Doce de leite artesanal retorna ao básico e ganha versões com outros leites


De vaca, búfala, cabra e ovelha... nova leva de produtores brasileiros usa menos açúcar e nada de espessantes nas receitas

Por Danielle Nagase
Atualização:

Leite, açúcar, amor e só. Esse é o slogan da mineira Rocca, produtora artesanal de doce leite, cuja receita se resume aos ingredientes básicos de antigamente – qualquer tipo de espessante ou conservante fica de fora do tacho. 

Caminho, aliás, percorrido por outros produtores que, de uns tempos para cá, passaram a olhar com mais carinho para o doce de leite nacional. Algo parecido com o que aconteceu com os queijos artesanais no Brasil.

De colher: nova leva de doces de leite artesanais brasileiros. Foto: Daniel Teixeira/Estadão
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Parafraseando o mote da Rocca, hoje em dia, já é possível falar em leites (no plural), pouco açúcar e talvez um tantinho de sal ou bicarbonato, mas nem todo mundo usa. O tempo, corrido sem pressa, também é ingrediente indispensável. É ele o responsável pelo ponto denso e cremoso (lembra? Não leva espessantes), pelo sabor e pela cor do doce, que vai do marrom claro ao escuro, tipo caramelo. A regra é clara: quanto mais tempo no fogo, mais intenso será o doce.

Rosi e Raphael Figueiredo demoraram quase um ano para desenvolver a receita da Rocca. “Compramos o primeiro tacho sem saber fazer doce de leite”, conta Rosi. Eles tinham dois objetivos em mente: diminuir a quantidade de açúcar e acabar com a "tragédia do amido e da glucose”, geralmente adicionados para acelerar o cozimento e aumentar o rendimento da receita. “Por isso que argentinos e uruguaios dizem que brasileiro não sabe fazer doce de leite”, lamenta.

Envazamento dodocesde leite, na fazenda Lano Alto. Foto: Peèle Lemos
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O leite de vacas holandesas vem de ordenha própria – tocada pelo pai de Rosi, seu Zé Pequeno – e de pequenas cooperativas da região. São 1,5 mil litros diários contra 240 quilos de açúcar para produzir quase 730 quilos de doce de leite. Algo bem distante da proporção de quase um para um usada pela indústria, quiçá por nossas bisavós. A consistência aveludada é fruto das longas cinco horas de fogo.

Na fazenda Lano Alto, em Catuçaba, na Serra do Mar, usa-se leite de vacas da raça Jersey, que é mais gordo, na produção do doce de leite. Elas são criadas a pasto, com pouca intervenção e bezerros ao pé, garantindo a qualidade da matéria-prima. A receita leva também açúcar (pouco), uma pitada de sal para não ficar enjoativo e um “tiquinho de bicarbonato para ajudar na textura e caramelização”, conta Peèle Lemos, um dos sócios.

A hora e a vez dos leites de cabra, búfala e ovela

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Para além da redução do açúcar – e da extinção do amido e demais aditivos –, produtores brasileiros têm trocado o convencional leite de vaca pelo de outros rebanhos leiteiros. O doce de leite passa a ser também de cabra, de ovelha e de búfala.

“Enquanto o doce de leite de vaca é mais suave, o de cabra é mais protagonista, tem mais personalidade. Não tenho um preferido, acho que cada um cumpre o seu papel”, acredita Peèle, que também já produziu e vendeu doce de leite de cabra na Lano Alto.

“Paramos porque decidimos vender o rebanho”, conta. O modo de preparo, que inclui sete horas de cozimento em fogo baixo, segundo ele, é o mesmo.

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+ Sete receitas para quem é apaixonado por doce de leite 

O capril mineiro Rancho das Vertentes, que fez fama por causa de seus queijos de cabra premiados internacionalmente, há pouco mais de cinco meses, também fabrica doce com o leite de produção própria. Edson Cardoso, dono do laticínio, conta que usa 20% de açúcar para temperar o leite de cabra, além de uma pitada de bicarbonato. O doce ainda não é vendido em São Paulo.

Quando elaboravam o portfólio da queijaria da Rima, em Porto Feliz, no interior paulista, Maria Clara Serra e Ricardo Rettmann atinaram para a escassez de “outros doces de leite, que não de vaca” no mercado. Foi então que decidiram produzir, além dos queijos, uma versão de doce de leite ovelha. Inspirada no modo de preparo argentino, a receita resultou em “um doce pouco doce com a cremosidade e o sabor característicos do leite de ovelha”, conta Ricardo. São apenas dois quilos de açúcar para 20 litros leite, além do bicarbonato e da pitadinha de sal.

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Doce de leite artesanal brasileiro explora outros leites além do de vaca. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“A receita basicamente é a mesma, com variações na quantidade de açúcar. O segredo é trabalhar com leite tirado no dia”, acredita Fabio Montezuma, do laticínio que leva seu sobrenome, em São João da Boa Vista, também no interior de São Paulo. “O dia passa, o leite muda.”

Sendo assim, o leite de búfala de rebanho próprio vira doce de leite de segunda a domingo. Cem litros de leite por semana rendem quase quarenta potes do doce encorpado, que tem cor de caramelo e sabor de toffee.

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Fábio conta que, certa vez, durante um evento, um cliente argentino, até então ressabiado, provou o doce de leite de búfala e ficou encantado. “Quanto é?”

“Não é nada”, retrucou. “Só quero que você leve um pote, tire uma foto em frente à Casa Rosada e diga que foi o melhor doce de leite que já comeu.”

“Prefiro pagar do que assinar minha sentença de morte”, recebeu em resposta.

Lano Alto

Doce de leite da Lano Alto (Catuçaba - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e  cremosaSabor: é o tradicional doce da fazenda, leite bem presente, mais salgadinho Onde: Lano Alto LAB (R. Turi, 213, Vila Madalena, 94287-0204) 

Rima

Doce de leite da Rima (Porto Feliz - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de ovelhaTextura: cremosa, untuosa e ligeiramente granuladaSabor: lácteo com caramelo salgado – bem diferente, por conta do leite de ovelha.Onde: Instituto Chão (R. Harmonia, 123, Vila Madalena, 3819-4205)

Montezuma

Doce de leite da Montezuma (São João da Boa Vista - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de búfalaTextura: lisa, cremosa e puxaSabor: bem leitoso, lembra toffee, menos doce que o tradicional.Onde: Encomendas pelo telefone (19) 3631-1294

Rocca

Doce de leite da Rocca (Pouso Alegre - MG). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e cremosaSabor: lembra o doce de leite uruguaio, é mais escuro, com sabor de carameloOnde: Mestre Queijeiro (R. Simão Álvares, 112, Pinheiros, 2369-1087)

Leite, açúcar, amor e só. Esse é o slogan da mineira Rocca, produtora artesanal de doce leite, cuja receita se resume aos ingredientes básicos de antigamente – qualquer tipo de espessante ou conservante fica de fora do tacho. 

Caminho, aliás, percorrido por outros produtores que, de uns tempos para cá, passaram a olhar com mais carinho para o doce de leite nacional. Algo parecido com o que aconteceu com os queijos artesanais no Brasil.

De colher: nova leva de doces de leite artesanais brasileiros. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Parafraseando o mote da Rocca, hoje em dia, já é possível falar em leites (no plural), pouco açúcar e talvez um tantinho de sal ou bicarbonato, mas nem todo mundo usa. O tempo, corrido sem pressa, também é ingrediente indispensável. É ele o responsável pelo ponto denso e cremoso (lembra? Não leva espessantes), pelo sabor e pela cor do doce, que vai do marrom claro ao escuro, tipo caramelo. A regra é clara: quanto mais tempo no fogo, mais intenso será o doce.

Rosi e Raphael Figueiredo demoraram quase um ano para desenvolver a receita da Rocca. “Compramos o primeiro tacho sem saber fazer doce de leite”, conta Rosi. Eles tinham dois objetivos em mente: diminuir a quantidade de açúcar e acabar com a "tragédia do amido e da glucose”, geralmente adicionados para acelerar o cozimento e aumentar o rendimento da receita. “Por isso que argentinos e uruguaios dizem que brasileiro não sabe fazer doce de leite”, lamenta.

Envazamento dodocesde leite, na fazenda Lano Alto. Foto: Peèle Lemos

O leite de vacas holandesas vem de ordenha própria – tocada pelo pai de Rosi, seu Zé Pequeno – e de pequenas cooperativas da região. São 1,5 mil litros diários contra 240 quilos de açúcar para produzir quase 730 quilos de doce de leite. Algo bem distante da proporção de quase um para um usada pela indústria, quiçá por nossas bisavós. A consistência aveludada é fruto das longas cinco horas de fogo.

Na fazenda Lano Alto, em Catuçaba, na Serra do Mar, usa-se leite de vacas da raça Jersey, que é mais gordo, na produção do doce de leite. Elas são criadas a pasto, com pouca intervenção e bezerros ao pé, garantindo a qualidade da matéria-prima. A receita leva também açúcar (pouco), uma pitada de sal para não ficar enjoativo e um “tiquinho de bicarbonato para ajudar na textura e caramelização”, conta Peèle Lemos, um dos sócios.

A hora e a vez dos leites de cabra, búfala e ovela

Para além da redução do açúcar – e da extinção do amido e demais aditivos –, produtores brasileiros têm trocado o convencional leite de vaca pelo de outros rebanhos leiteiros. O doce de leite passa a ser também de cabra, de ovelha e de búfala.

“Enquanto o doce de leite de vaca é mais suave, o de cabra é mais protagonista, tem mais personalidade. Não tenho um preferido, acho que cada um cumpre o seu papel”, acredita Peèle, que também já produziu e vendeu doce de leite de cabra na Lano Alto.

“Paramos porque decidimos vender o rebanho”, conta. O modo de preparo, que inclui sete horas de cozimento em fogo baixo, segundo ele, é o mesmo.

+ Sete receitas para quem é apaixonado por doce de leite 

O capril mineiro Rancho das Vertentes, que fez fama por causa de seus queijos de cabra premiados internacionalmente, há pouco mais de cinco meses, também fabrica doce com o leite de produção própria. Edson Cardoso, dono do laticínio, conta que usa 20% de açúcar para temperar o leite de cabra, além de uma pitada de bicarbonato. O doce ainda não é vendido em São Paulo.

Quando elaboravam o portfólio da queijaria da Rima, em Porto Feliz, no interior paulista, Maria Clara Serra e Ricardo Rettmann atinaram para a escassez de “outros doces de leite, que não de vaca” no mercado. Foi então que decidiram produzir, além dos queijos, uma versão de doce de leite ovelha. Inspirada no modo de preparo argentino, a receita resultou em “um doce pouco doce com a cremosidade e o sabor característicos do leite de ovelha”, conta Ricardo. São apenas dois quilos de açúcar para 20 litros leite, além do bicarbonato e da pitadinha de sal.

Doce de leite artesanal brasileiro explora outros leites além do de vaca. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“A receita basicamente é a mesma, com variações na quantidade de açúcar. O segredo é trabalhar com leite tirado no dia”, acredita Fabio Montezuma, do laticínio que leva seu sobrenome, em São João da Boa Vista, também no interior de São Paulo. “O dia passa, o leite muda.”

Sendo assim, o leite de búfala de rebanho próprio vira doce de leite de segunda a domingo. Cem litros de leite por semana rendem quase quarenta potes do doce encorpado, que tem cor de caramelo e sabor de toffee.

Fábio conta que, certa vez, durante um evento, um cliente argentino, até então ressabiado, provou o doce de leite de búfala e ficou encantado. “Quanto é?”

“Não é nada”, retrucou. “Só quero que você leve um pote, tire uma foto em frente à Casa Rosada e diga que foi o melhor doce de leite que já comeu.”

“Prefiro pagar do que assinar minha sentença de morte”, recebeu em resposta.

Lano Alto

Doce de leite da Lano Alto (Catuçaba - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e  cremosaSabor: é o tradicional doce da fazenda, leite bem presente, mais salgadinho Onde: Lano Alto LAB (R. Turi, 213, Vila Madalena, 94287-0204) 

Rima

Doce de leite da Rima (Porto Feliz - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de ovelhaTextura: cremosa, untuosa e ligeiramente granuladaSabor: lácteo com caramelo salgado – bem diferente, por conta do leite de ovelha.Onde: Instituto Chão (R. Harmonia, 123, Vila Madalena, 3819-4205)

Montezuma

Doce de leite da Montezuma (São João da Boa Vista - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de búfalaTextura: lisa, cremosa e puxaSabor: bem leitoso, lembra toffee, menos doce que o tradicional.Onde: Encomendas pelo telefone (19) 3631-1294

Rocca

Doce de leite da Rocca (Pouso Alegre - MG). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e cremosaSabor: lembra o doce de leite uruguaio, é mais escuro, com sabor de carameloOnde: Mestre Queijeiro (R. Simão Álvares, 112, Pinheiros, 2369-1087)

Leite, açúcar, amor e só. Esse é o slogan da mineira Rocca, produtora artesanal de doce leite, cuja receita se resume aos ingredientes básicos de antigamente – qualquer tipo de espessante ou conservante fica de fora do tacho. 

Caminho, aliás, percorrido por outros produtores que, de uns tempos para cá, passaram a olhar com mais carinho para o doce de leite nacional. Algo parecido com o que aconteceu com os queijos artesanais no Brasil.

De colher: nova leva de doces de leite artesanais brasileiros. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Parafraseando o mote da Rocca, hoje em dia, já é possível falar em leites (no plural), pouco açúcar e talvez um tantinho de sal ou bicarbonato, mas nem todo mundo usa. O tempo, corrido sem pressa, também é ingrediente indispensável. É ele o responsável pelo ponto denso e cremoso (lembra? Não leva espessantes), pelo sabor e pela cor do doce, que vai do marrom claro ao escuro, tipo caramelo. A regra é clara: quanto mais tempo no fogo, mais intenso será o doce.

Rosi e Raphael Figueiredo demoraram quase um ano para desenvolver a receita da Rocca. “Compramos o primeiro tacho sem saber fazer doce de leite”, conta Rosi. Eles tinham dois objetivos em mente: diminuir a quantidade de açúcar e acabar com a "tragédia do amido e da glucose”, geralmente adicionados para acelerar o cozimento e aumentar o rendimento da receita. “Por isso que argentinos e uruguaios dizem que brasileiro não sabe fazer doce de leite”, lamenta.

Envazamento dodocesde leite, na fazenda Lano Alto. Foto: Peèle Lemos

O leite de vacas holandesas vem de ordenha própria – tocada pelo pai de Rosi, seu Zé Pequeno – e de pequenas cooperativas da região. São 1,5 mil litros diários contra 240 quilos de açúcar para produzir quase 730 quilos de doce de leite. Algo bem distante da proporção de quase um para um usada pela indústria, quiçá por nossas bisavós. A consistência aveludada é fruto das longas cinco horas de fogo.

Na fazenda Lano Alto, em Catuçaba, na Serra do Mar, usa-se leite de vacas da raça Jersey, que é mais gordo, na produção do doce de leite. Elas são criadas a pasto, com pouca intervenção e bezerros ao pé, garantindo a qualidade da matéria-prima. A receita leva também açúcar (pouco), uma pitada de sal para não ficar enjoativo e um “tiquinho de bicarbonato para ajudar na textura e caramelização”, conta Peèle Lemos, um dos sócios.

A hora e a vez dos leites de cabra, búfala e ovela

Para além da redução do açúcar – e da extinção do amido e demais aditivos –, produtores brasileiros têm trocado o convencional leite de vaca pelo de outros rebanhos leiteiros. O doce de leite passa a ser também de cabra, de ovelha e de búfala.

“Enquanto o doce de leite de vaca é mais suave, o de cabra é mais protagonista, tem mais personalidade. Não tenho um preferido, acho que cada um cumpre o seu papel”, acredita Peèle, que também já produziu e vendeu doce de leite de cabra na Lano Alto.

“Paramos porque decidimos vender o rebanho”, conta. O modo de preparo, que inclui sete horas de cozimento em fogo baixo, segundo ele, é o mesmo.

+ Sete receitas para quem é apaixonado por doce de leite 

O capril mineiro Rancho das Vertentes, que fez fama por causa de seus queijos de cabra premiados internacionalmente, há pouco mais de cinco meses, também fabrica doce com o leite de produção própria. Edson Cardoso, dono do laticínio, conta que usa 20% de açúcar para temperar o leite de cabra, além de uma pitada de bicarbonato. O doce ainda não é vendido em São Paulo.

Quando elaboravam o portfólio da queijaria da Rima, em Porto Feliz, no interior paulista, Maria Clara Serra e Ricardo Rettmann atinaram para a escassez de “outros doces de leite, que não de vaca” no mercado. Foi então que decidiram produzir, além dos queijos, uma versão de doce de leite ovelha. Inspirada no modo de preparo argentino, a receita resultou em “um doce pouco doce com a cremosidade e o sabor característicos do leite de ovelha”, conta Ricardo. São apenas dois quilos de açúcar para 20 litros leite, além do bicarbonato e da pitadinha de sal.

Doce de leite artesanal brasileiro explora outros leites além do de vaca. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“A receita basicamente é a mesma, com variações na quantidade de açúcar. O segredo é trabalhar com leite tirado no dia”, acredita Fabio Montezuma, do laticínio que leva seu sobrenome, em São João da Boa Vista, também no interior de São Paulo. “O dia passa, o leite muda.”

Sendo assim, o leite de búfala de rebanho próprio vira doce de leite de segunda a domingo. Cem litros de leite por semana rendem quase quarenta potes do doce encorpado, que tem cor de caramelo e sabor de toffee.

Fábio conta que, certa vez, durante um evento, um cliente argentino, até então ressabiado, provou o doce de leite de búfala e ficou encantado. “Quanto é?”

“Não é nada”, retrucou. “Só quero que você leve um pote, tire uma foto em frente à Casa Rosada e diga que foi o melhor doce de leite que já comeu.”

“Prefiro pagar do que assinar minha sentença de morte”, recebeu em resposta.

Lano Alto

Doce de leite da Lano Alto (Catuçaba - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e  cremosaSabor: é o tradicional doce da fazenda, leite bem presente, mais salgadinho Onde: Lano Alto LAB (R. Turi, 213, Vila Madalena, 94287-0204) 

Rima

Doce de leite da Rima (Porto Feliz - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de ovelhaTextura: cremosa, untuosa e ligeiramente granuladaSabor: lácteo com caramelo salgado – bem diferente, por conta do leite de ovelha.Onde: Instituto Chão (R. Harmonia, 123, Vila Madalena, 3819-4205)

Montezuma

Doce de leite da Montezuma (São João da Boa Vista - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de búfalaTextura: lisa, cremosa e puxaSabor: bem leitoso, lembra toffee, menos doce que o tradicional.Onde: Encomendas pelo telefone (19) 3631-1294

Rocca

Doce de leite da Rocca (Pouso Alegre - MG). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e cremosaSabor: lembra o doce de leite uruguaio, é mais escuro, com sabor de carameloOnde: Mestre Queijeiro (R. Simão Álvares, 112, Pinheiros, 2369-1087)

Leite, açúcar, amor e só. Esse é o slogan da mineira Rocca, produtora artesanal de doce leite, cuja receita se resume aos ingredientes básicos de antigamente – qualquer tipo de espessante ou conservante fica de fora do tacho. 

Caminho, aliás, percorrido por outros produtores que, de uns tempos para cá, passaram a olhar com mais carinho para o doce de leite nacional. Algo parecido com o que aconteceu com os queijos artesanais no Brasil.

De colher: nova leva de doces de leite artesanais brasileiros. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Parafraseando o mote da Rocca, hoje em dia, já é possível falar em leites (no plural), pouco açúcar e talvez um tantinho de sal ou bicarbonato, mas nem todo mundo usa. O tempo, corrido sem pressa, também é ingrediente indispensável. É ele o responsável pelo ponto denso e cremoso (lembra? Não leva espessantes), pelo sabor e pela cor do doce, que vai do marrom claro ao escuro, tipo caramelo. A regra é clara: quanto mais tempo no fogo, mais intenso será o doce.

Rosi e Raphael Figueiredo demoraram quase um ano para desenvolver a receita da Rocca. “Compramos o primeiro tacho sem saber fazer doce de leite”, conta Rosi. Eles tinham dois objetivos em mente: diminuir a quantidade de açúcar e acabar com a "tragédia do amido e da glucose”, geralmente adicionados para acelerar o cozimento e aumentar o rendimento da receita. “Por isso que argentinos e uruguaios dizem que brasileiro não sabe fazer doce de leite”, lamenta.

Envazamento dodocesde leite, na fazenda Lano Alto. Foto: Peèle Lemos

O leite de vacas holandesas vem de ordenha própria – tocada pelo pai de Rosi, seu Zé Pequeno – e de pequenas cooperativas da região. São 1,5 mil litros diários contra 240 quilos de açúcar para produzir quase 730 quilos de doce de leite. Algo bem distante da proporção de quase um para um usada pela indústria, quiçá por nossas bisavós. A consistência aveludada é fruto das longas cinco horas de fogo.

Na fazenda Lano Alto, em Catuçaba, na Serra do Mar, usa-se leite de vacas da raça Jersey, que é mais gordo, na produção do doce de leite. Elas são criadas a pasto, com pouca intervenção e bezerros ao pé, garantindo a qualidade da matéria-prima. A receita leva também açúcar (pouco), uma pitada de sal para não ficar enjoativo e um “tiquinho de bicarbonato para ajudar na textura e caramelização”, conta Peèle Lemos, um dos sócios.

A hora e a vez dos leites de cabra, búfala e ovela

Para além da redução do açúcar – e da extinção do amido e demais aditivos –, produtores brasileiros têm trocado o convencional leite de vaca pelo de outros rebanhos leiteiros. O doce de leite passa a ser também de cabra, de ovelha e de búfala.

“Enquanto o doce de leite de vaca é mais suave, o de cabra é mais protagonista, tem mais personalidade. Não tenho um preferido, acho que cada um cumpre o seu papel”, acredita Peèle, que também já produziu e vendeu doce de leite de cabra na Lano Alto.

“Paramos porque decidimos vender o rebanho”, conta. O modo de preparo, que inclui sete horas de cozimento em fogo baixo, segundo ele, é o mesmo.

+ Sete receitas para quem é apaixonado por doce de leite 

O capril mineiro Rancho das Vertentes, que fez fama por causa de seus queijos de cabra premiados internacionalmente, há pouco mais de cinco meses, também fabrica doce com o leite de produção própria. Edson Cardoso, dono do laticínio, conta que usa 20% de açúcar para temperar o leite de cabra, além de uma pitada de bicarbonato. O doce ainda não é vendido em São Paulo.

Quando elaboravam o portfólio da queijaria da Rima, em Porto Feliz, no interior paulista, Maria Clara Serra e Ricardo Rettmann atinaram para a escassez de “outros doces de leite, que não de vaca” no mercado. Foi então que decidiram produzir, além dos queijos, uma versão de doce de leite ovelha. Inspirada no modo de preparo argentino, a receita resultou em “um doce pouco doce com a cremosidade e o sabor característicos do leite de ovelha”, conta Ricardo. São apenas dois quilos de açúcar para 20 litros leite, além do bicarbonato e da pitadinha de sal.

Doce de leite artesanal brasileiro explora outros leites além do de vaca. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“A receita basicamente é a mesma, com variações na quantidade de açúcar. O segredo é trabalhar com leite tirado no dia”, acredita Fabio Montezuma, do laticínio que leva seu sobrenome, em São João da Boa Vista, também no interior de São Paulo. “O dia passa, o leite muda.”

Sendo assim, o leite de búfala de rebanho próprio vira doce de leite de segunda a domingo. Cem litros de leite por semana rendem quase quarenta potes do doce encorpado, que tem cor de caramelo e sabor de toffee.

Fábio conta que, certa vez, durante um evento, um cliente argentino, até então ressabiado, provou o doce de leite de búfala e ficou encantado. “Quanto é?”

“Não é nada”, retrucou. “Só quero que você leve um pote, tire uma foto em frente à Casa Rosada e diga que foi o melhor doce de leite que já comeu.”

“Prefiro pagar do que assinar minha sentença de morte”, recebeu em resposta.

Lano Alto

Doce de leite da Lano Alto (Catuçaba - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e  cremosaSabor: é o tradicional doce da fazenda, leite bem presente, mais salgadinho Onde: Lano Alto LAB (R. Turi, 213, Vila Madalena, 94287-0204) 

Rima

Doce de leite da Rima (Porto Feliz - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de ovelhaTextura: cremosa, untuosa e ligeiramente granuladaSabor: lácteo com caramelo salgado – bem diferente, por conta do leite de ovelha.Onde: Instituto Chão (R. Harmonia, 123, Vila Madalena, 3819-4205)

Montezuma

Doce de leite da Montezuma (São João da Boa Vista - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de búfalaTextura: lisa, cremosa e puxaSabor: bem leitoso, lembra toffee, menos doce que o tradicional.Onde: Encomendas pelo telefone (19) 3631-1294

Rocca

Doce de leite da Rocca (Pouso Alegre - MG). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e cremosaSabor: lembra o doce de leite uruguaio, é mais escuro, com sabor de carameloOnde: Mestre Queijeiro (R. Simão Álvares, 112, Pinheiros, 2369-1087)

Leite, açúcar, amor e só. Esse é o slogan da mineira Rocca, produtora artesanal de doce leite, cuja receita se resume aos ingredientes básicos de antigamente – qualquer tipo de espessante ou conservante fica de fora do tacho. 

Caminho, aliás, percorrido por outros produtores que, de uns tempos para cá, passaram a olhar com mais carinho para o doce de leite nacional. Algo parecido com o que aconteceu com os queijos artesanais no Brasil.

De colher: nova leva de doces de leite artesanais brasileiros. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Parafraseando o mote da Rocca, hoje em dia, já é possível falar em leites (no plural), pouco açúcar e talvez um tantinho de sal ou bicarbonato, mas nem todo mundo usa. O tempo, corrido sem pressa, também é ingrediente indispensável. É ele o responsável pelo ponto denso e cremoso (lembra? Não leva espessantes), pelo sabor e pela cor do doce, que vai do marrom claro ao escuro, tipo caramelo. A regra é clara: quanto mais tempo no fogo, mais intenso será o doce.

Rosi e Raphael Figueiredo demoraram quase um ano para desenvolver a receita da Rocca. “Compramos o primeiro tacho sem saber fazer doce de leite”, conta Rosi. Eles tinham dois objetivos em mente: diminuir a quantidade de açúcar e acabar com a "tragédia do amido e da glucose”, geralmente adicionados para acelerar o cozimento e aumentar o rendimento da receita. “Por isso que argentinos e uruguaios dizem que brasileiro não sabe fazer doce de leite”, lamenta.

Envazamento dodocesde leite, na fazenda Lano Alto. Foto: Peèle Lemos

O leite de vacas holandesas vem de ordenha própria – tocada pelo pai de Rosi, seu Zé Pequeno – e de pequenas cooperativas da região. São 1,5 mil litros diários contra 240 quilos de açúcar para produzir quase 730 quilos de doce de leite. Algo bem distante da proporção de quase um para um usada pela indústria, quiçá por nossas bisavós. A consistência aveludada é fruto das longas cinco horas de fogo.

Na fazenda Lano Alto, em Catuçaba, na Serra do Mar, usa-se leite de vacas da raça Jersey, que é mais gordo, na produção do doce de leite. Elas são criadas a pasto, com pouca intervenção e bezerros ao pé, garantindo a qualidade da matéria-prima. A receita leva também açúcar (pouco), uma pitada de sal para não ficar enjoativo e um “tiquinho de bicarbonato para ajudar na textura e caramelização”, conta Peèle Lemos, um dos sócios.

A hora e a vez dos leites de cabra, búfala e ovela

Para além da redução do açúcar – e da extinção do amido e demais aditivos –, produtores brasileiros têm trocado o convencional leite de vaca pelo de outros rebanhos leiteiros. O doce de leite passa a ser também de cabra, de ovelha e de búfala.

“Enquanto o doce de leite de vaca é mais suave, o de cabra é mais protagonista, tem mais personalidade. Não tenho um preferido, acho que cada um cumpre o seu papel”, acredita Peèle, que também já produziu e vendeu doce de leite de cabra na Lano Alto.

“Paramos porque decidimos vender o rebanho”, conta. O modo de preparo, que inclui sete horas de cozimento em fogo baixo, segundo ele, é o mesmo.

+ Sete receitas para quem é apaixonado por doce de leite 

O capril mineiro Rancho das Vertentes, que fez fama por causa de seus queijos de cabra premiados internacionalmente, há pouco mais de cinco meses, também fabrica doce com o leite de produção própria. Edson Cardoso, dono do laticínio, conta que usa 20% de açúcar para temperar o leite de cabra, além de uma pitada de bicarbonato. O doce ainda não é vendido em São Paulo.

Quando elaboravam o portfólio da queijaria da Rima, em Porto Feliz, no interior paulista, Maria Clara Serra e Ricardo Rettmann atinaram para a escassez de “outros doces de leite, que não de vaca” no mercado. Foi então que decidiram produzir, além dos queijos, uma versão de doce de leite ovelha. Inspirada no modo de preparo argentino, a receita resultou em “um doce pouco doce com a cremosidade e o sabor característicos do leite de ovelha”, conta Ricardo. São apenas dois quilos de açúcar para 20 litros leite, além do bicarbonato e da pitadinha de sal.

Doce de leite artesanal brasileiro explora outros leites além do de vaca. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

“A receita basicamente é a mesma, com variações na quantidade de açúcar. O segredo é trabalhar com leite tirado no dia”, acredita Fabio Montezuma, do laticínio que leva seu sobrenome, em São João da Boa Vista, também no interior de São Paulo. “O dia passa, o leite muda.”

Sendo assim, o leite de búfala de rebanho próprio vira doce de leite de segunda a domingo. Cem litros de leite por semana rendem quase quarenta potes do doce encorpado, que tem cor de caramelo e sabor de toffee.

Fábio conta que, certa vez, durante um evento, um cliente argentino, até então ressabiado, provou o doce de leite de búfala e ficou encantado. “Quanto é?”

“Não é nada”, retrucou. “Só quero que você leve um pote, tire uma foto em frente à Casa Rosada e diga que foi o melhor doce de leite que já comeu.”

“Prefiro pagar do que assinar minha sentença de morte”, recebeu em resposta.

Lano Alto

Doce de leite da Lano Alto (Catuçaba - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e  cremosaSabor: é o tradicional doce da fazenda, leite bem presente, mais salgadinho Onde: Lano Alto LAB (R. Turi, 213, Vila Madalena, 94287-0204) 

Rima

Doce de leite da Rima (Porto Feliz - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de ovelhaTextura: cremosa, untuosa e ligeiramente granuladaSabor: lácteo com caramelo salgado – bem diferente, por conta do leite de ovelha.Onde: Instituto Chão (R. Harmonia, 123, Vila Madalena, 3819-4205)

Montezuma

Doce de leite da Montezuma (São João da Boa Vista - SP). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de búfalaTextura: lisa, cremosa e puxaSabor: bem leitoso, lembra toffee, menos doce que o tradicional.Onde: Encomendas pelo telefone (19) 3631-1294

Rocca

Doce de leite da Rocca (Pouso Alegre - MG). Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Leite: de vacaTextura: lisa e cremosaSabor: lembra o doce de leite uruguaio, é mais escuro, com sabor de carameloOnde: Mestre Queijeiro (R. Simão Álvares, 112, Pinheiros, 2369-1087)

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