Or mundial, em Lyon, em 2017. Até então, nenhum cozinheiro das Américas havia conseguido qualquer lugar no pódio, nem mesmo o terceiro lugar. “Leva-se muito tempo, tem de ser paciente”, diz ele, no lobby do hotel onde está hospedado, depois de ter arrastado as poltronas ele mesmo, sem muita frescura. “A Espanha fez um trabalho impressionante há tempos, eles são muito unidos. A Escandinávia já treinava cozinheiros na França há 40 anos. Quando eu era jovem, muitos japoneses iam estagiar na França.”

Na América Latina, ele cita o peruano Gaston Acurio como protagonista, e diz que países de língua espanhola das Américas se beneficiaram mundialmente por conta do idioma depois de a nueva cocina, capitaneada por Ferran Adrià, ter quebrados paradigmas. No Brasil, cita Alex Atala com uma boa reputação internacional e vê os mais jovens com criatividade para usar um número sem-fim de ingredientes nativos. “Não é fácil olhar para Alex Atala se você é jovem no Brasil, mas é interessante fazer isso. Tem de se trabalhar duro. O trabalho numa cozinha é estressante e, se você for lento, você não vai sobreviver”, diz ele, adentrando em orientações comuns ao seu livro Conselhos a Um Jovem Chef, publicado há 15 anos.

Hoje, os programas de TV e a internacionalização de cozinhas produziram novas revoluções, diz. “Mas nem toda oportunidade faz de você um grande chef, mesmo que você seja famoso. Você tem que ter o intelecto, uma boa base. A TV mostra um mundo legal, mas quando a vida começa tudo é diferente.” Daniel assinala que os principais conselhos do livro (escolha bem o seu mentor, tenha paixão pelo ofício) se mantêm, mas atualiza: aprenda a entender seu negócio como empresa.

Se hoje os jovens cozinheiros estão mais ávidos por ter o seu metro quadrado ao sol, eles devem saber como gerenciar o dinheiro, mas o dinheiro não chega por acaso. “O importante quando se é jovem é construir uma reputação para alguém acreditar em você e te dar dinheiro.” E eles vão crescendo, inspirando outros cozinheiros e criando uma nova geração de talentos. “Hoje tem muita gente no Brasil treinada por Claude Troisgros, Laurent Suaudeau. Thomas (filho de Claude) já é fruto dessa mistura com o Brasil.” Também elogia a cozinha de Felipe Bronze, onde comeu há cinco anos e “foi muito bom”, e se derrete pela Casa do Porco, de Jefferson Rueda, que conheceu na última terça-feira, quando chegou a São Paulo. “Existe ali um sabor brasileiro, é muito interessante. Comi um snack de feijoada (uma linguiça recheada de feijoada, que Rueda criou há menos de um mês) e muitas caipirinhas”, diverte-se, mas mostrando que o sorriso está mais ligado a uma simpatia inerente que ao grau de álcool ingerido antes da entrevista.

  Foto: Gil Cohen|Reuters

Aproveita para se derreter um pouco pelo Brasil – mais pelo Rio do que por São Paulo – e conta que até já cozinhou moqueca, um de seus pratos preferidos (ao lado de feijoada), para 800 pessoas. Era um jantar em Nova York, há cerca de dois anos, num evento que homenageava Vik Muniz, seu amigo. “Havia muitos brasileiros lá e eles me disseram que era a melhor moqueca que já tinham comido”, brinca. E o bom humor se mantém até quando fala da terceira estrela retirada pelo Michelin do seu restaurante Daniel recentemente. “Quando o Michelin chegou a Nova York, o Daniel já existia. Deu estrela, tirou estrela. Claro que dói um pouco, mas no fim do dia o cliente é o juiz. Agora, eu digo ao meu time: é um orgulho ser o melhor dois estrelas que Nova York já teve.” Termina uma hora de conversa às gargalhadas.

Chefs que admira

Grant Achatz  (americano, do Alinea, Chicago) “Muito criativo, muito persistente. Incansável, ele não para. Tem ótima formação de base. Sua cozinha tem uma festa teatral, claro, mas o teatro funciona.”

Massimo Bottura (italiano, da Osteria Francescana, em Modena) “Conquistou o mundo com grandes ideias. É inacreditável o que ele fez no Rio com o ReffetoRio (ao lado da Gastromotiva). Escolho ele por ter sido capaz de unir coletivamente tanta gente.”

Michel Troisgros (francês, do Le Bois sans Feuilles, em Ouches) “Tem uma constante ambição de reinventar o mundo, o mundo próprio dele. É muito criativo e tem uma formação muito sólida ao mesmo tempo.”

Bocuse D'Or escolhe finalista

A 3ª edição do Bocuse D’Or no Brasil será realizada nesta sexta, na feira Sirha, que ocorre desde ontem na São Paulo Expo. Serão quatro competidores, escolhidos na semifinal de 2016: Luiz Filipe Souza, Marcelo Milani, Daniel Nakamura e Ricardo Dornelles. Após a prova de 5h35, em que apresentarão dois pratos (com salmão selvagem e com porco magalitsa), um irá à final latina, no México, em abril. Do México sairão os eleitos para a final mundial em Lyon, em 2019. l Onde. São Paulo Expo. Rodovia dos Imigrantes, km 1,5.

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