Quais os melhores hambúrgueres vegetais do mercado? ‘Paladar’ testou oito marcas


Feitos com proteína de ervilha ou soja - e muita tecnologia -, eles prometem entregar textura, sabor e aroma idênticos aos de carne; confira o resultado da degustação às cegas

Por Danielle Nagase
Atualização:

Comer um hambúrguer feito de plantas, com o mesmo sabor e a textura de um de carne, por que não? Ou “why not?”, como provoca, em inglês, a chilena NotCo, que lançou sua versão de hambúrguer vegetal no Brasil em julho de 2020. Além dela, há pelo menos outras dez marcas disponíveis nas gôndolas, incluindo a Meta Foods, novo braço exclusivo de produtos plant based (à base de plantas) da Wessel, e gigantes como Sadia e Seara. Uma história que começou por aqui em meados de 2019 - com o lançamento do Futuro Burger - e ganha novos capítulos à medida que a demanda por esse tipo de produto cresce.

Amanda Magalhães, da The Burger Store, fez parte do júri que avaliou os hambúrgueres de plantas. Foto: Tiago Queiroz/Estadão
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Preparados com proteínas vegetais - soja e ervilha, principalmente -, e sem qualquer ingrediente de origem animal, esses hambúrgueres chegam ao mercado com a pretensão de imitar um burguer tradicional de carne na aparência, textura, aroma, sabor e suculência - e, pasme, alguns entregam até o “sangue” esperado em um disco malpassado, que é simulado com suco de beterraba.

O empenho em criar um sósia 100% vegetal, que envolve até algoritmos para processar informações dos alimentos e recriar receitas, tem um motivo: fisgar especialmente o consumidor que não é vegetariano nem vegano (que também são público-alvo, claro), mas que, consciente do peso de suas escolhas alimentares, procura diminuir o consumo de carne no dia a dia. São os chamados flexitarianos, que passaram a colocar à mesa questões como sustentabilidade, direito dos animais e saudabilidade.

Segundos os jurados, metade dos discos provados se passaria por um de carne no meio do sanduíche. Foto: Tiago Queiroz/Estadão
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“Decidir o que comer é um ato político. A indústria plant based encontrou uma forma de saciar o desejo humano de comer carne, livrando o comensal da culpa de estar consumindo um animal”, afirma a cientista de alimentos Lígia Moraes de Campos. “Você até pode fazer um hambúrguer gostoso de ervilha em casa, mas ele não vai ter a textura, a suculência e o sabor de carne, que são obtidos por meio de tecnologia. É provável que você não se satisfaça 100%. Por isso, a procura por esse tipo de produto é uma tendência que vai crescer mais e mais, já que o consumo desenfreado de carne é uma realidade insustentável.”

Pé na jaca

É importante ponderar: não é porque é “feito de plantas”, como as embalagens gostam de destacar, que esses hambúrgueres podem ser consumidos sem moderação. “Para chegar à textura desejada, a proteína vegetal é modificada por processos físicos de escala industrial, além de receber aditivos, como as gorduras vegetais e a metilcelulose [componente químico derivado da celulose], que ajudam na estruturação da carne vegetal. Trata-se de um alimento processado, que fere alguns princípios de saudabilidade”, alerta Marise Pollonio, professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), da Unicamp. “Ainda assim, não acho que esses produtos devam ser crucificados. A proposta é boa, o problema está na escolha repetitiva, o que, convenhamos, vale para a maioria dos industrializados.”

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Aparência e textura foram os pontos altos da degustação; aroma e sabor deixaram a desejar. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

E como não dá para colocar todas as marcas no mesmo balaio - já que se dividem entre foodtechs (startups de alimentação), empresas familiares e grandes grupos -, é importante que o consumidor atente-se à leitura dos rótulos no momento da escolha. “É preciso ficar de olho nos índices de sódio e de gordura saturada, principalmente”, alerta a nutricionista Lara Natacci, doutora pela USP. “Se o objetivo é substituir a carne, vale comparar a quantidade de proteína por porção e dar preferência aos que são fortificados com vitamina B12 e ferro”, complementa.

Chapa quente

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Com tantas opções disponíveis, o Paladar resolveu organizar uma degustação às cegas para avaliar os hambúrgueres de plantas gastronomicamente. Oito marcas foram colocadas à prova, todas encontradas em mercados e lojas especializadas em produtos vegetarianos e veganos.

Por conta da pandemia, o teste foi realizado à distância: cada um dos cinco jurados recebeu em sua casa uma caixa contendo os oito hambúrgueres descaracterizados (fora de suas embalagens originais), identificados apenas por números. Junto deles, enviamos as instruções de preparo conforme indicado na embalagem de cada marca e, por email, o formulário de avaliação.

Mesmo sendo feitos de plantas, hambúrgueres podem apresentar alto teor de gorduras saturadas e sódio. Foto: Tiagor Queiroz/Estadão
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O júri - composto por representantes dos grupos vegano, vegetariano e onívoro, entre chefs, donos de restaurantes e especialistas em hambúrgueres - levou em conta as qualidades e defeitos das amostras em cinco quesitos: aparência, textura, aroma, sabor e suculência.

Em questão de aparência e textura, a maioria dos burguers se saiu bem no parecer dos jurados. O calcanhar de aquiles está no aroma e, principalmente, no sabor dos discos. “Por mais que, hoje, a tecnologia permita identificar as moléculas de sabor presentes na carne para que se busque moléculas equivalentes em compostos vegetais, recriar um sabor do zero é algo muito complexo. Não se trata de uma ciência exata - junto A mais B e tenho C. Posso juntar A e B e obter Y”, explica Helena Bolini, professora da FEA, da Unicamp, que encabeçou pesquisas sensoriais junto a marcas de hambúrgueres plant based nos últimos dois anos.

Para mascarar o sabor das proteínas vegetais e fazê-las parecerem com carne, na avaliação dos jurados, algumas marcas pesaram a mão nos temperos e no aroma defumado. “A promessa é de imitar o gosto, aparência e textura de carne e, no processo, muitas vezes, a indústria esquece que o produto precisa ser gostoso antes de mais nada”, comenta o chef Daniel Biron, que é vegano e um dos jurados.

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Confira detalhes sobre cada um dos hambúrgueres a seguir.

Ranking

1º Futuro Burger 2030

Fazenda Futuro; 230g, 2 unidades; R$ 18,99 no Quitanda

A foodtech brasileira pode continuar a se gabar. De fato, o “revolucionário hambúrguer de plantas” agradou à maioria dos jurados, principalmente quanto à textura e suculência do disco. “Dá para passar por um burguer de verdade.” No quesito sabor, houve discordância, mas como ressaltou um dos jurados, “o fato de você mesmo temperar o burguer [com sal, pimenta ou seus temperos prediletos a gosto, conforme instrução na na caixa], deixa o sabor bem menos artificial”.

Ingredientes: água, preparado proteico (proteína texturizada de soja, proteína isolada de soja e proteína de ervilha), gordura de coco, óleo de canola, aroma natural, estabilizante metilcelulose, sal, beterraba em pó e corante carvão vegetal

2º Not Burger

NotCo; 200g, 2 unidades; R$ 18,99 no Quitanda

O hambúrguer da marca se saiu muito bem na degustação, ficando com notas acima da média em todos os quesitos. Algumas ressalvas surgiram quanto ao aroma, que para alguns pareceu artificial, “mas, ainda assim, bom”. Suculência, com direito a “sangue” de suco de beterraba, e textura foram os pontos altos. “Dentro de um sanduba, é fácil passar por um burguer de verdade”, cravou um dos jurados.

Ingredientes: água, proteína de ervilha, óleo de coco, óleo de girassol, fibra de bambu, cacau em pó, proteína de arroz, sal, suco de beterraba em pó, chia desengordurada em pó, espinafre em pó, minerais (Ferro e Zinco), vitamina A, vitamina B9, vitamina B12, estabilizante metilcelulose e aromas naturais.

3º The New Burger

The New Butcher’s; 240g, 2 unidades; R$ 19,49 no Quitanda

O aroma defumado dividiu os jurados: enquanto alguns classificaram como enjoativo, outros destacaram como atributo. A textura “perfeita, não quebradiça, idêntica à de carne”, como definiu um dos avaliadores, e a suculência da amostra - que tem marquinhas de grelha na superfície - levaram-na ao pódio. “A aparência é bonita, o hambúrguer é alto, tem bom tamanho. Não parece industrial.”

Ingredientes: água, proteína texturizada de ervilha, gordura de coco, amido modificado, cebola, extrato de levedura, beterraba em pó, 2% ou menos de: sal rosa do Himalaia, estabilizante metilcelulose, mix de vitaminas: tiamina (vitamina B1), riboflavina (vitamina B2), niacina (vitamina B3), piridoxina (vitamina B6), ácido fólico (vitamina B9), cobalamina (vitamina B12), biotina (vitamina B7), aroma idêntico ao natural, pimenta preta, alho, ferro e antioxidante ácido ascórbico.

4º Meta Burger

Meta Foods by Wessel - cebola tostada e ervas; 220g, 2 unidades; R$ 19,99 no Pão de Açúcar

Apesar da textura e da suculência satisfatórias, o hambúrguer 100% vegetal com assinatura da Wessel deixou o pódio por conta do sabor “muito forte de ervas”. A embalagem, assim como a lista de ingredientes, indica apenas temperos naturais, mas a combinação pareceu artificial aos jurados, além de ter roubado o protagonismo da “carne”. No mercado, também existe a opção temperada com páprica, tomate e alecrim.

Ingredientes: água, proteína concentrada de soja, óleo de coco, óleo vegetal, especiarias (cebola, alho, cebolinha, tomilho, noz moscada e mostarda), proteína isolada de soja, sal, fibra de soja, estabilizantes (metilcelulose, amido modificado, goma xantana, goma jataí, carragena, cloreto de potássio) e corantes (caramelo e beterraba).

Flexitarianos são públivo-alvo das marcas que investem em hambúrgueres vegetais que imitam carne. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

5º Burger de vegetais Veg & Tal

Sadia; 226g, 2 unidades; R$ 23,85 no Sonda

A aparência do disco, bastante avermelhada, induziu três dos cinco jurados a associar a amostra com um hambúrguer de calabresa - um deles, inclusive, chegou a sentir o gosto de carne suína. Aroma e sabor artificiais, com pimenta em evidência, e textura borrachuda. Manteve a sexta colocação graças à suculência do disco. “Num sanduíche com outros ingredientes pode até passar”, arrisca um jurado. O rótulo alerta: pode conter ovo e leite.

Ingredientes: água, proteína de trigo, óleo de coco, proteína de soja, óleo de girassol, cebola, beterraba, fibra de batata, ervas e especiarias, sal, alho, tomate, extrato de malte de cevada, maltodextrina, ortofosfato férrico (ferro), vitamina B12, aromatizantes: aromas naturais e aromas idênticos aos naturais, espessante metilcelulose.

6º Burger 100% vegetal

Frimesa; 540g, 6 unidades; R$ 26,90 no Fartura

Com 90 gramas, o hambúrguer da marca é fino e achatado, lembrando a aparência das versões mais populares de carne processada. O sabor artificial, com leve toque defumado, não chegou a desagradar completamente aos jurados, ao contrário da textura, quebradiça e com pouca suculência. Perdeu pontos pelo aroma, “que nem parece de comida”, como definiu um jurado.

Ingredientes: água, proteína de soja, óleo vegetal, proteína de fava, proteína de ervilha, amido de milho, extrato de levedura, extrato de alecrim, sal, aromatizantes, corantes (beterraba, caramelo III e páprica), espessante metilcelulose e maltodextrina.

7º Veg Burger

Vida Veg; 230g, 2 unidades; R$ 21,99 no Oba

Popular entre o público vegano, a marca anuncia seu hambúrguer como “o primeiro do Brasil feito de plantas e não congelado” - no mercado, porém, o produto foi mantido no freezer. Apesar da textura agradável, a amostra perdeu muitos pontos por conta do aroma artificial, “que não desperta o apetite”, e pelo sabor acentuado de ervilha, bem longe de lembrar o de carne.

Ingredientes: água, preparado proteico (proteína texturizada de soja, proteína isolada de ervilha), óleo de coco palmiste, cebola, sal do Himalaia, alho, pimenta, beterraba em pó, ferro, vitaminas (B6 e B12), estabilizante amido modificado e metilcelulose, aromas naturais e antioxidante extrato de alecrim.

8º Incrível Burger

Seara; 452g, 4 unidades; R$ 29,90 no Bergamini

Apesar da promessa de entregar textura e sabor de carne - conquistadas por meio da adição da tal da biomolécula I -, na degustação às cegas, esses mesmos quesitos deixaram a desejar. Os jurados alegaram sabor e aroma muito artificiais, além de textura borrachuda, com pedaços resistentes que lembravam nervos. De todos os pontos avaliados, a suculência do hambúrguer foi a que menos sofreu críticas.

Ingredientes: água, proteína de ervilha, óleo de algodão, gordura vegetal, glúten, sal, malte, cebola, alho, ferro, vitamina B12, espessante metilcelulose, aroma idêntico ao natural e aromas naturais, antioxidante ácido ascórbico, corante vermelho de beterraba.

O júri

Amanda Magalhães É sócia do The Burger Store, primeiro empório do Brasil dedicado ao universo do hambúrguer. Fã de carnes, como ela mesma declara, não se satisfez com nenhuma das amostras provadas na degustação, mas entende esses produtos como “uma alternativa para não deixar de fora da hamburgada aqueles que optam por não comer carne”. Ela já tinha provado alguns hambúrgueres plant based no passado e diz ter percebido evolução.

Amanda Magalhães, da The Burger Store. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Daniel Biron Vegano há 15 anos, é chef do restaurante de vegetais Teva, que não serve carnes e nenhum outro ingrediente de origem animal. Formado pela Natural Gourmet Institute for Health and Culinary Arts, em Nova York, é à favor de alimentos naturais, integrais, orgânicos e minimamente processados, mas não condena os hambúrgueres vegetais. “Como opção pontual e de transição para algumas pessoas, em determinadas situações, acho que são válidos.”

Daniel Biron, chef do restaurante Teva. Foto: Arquivo pessoal

Marcelo Huang Sócio do restaurante Cajuí, de cozinha com foco nos vegetais e 100% orgânica, se entende vegetariano desde que se conhece por gente. Sobre os hambúrgueres plant based que imitam carne, acha que são perfeitos para quem se preocupa com a crueldade com os animais e para quem está em processo de transição para o vegetarianismo ou veganismo, mas ainda sente falta do gosto da carne. “Mas sou do time dos hambúrgueres vegetais raiz, com textura e sabor naturais.”

Marcelo Huang, sócio do restaurante Cajuí. Foto: Arquivo pessoal

Márcio Silva É cozinheiro-motorista-carregador-sócio do Buzina, famoso por seus hambúrgueres altos e suculentos (de carne). Apesar do apreço pelo bom e velho burguer tradicional, o chef é “favorável à alimentação plant based” e, inclusive, montar um restaurante para delivery de sanduíches vegetarianos já esteve nos seus planos e nos do sócio Jorge Gonzalez. “Eu acho que um burguer vegetariano não deveria parecer em nada com um de carne. A indústria deveria concentrar esforços para fazer uma versão vegetariana de fato gostosa.” Ele diz ter terminado a degustação com “a barriga bem triste”.

Márcio Silva, chef do Buzina. Foto: Arquivo pessoal

Mari Sciotti Flexitariana, a chef do restaurante vegetariano Quincho consome carne de vez em quando, “com profundo respeito e consciência”. É fã de comida de verdade e aprecia o alimento pelo que ele é - e a degustação de oito hambúrgueres vegetais que buscam imitar carne só reforçou a posição de Mari. “Entendo a indústria querer buscar alternativas para as pessoas que sentem falta das sensações de comer carne. Acredito que é algo que iremos ver cada vez mais.”

Mari Sciotti, chef do restaraurante Quincho. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Comer um hambúrguer feito de plantas, com o mesmo sabor e a textura de um de carne, por que não? Ou “why not?”, como provoca, em inglês, a chilena NotCo, que lançou sua versão de hambúrguer vegetal no Brasil em julho de 2020. Além dela, há pelo menos outras dez marcas disponíveis nas gôndolas, incluindo a Meta Foods, novo braço exclusivo de produtos plant based (à base de plantas) da Wessel, e gigantes como Sadia e Seara. Uma história que começou por aqui em meados de 2019 - com o lançamento do Futuro Burger - e ganha novos capítulos à medida que a demanda por esse tipo de produto cresce.

Amanda Magalhães, da The Burger Store, fez parte do júri que avaliou os hambúrgueres de plantas. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Preparados com proteínas vegetais - soja e ervilha, principalmente -, e sem qualquer ingrediente de origem animal, esses hambúrgueres chegam ao mercado com a pretensão de imitar um burguer tradicional de carne na aparência, textura, aroma, sabor e suculência - e, pasme, alguns entregam até o “sangue” esperado em um disco malpassado, que é simulado com suco de beterraba.

O empenho em criar um sósia 100% vegetal, que envolve até algoritmos para processar informações dos alimentos e recriar receitas, tem um motivo: fisgar especialmente o consumidor que não é vegetariano nem vegano (que também são público-alvo, claro), mas que, consciente do peso de suas escolhas alimentares, procura diminuir o consumo de carne no dia a dia. São os chamados flexitarianos, que passaram a colocar à mesa questões como sustentabilidade, direito dos animais e saudabilidade.

Segundos os jurados, metade dos discos provados se passaria por um de carne no meio do sanduíche. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

“Decidir o que comer é um ato político. A indústria plant based encontrou uma forma de saciar o desejo humano de comer carne, livrando o comensal da culpa de estar consumindo um animal”, afirma a cientista de alimentos Lígia Moraes de Campos. “Você até pode fazer um hambúrguer gostoso de ervilha em casa, mas ele não vai ter a textura, a suculência e o sabor de carne, que são obtidos por meio de tecnologia. É provável que você não se satisfaça 100%. Por isso, a procura por esse tipo de produto é uma tendência que vai crescer mais e mais, já que o consumo desenfreado de carne é uma realidade insustentável.”

Pé na jaca

É importante ponderar: não é porque é “feito de plantas”, como as embalagens gostam de destacar, que esses hambúrgueres podem ser consumidos sem moderação. “Para chegar à textura desejada, a proteína vegetal é modificada por processos físicos de escala industrial, além de receber aditivos, como as gorduras vegetais e a metilcelulose [componente químico derivado da celulose], que ajudam na estruturação da carne vegetal. Trata-se de um alimento processado, que fere alguns princípios de saudabilidade”, alerta Marise Pollonio, professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), da Unicamp. “Ainda assim, não acho que esses produtos devam ser crucificados. A proposta é boa, o problema está na escolha repetitiva, o que, convenhamos, vale para a maioria dos industrializados.”

Aparência e textura foram os pontos altos da degustação; aroma e sabor deixaram a desejar. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

E como não dá para colocar todas as marcas no mesmo balaio - já que se dividem entre foodtechs (startups de alimentação), empresas familiares e grandes grupos -, é importante que o consumidor atente-se à leitura dos rótulos no momento da escolha. “É preciso ficar de olho nos índices de sódio e de gordura saturada, principalmente”, alerta a nutricionista Lara Natacci, doutora pela USP. “Se o objetivo é substituir a carne, vale comparar a quantidade de proteína por porção e dar preferência aos que são fortificados com vitamina B12 e ferro”, complementa.

Chapa quente

Com tantas opções disponíveis, o Paladar resolveu organizar uma degustação às cegas para avaliar os hambúrgueres de plantas gastronomicamente. Oito marcas foram colocadas à prova, todas encontradas em mercados e lojas especializadas em produtos vegetarianos e veganos.

Por conta da pandemia, o teste foi realizado à distância: cada um dos cinco jurados recebeu em sua casa uma caixa contendo os oito hambúrgueres descaracterizados (fora de suas embalagens originais), identificados apenas por números. Junto deles, enviamos as instruções de preparo conforme indicado na embalagem de cada marca e, por email, o formulário de avaliação.

Mesmo sendo feitos de plantas, hambúrgueres podem apresentar alto teor de gorduras saturadas e sódio. Foto: Tiagor Queiroz/Estadão

O júri - composto por representantes dos grupos vegano, vegetariano e onívoro, entre chefs, donos de restaurantes e especialistas em hambúrgueres - levou em conta as qualidades e defeitos das amostras em cinco quesitos: aparência, textura, aroma, sabor e suculência.

Em questão de aparência e textura, a maioria dos burguers se saiu bem no parecer dos jurados. O calcanhar de aquiles está no aroma e, principalmente, no sabor dos discos. “Por mais que, hoje, a tecnologia permita identificar as moléculas de sabor presentes na carne para que se busque moléculas equivalentes em compostos vegetais, recriar um sabor do zero é algo muito complexo. Não se trata de uma ciência exata - junto A mais B e tenho C. Posso juntar A e B e obter Y”, explica Helena Bolini, professora da FEA, da Unicamp, que encabeçou pesquisas sensoriais junto a marcas de hambúrgueres plant based nos últimos dois anos.

Para mascarar o sabor das proteínas vegetais e fazê-las parecerem com carne, na avaliação dos jurados, algumas marcas pesaram a mão nos temperos e no aroma defumado. “A promessa é de imitar o gosto, aparência e textura de carne e, no processo, muitas vezes, a indústria esquece que o produto precisa ser gostoso antes de mais nada”, comenta o chef Daniel Biron, que é vegano e um dos jurados.

Confira detalhes sobre cada um dos hambúrgueres a seguir.

Ranking

1º Futuro Burger 2030

Fazenda Futuro; 230g, 2 unidades; R$ 18,99 no Quitanda

A foodtech brasileira pode continuar a se gabar. De fato, o “revolucionário hambúrguer de plantas” agradou à maioria dos jurados, principalmente quanto à textura e suculência do disco. “Dá para passar por um burguer de verdade.” No quesito sabor, houve discordância, mas como ressaltou um dos jurados, “o fato de você mesmo temperar o burguer [com sal, pimenta ou seus temperos prediletos a gosto, conforme instrução na na caixa], deixa o sabor bem menos artificial”.

Ingredientes: água, preparado proteico (proteína texturizada de soja, proteína isolada de soja e proteína de ervilha), gordura de coco, óleo de canola, aroma natural, estabilizante metilcelulose, sal, beterraba em pó e corante carvão vegetal

2º Not Burger

NotCo; 200g, 2 unidades; R$ 18,99 no Quitanda

O hambúrguer da marca se saiu muito bem na degustação, ficando com notas acima da média em todos os quesitos. Algumas ressalvas surgiram quanto ao aroma, que para alguns pareceu artificial, “mas, ainda assim, bom”. Suculência, com direito a “sangue” de suco de beterraba, e textura foram os pontos altos. “Dentro de um sanduba, é fácil passar por um burguer de verdade”, cravou um dos jurados.

Ingredientes: água, proteína de ervilha, óleo de coco, óleo de girassol, fibra de bambu, cacau em pó, proteína de arroz, sal, suco de beterraba em pó, chia desengordurada em pó, espinafre em pó, minerais (Ferro e Zinco), vitamina A, vitamina B9, vitamina B12, estabilizante metilcelulose e aromas naturais.

3º The New Burger

The New Butcher’s; 240g, 2 unidades; R$ 19,49 no Quitanda

O aroma defumado dividiu os jurados: enquanto alguns classificaram como enjoativo, outros destacaram como atributo. A textura “perfeita, não quebradiça, idêntica à de carne”, como definiu um dos avaliadores, e a suculência da amostra - que tem marquinhas de grelha na superfície - levaram-na ao pódio. “A aparência é bonita, o hambúrguer é alto, tem bom tamanho. Não parece industrial.”

Ingredientes: água, proteína texturizada de ervilha, gordura de coco, amido modificado, cebola, extrato de levedura, beterraba em pó, 2% ou menos de: sal rosa do Himalaia, estabilizante metilcelulose, mix de vitaminas: tiamina (vitamina B1), riboflavina (vitamina B2), niacina (vitamina B3), piridoxina (vitamina B6), ácido fólico (vitamina B9), cobalamina (vitamina B12), biotina (vitamina B7), aroma idêntico ao natural, pimenta preta, alho, ferro e antioxidante ácido ascórbico.

4º Meta Burger

Meta Foods by Wessel - cebola tostada e ervas; 220g, 2 unidades; R$ 19,99 no Pão de Açúcar

Apesar da textura e da suculência satisfatórias, o hambúrguer 100% vegetal com assinatura da Wessel deixou o pódio por conta do sabor “muito forte de ervas”. A embalagem, assim como a lista de ingredientes, indica apenas temperos naturais, mas a combinação pareceu artificial aos jurados, além de ter roubado o protagonismo da “carne”. No mercado, também existe a opção temperada com páprica, tomate e alecrim.

Ingredientes: água, proteína concentrada de soja, óleo de coco, óleo vegetal, especiarias (cebola, alho, cebolinha, tomilho, noz moscada e mostarda), proteína isolada de soja, sal, fibra de soja, estabilizantes (metilcelulose, amido modificado, goma xantana, goma jataí, carragena, cloreto de potássio) e corantes (caramelo e beterraba).

Flexitarianos são públivo-alvo das marcas que investem em hambúrgueres vegetais que imitam carne. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

5º Burger de vegetais Veg & Tal

Sadia; 226g, 2 unidades; R$ 23,85 no Sonda

A aparência do disco, bastante avermelhada, induziu três dos cinco jurados a associar a amostra com um hambúrguer de calabresa - um deles, inclusive, chegou a sentir o gosto de carne suína. Aroma e sabor artificiais, com pimenta em evidência, e textura borrachuda. Manteve a sexta colocação graças à suculência do disco. “Num sanduíche com outros ingredientes pode até passar”, arrisca um jurado. O rótulo alerta: pode conter ovo e leite.

Ingredientes: água, proteína de trigo, óleo de coco, proteína de soja, óleo de girassol, cebola, beterraba, fibra de batata, ervas e especiarias, sal, alho, tomate, extrato de malte de cevada, maltodextrina, ortofosfato férrico (ferro), vitamina B12, aromatizantes: aromas naturais e aromas idênticos aos naturais, espessante metilcelulose.

6º Burger 100% vegetal

Frimesa; 540g, 6 unidades; R$ 26,90 no Fartura

Com 90 gramas, o hambúrguer da marca é fino e achatado, lembrando a aparência das versões mais populares de carne processada. O sabor artificial, com leve toque defumado, não chegou a desagradar completamente aos jurados, ao contrário da textura, quebradiça e com pouca suculência. Perdeu pontos pelo aroma, “que nem parece de comida”, como definiu um jurado.

Ingredientes: água, proteína de soja, óleo vegetal, proteína de fava, proteína de ervilha, amido de milho, extrato de levedura, extrato de alecrim, sal, aromatizantes, corantes (beterraba, caramelo III e páprica), espessante metilcelulose e maltodextrina.

7º Veg Burger

Vida Veg; 230g, 2 unidades; R$ 21,99 no Oba

Popular entre o público vegano, a marca anuncia seu hambúrguer como “o primeiro do Brasil feito de plantas e não congelado” - no mercado, porém, o produto foi mantido no freezer. Apesar da textura agradável, a amostra perdeu muitos pontos por conta do aroma artificial, “que não desperta o apetite”, e pelo sabor acentuado de ervilha, bem longe de lembrar o de carne.

Ingredientes: água, preparado proteico (proteína texturizada de soja, proteína isolada de ervilha), óleo de coco palmiste, cebola, sal do Himalaia, alho, pimenta, beterraba em pó, ferro, vitaminas (B6 e B12), estabilizante amido modificado e metilcelulose, aromas naturais e antioxidante extrato de alecrim.

8º Incrível Burger

Seara; 452g, 4 unidades; R$ 29,90 no Bergamini

Apesar da promessa de entregar textura e sabor de carne - conquistadas por meio da adição da tal da biomolécula I -, na degustação às cegas, esses mesmos quesitos deixaram a desejar. Os jurados alegaram sabor e aroma muito artificiais, além de textura borrachuda, com pedaços resistentes que lembravam nervos. De todos os pontos avaliados, a suculência do hambúrguer foi a que menos sofreu críticas.

Ingredientes: água, proteína de ervilha, óleo de algodão, gordura vegetal, glúten, sal, malte, cebola, alho, ferro, vitamina B12, espessante metilcelulose, aroma idêntico ao natural e aromas naturais, antioxidante ácido ascórbico, corante vermelho de beterraba.

O júri

Amanda Magalhães É sócia do The Burger Store, primeiro empório do Brasil dedicado ao universo do hambúrguer. Fã de carnes, como ela mesma declara, não se satisfez com nenhuma das amostras provadas na degustação, mas entende esses produtos como “uma alternativa para não deixar de fora da hamburgada aqueles que optam por não comer carne”. Ela já tinha provado alguns hambúrgueres plant based no passado e diz ter percebido evolução.

Amanda Magalhães, da The Burger Store. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Daniel Biron Vegano há 15 anos, é chef do restaurante de vegetais Teva, que não serve carnes e nenhum outro ingrediente de origem animal. Formado pela Natural Gourmet Institute for Health and Culinary Arts, em Nova York, é à favor de alimentos naturais, integrais, orgânicos e minimamente processados, mas não condena os hambúrgueres vegetais. “Como opção pontual e de transição para algumas pessoas, em determinadas situações, acho que são válidos.”

Daniel Biron, chef do restaurante Teva. Foto: Arquivo pessoal

Marcelo Huang Sócio do restaurante Cajuí, de cozinha com foco nos vegetais e 100% orgânica, se entende vegetariano desde que se conhece por gente. Sobre os hambúrgueres plant based que imitam carne, acha que são perfeitos para quem se preocupa com a crueldade com os animais e para quem está em processo de transição para o vegetarianismo ou veganismo, mas ainda sente falta do gosto da carne. “Mas sou do time dos hambúrgueres vegetais raiz, com textura e sabor naturais.”

Marcelo Huang, sócio do restaurante Cajuí. Foto: Arquivo pessoal

Márcio Silva É cozinheiro-motorista-carregador-sócio do Buzina, famoso por seus hambúrgueres altos e suculentos (de carne). Apesar do apreço pelo bom e velho burguer tradicional, o chef é “favorável à alimentação plant based” e, inclusive, montar um restaurante para delivery de sanduíches vegetarianos já esteve nos seus planos e nos do sócio Jorge Gonzalez. “Eu acho que um burguer vegetariano não deveria parecer em nada com um de carne. A indústria deveria concentrar esforços para fazer uma versão vegetariana de fato gostosa.” Ele diz ter terminado a degustação com “a barriga bem triste”.

Márcio Silva, chef do Buzina. Foto: Arquivo pessoal

Mari Sciotti Flexitariana, a chef do restaurante vegetariano Quincho consome carne de vez em quando, “com profundo respeito e consciência”. É fã de comida de verdade e aprecia o alimento pelo que ele é - e a degustação de oito hambúrgueres vegetais que buscam imitar carne só reforçou a posição de Mari. “Entendo a indústria querer buscar alternativas para as pessoas que sentem falta das sensações de comer carne. Acredito que é algo que iremos ver cada vez mais.”

Mari Sciotti, chef do restaraurante Quincho. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Comer um hambúrguer feito de plantas, com o mesmo sabor e a textura de um de carne, por que não? Ou “why not?”, como provoca, em inglês, a chilena NotCo, que lançou sua versão de hambúrguer vegetal no Brasil em julho de 2020. Além dela, há pelo menos outras dez marcas disponíveis nas gôndolas, incluindo a Meta Foods, novo braço exclusivo de produtos plant based (à base de plantas) da Wessel, e gigantes como Sadia e Seara. Uma história que começou por aqui em meados de 2019 - com o lançamento do Futuro Burger - e ganha novos capítulos à medida que a demanda por esse tipo de produto cresce.

Amanda Magalhães, da The Burger Store, fez parte do júri que avaliou os hambúrgueres de plantas. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Preparados com proteínas vegetais - soja e ervilha, principalmente -, e sem qualquer ingrediente de origem animal, esses hambúrgueres chegam ao mercado com a pretensão de imitar um burguer tradicional de carne na aparência, textura, aroma, sabor e suculência - e, pasme, alguns entregam até o “sangue” esperado em um disco malpassado, que é simulado com suco de beterraba.

O empenho em criar um sósia 100% vegetal, que envolve até algoritmos para processar informações dos alimentos e recriar receitas, tem um motivo: fisgar especialmente o consumidor que não é vegetariano nem vegano (que também são público-alvo, claro), mas que, consciente do peso de suas escolhas alimentares, procura diminuir o consumo de carne no dia a dia. São os chamados flexitarianos, que passaram a colocar à mesa questões como sustentabilidade, direito dos animais e saudabilidade.

Segundos os jurados, metade dos discos provados se passaria por um de carne no meio do sanduíche. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

“Decidir o que comer é um ato político. A indústria plant based encontrou uma forma de saciar o desejo humano de comer carne, livrando o comensal da culpa de estar consumindo um animal”, afirma a cientista de alimentos Lígia Moraes de Campos. “Você até pode fazer um hambúrguer gostoso de ervilha em casa, mas ele não vai ter a textura, a suculência e o sabor de carne, que são obtidos por meio de tecnologia. É provável que você não se satisfaça 100%. Por isso, a procura por esse tipo de produto é uma tendência que vai crescer mais e mais, já que o consumo desenfreado de carne é uma realidade insustentável.”

Pé na jaca

É importante ponderar: não é porque é “feito de plantas”, como as embalagens gostam de destacar, que esses hambúrgueres podem ser consumidos sem moderação. “Para chegar à textura desejada, a proteína vegetal é modificada por processos físicos de escala industrial, além de receber aditivos, como as gorduras vegetais e a metilcelulose [componente químico derivado da celulose], que ajudam na estruturação da carne vegetal. Trata-se de um alimento processado, que fere alguns princípios de saudabilidade”, alerta Marise Pollonio, professora da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), da Unicamp. “Ainda assim, não acho que esses produtos devam ser crucificados. A proposta é boa, o problema está na escolha repetitiva, o que, convenhamos, vale para a maioria dos industrializados.”

Aparência e textura foram os pontos altos da degustação; aroma e sabor deixaram a desejar. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

E como não dá para colocar todas as marcas no mesmo balaio - já que se dividem entre foodtechs (startups de alimentação), empresas familiares e grandes grupos -, é importante que o consumidor atente-se à leitura dos rótulos no momento da escolha. “É preciso ficar de olho nos índices de sódio e de gordura saturada, principalmente”, alerta a nutricionista Lara Natacci, doutora pela USP. “Se o objetivo é substituir a carne, vale comparar a quantidade de proteína por porção e dar preferência aos que são fortificados com vitamina B12 e ferro”, complementa.

Chapa quente

Com tantas opções disponíveis, o Paladar resolveu organizar uma degustação às cegas para avaliar os hambúrgueres de plantas gastronomicamente. Oito marcas foram colocadas à prova, todas encontradas em mercados e lojas especializadas em produtos vegetarianos e veganos.

Por conta da pandemia, o teste foi realizado à distância: cada um dos cinco jurados recebeu em sua casa uma caixa contendo os oito hambúrgueres descaracterizados (fora de suas embalagens originais), identificados apenas por números. Junto deles, enviamos as instruções de preparo conforme indicado na embalagem de cada marca e, por email, o formulário de avaliação.

Mesmo sendo feitos de plantas, hambúrgueres podem apresentar alto teor de gorduras saturadas e sódio. Foto: Tiagor Queiroz/Estadão

O júri - composto por representantes dos grupos vegano, vegetariano e onívoro, entre chefs, donos de restaurantes e especialistas em hambúrgueres - levou em conta as qualidades e defeitos das amostras em cinco quesitos: aparência, textura, aroma, sabor e suculência.

Em questão de aparência e textura, a maioria dos burguers se saiu bem no parecer dos jurados. O calcanhar de aquiles está no aroma e, principalmente, no sabor dos discos. “Por mais que, hoje, a tecnologia permita identificar as moléculas de sabor presentes na carne para que se busque moléculas equivalentes em compostos vegetais, recriar um sabor do zero é algo muito complexo. Não se trata de uma ciência exata - junto A mais B e tenho C. Posso juntar A e B e obter Y”, explica Helena Bolini, professora da FEA, da Unicamp, que encabeçou pesquisas sensoriais junto a marcas de hambúrgueres plant based nos últimos dois anos.

Para mascarar o sabor das proteínas vegetais e fazê-las parecerem com carne, na avaliação dos jurados, algumas marcas pesaram a mão nos temperos e no aroma defumado. “A promessa é de imitar o gosto, aparência e textura de carne e, no processo, muitas vezes, a indústria esquece que o produto precisa ser gostoso antes de mais nada”, comenta o chef Daniel Biron, que é vegano e um dos jurados.

Confira detalhes sobre cada um dos hambúrgueres a seguir.

Ranking

1º Futuro Burger 2030

Fazenda Futuro; 230g, 2 unidades; R$ 18,99 no Quitanda

A foodtech brasileira pode continuar a se gabar. De fato, o “revolucionário hambúrguer de plantas” agradou à maioria dos jurados, principalmente quanto à textura e suculência do disco. “Dá para passar por um burguer de verdade.” No quesito sabor, houve discordância, mas como ressaltou um dos jurados, “o fato de você mesmo temperar o burguer [com sal, pimenta ou seus temperos prediletos a gosto, conforme instrução na na caixa], deixa o sabor bem menos artificial”.

Ingredientes: água, preparado proteico (proteína texturizada de soja, proteína isolada de soja e proteína de ervilha), gordura de coco, óleo de canola, aroma natural, estabilizante metilcelulose, sal, beterraba em pó e corante carvão vegetal

2º Not Burger

NotCo; 200g, 2 unidades; R$ 18,99 no Quitanda

O hambúrguer da marca se saiu muito bem na degustação, ficando com notas acima da média em todos os quesitos. Algumas ressalvas surgiram quanto ao aroma, que para alguns pareceu artificial, “mas, ainda assim, bom”. Suculência, com direito a “sangue” de suco de beterraba, e textura foram os pontos altos. “Dentro de um sanduba, é fácil passar por um burguer de verdade”, cravou um dos jurados.

Ingredientes: água, proteína de ervilha, óleo de coco, óleo de girassol, fibra de bambu, cacau em pó, proteína de arroz, sal, suco de beterraba em pó, chia desengordurada em pó, espinafre em pó, minerais (Ferro e Zinco), vitamina A, vitamina B9, vitamina B12, estabilizante metilcelulose e aromas naturais.

3º The New Burger

The New Butcher’s; 240g, 2 unidades; R$ 19,49 no Quitanda

O aroma defumado dividiu os jurados: enquanto alguns classificaram como enjoativo, outros destacaram como atributo. A textura “perfeita, não quebradiça, idêntica à de carne”, como definiu um dos avaliadores, e a suculência da amostra - que tem marquinhas de grelha na superfície - levaram-na ao pódio. “A aparência é bonita, o hambúrguer é alto, tem bom tamanho. Não parece industrial.”

Ingredientes: água, proteína texturizada de ervilha, gordura de coco, amido modificado, cebola, extrato de levedura, beterraba em pó, 2% ou menos de: sal rosa do Himalaia, estabilizante metilcelulose, mix de vitaminas: tiamina (vitamina B1), riboflavina (vitamina B2), niacina (vitamina B3), piridoxina (vitamina B6), ácido fólico (vitamina B9), cobalamina (vitamina B12), biotina (vitamina B7), aroma idêntico ao natural, pimenta preta, alho, ferro e antioxidante ácido ascórbico.

4º Meta Burger

Meta Foods by Wessel - cebola tostada e ervas; 220g, 2 unidades; R$ 19,99 no Pão de Açúcar

Apesar da textura e da suculência satisfatórias, o hambúrguer 100% vegetal com assinatura da Wessel deixou o pódio por conta do sabor “muito forte de ervas”. A embalagem, assim como a lista de ingredientes, indica apenas temperos naturais, mas a combinação pareceu artificial aos jurados, além de ter roubado o protagonismo da “carne”. No mercado, também existe a opção temperada com páprica, tomate e alecrim.

Ingredientes: água, proteína concentrada de soja, óleo de coco, óleo vegetal, especiarias (cebola, alho, cebolinha, tomilho, noz moscada e mostarda), proteína isolada de soja, sal, fibra de soja, estabilizantes (metilcelulose, amido modificado, goma xantana, goma jataí, carragena, cloreto de potássio) e corantes (caramelo e beterraba).

Flexitarianos são públivo-alvo das marcas que investem em hambúrgueres vegetais que imitam carne. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

5º Burger de vegetais Veg & Tal

Sadia; 226g, 2 unidades; R$ 23,85 no Sonda

A aparência do disco, bastante avermelhada, induziu três dos cinco jurados a associar a amostra com um hambúrguer de calabresa - um deles, inclusive, chegou a sentir o gosto de carne suína. Aroma e sabor artificiais, com pimenta em evidência, e textura borrachuda. Manteve a sexta colocação graças à suculência do disco. “Num sanduíche com outros ingredientes pode até passar”, arrisca um jurado. O rótulo alerta: pode conter ovo e leite.

Ingredientes: água, proteína de trigo, óleo de coco, proteína de soja, óleo de girassol, cebola, beterraba, fibra de batata, ervas e especiarias, sal, alho, tomate, extrato de malte de cevada, maltodextrina, ortofosfato férrico (ferro), vitamina B12, aromatizantes: aromas naturais e aromas idênticos aos naturais, espessante metilcelulose.

6º Burger 100% vegetal

Frimesa; 540g, 6 unidades; R$ 26,90 no Fartura

Com 90 gramas, o hambúrguer da marca é fino e achatado, lembrando a aparência das versões mais populares de carne processada. O sabor artificial, com leve toque defumado, não chegou a desagradar completamente aos jurados, ao contrário da textura, quebradiça e com pouca suculência. Perdeu pontos pelo aroma, “que nem parece de comida”, como definiu um jurado.

Ingredientes: água, proteína de soja, óleo vegetal, proteína de fava, proteína de ervilha, amido de milho, extrato de levedura, extrato de alecrim, sal, aromatizantes, corantes (beterraba, caramelo III e páprica), espessante metilcelulose e maltodextrina.

7º Veg Burger

Vida Veg; 230g, 2 unidades; R$ 21,99 no Oba

Popular entre o público vegano, a marca anuncia seu hambúrguer como “o primeiro do Brasil feito de plantas e não congelado” - no mercado, porém, o produto foi mantido no freezer. Apesar da textura agradável, a amostra perdeu muitos pontos por conta do aroma artificial, “que não desperta o apetite”, e pelo sabor acentuado de ervilha, bem longe de lembrar o de carne.

Ingredientes: água, preparado proteico (proteína texturizada de soja, proteína isolada de ervilha), óleo de coco palmiste, cebola, sal do Himalaia, alho, pimenta, beterraba em pó, ferro, vitaminas (B6 e B12), estabilizante amido modificado e metilcelulose, aromas naturais e antioxidante extrato de alecrim.

8º Incrível Burger

Seara; 452g, 4 unidades; R$ 29,90 no Bergamini

Apesar da promessa de entregar textura e sabor de carne - conquistadas por meio da adição da tal da biomolécula I -, na degustação às cegas, esses mesmos quesitos deixaram a desejar. Os jurados alegaram sabor e aroma muito artificiais, além de textura borrachuda, com pedaços resistentes que lembravam nervos. De todos os pontos avaliados, a suculência do hambúrguer foi a que menos sofreu críticas.

Ingredientes: água, proteína de ervilha, óleo de algodão, gordura vegetal, glúten, sal, malte, cebola, alho, ferro, vitamina B12, espessante metilcelulose, aroma idêntico ao natural e aromas naturais, antioxidante ácido ascórbico, corante vermelho de beterraba.

O júri

Amanda Magalhães É sócia do The Burger Store, primeiro empório do Brasil dedicado ao universo do hambúrguer. Fã de carnes, como ela mesma declara, não se satisfez com nenhuma das amostras provadas na degustação, mas entende esses produtos como “uma alternativa para não deixar de fora da hamburgada aqueles que optam por não comer carne”. Ela já tinha provado alguns hambúrgueres plant based no passado e diz ter percebido evolução.

Amanda Magalhães, da The Burger Store. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

Daniel Biron Vegano há 15 anos, é chef do restaurante de vegetais Teva, que não serve carnes e nenhum outro ingrediente de origem animal. Formado pela Natural Gourmet Institute for Health and Culinary Arts, em Nova York, é à favor de alimentos naturais, integrais, orgânicos e minimamente processados, mas não condena os hambúrgueres vegetais. “Como opção pontual e de transição para algumas pessoas, em determinadas situações, acho que são válidos.”

Daniel Biron, chef do restaurante Teva. Foto: Arquivo pessoal

Marcelo Huang Sócio do restaurante Cajuí, de cozinha com foco nos vegetais e 100% orgânica, se entende vegetariano desde que se conhece por gente. Sobre os hambúrgueres plant based que imitam carne, acha que são perfeitos para quem se preocupa com a crueldade com os animais e para quem está em processo de transição para o vegetarianismo ou veganismo, mas ainda sente falta do gosto da carne. “Mas sou do time dos hambúrgueres vegetais raiz, com textura e sabor naturais.”

Marcelo Huang, sócio do restaurante Cajuí. Foto: Arquivo pessoal

Márcio Silva É cozinheiro-motorista-carregador-sócio do Buzina, famoso por seus hambúrgueres altos e suculentos (de carne). Apesar do apreço pelo bom e velho burguer tradicional, o chef é “favorável à alimentação plant based” e, inclusive, montar um restaurante para delivery de sanduíches vegetarianos já esteve nos seus planos e nos do sócio Jorge Gonzalez. “Eu acho que um burguer vegetariano não deveria parecer em nada com um de carne. A indústria deveria concentrar esforços para fazer uma versão vegetariana de fato gostosa.” Ele diz ter terminado a degustação com “a barriga bem triste”.

Márcio Silva, chef do Buzina. Foto: Arquivo pessoal

Mari Sciotti Flexitariana, a chef do restaurante vegetariano Quincho consome carne de vez em quando, “com profundo respeito e consciência”. É fã de comida de verdade e aprecia o alimento pelo que ele é - e a degustação de oito hambúrgueres vegetais que buscam imitar carne só reforçou a posição de Mari. “Entendo a indústria querer buscar alternativas para as pessoas que sentem falta das sensações de comer carne. Acredito que é algo que iremos ver cada vez mais.”

Mari Sciotti, chef do restaraurante Quincho. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

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