Você conhece Chermoula?


Mulher, preta e periférica, Aline Araújo – mais conhecida pelo sobrenome artístico-culinário – faz de sua cozinha em ato de resistência cultural

Por Danielle Nagase

Chermoula é um tempero popular do norte da África, bom para usar em marinadas e também na finalização de pratos. Leva coentro fresco picado grosseiramente, folhas de hortelã rasgadas à mão, cominho, açafrão, pimentas. É típico, potente e cheio de personalidade – assim como Aline, que há alguns anos (e não por acaso) aposentou o familiar Araújo para também adotar o Chermoula, seu sobrenome, digamos, de guerra contra o racismo e o preconceito cultural.

Aline Chermoula, 36, dedica-se à cozinha diaspórica africana nas Américas. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Minha cozinha é a expressão da resistência. Eu, como mulher preta, cozinheira e periférica, resisto ao usar coentro, azeite de dendê, pimenta e um sem-fim de especiarias que fazem parte da minha identidade.” Quando a clientela torce o nariz, Aline tenta explicar, com muito jeitinho, que aquele ingrediente tem uma função dentro da receita e que retirá-lo significaria descaracterizar o prato. Ela também garante que, quando usado na medida certa, nada pesa no estômago nem domina o sabor na garfada. “Estou aqui para acabar com o preconceito e a desigualdade raciais por meio da valorização dessa cultura”, afirma.

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+ Aline Chermoula ensina como fazer jambalaya em casa.

Natural de Feira de Santana, na Bahia, Aline cursou História na USP e se formou cozinheira pelo ProUni na universidade Anhembi-Morumbi: “Eu era a única aluna preta do período”. Ela busca um resgate de sua ancestralidade ao dedicar-se ao que chama de “cozinha diaspórica africana nas Américas”, ou seja, uma cozinha mestiça, com base na cultura alimentar africana, trazida para cá juntamente com os povos escravizados, mas apinhada de influências locais e europeias (proveniente dos exploradores). Por local, entenda não só o Brasil com suas moquecas e acarajés, mas também a Colômbia, o México, a Venezuela, Cuba, o Haiti, os Estados Unidos…

É de Nova Orleans, aliás, a receita que converteu Aline para a pesquisa culinária ancestral.

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Refogado de frango, linguiça calabresa e vegetais que dará origem ao jambalaya. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Aprendi a fazer o jambalaya num pub aqui em São Paulo, onde trabalhei como subchef. Virou o prato da minha vida, nunca mais parei de fazer”, conta. Trata-se de uma comida de mistura, semelhante à paella espanhola, mas que leva frango, linguiça calabresa e camarões. No refogado entram também tomate, pimentão, salsão e alho-poró, além do tempero cajun, pilar da cozinha da Louisiana, que mescla pimentas, ervas, páprica, estragão e canela. “Coloco cravos também, é o meu toque, e digo que quem encontrar um deles no prato terá uma conta bancária milionária. Mas tem que ter fé, né?”, brinca.

O aroma da boa vizinhança

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Hoje fora dos restaurantes, Aline trabalha de casa e faz milagre com um fogão de quatro bocas para atender às encomendas de jambalaya e outros pratos típicos. Quando o evento é grande – coisa rara em tempos de pandemia –, a chef aluga uma cozinha comunitária em Guaianases, que é maior e com mais estrutura. Os vizinhos da Cohab em Cidade Tiradentes, na zona leste, já estão acostumados com o aroma que escapa pelas janelas do apartamento de Aline. “Vira e mexe escuto alguém no corredor apreciando minha comida pelo cheiro, ‘nossa, isso deve estar muito gostoso’. Eu fico toda me achando”, conta, orgulhosa.

Aline Chermoula prepara prato sob encomenda da cozinha de sua casa. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aos sábados, Aline prepara acarajés com o azeite de dendê que manda buscar lá na Bahia, num coletivo quilombola. “Por ser artesanal e muito bem feito, ele é completamente diferente das versões que encontro por aqui. É fresco, tem sabor apurado, até o aspecto muda”, conta. As ervas vêm de uma horta comunitária em Guaianases (exceto o tomilho, que diz só encontrar na região central). Já o leite de coco, Aline prefere fazer do zero em casa, batendo o fruto seco com água morna. “Fica mais leve e, ao mesmo tempo, rico em sabor.”

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O cardápio para encomendas ainda inclui gumbo (ensopado de quiabo com camarões e chouriço), cachupa (cozido de carnes, feijão, grão de bico e milho) e muamba de galinha, prato típico de Angola, com azeite de dendê. A variedade de panetones, que à primeira vista parece estar fora de contexto, veio para reforçar o orçamento prejudicado com os eventos cancelados pela pandemia. “Fiz de tudo esse ano, de ovo de Páscoa a marmita fit. Tive que me virar para honrar com meus boletos”, explica.

Jambalaya, prato de mistura que lembra a paella espanhola. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aline, que é mãe de dois, também faz lives (@alinechermoulaoficial), grava podcast, assina uma coluna no portal Mundo Negro e coordena o projeto social Xepa no Prato. “Estou em busca de espaço para mostrar meu trabalho. Eu como mulher, preta e periférica preciso marcar território, senão daqui a pouco chega um chef branco e tatuado para roubar os créditos”, pondera. 

Chermoula é um tempero popular do norte da África, bom para usar em marinadas e também na finalização de pratos. Leva coentro fresco picado grosseiramente, folhas de hortelã rasgadas à mão, cominho, açafrão, pimentas. É típico, potente e cheio de personalidade – assim como Aline, que há alguns anos (e não por acaso) aposentou o familiar Araújo para também adotar o Chermoula, seu sobrenome, digamos, de guerra contra o racismo e o preconceito cultural.

Aline Chermoula, 36, dedica-se à cozinha diaspórica africana nas Américas. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Minha cozinha é a expressão da resistência. Eu, como mulher preta, cozinheira e periférica, resisto ao usar coentro, azeite de dendê, pimenta e um sem-fim de especiarias que fazem parte da minha identidade.” Quando a clientela torce o nariz, Aline tenta explicar, com muito jeitinho, que aquele ingrediente tem uma função dentro da receita e que retirá-lo significaria descaracterizar o prato. Ela também garante que, quando usado na medida certa, nada pesa no estômago nem domina o sabor na garfada. “Estou aqui para acabar com o preconceito e a desigualdade raciais por meio da valorização dessa cultura”, afirma.

+ Aline Chermoula ensina como fazer jambalaya em casa.

Natural de Feira de Santana, na Bahia, Aline cursou História na USP e se formou cozinheira pelo ProUni na universidade Anhembi-Morumbi: “Eu era a única aluna preta do período”. Ela busca um resgate de sua ancestralidade ao dedicar-se ao que chama de “cozinha diaspórica africana nas Américas”, ou seja, uma cozinha mestiça, com base na cultura alimentar africana, trazida para cá juntamente com os povos escravizados, mas apinhada de influências locais e europeias (proveniente dos exploradores). Por local, entenda não só o Brasil com suas moquecas e acarajés, mas também a Colômbia, o México, a Venezuela, Cuba, o Haiti, os Estados Unidos…

É de Nova Orleans, aliás, a receita que converteu Aline para a pesquisa culinária ancestral.

Refogado de frango, linguiça calabresa e vegetais que dará origem ao jambalaya. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Aprendi a fazer o jambalaya num pub aqui em São Paulo, onde trabalhei como subchef. Virou o prato da minha vida, nunca mais parei de fazer”, conta. Trata-se de uma comida de mistura, semelhante à paella espanhola, mas que leva frango, linguiça calabresa e camarões. No refogado entram também tomate, pimentão, salsão e alho-poró, além do tempero cajun, pilar da cozinha da Louisiana, que mescla pimentas, ervas, páprica, estragão e canela. “Coloco cravos também, é o meu toque, e digo que quem encontrar um deles no prato terá uma conta bancária milionária. Mas tem que ter fé, né?”, brinca.

O aroma da boa vizinhança

Hoje fora dos restaurantes, Aline trabalha de casa e faz milagre com um fogão de quatro bocas para atender às encomendas de jambalaya e outros pratos típicos. Quando o evento é grande – coisa rara em tempos de pandemia –, a chef aluga uma cozinha comunitária em Guaianases, que é maior e com mais estrutura. Os vizinhos da Cohab em Cidade Tiradentes, na zona leste, já estão acostumados com o aroma que escapa pelas janelas do apartamento de Aline. “Vira e mexe escuto alguém no corredor apreciando minha comida pelo cheiro, ‘nossa, isso deve estar muito gostoso’. Eu fico toda me achando”, conta, orgulhosa.

Aline Chermoula prepara prato sob encomenda da cozinha de sua casa. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aos sábados, Aline prepara acarajés com o azeite de dendê que manda buscar lá na Bahia, num coletivo quilombola. “Por ser artesanal e muito bem feito, ele é completamente diferente das versões que encontro por aqui. É fresco, tem sabor apurado, até o aspecto muda”, conta. As ervas vêm de uma horta comunitária em Guaianases (exceto o tomilho, que diz só encontrar na região central). Já o leite de coco, Aline prefere fazer do zero em casa, batendo o fruto seco com água morna. “Fica mais leve e, ao mesmo tempo, rico em sabor.”

O cardápio para encomendas ainda inclui gumbo (ensopado de quiabo com camarões e chouriço), cachupa (cozido de carnes, feijão, grão de bico e milho) e muamba de galinha, prato típico de Angola, com azeite de dendê. A variedade de panetones, que à primeira vista parece estar fora de contexto, veio para reforçar o orçamento prejudicado com os eventos cancelados pela pandemia. “Fiz de tudo esse ano, de ovo de Páscoa a marmita fit. Tive que me virar para honrar com meus boletos”, explica.

Jambalaya, prato de mistura que lembra a paella espanhola. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aline, que é mãe de dois, também faz lives (@alinechermoulaoficial), grava podcast, assina uma coluna no portal Mundo Negro e coordena o projeto social Xepa no Prato. “Estou em busca de espaço para mostrar meu trabalho. Eu como mulher, preta e periférica preciso marcar território, senão daqui a pouco chega um chef branco e tatuado para roubar os créditos”, pondera. 

Chermoula é um tempero popular do norte da África, bom para usar em marinadas e também na finalização de pratos. Leva coentro fresco picado grosseiramente, folhas de hortelã rasgadas à mão, cominho, açafrão, pimentas. É típico, potente e cheio de personalidade – assim como Aline, que há alguns anos (e não por acaso) aposentou o familiar Araújo para também adotar o Chermoula, seu sobrenome, digamos, de guerra contra o racismo e o preconceito cultural.

Aline Chermoula, 36, dedica-se à cozinha diaspórica africana nas Américas. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Minha cozinha é a expressão da resistência. Eu, como mulher preta, cozinheira e periférica, resisto ao usar coentro, azeite de dendê, pimenta e um sem-fim de especiarias que fazem parte da minha identidade.” Quando a clientela torce o nariz, Aline tenta explicar, com muito jeitinho, que aquele ingrediente tem uma função dentro da receita e que retirá-lo significaria descaracterizar o prato. Ela também garante que, quando usado na medida certa, nada pesa no estômago nem domina o sabor na garfada. “Estou aqui para acabar com o preconceito e a desigualdade raciais por meio da valorização dessa cultura”, afirma.

+ Aline Chermoula ensina como fazer jambalaya em casa.

Natural de Feira de Santana, na Bahia, Aline cursou História na USP e se formou cozinheira pelo ProUni na universidade Anhembi-Morumbi: “Eu era a única aluna preta do período”. Ela busca um resgate de sua ancestralidade ao dedicar-se ao que chama de “cozinha diaspórica africana nas Américas”, ou seja, uma cozinha mestiça, com base na cultura alimentar africana, trazida para cá juntamente com os povos escravizados, mas apinhada de influências locais e europeias (proveniente dos exploradores). Por local, entenda não só o Brasil com suas moquecas e acarajés, mas também a Colômbia, o México, a Venezuela, Cuba, o Haiti, os Estados Unidos…

É de Nova Orleans, aliás, a receita que converteu Aline para a pesquisa culinária ancestral.

Refogado de frango, linguiça calabresa e vegetais que dará origem ao jambalaya. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Aprendi a fazer o jambalaya num pub aqui em São Paulo, onde trabalhei como subchef. Virou o prato da minha vida, nunca mais parei de fazer”, conta. Trata-se de uma comida de mistura, semelhante à paella espanhola, mas que leva frango, linguiça calabresa e camarões. No refogado entram também tomate, pimentão, salsão e alho-poró, além do tempero cajun, pilar da cozinha da Louisiana, que mescla pimentas, ervas, páprica, estragão e canela. “Coloco cravos também, é o meu toque, e digo que quem encontrar um deles no prato terá uma conta bancária milionária. Mas tem que ter fé, né?”, brinca.

O aroma da boa vizinhança

Hoje fora dos restaurantes, Aline trabalha de casa e faz milagre com um fogão de quatro bocas para atender às encomendas de jambalaya e outros pratos típicos. Quando o evento é grande – coisa rara em tempos de pandemia –, a chef aluga uma cozinha comunitária em Guaianases, que é maior e com mais estrutura. Os vizinhos da Cohab em Cidade Tiradentes, na zona leste, já estão acostumados com o aroma que escapa pelas janelas do apartamento de Aline. “Vira e mexe escuto alguém no corredor apreciando minha comida pelo cheiro, ‘nossa, isso deve estar muito gostoso’. Eu fico toda me achando”, conta, orgulhosa.

Aline Chermoula prepara prato sob encomenda da cozinha de sua casa. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aos sábados, Aline prepara acarajés com o azeite de dendê que manda buscar lá na Bahia, num coletivo quilombola. “Por ser artesanal e muito bem feito, ele é completamente diferente das versões que encontro por aqui. É fresco, tem sabor apurado, até o aspecto muda”, conta. As ervas vêm de uma horta comunitária em Guaianases (exceto o tomilho, que diz só encontrar na região central). Já o leite de coco, Aline prefere fazer do zero em casa, batendo o fruto seco com água morna. “Fica mais leve e, ao mesmo tempo, rico em sabor.”

O cardápio para encomendas ainda inclui gumbo (ensopado de quiabo com camarões e chouriço), cachupa (cozido de carnes, feijão, grão de bico e milho) e muamba de galinha, prato típico de Angola, com azeite de dendê. A variedade de panetones, que à primeira vista parece estar fora de contexto, veio para reforçar o orçamento prejudicado com os eventos cancelados pela pandemia. “Fiz de tudo esse ano, de ovo de Páscoa a marmita fit. Tive que me virar para honrar com meus boletos”, explica.

Jambalaya, prato de mistura que lembra a paella espanhola. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aline, que é mãe de dois, também faz lives (@alinechermoulaoficial), grava podcast, assina uma coluna no portal Mundo Negro e coordena o projeto social Xepa no Prato. “Estou em busca de espaço para mostrar meu trabalho. Eu como mulher, preta e periférica preciso marcar território, senão daqui a pouco chega um chef branco e tatuado para roubar os créditos”, pondera. 

Chermoula é um tempero popular do norte da África, bom para usar em marinadas e também na finalização de pratos. Leva coentro fresco picado grosseiramente, folhas de hortelã rasgadas à mão, cominho, açafrão, pimentas. É típico, potente e cheio de personalidade – assim como Aline, que há alguns anos (e não por acaso) aposentou o familiar Araújo para também adotar o Chermoula, seu sobrenome, digamos, de guerra contra o racismo e o preconceito cultural.

Aline Chermoula, 36, dedica-se à cozinha diaspórica africana nas Américas. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Minha cozinha é a expressão da resistência. Eu, como mulher preta, cozinheira e periférica, resisto ao usar coentro, azeite de dendê, pimenta e um sem-fim de especiarias que fazem parte da minha identidade.” Quando a clientela torce o nariz, Aline tenta explicar, com muito jeitinho, que aquele ingrediente tem uma função dentro da receita e que retirá-lo significaria descaracterizar o prato. Ela também garante que, quando usado na medida certa, nada pesa no estômago nem domina o sabor na garfada. “Estou aqui para acabar com o preconceito e a desigualdade raciais por meio da valorização dessa cultura”, afirma.

+ Aline Chermoula ensina como fazer jambalaya em casa.

Natural de Feira de Santana, na Bahia, Aline cursou História na USP e se formou cozinheira pelo ProUni na universidade Anhembi-Morumbi: “Eu era a única aluna preta do período”. Ela busca um resgate de sua ancestralidade ao dedicar-se ao que chama de “cozinha diaspórica africana nas Américas”, ou seja, uma cozinha mestiça, com base na cultura alimentar africana, trazida para cá juntamente com os povos escravizados, mas apinhada de influências locais e europeias (proveniente dos exploradores). Por local, entenda não só o Brasil com suas moquecas e acarajés, mas também a Colômbia, o México, a Venezuela, Cuba, o Haiti, os Estados Unidos…

É de Nova Orleans, aliás, a receita que converteu Aline para a pesquisa culinária ancestral.

Refogado de frango, linguiça calabresa e vegetais que dará origem ao jambalaya. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Aprendi a fazer o jambalaya num pub aqui em São Paulo, onde trabalhei como subchef. Virou o prato da minha vida, nunca mais parei de fazer”, conta. Trata-se de uma comida de mistura, semelhante à paella espanhola, mas que leva frango, linguiça calabresa e camarões. No refogado entram também tomate, pimentão, salsão e alho-poró, além do tempero cajun, pilar da cozinha da Louisiana, que mescla pimentas, ervas, páprica, estragão e canela. “Coloco cravos também, é o meu toque, e digo que quem encontrar um deles no prato terá uma conta bancária milionária. Mas tem que ter fé, né?”, brinca.

O aroma da boa vizinhança

Hoje fora dos restaurantes, Aline trabalha de casa e faz milagre com um fogão de quatro bocas para atender às encomendas de jambalaya e outros pratos típicos. Quando o evento é grande – coisa rara em tempos de pandemia –, a chef aluga uma cozinha comunitária em Guaianases, que é maior e com mais estrutura. Os vizinhos da Cohab em Cidade Tiradentes, na zona leste, já estão acostumados com o aroma que escapa pelas janelas do apartamento de Aline. “Vira e mexe escuto alguém no corredor apreciando minha comida pelo cheiro, ‘nossa, isso deve estar muito gostoso’. Eu fico toda me achando”, conta, orgulhosa.

Aline Chermoula prepara prato sob encomenda da cozinha de sua casa. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aos sábados, Aline prepara acarajés com o azeite de dendê que manda buscar lá na Bahia, num coletivo quilombola. “Por ser artesanal e muito bem feito, ele é completamente diferente das versões que encontro por aqui. É fresco, tem sabor apurado, até o aspecto muda”, conta. As ervas vêm de uma horta comunitária em Guaianases (exceto o tomilho, que diz só encontrar na região central). Já o leite de coco, Aline prefere fazer do zero em casa, batendo o fruto seco com água morna. “Fica mais leve e, ao mesmo tempo, rico em sabor.”

O cardápio para encomendas ainda inclui gumbo (ensopado de quiabo com camarões e chouriço), cachupa (cozido de carnes, feijão, grão de bico e milho) e muamba de galinha, prato típico de Angola, com azeite de dendê. A variedade de panetones, que à primeira vista parece estar fora de contexto, veio para reforçar o orçamento prejudicado com os eventos cancelados pela pandemia. “Fiz de tudo esse ano, de ovo de Páscoa a marmita fit. Tive que me virar para honrar com meus boletos”, explica.

Jambalaya, prato de mistura que lembra a paella espanhola. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aline, que é mãe de dois, também faz lives (@alinechermoulaoficial), grava podcast, assina uma coluna no portal Mundo Negro e coordena o projeto social Xepa no Prato. “Estou em busca de espaço para mostrar meu trabalho. Eu como mulher, preta e periférica preciso marcar território, senão daqui a pouco chega um chef branco e tatuado para roubar os créditos”, pondera. 

Chermoula é um tempero popular do norte da África, bom para usar em marinadas e também na finalização de pratos. Leva coentro fresco picado grosseiramente, folhas de hortelã rasgadas à mão, cominho, açafrão, pimentas. É típico, potente e cheio de personalidade – assim como Aline, que há alguns anos (e não por acaso) aposentou o familiar Araújo para também adotar o Chermoula, seu sobrenome, digamos, de guerra contra o racismo e o preconceito cultural.

Aline Chermoula, 36, dedica-se à cozinha diaspórica africana nas Américas. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Minha cozinha é a expressão da resistência. Eu, como mulher preta, cozinheira e periférica, resisto ao usar coentro, azeite de dendê, pimenta e um sem-fim de especiarias que fazem parte da minha identidade.” Quando a clientela torce o nariz, Aline tenta explicar, com muito jeitinho, que aquele ingrediente tem uma função dentro da receita e que retirá-lo significaria descaracterizar o prato. Ela também garante que, quando usado na medida certa, nada pesa no estômago nem domina o sabor na garfada. “Estou aqui para acabar com o preconceito e a desigualdade raciais por meio da valorização dessa cultura”, afirma.

+ Aline Chermoula ensina como fazer jambalaya em casa.

Natural de Feira de Santana, na Bahia, Aline cursou História na USP e se formou cozinheira pelo ProUni na universidade Anhembi-Morumbi: “Eu era a única aluna preta do período”. Ela busca um resgate de sua ancestralidade ao dedicar-se ao que chama de “cozinha diaspórica africana nas Américas”, ou seja, uma cozinha mestiça, com base na cultura alimentar africana, trazida para cá juntamente com os povos escravizados, mas apinhada de influências locais e europeias (proveniente dos exploradores). Por local, entenda não só o Brasil com suas moquecas e acarajés, mas também a Colômbia, o México, a Venezuela, Cuba, o Haiti, os Estados Unidos…

É de Nova Orleans, aliás, a receita que converteu Aline para a pesquisa culinária ancestral.

Refogado de frango, linguiça calabresa e vegetais que dará origem ao jambalaya. Foto: Felipe Rau/Estadão

“Aprendi a fazer o jambalaya num pub aqui em São Paulo, onde trabalhei como subchef. Virou o prato da minha vida, nunca mais parei de fazer”, conta. Trata-se de uma comida de mistura, semelhante à paella espanhola, mas que leva frango, linguiça calabresa e camarões. No refogado entram também tomate, pimentão, salsão e alho-poró, além do tempero cajun, pilar da cozinha da Louisiana, que mescla pimentas, ervas, páprica, estragão e canela. “Coloco cravos também, é o meu toque, e digo que quem encontrar um deles no prato terá uma conta bancária milionária. Mas tem que ter fé, né?”, brinca.

O aroma da boa vizinhança

Hoje fora dos restaurantes, Aline trabalha de casa e faz milagre com um fogão de quatro bocas para atender às encomendas de jambalaya e outros pratos típicos. Quando o evento é grande – coisa rara em tempos de pandemia –, a chef aluga uma cozinha comunitária em Guaianases, que é maior e com mais estrutura. Os vizinhos da Cohab em Cidade Tiradentes, na zona leste, já estão acostumados com o aroma que escapa pelas janelas do apartamento de Aline. “Vira e mexe escuto alguém no corredor apreciando minha comida pelo cheiro, ‘nossa, isso deve estar muito gostoso’. Eu fico toda me achando”, conta, orgulhosa.

Aline Chermoula prepara prato sob encomenda da cozinha de sua casa. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aos sábados, Aline prepara acarajés com o azeite de dendê que manda buscar lá na Bahia, num coletivo quilombola. “Por ser artesanal e muito bem feito, ele é completamente diferente das versões que encontro por aqui. É fresco, tem sabor apurado, até o aspecto muda”, conta. As ervas vêm de uma horta comunitária em Guaianases (exceto o tomilho, que diz só encontrar na região central). Já o leite de coco, Aline prefere fazer do zero em casa, batendo o fruto seco com água morna. “Fica mais leve e, ao mesmo tempo, rico em sabor.”

O cardápio para encomendas ainda inclui gumbo (ensopado de quiabo com camarões e chouriço), cachupa (cozido de carnes, feijão, grão de bico e milho) e muamba de galinha, prato típico de Angola, com azeite de dendê. A variedade de panetones, que à primeira vista parece estar fora de contexto, veio para reforçar o orçamento prejudicado com os eventos cancelados pela pandemia. “Fiz de tudo esse ano, de ovo de Páscoa a marmita fit. Tive que me virar para honrar com meus boletos”, explica.

Jambalaya, prato de mistura que lembra a paella espanhola. Foto: Felipe Rau/Estadão

Aline, que é mãe de dois, também faz lives (@alinechermoulaoficial), grava podcast, assina uma coluna no portal Mundo Negro e coordena o projeto social Xepa no Prato. “Estou em busca de espaço para mostrar meu trabalho. Eu como mulher, preta e periférica preciso marcar território, senão daqui a pouco chega um chef branco e tatuado para roubar os créditos”, pondera. 

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