Farinha brasileira ganha força nas padarias, mas ainda enfrenta desafios


Apesar de preconceitos, trigo brasileiro começa a mostrar suas qualidades e a impactar positivamente a produção de pão, agora brasileiro de ponta a ponta

Por Matheus Mans

Quando Diêgo Penido começou a fazer pão em casa, percebeu que não tinha como comprar grandes sacas de farinha nem estocar grandes volumes. Precisava de agilidade e praticidade na gestão de insumos. Foi aí que ele, que hoje é dono da padaria Na Fila do Pão, percebeu uma saída viável para seu dilema: ao invés de comprar quilos e quilos de trigo importado para armazenar por longos períodos, começou a usar farinha brasileira.

Primeiramente, o padeiro experimentou algumas marcas que misturavam o trigo brasileiro com o argentino. Não era bem o que queria. “Com o tempo, estudo, pesquisa e conhecimento, fui ganhando repertório sobre o universo das farinhas e comecei a me aventurar entre opções importadas e nacionais”, contextualiza o padeiro da Barra Funda.

Pães da padaria Na Fila do Pão são feitos com farinha orgânica nacional. Foto: Diêgo Penido Foto: Diêgo Penido
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Aí, assim que o projeto da Na Fila do Pão começou a ganhar corpo durante a pandemia, ele quis trabalhar com o máximo de insumos nacionais. Hoje, usa 5 tipos de farinha na produção. 70% delas são brasileiras -- e as nacionais são, de longe, as favoritas. As internacionais estão ali apenas para processos que exigem farinha com nutrientes, proteínas e componentes que não são encontrados aqui, como o panetone e o croissant.

“Ela proporciona resultados incríveis aos nossos pães, onde a sua crosta desenvolve uma reação de Maillard acima das outras farinhas que havíamos utilizado. A crosta fica bem caramelizada, crocante e pururucada; o miolo do pão feito com essa farinha é leve, fosco, rústico, fofo e elástico, com um sabor levemente ácido e surpreendente, remetendo a um pão do campo assado em forno a lenha, mesmo não sendo assado dessa forma”, diz ele, que usa farinha brasileira em todos os seus pães sourdough de fermentação natural.

Farinha brasileira domina padarias artesanais

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Esse movimento de Diêgo não é algo solitário no mercado. As farinhas brasileiras começaram a ganhar força principalmente durante a pandemia, quando o pão se tornou um assunto central nas conversas. Naquele momento, os padeiros começaram a elevar o trigo brasileiro para um outro patamar. Antes deixado de lado, se tornou “especial” no dia a dia.

Afinal, pense no processo de uma farinha internacional: o trigo é colhido, armazenado, depois moído e ensacado para, enfim, ser transportado por longas distâncias até chegar na mão do padeiro. Parecer que não, mas a farinha tem frescor, como acontece com o azeite.

Isso pode ser determinante na hora de fazer o pão. “A farinha brasileira ganha por ser mais regional. Ela ganha mais frescor”, contextualiza Carlos Maceiras, padeiro da Tu és Pão, padaria especializada em pães artesanais em Pinheiros. “A farinha gringa é moída fora, fica esperando em silos, passa por longa viagem. Até chegar para nós, ela perde um pouco de qualidade. Se temos farinha nacional, ela tem mais frescor e isso se reflete no pão”.

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Maria Tereza Silverio, uma das proprietárias da St. Chico, que usa farinha brasileira nos pãezinhos Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Isso sem falar de uma questão de sustentabilidade, discussão que está crescendo entre produtores de alimentos -- incluindo padeiros que importam vários insumos. “Considero preocupante comprar toneladas de farinhas ou qualquer outro produto que atravesse o oceano”, diz Diêgo. “É pouco sustentável ecologicamente e você paga em outra moeda apenas para enfatizar o selo de farinha importada em detrimento das opções brasileiras”.

Isso tudo ainda desemboca em outro ponto: o preço. Farinhas importadas não apenas contam com as taxas alfandegárias, como também embutem no quilo o preço do transporte. Já as brasileiras, mesmo vindo de moinhos menores, conseguem chegar em preços atrativos. “O preço acaba colocando ela na concorrência”, diz Helena Mil Homens, da padaria St. Chico, que usa a farinha nacional em todos os pães produzidos em sua padaria.

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Com isso, representantes do setor percebem uma movimentação, mesmo que pequena. “A farinha brasileira ainda não consegue atender todo o setor de panificação, por isso acaba sendo um produto mais de nicho, de padarias menores”, diz Rui Gonçalves, presidente da Sampapão, entidade que representa o setor de padarias em São Paulo. “Mas nós podemos constatar que as padarias estão começando a se interessar por isso, buscando opções”.

Desafios à vista

Apesar da empolgação que toma conta da cena de algumas padarias com a farinha nacional, há alguns obstáculos pela frente. Pra começar, a produção brasileira de trigo. Como destacado por Rui Gonçalves, da Sampapão, ainda é difícil uma padaria com uma produção muito grande usar farinha 100% nacional, já os números são contrastantes.

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Em 2019, a importação de trigo ocupou a quarta colocação no ranking das importações de produtos básicos. Isso acontece, de acordo com dados da Associação Brasileira de Indústria de Trigo (Abratrigo), por conta de uma defasagem: a demanda do trigo no país é de 11 milhões de toneladas quando o país produz 6 milhões de toneladas por ano.

“Estão surgindo cada vez mais opções de farinhas ao redor do mundo, como orgânicas e até mesmo farinha sem glúten”, diz o presidente da Sampapão, Rui Gonçalves. “Ainda temos uma produção muito pequena por aqui, que podemos crescer até de olho nisso”.

Se torna um desafio, então, encontrar uma farinha 100% brasileira à disposição no mercado -- afinal, muitas acabam usando trigo importado, principalmente da Argentina, sem nem ao menos comunicar a padaria dessa mistura de origens. Dentre as marcas utilizadas pelos padeiros consultados pela reportagem, estão a Orgânicos Paullinia, do Paraná; a Biorgânica, também do sul;  e a Irati, que é moída em pedra, seja a branca ou a integral. Também são citadas as farinhas Anaconda, também do Paraná, e a Mirella Orgânica.

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Também falta uma constância na qualidade. Helena Mil-Homens conta que testou muitas farinhas com as receitas que queria usar na padaria. A que ela usa foi a que se saiu melhor em termos de sabor, mas não é muito fácil de trabalhar. Isso acontece devido a algumas variações na qualidade da safra. Mas tem constância no fornecimento. Optamos por usá-la justamente por ser KM-zero, além de ser orgânica”, diz ela, citando a sustentabilidade.

Hoje, porém, o clima é de otimismo entre os padeiros -- que apostam em uma produção cada vez mais nacional do pãozinho de cada dia que chega à mesa dos brasileiros. “Estão começando a olhar para as farinhas, como já aconteceu com o café, com o vinho, com o azeite. Hoje tem muito mais qualidade e ainda está muito no início”, diz Maceiras. “O trigo está em adaptação no solo brasileiro. Ainda tem a melhorar. Mas isso já está acontecendo”.

Quando Diêgo Penido começou a fazer pão em casa, percebeu que não tinha como comprar grandes sacas de farinha nem estocar grandes volumes. Precisava de agilidade e praticidade na gestão de insumos. Foi aí que ele, que hoje é dono da padaria Na Fila do Pão, percebeu uma saída viável para seu dilema: ao invés de comprar quilos e quilos de trigo importado para armazenar por longos períodos, começou a usar farinha brasileira.

Primeiramente, o padeiro experimentou algumas marcas que misturavam o trigo brasileiro com o argentino. Não era bem o que queria. “Com o tempo, estudo, pesquisa e conhecimento, fui ganhando repertório sobre o universo das farinhas e comecei a me aventurar entre opções importadas e nacionais”, contextualiza o padeiro da Barra Funda.

Pães da padaria Na Fila do Pão são feitos com farinha orgânica nacional. Foto: Diêgo Penido Foto: Diêgo Penido

Aí, assim que o projeto da Na Fila do Pão começou a ganhar corpo durante a pandemia, ele quis trabalhar com o máximo de insumos nacionais. Hoje, usa 5 tipos de farinha na produção. 70% delas são brasileiras -- e as nacionais são, de longe, as favoritas. As internacionais estão ali apenas para processos que exigem farinha com nutrientes, proteínas e componentes que não são encontrados aqui, como o panetone e o croissant.

“Ela proporciona resultados incríveis aos nossos pães, onde a sua crosta desenvolve uma reação de Maillard acima das outras farinhas que havíamos utilizado. A crosta fica bem caramelizada, crocante e pururucada; o miolo do pão feito com essa farinha é leve, fosco, rústico, fofo e elástico, com um sabor levemente ácido e surpreendente, remetendo a um pão do campo assado em forno a lenha, mesmo não sendo assado dessa forma”, diz ele, que usa farinha brasileira em todos os seus pães sourdough de fermentação natural.

Farinha brasileira domina padarias artesanais

Esse movimento de Diêgo não é algo solitário no mercado. As farinhas brasileiras começaram a ganhar força principalmente durante a pandemia, quando o pão se tornou um assunto central nas conversas. Naquele momento, os padeiros começaram a elevar o trigo brasileiro para um outro patamar. Antes deixado de lado, se tornou “especial” no dia a dia.

Afinal, pense no processo de uma farinha internacional: o trigo é colhido, armazenado, depois moído e ensacado para, enfim, ser transportado por longas distâncias até chegar na mão do padeiro. Parecer que não, mas a farinha tem frescor, como acontece com o azeite.

Isso pode ser determinante na hora de fazer o pão. “A farinha brasileira ganha por ser mais regional. Ela ganha mais frescor”, contextualiza Carlos Maceiras, padeiro da Tu és Pão, padaria especializada em pães artesanais em Pinheiros. “A farinha gringa é moída fora, fica esperando em silos, passa por longa viagem. Até chegar para nós, ela perde um pouco de qualidade. Se temos farinha nacional, ela tem mais frescor e isso se reflete no pão”.

Maria Tereza Silverio, uma das proprietárias da St. Chico, que usa farinha brasileira nos pãezinhos Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Isso sem falar de uma questão de sustentabilidade, discussão que está crescendo entre produtores de alimentos -- incluindo padeiros que importam vários insumos. “Considero preocupante comprar toneladas de farinhas ou qualquer outro produto que atravesse o oceano”, diz Diêgo. “É pouco sustentável ecologicamente e você paga em outra moeda apenas para enfatizar o selo de farinha importada em detrimento das opções brasileiras”.

Isso tudo ainda desemboca em outro ponto: o preço. Farinhas importadas não apenas contam com as taxas alfandegárias, como também embutem no quilo o preço do transporte. Já as brasileiras, mesmo vindo de moinhos menores, conseguem chegar em preços atrativos. “O preço acaba colocando ela na concorrência”, diz Helena Mil Homens, da padaria St. Chico, que usa a farinha nacional em todos os pães produzidos em sua padaria.

Com isso, representantes do setor percebem uma movimentação, mesmo que pequena. “A farinha brasileira ainda não consegue atender todo o setor de panificação, por isso acaba sendo um produto mais de nicho, de padarias menores”, diz Rui Gonçalves, presidente da Sampapão, entidade que representa o setor de padarias em São Paulo. “Mas nós podemos constatar que as padarias estão começando a se interessar por isso, buscando opções”.

Desafios à vista

Apesar da empolgação que toma conta da cena de algumas padarias com a farinha nacional, há alguns obstáculos pela frente. Pra começar, a produção brasileira de trigo. Como destacado por Rui Gonçalves, da Sampapão, ainda é difícil uma padaria com uma produção muito grande usar farinha 100% nacional, já os números são contrastantes.

Em 2019, a importação de trigo ocupou a quarta colocação no ranking das importações de produtos básicos. Isso acontece, de acordo com dados da Associação Brasileira de Indústria de Trigo (Abratrigo), por conta de uma defasagem: a demanda do trigo no país é de 11 milhões de toneladas quando o país produz 6 milhões de toneladas por ano.

“Estão surgindo cada vez mais opções de farinhas ao redor do mundo, como orgânicas e até mesmo farinha sem glúten”, diz o presidente da Sampapão, Rui Gonçalves. “Ainda temos uma produção muito pequena por aqui, que podemos crescer até de olho nisso”.

Se torna um desafio, então, encontrar uma farinha 100% brasileira à disposição no mercado -- afinal, muitas acabam usando trigo importado, principalmente da Argentina, sem nem ao menos comunicar a padaria dessa mistura de origens. Dentre as marcas utilizadas pelos padeiros consultados pela reportagem, estão a Orgânicos Paullinia, do Paraná; a Biorgânica, também do sul;  e a Irati, que é moída em pedra, seja a branca ou a integral. Também são citadas as farinhas Anaconda, também do Paraná, e a Mirella Orgânica.

Também falta uma constância na qualidade. Helena Mil-Homens conta que testou muitas farinhas com as receitas que queria usar na padaria. A que ela usa foi a que se saiu melhor em termos de sabor, mas não é muito fácil de trabalhar. Isso acontece devido a algumas variações na qualidade da safra. Mas tem constância no fornecimento. Optamos por usá-la justamente por ser KM-zero, além de ser orgânica”, diz ela, citando a sustentabilidade.

Hoje, porém, o clima é de otimismo entre os padeiros -- que apostam em uma produção cada vez mais nacional do pãozinho de cada dia que chega à mesa dos brasileiros. “Estão começando a olhar para as farinhas, como já aconteceu com o café, com o vinho, com o azeite. Hoje tem muito mais qualidade e ainda está muito no início”, diz Maceiras. “O trigo está em adaptação no solo brasileiro. Ainda tem a melhorar. Mas isso já está acontecendo”.

Quando Diêgo Penido começou a fazer pão em casa, percebeu que não tinha como comprar grandes sacas de farinha nem estocar grandes volumes. Precisava de agilidade e praticidade na gestão de insumos. Foi aí que ele, que hoje é dono da padaria Na Fila do Pão, percebeu uma saída viável para seu dilema: ao invés de comprar quilos e quilos de trigo importado para armazenar por longos períodos, começou a usar farinha brasileira.

Primeiramente, o padeiro experimentou algumas marcas que misturavam o trigo brasileiro com o argentino. Não era bem o que queria. “Com o tempo, estudo, pesquisa e conhecimento, fui ganhando repertório sobre o universo das farinhas e comecei a me aventurar entre opções importadas e nacionais”, contextualiza o padeiro da Barra Funda.

Pães da padaria Na Fila do Pão são feitos com farinha orgânica nacional. Foto: Diêgo Penido Foto: Diêgo Penido

Aí, assim que o projeto da Na Fila do Pão começou a ganhar corpo durante a pandemia, ele quis trabalhar com o máximo de insumos nacionais. Hoje, usa 5 tipos de farinha na produção. 70% delas são brasileiras -- e as nacionais são, de longe, as favoritas. As internacionais estão ali apenas para processos que exigem farinha com nutrientes, proteínas e componentes que não são encontrados aqui, como o panetone e o croissant.

“Ela proporciona resultados incríveis aos nossos pães, onde a sua crosta desenvolve uma reação de Maillard acima das outras farinhas que havíamos utilizado. A crosta fica bem caramelizada, crocante e pururucada; o miolo do pão feito com essa farinha é leve, fosco, rústico, fofo e elástico, com um sabor levemente ácido e surpreendente, remetendo a um pão do campo assado em forno a lenha, mesmo não sendo assado dessa forma”, diz ele, que usa farinha brasileira em todos os seus pães sourdough de fermentação natural.

Farinha brasileira domina padarias artesanais

Esse movimento de Diêgo não é algo solitário no mercado. As farinhas brasileiras começaram a ganhar força principalmente durante a pandemia, quando o pão se tornou um assunto central nas conversas. Naquele momento, os padeiros começaram a elevar o trigo brasileiro para um outro patamar. Antes deixado de lado, se tornou “especial” no dia a dia.

Afinal, pense no processo de uma farinha internacional: o trigo é colhido, armazenado, depois moído e ensacado para, enfim, ser transportado por longas distâncias até chegar na mão do padeiro. Parecer que não, mas a farinha tem frescor, como acontece com o azeite.

Isso pode ser determinante na hora de fazer o pão. “A farinha brasileira ganha por ser mais regional. Ela ganha mais frescor”, contextualiza Carlos Maceiras, padeiro da Tu és Pão, padaria especializada em pães artesanais em Pinheiros. “A farinha gringa é moída fora, fica esperando em silos, passa por longa viagem. Até chegar para nós, ela perde um pouco de qualidade. Se temos farinha nacional, ela tem mais frescor e isso se reflete no pão”.

Maria Tereza Silverio, uma das proprietárias da St. Chico, que usa farinha brasileira nos pãezinhos Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

Isso sem falar de uma questão de sustentabilidade, discussão que está crescendo entre produtores de alimentos -- incluindo padeiros que importam vários insumos. “Considero preocupante comprar toneladas de farinhas ou qualquer outro produto que atravesse o oceano”, diz Diêgo. “É pouco sustentável ecologicamente e você paga em outra moeda apenas para enfatizar o selo de farinha importada em detrimento das opções brasileiras”.

Isso tudo ainda desemboca em outro ponto: o preço. Farinhas importadas não apenas contam com as taxas alfandegárias, como também embutem no quilo o preço do transporte. Já as brasileiras, mesmo vindo de moinhos menores, conseguem chegar em preços atrativos. “O preço acaba colocando ela na concorrência”, diz Helena Mil Homens, da padaria St. Chico, que usa a farinha nacional em todos os pães produzidos em sua padaria.

Com isso, representantes do setor percebem uma movimentação, mesmo que pequena. “A farinha brasileira ainda não consegue atender todo o setor de panificação, por isso acaba sendo um produto mais de nicho, de padarias menores”, diz Rui Gonçalves, presidente da Sampapão, entidade que representa o setor de padarias em São Paulo. “Mas nós podemos constatar que as padarias estão começando a se interessar por isso, buscando opções”.

Desafios à vista

Apesar da empolgação que toma conta da cena de algumas padarias com a farinha nacional, há alguns obstáculos pela frente. Pra começar, a produção brasileira de trigo. Como destacado por Rui Gonçalves, da Sampapão, ainda é difícil uma padaria com uma produção muito grande usar farinha 100% nacional, já os números são contrastantes.

Em 2019, a importação de trigo ocupou a quarta colocação no ranking das importações de produtos básicos. Isso acontece, de acordo com dados da Associação Brasileira de Indústria de Trigo (Abratrigo), por conta de uma defasagem: a demanda do trigo no país é de 11 milhões de toneladas quando o país produz 6 milhões de toneladas por ano.

“Estão surgindo cada vez mais opções de farinhas ao redor do mundo, como orgânicas e até mesmo farinha sem glúten”, diz o presidente da Sampapão, Rui Gonçalves. “Ainda temos uma produção muito pequena por aqui, que podemos crescer até de olho nisso”.

Se torna um desafio, então, encontrar uma farinha 100% brasileira à disposição no mercado -- afinal, muitas acabam usando trigo importado, principalmente da Argentina, sem nem ao menos comunicar a padaria dessa mistura de origens. Dentre as marcas utilizadas pelos padeiros consultados pela reportagem, estão a Orgânicos Paullinia, do Paraná; a Biorgânica, também do sul;  e a Irati, que é moída em pedra, seja a branca ou a integral. Também são citadas as farinhas Anaconda, também do Paraná, e a Mirella Orgânica.

Também falta uma constância na qualidade. Helena Mil-Homens conta que testou muitas farinhas com as receitas que queria usar na padaria. A que ela usa foi a que se saiu melhor em termos de sabor, mas não é muito fácil de trabalhar. Isso acontece devido a algumas variações na qualidade da safra. Mas tem constância no fornecimento. Optamos por usá-la justamente por ser KM-zero, além de ser orgânica”, diz ela, citando a sustentabilidade.

Hoje, porém, o clima é de otimismo entre os padeiros -- que apostam em uma produção cada vez mais nacional do pãozinho de cada dia que chega à mesa dos brasileiros. “Estão começando a olhar para as farinhas, como já aconteceu com o café, com o vinho, com o azeite. Hoje tem muito mais qualidade e ainda está muito no início”, diz Maceiras. “O trigo está em adaptação no solo brasileiro. Ainda tem a melhorar. Mas isso já está acontecendo”.

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