Só uma pitada por favor: confeiteiros reduzem o uso do açúcar em sobremesas


Em busca de equilíbrio, restaurantes e docerias tratam o ingrediente como mero tempero, ao mesmo tempo em que a indústria firma acordo para reduzir o teor de açúcares em alimentos processados

Por Danielle Nagase
Atualização:

Especial para o Estado 

Que Carême (o cozinheiro dos reis do século 18) e suas grandiosas esculturas de açúcar nos perdoem, mas o uso indiscriminado desse pó branco e doce anda fora de moda. Uma nova leva de confeiteiros torce o nariz para sobremesas açucaradas demais, ao mesmo tempo em que a indústria firmou um acordo com o Ministério da Saúde para reduzir o teor de açúcares em alimentos processados (leia abaixo). É uma grande mudança para a doçaria brasileira, uma das mais doces do mundo, por tradição e herança portuguesa.

Confeiteiros tiram o protagonismo do açúcar em sobremesas Foto: Valéria Gonçalvez|Estadão
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Para conceber a Dona Doceira, especializada na doçaria tradicional brasileira, Adriana Lira revisitou o passado com um olhar mais moderno. “A ideia era transformar o caseiro em doce fino para festas.” Em vez de reproduzir fielmente as receitas dos cadernos de doceiras de Goiás – coisa que é feita de geração em geração, sem revisão – Adriana equilibrou ingredientes e lapidou modos de preparo.

Primeiro, diminuiu o açúcar nas compotas. “As frutas já têm frutose, um adoçante natural, então uso bem menos do refinado”, conta. A redução chega a 70% em alguns casos. “Doce de fruta tem que ter gosto da fruta. Uso o açúcar como tempero, com a mesma parcimônia com que usaria o sal.” 

Adriana também substitui o leite condensado, que considera “doce demais”, por doce de leite caseiro, feito com apenas 100 gramas de açúcar dissolvidos em um litro de leite – para dar ponto, são necessárias quase duas horas e meia de cozimento em fogo baixíssimo. Superleve, ele vai parar dentro da casca do limãozinho galego orgânico. 

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Dona Doceira. Limãozinho galego com diferentes recheios Foto: Wellington Nemeth

Marilia Zylbersztajn, que fez fama por seus doces não tão doces, também trata o açúcar como coadjuvante, mas conta que enfrentou certa resistência na época em que abriu a confeitaria com seu nome. “Diziam que meu doce não teria público.” Mas quem não gosta de doce muito doce virou fã. E a confeiteira tem, hoje, dois endereços na capital.

Marilia também investe em “sobremesas limpas”, sem muitos componentes. Chantilly? Creme de avelã? Esqueça. Ela gosta de usar chocolates com alto teor de cacau, especiarias e frutas ácidas. A calda de morango que cobre seu cheesecake, por exemplo, leva metade do açúcar que a maioria costuma usar. “Tem que ter gosto de fruta não de torrão de açúcar”. 

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Torta de chocolate e amora da confeiteira Marilia Zylbersztajn, famosa pelos doces não tão doces Foto: Rubens Kato

 Alta confeitaria. A presença do chef-confeiteiro na cozinha de um restaurante gastronômico é recente no Brasil. “Não valorizavam a sobremesa”, critica Marilia, e a refeição terminava sem grandes arroubos. Há quatro meses, as sobremesas do Carlota, da chef Carla Pernambuco, estão sob a batuta da confeiteira Mariana Sanchez (ex-Le Vin Pâtisserie), formada pela Le Cordon Bleu de Paris.

“Discrição no açúcar”, orientou Carlota. “Doçura em excesso dá sede, péssimo jeito de encerrar a refeição.” Numa de suas criações, Mariana mistura chocolates amargo e branco com o aroma cítrico e delicado do yuzu. Na releitura da torta de limão, o que prevalece é o creme ácido da fruta e não o merengue. 

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Carlota. Releitura da torta de limão da confeiteira Mariana Sanchez Foto: Carla Pernambuco

No recém-aberto Charco, a sócia e confeiteira Nathalia Gonçalves brinca com o contraste entre o doce e o ácido no bolo de chocolate branco (doce) com sorbet de mel de cacau (extremamente ácido), sementes de cacau (bem amargas) caramelizadas e mousse de chocolate ao leite. Em outra criação, ela mistura sorbet de butiá, fruta que lembra pequi, cítrica e untuosa, com casca de laranja caramelizada, caramelo de maracujá e espuma de iogurte.

Rodrigo Ribeiro, confeiteiro do Petí, acredita que o processo criativo para elaborar uma sobremesa é o mesmo que o de um prato salgado. “Busco o equilíbrio de sabores - doce, ácido, amargo, até salgado”, revela. “Além disso, procuro explorar diferentes texturas”.

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Para balancear a doçura, Rodrigo usa chocolates mais amargos, meles de abelhas nativas “que têm uma acidez particular”, flor de sal e frutas bastante ácidas. “Para falar a verdade, tenho usado cada vez menos açúcar, sempre que dá, substituo o açúcar por outro ingrediente”.

E diz mais: “prevejo um futuro com sobremesas cada vez mais equilibradas e de valorização do chef-confeiteiro para além do restaurante”. Seu sonho, confessa, é abrir um bar de sobremesas, assim como fez Will Goldfarb com o Room 4 Dessert, primeiro em Nova York e agora em Bali, que extingue qualquer prato salgado do cardápio.

Floresta de chocolate, sobremesa de Rodrigo Ribeiro do Petí, que leva chocolate em diversas versões e texturas com pancs e gel de cambuci Foto: Gabriela Biló|Estadão
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Albert Adrià também tem um bar de sobremesas no seu concorridíssimo Tickets, em Barcelona. Ali os doces fazem parte de um menu-degustação bem divertido e cheio de surpresas. 

Novas regras para os alimentos processados

Na última semana de novembro, grupos industriais – 68 empresas, que representam 87% do setor – firmaram um acordo com o Ministério da Saúde, que estabelece metas nacionais para redução do teor de açúcares em alimentos processados.

Em caráter cooperativo, ou seja, não há punição para quem descumprir o trato, a indústria se compromete a diminuir, até 2022, a quantidade de açúcares em cinco categorias de alimentos: lácteos, achocolatados, bebidas açucaradas, biscoitos e bolos. A supervisão fica a cargo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Segundo a nutricionista Sophie Deram, doutora no departamento de endocrinologia da Faculdade de Medicina da USP, “a proposta faz todo sentido já que o Brasil é o quarto país que mais consome açúcares no mundo”. Mas alerta. “ Não adianta tirar o açúcar e encher de outras porcarias, como edulcorantes e concentrados de frutas que, em excesso, também fazem mal”. Ela defende a criação de regras na rotulagem dos ultraprocessados. 

Serviço

Carlota R. Sergipe, 753, Higienópolis Tel.: 3661-8670

Charco  R. Peixoto Gomide, 1492, Cerqueira César Tel.: 3063-0360

Dona Doceira R. Tabapuã, 838, Itaim Bibi Tel.: 2157-6114

Marilia Zylbersztajn R. Fradique Coutinho, 942, Pinheiros -  tel.: 4301-6003 R. Dr. Renato Paes de Barros, 433, Itaim Bibi - tel.:  3071-0041

Petí  R. Cotoxó, 110 - Vila Pompeia Tel.: 3873-0099

Especial para o Estado 

Que Carême (o cozinheiro dos reis do século 18) e suas grandiosas esculturas de açúcar nos perdoem, mas o uso indiscriminado desse pó branco e doce anda fora de moda. Uma nova leva de confeiteiros torce o nariz para sobremesas açucaradas demais, ao mesmo tempo em que a indústria firmou um acordo com o Ministério da Saúde para reduzir o teor de açúcares em alimentos processados (leia abaixo). É uma grande mudança para a doçaria brasileira, uma das mais doces do mundo, por tradição e herança portuguesa.

Confeiteiros tiram o protagonismo do açúcar em sobremesas Foto: Valéria Gonçalvez|Estadão

Para conceber a Dona Doceira, especializada na doçaria tradicional brasileira, Adriana Lira revisitou o passado com um olhar mais moderno. “A ideia era transformar o caseiro em doce fino para festas.” Em vez de reproduzir fielmente as receitas dos cadernos de doceiras de Goiás – coisa que é feita de geração em geração, sem revisão – Adriana equilibrou ingredientes e lapidou modos de preparo.

Primeiro, diminuiu o açúcar nas compotas. “As frutas já têm frutose, um adoçante natural, então uso bem menos do refinado”, conta. A redução chega a 70% em alguns casos. “Doce de fruta tem que ter gosto da fruta. Uso o açúcar como tempero, com a mesma parcimônia com que usaria o sal.” 

Adriana também substitui o leite condensado, que considera “doce demais”, por doce de leite caseiro, feito com apenas 100 gramas de açúcar dissolvidos em um litro de leite – para dar ponto, são necessárias quase duas horas e meia de cozimento em fogo baixíssimo. Superleve, ele vai parar dentro da casca do limãozinho galego orgânico. 

Dona Doceira. Limãozinho galego com diferentes recheios Foto: Wellington Nemeth

Marilia Zylbersztajn, que fez fama por seus doces não tão doces, também trata o açúcar como coadjuvante, mas conta que enfrentou certa resistência na época em que abriu a confeitaria com seu nome. “Diziam que meu doce não teria público.” Mas quem não gosta de doce muito doce virou fã. E a confeiteira tem, hoje, dois endereços na capital.

Marilia também investe em “sobremesas limpas”, sem muitos componentes. Chantilly? Creme de avelã? Esqueça. Ela gosta de usar chocolates com alto teor de cacau, especiarias e frutas ácidas. A calda de morango que cobre seu cheesecake, por exemplo, leva metade do açúcar que a maioria costuma usar. “Tem que ter gosto de fruta não de torrão de açúcar”. 

Torta de chocolate e amora da confeiteira Marilia Zylbersztajn, famosa pelos doces não tão doces Foto: Rubens Kato

 Alta confeitaria. A presença do chef-confeiteiro na cozinha de um restaurante gastronômico é recente no Brasil. “Não valorizavam a sobremesa”, critica Marilia, e a refeição terminava sem grandes arroubos. Há quatro meses, as sobremesas do Carlota, da chef Carla Pernambuco, estão sob a batuta da confeiteira Mariana Sanchez (ex-Le Vin Pâtisserie), formada pela Le Cordon Bleu de Paris.

“Discrição no açúcar”, orientou Carlota. “Doçura em excesso dá sede, péssimo jeito de encerrar a refeição.” Numa de suas criações, Mariana mistura chocolates amargo e branco com o aroma cítrico e delicado do yuzu. Na releitura da torta de limão, o que prevalece é o creme ácido da fruta e não o merengue. 

Carlota. Releitura da torta de limão da confeiteira Mariana Sanchez Foto: Carla Pernambuco

No recém-aberto Charco, a sócia e confeiteira Nathalia Gonçalves brinca com o contraste entre o doce e o ácido no bolo de chocolate branco (doce) com sorbet de mel de cacau (extremamente ácido), sementes de cacau (bem amargas) caramelizadas e mousse de chocolate ao leite. Em outra criação, ela mistura sorbet de butiá, fruta que lembra pequi, cítrica e untuosa, com casca de laranja caramelizada, caramelo de maracujá e espuma de iogurte.

Rodrigo Ribeiro, confeiteiro do Petí, acredita que o processo criativo para elaborar uma sobremesa é o mesmo que o de um prato salgado. “Busco o equilíbrio de sabores - doce, ácido, amargo, até salgado”, revela. “Além disso, procuro explorar diferentes texturas”.

Para balancear a doçura, Rodrigo usa chocolates mais amargos, meles de abelhas nativas “que têm uma acidez particular”, flor de sal e frutas bastante ácidas. “Para falar a verdade, tenho usado cada vez menos açúcar, sempre que dá, substituo o açúcar por outro ingrediente”.

E diz mais: “prevejo um futuro com sobremesas cada vez mais equilibradas e de valorização do chef-confeiteiro para além do restaurante”. Seu sonho, confessa, é abrir um bar de sobremesas, assim como fez Will Goldfarb com o Room 4 Dessert, primeiro em Nova York e agora em Bali, que extingue qualquer prato salgado do cardápio.

Floresta de chocolate, sobremesa de Rodrigo Ribeiro do Petí, que leva chocolate em diversas versões e texturas com pancs e gel de cambuci Foto: Gabriela Biló|Estadão

Albert Adrià também tem um bar de sobremesas no seu concorridíssimo Tickets, em Barcelona. Ali os doces fazem parte de um menu-degustação bem divertido e cheio de surpresas. 

Novas regras para os alimentos processados

Na última semana de novembro, grupos industriais – 68 empresas, que representam 87% do setor – firmaram um acordo com o Ministério da Saúde, que estabelece metas nacionais para redução do teor de açúcares em alimentos processados.

Em caráter cooperativo, ou seja, não há punição para quem descumprir o trato, a indústria se compromete a diminuir, até 2022, a quantidade de açúcares em cinco categorias de alimentos: lácteos, achocolatados, bebidas açucaradas, biscoitos e bolos. A supervisão fica a cargo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Segundo a nutricionista Sophie Deram, doutora no departamento de endocrinologia da Faculdade de Medicina da USP, “a proposta faz todo sentido já que o Brasil é o quarto país que mais consome açúcares no mundo”. Mas alerta. “ Não adianta tirar o açúcar e encher de outras porcarias, como edulcorantes e concentrados de frutas que, em excesso, também fazem mal”. Ela defende a criação de regras na rotulagem dos ultraprocessados. 

Serviço

Carlota R. Sergipe, 753, Higienópolis Tel.: 3661-8670

Charco  R. Peixoto Gomide, 1492, Cerqueira César Tel.: 3063-0360

Dona Doceira R. Tabapuã, 838, Itaim Bibi Tel.: 2157-6114

Marilia Zylbersztajn R. Fradique Coutinho, 942, Pinheiros -  tel.: 4301-6003 R. Dr. Renato Paes de Barros, 433, Itaim Bibi - tel.:  3071-0041

Petí  R. Cotoxó, 110 - Vila Pompeia Tel.: 3873-0099

Especial para o Estado 

Que Carême (o cozinheiro dos reis do século 18) e suas grandiosas esculturas de açúcar nos perdoem, mas o uso indiscriminado desse pó branco e doce anda fora de moda. Uma nova leva de confeiteiros torce o nariz para sobremesas açucaradas demais, ao mesmo tempo em que a indústria firmou um acordo com o Ministério da Saúde para reduzir o teor de açúcares em alimentos processados (leia abaixo). É uma grande mudança para a doçaria brasileira, uma das mais doces do mundo, por tradição e herança portuguesa.

Confeiteiros tiram o protagonismo do açúcar em sobremesas Foto: Valéria Gonçalvez|Estadão

Para conceber a Dona Doceira, especializada na doçaria tradicional brasileira, Adriana Lira revisitou o passado com um olhar mais moderno. “A ideia era transformar o caseiro em doce fino para festas.” Em vez de reproduzir fielmente as receitas dos cadernos de doceiras de Goiás – coisa que é feita de geração em geração, sem revisão – Adriana equilibrou ingredientes e lapidou modos de preparo.

Primeiro, diminuiu o açúcar nas compotas. “As frutas já têm frutose, um adoçante natural, então uso bem menos do refinado”, conta. A redução chega a 70% em alguns casos. “Doce de fruta tem que ter gosto da fruta. Uso o açúcar como tempero, com a mesma parcimônia com que usaria o sal.” 

Adriana também substitui o leite condensado, que considera “doce demais”, por doce de leite caseiro, feito com apenas 100 gramas de açúcar dissolvidos em um litro de leite – para dar ponto, são necessárias quase duas horas e meia de cozimento em fogo baixíssimo. Superleve, ele vai parar dentro da casca do limãozinho galego orgânico. 

Dona Doceira. Limãozinho galego com diferentes recheios Foto: Wellington Nemeth

Marilia Zylbersztajn, que fez fama por seus doces não tão doces, também trata o açúcar como coadjuvante, mas conta que enfrentou certa resistência na época em que abriu a confeitaria com seu nome. “Diziam que meu doce não teria público.” Mas quem não gosta de doce muito doce virou fã. E a confeiteira tem, hoje, dois endereços na capital.

Marilia também investe em “sobremesas limpas”, sem muitos componentes. Chantilly? Creme de avelã? Esqueça. Ela gosta de usar chocolates com alto teor de cacau, especiarias e frutas ácidas. A calda de morango que cobre seu cheesecake, por exemplo, leva metade do açúcar que a maioria costuma usar. “Tem que ter gosto de fruta não de torrão de açúcar”. 

Torta de chocolate e amora da confeiteira Marilia Zylbersztajn, famosa pelos doces não tão doces Foto: Rubens Kato

 Alta confeitaria. A presença do chef-confeiteiro na cozinha de um restaurante gastronômico é recente no Brasil. “Não valorizavam a sobremesa”, critica Marilia, e a refeição terminava sem grandes arroubos. Há quatro meses, as sobremesas do Carlota, da chef Carla Pernambuco, estão sob a batuta da confeiteira Mariana Sanchez (ex-Le Vin Pâtisserie), formada pela Le Cordon Bleu de Paris.

“Discrição no açúcar”, orientou Carlota. “Doçura em excesso dá sede, péssimo jeito de encerrar a refeição.” Numa de suas criações, Mariana mistura chocolates amargo e branco com o aroma cítrico e delicado do yuzu. Na releitura da torta de limão, o que prevalece é o creme ácido da fruta e não o merengue. 

Carlota. Releitura da torta de limão da confeiteira Mariana Sanchez Foto: Carla Pernambuco

No recém-aberto Charco, a sócia e confeiteira Nathalia Gonçalves brinca com o contraste entre o doce e o ácido no bolo de chocolate branco (doce) com sorbet de mel de cacau (extremamente ácido), sementes de cacau (bem amargas) caramelizadas e mousse de chocolate ao leite. Em outra criação, ela mistura sorbet de butiá, fruta que lembra pequi, cítrica e untuosa, com casca de laranja caramelizada, caramelo de maracujá e espuma de iogurte.

Rodrigo Ribeiro, confeiteiro do Petí, acredita que o processo criativo para elaborar uma sobremesa é o mesmo que o de um prato salgado. “Busco o equilíbrio de sabores - doce, ácido, amargo, até salgado”, revela. “Além disso, procuro explorar diferentes texturas”.

Para balancear a doçura, Rodrigo usa chocolates mais amargos, meles de abelhas nativas “que têm uma acidez particular”, flor de sal e frutas bastante ácidas. “Para falar a verdade, tenho usado cada vez menos açúcar, sempre que dá, substituo o açúcar por outro ingrediente”.

E diz mais: “prevejo um futuro com sobremesas cada vez mais equilibradas e de valorização do chef-confeiteiro para além do restaurante”. Seu sonho, confessa, é abrir um bar de sobremesas, assim como fez Will Goldfarb com o Room 4 Dessert, primeiro em Nova York e agora em Bali, que extingue qualquer prato salgado do cardápio.

Floresta de chocolate, sobremesa de Rodrigo Ribeiro do Petí, que leva chocolate em diversas versões e texturas com pancs e gel de cambuci Foto: Gabriela Biló|Estadão

Albert Adrià também tem um bar de sobremesas no seu concorridíssimo Tickets, em Barcelona. Ali os doces fazem parte de um menu-degustação bem divertido e cheio de surpresas. 

Novas regras para os alimentos processados

Na última semana de novembro, grupos industriais – 68 empresas, que representam 87% do setor – firmaram um acordo com o Ministério da Saúde, que estabelece metas nacionais para redução do teor de açúcares em alimentos processados.

Em caráter cooperativo, ou seja, não há punição para quem descumprir o trato, a indústria se compromete a diminuir, até 2022, a quantidade de açúcares em cinco categorias de alimentos: lácteos, achocolatados, bebidas açucaradas, biscoitos e bolos. A supervisão fica a cargo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Segundo a nutricionista Sophie Deram, doutora no departamento de endocrinologia da Faculdade de Medicina da USP, “a proposta faz todo sentido já que o Brasil é o quarto país que mais consome açúcares no mundo”. Mas alerta. “ Não adianta tirar o açúcar e encher de outras porcarias, como edulcorantes e concentrados de frutas que, em excesso, também fazem mal”. Ela defende a criação de regras na rotulagem dos ultraprocessados. 

Serviço

Carlota R. Sergipe, 753, Higienópolis Tel.: 3661-8670

Charco  R. Peixoto Gomide, 1492, Cerqueira César Tel.: 3063-0360

Dona Doceira R. Tabapuã, 838, Itaim Bibi Tel.: 2157-6114

Marilia Zylbersztajn R. Fradique Coutinho, 942, Pinheiros -  tel.: 4301-6003 R. Dr. Renato Paes de Barros, 433, Itaim Bibi - tel.:  3071-0041

Petí  R. Cotoxó, 110 - Vila Pompeia Tel.: 3873-0099

Especial para o Estado 

Que Carême (o cozinheiro dos reis do século 18) e suas grandiosas esculturas de açúcar nos perdoem, mas o uso indiscriminado desse pó branco e doce anda fora de moda. Uma nova leva de confeiteiros torce o nariz para sobremesas açucaradas demais, ao mesmo tempo em que a indústria firmou um acordo com o Ministério da Saúde para reduzir o teor de açúcares em alimentos processados (leia abaixo). É uma grande mudança para a doçaria brasileira, uma das mais doces do mundo, por tradição e herança portuguesa.

Confeiteiros tiram o protagonismo do açúcar em sobremesas Foto: Valéria Gonçalvez|Estadão

Para conceber a Dona Doceira, especializada na doçaria tradicional brasileira, Adriana Lira revisitou o passado com um olhar mais moderno. “A ideia era transformar o caseiro em doce fino para festas.” Em vez de reproduzir fielmente as receitas dos cadernos de doceiras de Goiás – coisa que é feita de geração em geração, sem revisão – Adriana equilibrou ingredientes e lapidou modos de preparo.

Primeiro, diminuiu o açúcar nas compotas. “As frutas já têm frutose, um adoçante natural, então uso bem menos do refinado”, conta. A redução chega a 70% em alguns casos. “Doce de fruta tem que ter gosto da fruta. Uso o açúcar como tempero, com a mesma parcimônia com que usaria o sal.” 

Adriana também substitui o leite condensado, que considera “doce demais”, por doce de leite caseiro, feito com apenas 100 gramas de açúcar dissolvidos em um litro de leite – para dar ponto, são necessárias quase duas horas e meia de cozimento em fogo baixíssimo. Superleve, ele vai parar dentro da casca do limãozinho galego orgânico. 

Dona Doceira. Limãozinho galego com diferentes recheios Foto: Wellington Nemeth

Marilia Zylbersztajn, que fez fama por seus doces não tão doces, também trata o açúcar como coadjuvante, mas conta que enfrentou certa resistência na época em que abriu a confeitaria com seu nome. “Diziam que meu doce não teria público.” Mas quem não gosta de doce muito doce virou fã. E a confeiteira tem, hoje, dois endereços na capital.

Marilia também investe em “sobremesas limpas”, sem muitos componentes. Chantilly? Creme de avelã? Esqueça. Ela gosta de usar chocolates com alto teor de cacau, especiarias e frutas ácidas. A calda de morango que cobre seu cheesecake, por exemplo, leva metade do açúcar que a maioria costuma usar. “Tem que ter gosto de fruta não de torrão de açúcar”. 

Torta de chocolate e amora da confeiteira Marilia Zylbersztajn, famosa pelos doces não tão doces Foto: Rubens Kato

 Alta confeitaria. A presença do chef-confeiteiro na cozinha de um restaurante gastronômico é recente no Brasil. “Não valorizavam a sobremesa”, critica Marilia, e a refeição terminava sem grandes arroubos. Há quatro meses, as sobremesas do Carlota, da chef Carla Pernambuco, estão sob a batuta da confeiteira Mariana Sanchez (ex-Le Vin Pâtisserie), formada pela Le Cordon Bleu de Paris.

“Discrição no açúcar”, orientou Carlota. “Doçura em excesso dá sede, péssimo jeito de encerrar a refeição.” Numa de suas criações, Mariana mistura chocolates amargo e branco com o aroma cítrico e delicado do yuzu. Na releitura da torta de limão, o que prevalece é o creme ácido da fruta e não o merengue. 

Carlota. Releitura da torta de limão da confeiteira Mariana Sanchez Foto: Carla Pernambuco

No recém-aberto Charco, a sócia e confeiteira Nathalia Gonçalves brinca com o contraste entre o doce e o ácido no bolo de chocolate branco (doce) com sorbet de mel de cacau (extremamente ácido), sementes de cacau (bem amargas) caramelizadas e mousse de chocolate ao leite. Em outra criação, ela mistura sorbet de butiá, fruta que lembra pequi, cítrica e untuosa, com casca de laranja caramelizada, caramelo de maracujá e espuma de iogurte.

Rodrigo Ribeiro, confeiteiro do Petí, acredita que o processo criativo para elaborar uma sobremesa é o mesmo que o de um prato salgado. “Busco o equilíbrio de sabores - doce, ácido, amargo, até salgado”, revela. “Além disso, procuro explorar diferentes texturas”.

Para balancear a doçura, Rodrigo usa chocolates mais amargos, meles de abelhas nativas “que têm uma acidez particular”, flor de sal e frutas bastante ácidas. “Para falar a verdade, tenho usado cada vez menos açúcar, sempre que dá, substituo o açúcar por outro ingrediente”.

E diz mais: “prevejo um futuro com sobremesas cada vez mais equilibradas e de valorização do chef-confeiteiro para além do restaurante”. Seu sonho, confessa, é abrir um bar de sobremesas, assim como fez Will Goldfarb com o Room 4 Dessert, primeiro em Nova York e agora em Bali, que extingue qualquer prato salgado do cardápio.

Floresta de chocolate, sobremesa de Rodrigo Ribeiro do Petí, que leva chocolate em diversas versões e texturas com pancs e gel de cambuci Foto: Gabriela Biló|Estadão

Albert Adrià também tem um bar de sobremesas no seu concorridíssimo Tickets, em Barcelona. Ali os doces fazem parte de um menu-degustação bem divertido e cheio de surpresas. 

Novas regras para os alimentos processados

Na última semana de novembro, grupos industriais – 68 empresas, que representam 87% do setor – firmaram um acordo com o Ministério da Saúde, que estabelece metas nacionais para redução do teor de açúcares em alimentos processados.

Em caráter cooperativo, ou seja, não há punição para quem descumprir o trato, a indústria se compromete a diminuir, até 2022, a quantidade de açúcares em cinco categorias de alimentos: lácteos, achocolatados, bebidas açucaradas, biscoitos e bolos. A supervisão fica a cargo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Segundo a nutricionista Sophie Deram, doutora no departamento de endocrinologia da Faculdade de Medicina da USP, “a proposta faz todo sentido já que o Brasil é o quarto país que mais consome açúcares no mundo”. Mas alerta. “ Não adianta tirar o açúcar e encher de outras porcarias, como edulcorantes e concentrados de frutas que, em excesso, também fazem mal”. Ela defende a criação de regras na rotulagem dos ultraprocessados. 

Serviço

Carlota R. Sergipe, 753, Higienópolis Tel.: 3661-8670

Charco  R. Peixoto Gomide, 1492, Cerqueira César Tel.: 3063-0360

Dona Doceira R. Tabapuã, 838, Itaim Bibi Tel.: 2157-6114

Marilia Zylbersztajn R. Fradique Coutinho, 942, Pinheiros -  tel.: 4301-6003 R. Dr. Renato Paes de Barros, 433, Itaim Bibi - tel.:  3071-0041

Petí  R. Cotoxó, 110 - Vila Pompeia Tel.: 3873-0099

Especial para o Estado 

Que Carême (o cozinheiro dos reis do século 18) e suas grandiosas esculturas de açúcar nos perdoem, mas o uso indiscriminado desse pó branco e doce anda fora de moda. Uma nova leva de confeiteiros torce o nariz para sobremesas açucaradas demais, ao mesmo tempo em que a indústria firmou um acordo com o Ministério da Saúde para reduzir o teor de açúcares em alimentos processados (leia abaixo). É uma grande mudança para a doçaria brasileira, uma das mais doces do mundo, por tradição e herança portuguesa.

Confeiteiros tiram o protagonismo do açúcar em sobremesas Foto: Valéria Gonçalvez|Estadão

Para conceber a Dona Doceira, especializada na doçaria tradicional brasileira, Adriana Lira revisitou o passado com um olhar mais moderno. “A ideia era transformar o caseiro em doce fino para festas.” Em vez de reproduzir fielmente as receitas dos cadernos de doceiras de Goiás – coisa que é feita de geração em geração, sem revisão – Adriana equilibrou ingredientes e lapidou modos de preparo.

Primeiro, diminuiu o açúcar nas compotas. “As frutas já têm frutose, um adoçante natural, então uso bem menos do refinado”, conta. A redução chega a 70% em alguns casos. “Doce de fruta tem que ter gosto da fruta. Uso o açúcar como tempero, com a mesma parcimônia com que usaria o sal.” 

Adriana também substitui o leite condensado, que considera “doce demais”, por doce de leite caseiro, feito com apenas 100 gramas de açúcar dissolvidos em um litro de leite – para dar ponto, são necessárias quase duas horas e meia de cozimento em fogo baixíssimo. Superleve, ele vai parar dentro da casca do limãozinho galego orgânico. 

Dona Doceira. Limãozinho galego com diferentes recheios Foto: Wellington Nemeth

Marilia Zylbersztajn, que fez fama por seus doces não tão doces, também trata o açúcar como coadjuvante, mas conta que enfrentou certa resistência na época em que abriu a confeitaria com seu nome. “Diziam que meu doce não teria público.” Mas quem não gosta de doce muito doce virou fã. E a confeiteira tem, hoje, dois endereços na capital.

Marilia também investe em “sobremesas limpas”, sem muitos componentes. Chantilly? Creme de avelã? Esqueça. Ela gosta de usar chocolates com alto teor de cacau, especiarias e frutas ácidas. A calda de morango que cobre seu cheesecake, por exemplo, leva metade do açúcar que a maioria costuma usar. “Tem que ter gosto de fruta não de torrão de açúcar”. 

Torta de chocolate e amora da confeiteira Marilia Zylbersztajn, famosa pelos doces não tão doces Foto: Rubens Kato

 Alta confeitaria. A presença do chef-confeiteiro na cozinha de um restaurante gastronômico é recente no Brasil. “Não valorizavam a sobremesa”, critica Marilia, e a refeição terminava sem grandes arroubos. Há quatro meses, as sobremesas do Carlota, da chef Carla Pernambuco, estão sob a batuta da confeiteira Mariana Sanchez (ex-Le Vin Pâtisserie), formada pela Le Cordon Bleu de Paris.

“Discrição no açúcar”, orientou Carlota. “Doçura em excesso dá sede, péssimo jeito de encerrar a refeição.” Numa de suas criações, Mariana mistura chocolates amargo e branco com o aroma cítrico e delicado do yuzu. Na releitura da torta de limão, o que prevalece é o creme ácido da fruta e não o merengue. 

Carlota. Releitura da torta de limão da confeiteira Mariana Sanchez Foto: Carla Pernambuco

No recém-aberto Charco, a sócia e confeiteira Nathalia Gonçalves brinca com o contraste entre o doce e o ácido no bolo de chocolate branco (doce) com sorbet de mel de cacau (extremamente ácido), sementes de cacau (bem amargas) caramelizadas e mousse de chocolate ao leite. Em outra criação, ela mistura sorbet de butiá, fruta que lembra pequi, cítrica e untuosa, com casca de laranja caramelizada, caramelo de maracujá e espuma de iogurte.

Rodrigo Ribeiro, confeiteiro do Petí, acredita que o processo criativo para elaborar uma sobremesa é o mesmo que o de um prato salgado. “Busco o equilíbrio de sabores - doce, ácido, amargo, até salgado”, revela. “Além disso, procuro explorar diferentes texturas”.

Para balancear a doçura, Rodrigo usa chocolates mais amargos, meles de abelhas nativas “que têm uma acidez particular”, flor de sal e frutas bastante ácidas. “Para falar a verdade, tenho usado cada vez menos açúcar, sempre que dá, substituo o açúcar por outro ingrediente”.

E diz mais: “prevejo um futuro com sobremesas cada vez mais equilibradas e de valorização do chef-confeiteiro para além do restaurante”. Seu sonho, confessa, é abrir um bar de sobremesas, assim como fez Will Goldfarb com o Room 4 Dessert, primeiro em Nova York e agora em Bali, que extingue qualquer prato salgado do cardápio.

Floresta de chocolate, sobremesa de Rodrigo Ribeiro do Petí, que leva chocolate em diversas versões e texturas com pancs e gel de cambuci Foto: Gabriela Biló|Estadão

Albert Adrià também tem um bar de sobremesas no seu concorridíssimo Tickets, em Barcelona. Ali os doces fazem parte de um menu-degustação bem divertido e cheio de surpresas. 

Novas regras para os alimentos processados

Na última semana de novembro, grupos industriais – 68 empresas, que representam 87% do setor – firmaram um acordo com o Ministério da Saúde, que estabelece metas nacionais para redução do teor de açúcares em alimentos processados.

Em caráter cooperativo, ou seja, não há punição para quem descumprir o trato, a indústria se compromete a diminuir, até 2022, a quantidade de açúcares em cinco categorias de alimentos: lácteos, achocolatados, bebidas açucaradas, biscoitos e bolos. A supervisão fica a cargo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Segundo a nutricionista Sophie Deram, doutora no departamento de endocrinologia da Faculdade de Medicina da USP, “a proposta faz todo sentido já que o Brasil é o quarto país que mais consome açúcares no mundo”. Mas alerta. “ Não adianta tirar o açúcar e encher de outras porcarias, como edulcorantes e concentrados de frutas que, em excesso, também fazem mal”. Ela defende a criação de regras na rotulagem dos ultraprocessados. 

Serviço

Carlota R. Sergipe, 753, Higienópolis Tel.: 3661-8670

Charco  R. Peixoto Gomide, 1492, Cerqueira César Tel.: 3063-0360

Dona Doceira R. Tabapuã, 838, Itaim Bibi Tel.: 2157-6114

Marilia Zylbersztajn R. Fradique Coutinho, 942, Pinheiros -  tel.: 4301-6003 R. Dr. Renato Paes de Barros, 433, Itaim Bibi - tel.:  3071-0041

Petí  R. Cotoxó, 110 - Vila Pompeia Tel.: 3873-0099

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