Suzana Barelli

Sopa e vinho combinam? Veja as melhores harmonizações


A melhor maneira de responder é testando as harmonizações, com caldos diversos e 12 vinhos, com preços entre R$ 77 e R$ 331

Por Suzana Barelli

Se não fosse pela deliciosa sopa de tartaruga, harmonizada com jerez, no filme “A festa de Babette”, a resposta seria que os dois – sopa e vinho – são líquidos demais para uma harmonização gastronômica dar certo. Na teoria, não há muitas indicações para combinar uma fumegante sopa com brancos, tintos e até amontilhados, como aconteceu neste clássico filme de 1987. Na prática, no entanto, o conceito muda e, acredite, tem sopa que melhora com o vinho.

Harmonização incluiu 12 vinhos e três sopas: os clássicos capelete in brodo e caldo verde e uma sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão
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Esta foi a boa surpresa da harmonização que incluiu três sopas e 12 vinhos. Os clássicos capeletti in brodo e caldo verde e a mais contemporânea sopa de cenoura com gengibre, em receita da rede Dona Deôla, foram degustadas com mais diversos estilos de vinho. Espumante, brancos, rosés, tintos e até o amontillado – vinho fortificado inspirado no filme que eternizou o casamento deste estilo de jerez com os caldos de inverno – foram testados neste painel.

O jerez, já adiantamos, foi o vinho que melhor casou com a sopa, mas aqui há um problema de logística: com a bagunça de fretes internacionais, reflexo do fechamento de mercados pela pandemia, e também com a invasão da Ucrânia pela Rússia, não está fácil encontrar amontillado (o estilo de Jerez que perde a sua capa de leveduras enquanto envelhece em barricas e começa a sofrer a ação do oxigênio) no mercado brasileiro. Assim, o estoque de garrafas do jerez degustado nesta prova é baixo na importadora Belle Cave e a previsão é de um novo lote apenas na metade do segundo semestre.

Na degustação, ficou claro que alguns estilos de vinho favorecem à harmonização com os caldos. O espumante, por exemplo. Escolhemos uma garrafa da categoria Sur Lie, que chega ao mercado ainda com o que restou das leveduras e, por isso, tem mais aromas de fermentação. Estas notas fizeram o papel daquele pãozinho que acompanha a sopa, num gostoso casamento à mesa.

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A degustação foi realizada pela colunista Suzana Barelli e pelo especialista Felipe Campos. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Nos brancos, entre as três opções, o destaque foi para aquele que tinha passagem por barrica de carvalho (informação em geral presente no contrarrótulo). A maior, digamos, cremosidade do vinho combinou com a textura das sopas também mais cremosas, indicando que deve casar também com outras receitas mais cremosas, como sopa de abóbora, de mandioquinha etc. Assim como nas receitas com ingredientes mais sólidos, os brancos casam melhor com sopas mais leves, com legumes e provavelmente pescados como ingredientes principais. 

Sopas de carne, por sua vez, pedem tintos. Mas os tintos mais leves e menos alcoólicos foram melhores do que os mais encorpados – e isso que nem foi colocado à prova um cabernet sauvignon ou um tannat, em geral mais potentes e muito consumidos no inverno. Na degustação, um tinto italiano, elaborado com a uva barbera, se destacou, comprovando a vocação dos rótulos italianos para a comida.

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Na logística da degustação, o especialista Felipe Campos, professor da The Wine School, e a jornalista Suzana Barelli, colunista de vinhos do Paladar, primeiro provaram os vinhos separadamente e, depois, degustaram as sopas, anotando as características da comida e da bebida. Em um segundo momento, foi provada cada sopa com cada um dos 12 vinhos, analisando a sensação no paladar a cada colherada. As receitas foram preparadas pela Dona Deôla, rede de padarias em São Paulo que tem um buffet de sopas durante todo o inverno. 

As melhores harmonizações

Sanchez Romate Amontillado Jerez, Espanha R$ 331, na Belle Cave (estoque pequeno e previsão de chegar nova remessa em setembro) Elaborado com a uva palomino fino, no sistema de soleras e criaderas de Jerez, este fortificado traz notas de frutas secas, um toque oxidativo e outro salgado. Com corpo médio, é mais cremoso, com boa acidez e 19% de álcool. Casou com a sopa de cenoura com gengibre, pela cremosidade e também pelo teor alcóolico, que parece deixar o prato mais confort-food. Combinou com o capeletti, com os dois, prato e bebida, com o mesmo “peso”, e também com o caldo-verde, com a sua acidez equilibrando a gordura da receita.

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Jerez Sanchez Romate Amontillado. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Ricossa Barbera D’Asti 2019 Piemonte, Itália R$ 131,90, na Grand Cru De cor rubi, traz notas de frutas vermelhas frescas no nariz, com um toque de madeira. De corpo médio, com taninos bem integrados, bela acidez, e um tostadinho no final, com 13,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o tinto não brigou, mas também não brilhou. Foi bem o casamento com o capeletti, com a acidez do vinho combinando com a gordura da sopa; e casou com o caldo verde, mesmo a sopa tendo deixado o vinho um pouco doce.

O brasileiro Valduga Sur Lie fez boa companhinha à sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão
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O par da sopa de cenoura com gengibre

Valduga Sur Lie Vale dos Vinhedos, Brasil R$ 85,50, na Casa Valduga O espumante traz as notas de levedura nos aromas, lembrando panificação, com toques cítricos e de maça verde. Tem corpo médio, bom frescor e 12,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o espumante funciona bem como o pãozinho que acompanha a receita, completando o sabor. Com o caldo verde, a sua acidez combinou com a gordura da receita, mas faltou ao espumante um pouco mais de corpo para acompanhar a sopa. O capeletti brilhou, apagando o vinho e deixando-o apenas um líquido insosso na boca.

Valduga Sur Lie. Foto: Taba Benedicto/Estadão
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Montes Classic Series Reserva Chardonnay 2019 Vale Central, Chile R$ 121,05, na Mistral Chardonnay com boa tipicidade, notas cítricas e frutas tropicais (melão) e algo de torta de marmelo, com leve tostado no nariz. Corpo médio, cremoso no paladar, com notas de baunilha e acidez mais baixa, com 13,5% de álcool. Com estas características, combinou muito bem com a sopa de cenoura, indicando um bom casamento. Com maior estrutura, a expectativa era que combinasse com as demais receitas, mas a harmonização acabou trazendo um amargor no paladar com os dois outros pratos.

Les Galuches Chinon 2020 Loire, França R$ 189, na De la Croix Cabernet Franc elaborado pela domaine Wilfrid Rousse, de cor púrpura mais escura, traz aromas de frutas negras (como amoras), mescladas com especiarias. Muito equilibrado no paladar, com taninos macios, persistência média e 12,5% de álcool. Logo na primeira garfada, o vinho logo deixou a sopa de cenoura mais delicada, prazerosa. Com o capeletti, o vinho se fez mais presente do que a sopa no paladar; enquanto para o caldo verde foi exatamente o contrário, com o vinho perdendo espaço frente à receita.

Les Galuches Chinon 2020. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Chateau de Pourcieux 2020 Côtes de Provence, França R$ 130, na Cantu De coloração rosa claro, este rosé se destaca pelas muitas notas de frutas vermelhas, lembrando morango, tutti-frutti, e temperos de cozinha. De corpo leve, traz algumas notas doces no paladar, com 13,5% de álcool. A sopa de cenoura despertou as notas mais adocicadas do vinho, o que deve agradar quem tem o paladar mais doce. No capeletti, vinho e sopa foram em sentidos opostos e o caldo verde passou por cima da sopa.

O par do caldo verde

Tinto de Talha 2019 Alentejo, Portugal R$ 77, na Adega Alentejana Elaborado com as uvas trincadeira e castelão pela Segur Estates, é um tinto mais simples e rústico, com cor púrpura, notas florais e de frutas vermelhas e um toque de barro, como água em moringa. Apresenta corpo médico, com taninos mais intensos, maior rusticidade, final curto com 13,5% de álcool. Vinho e sopa de cenoura não casaram, um anulando o sabor do outro. Com o capeletti, o tinto não brigou, mas também não se destacou. Mas combinou bastante com o caldo verde, talvez pelo encontro de seus taninos com o paio, convidando a uma nova colherada, ou pela lógica da harmonização regional, de que as receitas e os vinhos locais combinam entre si.

Tinto de Talha 2019, do Alentejo. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Vinyes Ocults Malbec COT 2020 Vale de Uco, Argentina R$ 170, na Boca a Boca Vinhos A aposta foi em um malbec de maceração carbônica (com cachos em um tanque fechado), mais refrescante e menos intenso do que os malbecs de fermentação tradicional. De coloração púrpura, apresenta notas de frutas negras, com muita acidez, como a de um limão, tem corpo de média intensidade, com taninos bem macios e 14% de álcool. Com a sopa de cenoura, não houve encontro, cada um para um lado. Com o capeletti, a boa acidez do vinho ajudou a balancear a gordura da receita, mas o tinto ficou mais tânico. E combinou deliciosamente com o caldo verde, com a carne de porco envolvendo os taninos e deixando-os ainda mais macios.

Cordilheira de Sant’Ana Merlot 2010 Campanha gaúcha, Brasil R$ 99, na Alvino O representante nacional traz aromas de fruta negra (amoras) mesclada com notas de madeira e um toque empireumático. No paladar, corpo médio, uma leve acidez em destaque, persistência média e 12,6% de álcool. O vinho se mostrou encorpado para a sopa de cenoura, anulando o seu sabor. Com o capeletti, o vinho pareceu mais tânico do que era, talvez porque a temperatura da comida também influencia na harmonização, destacando algumas características da bebida, como o álcool e os taninos. Houve uma sútil combinação com o caldo verde: os dois se completaram no paladar, mas sem tornar a harmonização brilhante.

Melhor tentar outra receita

Pfaffmann Riesling Trocken 2020 Pfalz, Alemanha R$159, na Weinkeller Típico riesling alemão, com notas minerais e petroláceas no nariz e um toque de maça verde, elaborado pelos princípios orgânicos, com 13% de álcool. Tem muita acidez, daquelas que faz salivar, e corpo médio. Suas características não casaram com as sopas. Com a de cenoura, a sensação no paladar é que a sopa foi para um lado e o vinho para outro. Não brigaram, mas não combinaram. O capeletti se mostrou muito potente, escondendo o vinho. E o caldo verde trouxe uma sensação de doçura ao vinho.

Petit-Chablis Jean Bouchard 2020 Chablis, França R$ 199, no Saint Marché  Gostoso chardonnay sem passagem por madeira, com corpo leve, notas aromáticas que lembram cítricos, maças verdes e um damasco no final de boca, além do esperado toque mineral. De corpo leve para médio, acidez bem colocada e pouca persistência, com 12,5% de álcool. Ensaiou um casamento com a sopa de cenoura, mas depois faltou corpo ao vinho. Teve comportamento semelhante ao riesling nas outras duas harmonizações, indicando que brancos mais leves podem sopas também levinhas. Certamente casaria com receitas como sopa de cebola.

Pour Ma Gueule 2018 Itata, Chile R$ 111, na World Wine Tinto de cor rubi mais clara, translúcida, com notas de cerejas frescas, um toque terroso. Com corpo leve para médio, traz boa acidez, com 14% de álcool. Com a receita de cenoura, foram cada um para um lado. O capeletti tinha mais corpo que o vinho e o tinto pareceu mais alcoólico e doce. O caldo verde foi aquela combinação que não compromete, mas que também não há uma função de sabores.

Se não fosse pela deliciosa sopa de tartaruga, harmonizada com jerez, no filme “A festa de Babette”, a resposta seria que os dois – sopa e vinho – são líquidos demais para uma harmonização gastronômica dar certo. Na teoria, não há muitas indicações para combinar uma fumegante sopa com brancos, tintos e até amontilhados, como aconteceu neste clássico filme de 1987. Na prática, no entanto, o conceito muda e, acredite, tem sopa que melhora com o vinho.

Harmonização incluiu 12 vinhos e três sopas: os clássicos capelete in brodo e caldo verde e uma sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Esta foi a boa surpresa da harmonização que incluiu três sopas e 12 vinhos. Os clássicos capeletti in brodo e caldo verde e a mais contemporânea sopa de cenoura com gengibre, em receita da rede Dona Deôla, foram degustadas com mais diversos estilos de vinho. Espumante, brancos, rosés, tintos e até o amontillado – vinho fortificado inspirado no filme que eternizou o casamento deste estilo de jerez com os caldos de inverno – foram testados neste painel.

O jerez, já adiantamos, foi o vinho que melhor casou com a sopa, mas aqui há um problema de logística: com a bagunça de fretes internacionais, reflexo do fechamento de mercados pela pandemia, e também com a invasão da Ucrânia pela Rússia, não está fácil encontrar amontillado (o estilo de Jerez que perde a sua capa de leveduras enquanto envelhece em barricas e começa a sofrer a ação do oxigênio) no mercado brasileiro. Assim, o estoque de garrafas do jerez degustado nesta prova é baixo na importadora Belle Cave e a previsão é de um novo lote apenas na metade do segundo semestre.

Na degustação, ficou claro que alguns estilos de vinho favorecem à harmonização com os caldos. O espumante, por exemplo. Escolhemos uma garrafa da categoria Sur Lie, que chega ao mercado ainda com o que restou das leveduras e, por isso, tem mais aromas de fermentação. Estas notas fizeram o papel daquele pãozinho que acompanha a sopa, num gostoso casamento à mesa.

A degustação foi realizada pela colunista Suzana Barelli e pelo especialista Felipe Campos. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Nos brancos, entre as três opções, o destaque foi para aquele que tinha passagem por barrica de carvalho (informação em geral presente no contrarrótulo). A maior, digamos, cremosidade do vinho combinou com a textura das sopas também mais cremosas, indicando que deve casar também com outras receitas mais cremosas, como sopa de abóbora, de mandioquinha etc. Assim como nas receitas com ingredientes mais sólidos, os brancos casam melhor com sopas mais leves, com legumes e provavelmente pescados como ingredientes principais. 

Sopas de carne, por sua vez, pedem tintos. Mas os tintos mais leves e menos alcoólicos foram melhores do que os mais encorpados – e isso que nem foi colocado à prova um cabernet sauvignon ou um tannat, em geral mais potentes e muito consumidos no inverno. Na degustação, um tinto italiano, elaborado com a uva barbera, se destacou, comprovando a vocação dos rótulos italianos para a comida.

Na logística da degustação, o especialista Felipe Campos, professor da The Wine School, e a jornalista Suzana Barelli, colunista de vinhos do Paladar, primeiro provaram os vinhos separadamente e, depois, degustaram as sopas, anotando as características da comida e da bebida. Em um segundo momento, foi provada cada sopa com cada um dos 12 vinhos, analisando a sensação no paladar a cada colherada. As receitas foram preparadas pela Dona Deôla, rede de padarias em São Paulo que tem um buffet de sopas durante todo o inverno. 

As melhores harmonizações

Sanchez Romate Amontillado Jerez, Espanha R$ 331, na Belle Cave (estoque pequeno e previsão de chegar nova remessa em setembro) Elaborado com a uva palomino fino, no sistema de soleras e criaderas de Jerez, este fortificado traz notas de frutas secas, um toque oxidativo e outro salgado. Com corpo médio, é mais cremoso, com boa acidez e 19% de álcool. Casou com a sopa de cenoura com gengibre, pela cremosidade e também pelo teor alcóolico, que parece deixar o prato mais confort-food. Combinou com o capeletti, com os dois, prato e bebida, com o mesmo “peso”, e também com o caldo-verde, com a sua acidez equilibrando a gordura da receita.

Jerez Sanchez Romate Amontillado. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Ricossa Barbera D’Asti 2019 Piemonte, Itália R$ 131,90, na Grand Cru De cor rubi, traz notas de frutas vermelhas frescas no nariz, com um toque de madeira. De corpo médio, com taninos bem integrados, bela acidez, e um tostadinho no final, com 13,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o tinto não brigou, mas também não brilhou. Foi bem o casamento com o capeletti, com a acidez do vinho combinando com a gordura da sopa; e casou com o caldo verde, mesmo a sopa tendo deixado o vinho um pouco doce.

O brasileiro Valduga Sur Lie fez boa companhinha à sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão

O par da sopa de cenoura com gengibre

Valduga Sur Lie Vale dos Vinhedos, Brasil R$ 85,50, na Casa Valduga O espumante traz as notas de levedura nos aromas, lembrando panificação, com toques cítricos e de maça verde. Tem corpo médio, bom frescor e 12,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o espumante funciona bem como o pãozinho que acompanha a receita, completando o sabor. Com o caldo verde, a sua acidez combinou com a gordura da receita, mas faltou ao espumante um pouco mais de corpo para acompanhar a sopa. O capeletti brilhou, apagando o vinho e deixando-o apenas um líquido insosso na boca.

Valduga Sur Lie. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Montes Classic Series Reserva Chardonnay 2019 Vale Central, Chile R$ 121,05, na Mistral Chardonnay com boa tipicidade, notas cítricas e frutas tropicais (melão) e algo de torta de marmelo, com leve tostado no nariz. Corpo médio, cremoso no paladar, com notas de baunilha e acidez mais baixa, com 13,5% de álcool. Com estas características, combinou muito bem com a sopa de cenoura, indicando um bom casamento. Com maior estrutura, a expectativa era que combinasse com as demais receitas, mas a harmonização acabou trazendo um amargor no paladar com os dois outros pratos.

Les Galuches Chinon 2020 Loire, França R$ 189, na De la Croix Cabernet Franc elaborado pela domaine Wilfrid Rousse, de cor púrpura mais escura, traz aromas de frutas negras (como amoras), mescladas com especiarias. Muito equilibrado no paladar, com taninos macios, persistência média e 12,5% de álcool. Logo na primeira garfada, o vinho logo deixou a sopa de cenoura mais delicada, prazerosa. Com o capeletti, o vinho se fez mais presente do que a sopa no paladar; enquanto para o caldo verde foi exatamente o contrário, com o vinho perdendo espaço frente à receita.

Les Galuches Chinon 2020. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Chateau de Pourcieux 2020 Côtes de Provence, França R$ 130, na Cantu De coloração rosa claro, este rosé se destaca pelas muitas notas de frutas vermelhas, lembrando morango, tutti-frutti, e temperos de cozinha. De corpo leve, traz algumas notas doces no paladar, com 13,5% de álcool. A sopa de cenoura despertou as notas mais adocicadas do vinho, o que deve agradar quem tem o paladar mais doce. No capeletti, vinho e sopa foram em sentidos opostos e o caldo verde passou por cima da sopa.

O par do caldo verde

Tinto de Talha 2019 Alentejo, Portugal R$ 77, na Adega Alentejana Elaborado com as uvas trincadeira e castelão pela Segur Estates, é um tinto mais simples e rústico, com cor púrpura, notas florais e de frutas vermelhas e um toque de barro, como água em moringa. Apresenta corpo médico, com taninos mais intensos, maior rusticidade, final curto com 13,5% de álcool. Vinho e sopa de cenoura não casaram, um anulando o sabor do outro. Com o capeletti, o tinto não brigou, mas também não se destacou. Mas combinou bastante com o caldo verde, talvez pelo encontro de seus taninos com o paio, convidando a uma nova colherada, ou pela lógica da harmonização regional, de que as receitas e os vinhos locais combinam entre si.

Tinto de Talha 2019, do Alentejo. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Vinyes Ocults Malbec COT 2020 Vale de Uco, Argentina R$ 170, na Boca a Boca Vinhos A aposta foi em um malbec de maceração carbônica (com cachos em um tanque fechado), mais refrescante e menos intenso do que os malbecs de fermentação tradicional. De coloração púrpura, apresenta notas de frutas negras, com muita acidez, como a de um limão, tem corpo de média intensidade, com taninos bem macios e 14% de álcool. Com a sopa de cenoura, não houve encontro, cada um para um lado. Com o capeletti, a boa acidez do vinho ajudou a balancear a gordura da receita, mas o tinto ficou mais tânico. E combinou deliciosamente com o caldo verde, com a carne de porco envolvendo os taninos e deixando-os ainda mais macios.

Cordilheira de Sant’Ana Merlot 2010 Campanha gaúcha, Brasil R$ 99, na Alvino O representante nacional traz aromas de fruta negra (amoras) mesclada com notas de madeira e um toque empireumático. No paladar, corpo médio, uma leve acidez em destaque, persistência média e 12,6% de álcool. O vinho se mostrou encorpado para a sopa de cenoura, anulando o seu sabor. Com o capeletti, o vinho pareceu mais tânico do que era, talvez porque a temperatura da comida também influencia na harmonização, destacando algumas características da bebida, como o álcool e os taninos. Houve uma sútil combinação com o caldo verde: os dois se completaram no paladar, mas sem tornar a harmonização brilhante.

Melhor tentar outra receita

Pfaffmann Riesling Trocken 2020 Pfalz, Alemanha R$159, na Weinkeller Típico riesling alemão, com notas minerais e petroláceas no nariz e um toque de maça verde, elaborado pelos princípios orgânicos, com 13% de álcool. Tem muita acidez, daquelas que faz salivar, e corpo médio. Suas características não casaram com as sopas. Com a de cenoura, a sensação no paladar é que a sopa foi para um lado e o vinho para outro. Não brigaram, mas não combinaram. O capeletti se mostrou muito potente, escondendo o vinho. E o caldo verde trouxe uma sensação de doçura ao vinho.

Petit-Chablis Jean Bouchard 2020 Chablis, França R$ 199, no Saint Marché  Gostoso chardonnay sem passagem por madeira, com corpo leve, notas aromáticas que lembram cítricos, maças verdes e um damasco no final de boca, além do esperado toque mineral. De corpo leve para médio, acidez bem colocada e pouca persistência, com 12,5% de álcool. Ensaiou um casamento com a sopa de cenoura, mas depois faltou corpo ao vinho. Teve comportamento semelhante ao riesling nas outras duas harmonizações, indicando que brancos mais leves podem sopas também levinhas. Certamente casaria com receitas como sopa de cebola.

Pour Ma Gueule 2018 Itata, Chile R$ 111, na World Wine Tinto de cor rubi mais clara, translúcida, com notas de cerejas frescas, um toque terroso. Com corpo leve para médio, traz boa acidez, com 14% de álcool. Com a receita de cenoura, foram cada um para um lado. O capeletti tinha mais corpo que o vinho e o tinto pareceu mais alcoólico e doce. O caldo verde foi aquela combinação que não compromete, mas que também não há uma função de sabores.

Se não fosse pela deliciosa sopa de tartaruga, harmonizada com jerez, no filme “A festa de Babette”, a resposta seria que os dois – sopa e vinho – são líquidos demais para uma harmonização gastronômica dar certo. Na teoria, não há muitas indicações para combinar uma fumegante sopa com brancos, tintos e até amontilhados, como aconteceu neste clássico filme de 1987. Na prática, no entanto, o conceito muda e, acredite, tem sopa que melhora com o vinho.

Harmonização incluiu 12 vinhos e três sopas: os clássicos capelete in brodo e caldo verde e uma sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Esta foi a boa surpresa da harmonização que incluiu três sopas e 12 vinhos. Os clássicos capeletti in brodo e caldo verde e a mais contemporânea sopa de cenoura com gengibre, em receita da rede Dona Deôla, foram degustadas com mais diversos estilos de vinho. Espumante, brancos, rosés, tintos e até o amontillado – vinho fortificado inspirado no filme que eternizou o casamento deste estilo de jerez com os caldos de inverno – foram testados neste painel.

O jerez, já adiantamos, foi o vinho que melhor casou com a sopa, mas aqui há um problema de logística: com a bagunça de fretes internacionais, reflexo do fechamento de mercados pela pandemia, e também com a invasão da Ucrânia pela Rússia, não está fácil encontrar amontillado (o estilo de Jerez que perde a sua capa de leveduras enquanto envelhece em barricas e começa a sofrer a ação do oxigênio) no mercado brasileiro. Assim, o estoque de garrafas do jerez degustado nesta prova é baixo na importadora Belle Cave e a previsão é de um novo lote apenas na metade do segundo semestre.

Na degustação, ficou claro que alguns estilos de vinho favorecem à harmonização com os caldos. O espumante, por exemplo. Escolhemos uma garrafa da categoria Sur Lie, que chega ao mercado ainda com o que restou das leveduras e, por isso, tem mais aromas de fermentação. Estas notas fizeram o papel daquele pãozinho que acompanha a sopa, num gostoso casamento à mesa.

A degustação foi realizada pela colunista Suzana Barelli e pelo especialista Felipe Campos. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Nos brancos, entre as três opções, o destaque foi para aquele que tinha passagem por barrica de carvalho (informação em geral presente no contrarrótulo). A maior, digamos, cremosidade do vinho combinou com a textura das sopas também mais cremosas, indicando que deve casar também com outras receitas mais cremosas, como sopa de abóbora, de mandioquinha etc. Assim como nas receitas com ingredientes mais sólidos, os brancos casam melhor com sopas mais leves, com legumes e provavelmente pescados como ingredientes principais. 

Sopas de carne, por sua vez, pedem tintos. Mas os tintos mais leves e menos alcoólicos foram melhores do que os mais encorpados – e isso que nem foi colocado à prova um cabernet sauvignon ou um tannat, em geral mais potentes e muito consumidos no inverno. Na degustação, um tinto italiano, elaborado com a uva barbera, se destacou, comprovando a vocação dos rótulos italianos para a comida.

Na logística da degustação, o especialista Felipe Campos, professor da The Wine School, e a jornalista Suzana Barelli, colunista de vinhos do Paladar, primeiro provaram os vinhos separadamente e, depois, degustaram as sopas, anotando as características da comida e da bebida. Em um segundo momento, foi provada cada sopa com cada um dos 12 vinhos, analisando a sensação no paladar a cada colherada. As receitas foram preparadas pela Dona Deôla, rede de padarias em São Paulo que tem um buffet de sopas durante todo o inverno. 

As melhores harmonizações

Sanchez Romate Amontillado Jerez, Espanha R$ 331, na Belle Cave (estoque pequeno e previsão de chegar nova remessa em setembro) Elaborado com a uva palomino fino, no sistema de soleras e criaderas de Jerez, este fortificado traz notas de frutas secas, um toque oxidativo e outro salgado. Com corpo médio, é mais cremoso, com boa acidez e 19% de álcool. Casou com a sopa de cenoura com gengibre, pela cremosidade e também pelo teor alcóolico, que parece deixar o prato mais confort-food. Combinou com o capeletti, com os dois, prato e bebida, com o mesmo “peso”, e também com o caldo-verde, com a sua acidez equilibrando a gordura da receita.

Jerez Sanchez Romate Amontillado. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Ricossa Barbera D’Asti 2019 Piemonte, Itália R$ 131,90, na Grand Cru De cor rubi, traz notas de frutas vermelhas frescas no nariz, com um toque de madeira. De corpo médio, com taninos bem integrados, bela acidez, e um tostadinho no final, com 13,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o tinto não brigou, mas também não brilhou. Foi bem o casamento com o capeletti, com a acidez do vinho combinando com a gordura da sopa; e casou com o caldo verde, mesmo a sopa tendo deixado o vinho um pouco doce.

O brasileiro Valduga Sur Lie fez boa companhinha à sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão

O par da sopa de cenoura com gengibre

Valduga Sur Lie Vale dos Vinhedos, Brasil R$ 85,50, na Casa Valduga O espumante traz as notas de levedura nos aromas, lembrando panificação, com toques cítricos e de maça verde. Tem corpo médio, bom frescor e 12,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o espumante funciona bem como o pãozinho que acompanha a receita, completando o sabor. Com o caldo verde, a sua acidez combinou com a gordura da receita, mas faltou ao espumante um pouco mais de corpo para acompanhar a sopa. O capeletti brilhou, apagando o vinho e deixando-o apenas um líquido insosso na boca.

Valduga Sur Lie. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Montes Classic Series Reserva Chardonnay 2019 Vale Central, Chile R$ 121,05, na Mistral Chardonnay com boa tipicidade, notas cítricas e frutas tropicais (melão) e algo de torta de marmelo, com leve tostado no nariz. Corpo médio, cremoso no paladar, com notas de baunilha e acidez mais baixa, com 13,5% de álcool. Com estas características, combinou muito bem com a sopa de cenoura, indicando um bom casamento. Com maior estrutura, a expectativa era que combinasse com as demais receitas, mas a harmonização acabou trazendo um amargor no paladar com os dois outros pratos.

Les Galuches Chinon 2020 Loire, França R$ 189, na De la Croix Cabernet Franc elaborado pela domaine Wilfrid Rousse, de cor púrpura mais escura, traz aromas de frutas negras (como amoras), mescladas com especiarias. Muito equilibrado no paladar, com taninos macios, persistência média e 12,5% de álcool. Logo na primeira garfada, o vinho logo deixou a sopa de cenoura mais delicada, prazerosa. Com o capeletti, o vinho se fez mais presente do que a sopa no paladar; enquanto para o caldo verde foi exatamente o contrário, com o vinho perdendo espaço frente à receita.

Les Galuches Chinon 2020. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Chateau de Pourcieux 2020 Côtes de Provence, França R$ 130, na Cantu De coloração rosa claro, este rosé se destaca pelas muitas notas de frutas vermelhas, lembrando morango, tutti-frutti, e temperos de cozinha. De corpo leve, traz algumas notas doces no paladar, com 13,5% de álcool. A sopa de cenoura despertou as notas mais adocicadas do vinho, o que deve agradar quem tem o paladar mais doce. No capeletti, vinho e sopa foram em sentidos opostos e o caldo verde passou por cima da sopa.

O par do caldo verde

Tinto de Talha 2019 Alentejo, Portugal R$ 77, na Adega Alentejana Elaborado com as uvas trincadeira e castelão pela Segur Estates, é um tinto mais simples e rústico, com cor púrpura, notas florais e de frutas vermelhas e um toque de barro, como água em moringa. Apresenta corpo médico, com taninos mais intensos, maior rusticidade, final curto com 13,5% de álcool. Vinho e sopa de cenoura não casaram, um anulando o sabor do outro. Com o capeletti, o tinto não brigou, mas também não se destacou. Mas combinou bastante com o caldo verde, talvez pelo encontro de seus taninos com o paio, convidando a uma nova colherada, ou pela lógica da harmonização regional, de que as receitas e os vinhos locais combinam entre si.

Tinto de Talha 2019, do Alentejo. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Vinyes Ocults Malbec COT 2020 Vale de Uco, Argentina R$ 170, na Boca a Boca Vinhos A aposta foi em um malbec de maceração carbônica (com cachos em um tanque fechado), mais refrescante e menos intenso do que os malbecs de fermentação tradicional. De coloração púrpura, apresenta notas de frutas negras, com muita acidez, como a de um limão, tem corpo de média intensidade, com taninos bem macios e 14% de álcool. Com a sopa de cenoura, não houve encontro, cada um para um lado. Com o capeletti, a boa acidez do vinho ajudou a balancear a gordura da receita, mas o tinto ficou mais tânico. E combinou deliciosamente com o caldo verde, com a carne de porco envolvendo os taninos e deixando-os ainda mais macios.

Cordilheira de Sant’Ana Merlot 2010 Campanha gaúcha, Brasil R$ 99, na Alvino O representante nacional traz aromas de fruta negra (amoras) mesclada com notas de madeira e um toque empireumático. No paladar, corpo médio, uma leve acidez em destaque, persistência média e 12,6% de álcool. O vinho se mostrou encorpado para a sopa de cenoura, anulando o seu sabor. Com o capeletti, o vinho pareceu mais tânico do que era, talvez porque a temperatura da comida também influencia na harmonização, destacando algumas características da bebida, como o álcool e os taninos. Houve uma sútil combinação com o caldo verde: os dois se completaram no paladar, mas sem tornar a harmonização brilhante.

Melhor tentar outra receita

Pfaffmann Riesling Trocken 2020 Pfalz, Alemanha R$159, na Weinkeller Típico riesling alemão, com notas minerais e petroláceas no nariz e um toque de maça verde, elaborado pelos princípios orgânicos, com 13% de álcool. Tem muita acidez, daquelas que faz salivar, e corpo médio. Suas características não casaram com as sopas. Com a de cenoura, a sensação no paladar é que a sopa foi para um lado e o vinho para outro. Não brigaram, mas não combinaram. O capeletti se mostrou muito potente, escondendo o vinho. E o caldo verde trouxe uma sensação de doçura ao vinho.

Petit-Chablis Jean Bouchard 2020 Chablis, França R$ 199, no Saint Marché  Gostoso chardonnay sem passagem por madeira, com corpo leve, notas aromáticas que lembram cítricos, maças verdes e um damasco no final de boca, além do esperado toque mineral. De corpo leve para médio, acidez bem colocada e pouca persistência, com 12,5% de álcool. Ensaiou um casamento com a sopa de cenoura, mas depois faltou corpo ao vinho. Teve comportamento semelhante ao riesling nas outras duas harmonizações, indicando que brancos mais leves podem sopas também levinhas. Certamente casaria com receitas como sopa de cebola.

Pour Ma Gueule 2018 Itata, Chile R$ 111, na World Wine Tinto de cor rubi mais clara, translúcida, com notas de cerejas frescas, um toque terroso. Com corpo leve para médio, traz boa acidez, com 14% de álcool. Com a receita de cenoura, foram cada um para um lado. O capeletti tinha mais corpo que o vinho e o tinto pareceu mais alcoólico e doce. O caldo verde foi aquela combinação que não compromete, mas que também não há uma função de sabores.

Se não fosse pela deliciosa sopa de tartaruga, harmonizada com jerez, no filme “A festa de Babette”, a resposta seria que os dois – sopa e vinho – são líquidos demais para uma harmonização gastronômica dar certo. Na teoria, não há muitas indicações para combinar uma fumegante sopa com brancos, tintos e até amontilhados, como aconteceu neste clássico filme de 1987. Na prática, no entanto, o conceito muda e, acredite, tem sopa que melhora com o vinho.

Harmonização incluiu 12 vinhos e três sopas: os clássicos capelete in brodo e caldo verde e uma sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Esta foi a boa surpresa da harmonização que incluiu três sopas e 12 vinhos. Os clássicos capeletti in brodo e caldo verde e a mais contemporânea sopa de cenoura com gengibre, em receita da rede Dona Deôla, foram degustadas com mais diversos estilos de vinho. Espumante, brancos, rosés, tintos e até o amontillado – vinho fortificado inspirado no filme que eternizou o casamento deste estilo de jerez com os caldos de inverno – foram testados neste painel.

O jerez, já adiantamos, foi o vinho que melhor casou com a sopa, mas aqui há um problema de logística: com a bagunça de fretes internacionais, reflexo do fechamento de mercados pela pandemia, e também com a invasão da Ucrânia pela Rússia, não está fácil encontrar amontillado (o estilo de Jerez que perde a sua capa de leveduras enquanto envelhece em barricas e começa a sofrer a ação do oxigênio) no mercado brasileiro. Assim, o estoque de garrafas do jerez degustado nesta prova é baixo na importadora Belle Cave e a previsão é de um novo lote apenas na metade do segundo semestre.

Na degustação, ficou claro que alguns estilos de vinho favorecem à harmonização com os caldos. O espumante, por exemplo. Escolhemos uma garrafa da categoria Sur Lie, que chega ao mercado ainda com o que restou das leveduras e, por isso, tem mais aromas de fermentação. Estas notas fizeram o papel daquele pãozinho que acompanha a sopa, num gostoso casamento à mesa.

A degustação foi realizada pela colunista Suzana Barelli e pelo especialista Felipe Campos. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Nos brancos, entre as três opções, o destaque foi para aquele que tinha passagem por barrica de carvalho (informação em geral presente no contrarrótulo). A maior, digamos, cremosidade do vinho combinou com a textura das sopas também mais cremosas, indicando que deve casar também com outras receitas mais cremosas, como sopa de abóbora, de mandioquinha etc. Assim como nas receitas com ingredientes mais sólidos, os brancos casam melhor com sopas mais leves, com legumes e provavelmente pescados como ingredientes principais. 

Sopas de carne, por sua vez, pedem tintos. Mas os tintos mais leves e menos alcoólicos foram melhores do que os mais encorpados – e isso que nem foi colocado à prova um cabernet sauvignon ou um tannat, em geral mais potentes e muito consumidos no inverno. Na degustação, um tinto italiano, elaborado com a uva barbera, se destacou, comprovando a vocação dos rótulos italianos para a comida.

Na logística da degustação, o especialista Felipe Campos, professor da The Wine School, e a jornalista Suzana Barelli, colunista de vinhos do Paladar, primeiro provaram os vinhos separadamente e, depois, degustaram as sopas, anotando as características da comida e da bebida. Em um segundo momento, foi provada cada sopa com cada um dos 12 vinhos, analisando a sensação no paladar a cada colherada. As receitas foram preparadas pela Dona Deôla, rede de padarias em São Paulo que tem um buffet de sopas durante todo o inverno. 

As melhores harmonizações

Sanchez Romate Amontillado Jerez, Espanha R$ 331, na Belle Cave (estoque pequeno e previsão de chegar nova remessa em setembro) Elaborado com a uva palomino fino, no sistema de soleras e criaderas de Jerez, este fortificado traz notas de frutas secas, um toque oxidativo e outro salgado. Com corpo médio, é mais cremoso, com boa acidez e 19% de álcool. Casou com a sopa de cenoura com gengibre, pela cremosidade e também pelo teor alcóolico, que parece deixar o prato mais confort-food. Combinou com o capeletti, com os dois, prato e bebida, com o mesmo “peso”, e também com o caldo-verde, com a sua acidez equilibrando a gordura da receita.

Jerez Sanchez Romate Amontillado. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Ricossa Barbera D’Asti 2019 Piemonte, Itália R$ 131,90, na Grand Cru De cor rubi, traz notas de frutas vermelhas frescas no nariz, com um toque de madeira. De corpo médio, com taninos bem integrados, bela acidez, e um tostadinho no final, com 13,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o tinto não brigou, mas também não brilhou. Foi bem o casamento com o capeletti, com a acidez do vinho combinando com a gordura da sopa; e casou com o caldo verde, mesmo a sopa tendo deixado o vinho um pouco doce.

O brasileiro Valduga Sur Lie fez boa companhinha à sopa de cenoura com gengibre. Foto: Taba Benedicto/Estadão

O par da sopa de cenoura com gengibre

Valduga Sur Lie Vale dos Vinhedos, Brasil R$ 85,50, na Casa Valduga O espumante traz as notas de levedura nos aromas, lembrando panificação, com toques cítricos e de maça verde. Tem corpo médio, bom frescor e 12,5% de álcool. Com a sopa de cenoura, o espumante funciona bem como o pãozinho que acompanha a receita, completando o sabor. Com o caldo verde, a sua acidez combinou com a gordura da receita, mas faltou ao espumante um pouco mais de corpo para acompanhar a sopa. O capeletti brilhou, apagando o vinho e deixando-o apenas um líquido insosso na boca.

Valduga Sur Lie. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Montes Classic Series Reserva Chardonnay 2019 Vale Central, Chile R$ 121,05, na Mistral Chardonnay com boa tipicidade, notas cítricas e frutas tropicais (melão) e algo de torta de marmelo, com leve tostado no nariz. Corpo médio, cremoso no paladar, com notas de baunilha e acidez mais baixa, com 13,5% de álcool. Com estas características, combinou muito bem com a sopa de cenoura, indicando um bom casamento. Com maior estrutura, a expectativa era que combinasse com as demais receitas, mas a harmonização acabou trazendo um amargor no paladar com os dois outros pratos.

Les Galuches Chinon 2020 Loire, França R$ 189, na De la Croix Cabernet Franc elaborado pela domaine Wilfrid Rousse, de cor púrpura mais escura, traz aromas de frutas negras (como amoras), mescladas com especiarias. Muito equilibrado no paladar, com taninos macios, persistência média e 12,5% de álcool. Logo na primeira garfada, o vinho logo deixou a sopa de cenoura mais delicada, prazerosa. Com o capeletti, o vinho se fez mais presente do que a sopa no paladar; enquanto para o caldo verde foi exatamente o contrário, com o vinho perdendo espaço frente à receita.

Les Galuches Chinon 2020. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Chateau de Pourcieux 2020 Côtes de Provence, França R$ 130, na Cantu De coloração rosa claro, este rosé se destaca pelas muitas notas de frutas vermelhas, lembrando morango, tutti-frutti, e temperos de cozinha. De corpo leve, traz algumas notas doces no paladar, com 13,5% de álcool. A sopa de cenoura despertou as notas mais adocicadas do vinho, o que deve agradar quem tem o paladar mais doce. No capeletti, vinho e sopa foram em sentidos opostos e o caldo verde passou por cima da sopa.

O par do caldo verde

Tinto de Talha 2019 Alentejo, Portugal R$ 77, na Adega Alentejana Elaborado com as uvas trincadeira e castelão pela Segur Estates, é um tinto mais simples e rústico, com cor púrpura, notas florais e de frutas vermelhas e um toque de barro, como água em moringa. Apresenta corpo médico, com taninos mais intensos, maior rusticidade, final curto com 13,5% de álcool. Vinho e sopa de cenoura não casaram, um anulando o sabor do outro. Com o capeletti, o tinto não brigou, mas também não se destacou. Mas combinou bastante com o caldo verde, talvez pelo encontro de seus taninos com o paio, convidando a uma nova colherada, ou pela lógica da harmonização regional, de que as receitas e os vinhos locais combinam entre si.

Tinto de Talha 2019, do Alentejo. Foto: Taba Benedicto/Estadão

Vinyes Ocults Malbec COT 2020 Vale de Uco, Argentina R$ 170, na Boca a Boca Vinhos A aposta foi em um malbec de maceração carbônica (com cachos em um tanque fechado), mais refrescante e menos intenso do que os malbecs de fermentação tradicional. De coloração púrpura, apresenta notas de frutas negras, com muita acidez, como a de um limão, tem corpo de média intensidade, com taninos bem macios e 14% de álcool. Com a sopa de cenoura, não houve encontro, cada um para um lado. Com o capeletti, a boa acidez do vinho ajudou a balancear a gordura da receita, mas o tinto ficou mais tânico. E combinou deliciosamente com o caldo verde, com a carne de porco envolvendo os taninos e deixando-os ainda mais macios.

Cordilheira de Sant’Ana Merlot 2010 Campanha gaúcha, Brasil R$ 99, na Alvino O representante nacional traz aromas de fruta negra (amoras) mesclada com notas de madeira e um toque empireumático. No paladar, corpo médio, uma leve acidez em destaque, persistência média e 12,6% de álcool. O vinho se mostrou encorpado para a sopa de cenoura, anulando o seu sabor. Com o capeletti, o vinho pareceu mais tânico do que era, talvez porque a temperatura da comida também influencia na harmonização, destacando algumas características da bebida, como o álcool e os taninos. Houve uma sútil combinação com o caldo verde: os dois se completaram no paladar, mas sem tornar a harmonização brilhante.

Melhor tentar outra receita

Pfaffmann Riesling Trocken 2020 Pfalz, Alemanha R$159, na Weinkeller Típico riesling alemão, com notas minerais e petroláceas no nariz e um toque de maça verde, elaborado pelos princípios orgânicos, com 13% de álcool. Tem muita acidez, daquelas que faz salivar, e corpo médio. Suas características não casaram com as sopas. Com a de cenoura, a sensação no paladar é que a sopa foi para um lado e o vinho para outro. Não brigaram, mas não combinaram. O capeletti se mostrou muito potente, escondendo o vinho. E o caldo verde trouxe uma sensação de doçura ao vinho.

Petit-Chablis Jean Bouchard 2020 Chablis, França R$ 199, no Saint Marché  Gostoso chardonnay sem passagem por madeira, com corpo leve, notas aromáticas que lembram cítricos, maças verdes e um damasco no final de boca, além do esperado toque mineral. De corpo leve para médio, acidez bem colocada e pouca persistência, com 12,5% de álcool. Ensaiou um casamento com a sopa de cenoura, mas depois faltou corpo ao vinho. Teve comportamento semelhante ao riesling nas outras duas harmonizações, indicando que brancos mais leves podem sopas também levinhas. Certamente casaria com receitas como sopa de cebola.

Pour Ma Gueule 2018 Itata, Chile R$ 111, na World Wine Tinto de cor rubi mais clara, translúcida, com notas de cerejas frescas, um toque terroso. Com corpo leve para médio, traz boa acidez, com 14% de álcool. Com a receita de cenoura, foram cada um para um lado. O capeletti tinha mais corpo que o vinho e o tinto pareceu mais alcoólico e doce. O caldo verde foi aquela combinação que não compromete, mas que também não há uma função de sabores.

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