Quem disse que churrasco é coisa só de homem? Apesar de ser considerado um ambiente tipicamente masculino, nos últimos anos, não foram poucas as mulheres que conseguiram se colocar em pé de igualdade aos homens quando se fala em comandar a grelha. Mas ainda que em menor escala, as chefs assadoras já são muitas e cada vez mais se impõem, mostrando técnica e maestria no manejo das carnes e das churrasqueiras.Quer conhecer algumas delas? Paladar selecionou cinco chefs assadoras que têm muito a dizer sobre a profissão, machismo e claro, a paixão pela carne.
LIGIA KARAZAWA
A especialidade da chef assadora Ligia Karazawa é o churrasco japonês, feito por ela com a carne de gado Wagyu, raça asiática que tem criadores no Brasil. A escolha por essa modalidade, conta, é creditada às suas raízes. “Por isso mesmo, procurei sempre imprimir uma certa identidade ao meu trabalho como assadora.” Dona de um currículo estrelado, Lígia passou por algumas dos restaurantes mais renomados da Europa. E foi na Espanha que seu interesse pelos grelhados começou. “Eles têm uma uma ligação muito próxima da brasa. Não só com as Chuletas, mas também com a própria Paella, que originalmente é feita dessa maneira. De volta ao Brasil, Ligia foi responsável montar, no empório Eataly, o Brace (brasa em italiano) e ali também comandou uma série de eventos na rua, sempre com carne assada na brasa. Lígia adora a combinação clássica de churrasco com cerveja, mas acha que o prato cabe em qualquer ocasião e combina com tudo. “Outro dia eu fiz evento chiquérrimo onde o churrasco foi servido com acompanhamentos como Abóbora Cabotiá Assada com Manteiga de Ervas e Beterraba com Sour Cream de Limão e harmonizado com champanhe francês. Foi uma vivência bem diferente, ficou incrível”, diz. “Isso só prova que temos que abrir a mente, inclusive para churrascos de outras nacionalidades, como o coreano”.
PAULA LABAKI
Quando se fala em churrasco feito por mulheres, Paula Labaki é um dos primeiros nomes mais conhecidos. Nascida e criada em uma fazenda no interior de São Paulo, ela sempre acompanhou o pai nos churrascos e conta que, desde que começou a trabalhar com gastronomia, a praça das carnes sempre a fascinou. Dali para estudar e se aperfeiçoar, foi um pulo. Hoje, além de apresentar um programa sobre o assunto, o Direto da Brasa, do canal Sabor & Arte, ela leva o churrasco brazilian style por festivais mundo afora. “O Brasil é visto como a terra do churrasco e é lindo ver a cara dos gringos comendo nosso churrasco com uma bela farofa e vinagrete. Eles ficam loucos”, conta. Mãe e avó de duas crianças, Paula diz ser gratificante ver que há cada vez mais mulheres assadoras. “É uma profissão que exige foco, determinação, preparo e estudo. Não é uma rotina fácil, são horas e horas em pé ao lado de um calor extremo”, reflete. “Muitas mulheres ainda se sentem intimidadas por ser um meio muito masculino, mas é importante vencer esse pensamento. Nosso lugar é onde queremos estar!”.
PRISCILA DEUS
“Com técnica, qualquer um pode fazer um churrasco. Mas tem sempre um toque final de cada um que vai trazer mais elegância”, diz a expert Priscila Deus, chef assadora do Pobre Juan, para quem a profissão aconteceu quase por acaso. “Quando eu me reunia com os amigos, eu sempre era escalada para tocar churrasqueira, mas nunca vi isso como uma profissão”, relembra. Antes de entrar neste universo, Priscila estagiou com o masterchef Érick Jacquin e, depois de se formar, rumou para a Espanha, onde trabalhou com confeitaria. “Mas descobri que, durante a madrugada, o chef reunia uma equipe para fazer a limpeza e os cortes. Eu pedi pra ajudar e logo peguei prática.” De lá, Priscila seguiu para a Inglaterra, onde teve sua primeira experiência de verdade com carnes. “Meu inglês era péssimo e eu tinha de escrever os nomes dos cortes num papelzinho para saber o que o chef queria”, confessa. Quando voltou ao Brasil, teve o primeiro contato com a defumação e chegou a produzir bacon e pastrami. Já mais madura, partiu para uma nova aventura em Londres, desta vez em um restaurante argentino. “Lembro de uma noite em que tive de cozinhar, sozinha, para 300 mesas. Fiquei tensa, mas dei conta e acabei sendo promovida a chef”, recorda. “Não gosto muito de falar que faço churrasco. Costumo dizer que eu trabalho com fogo. Isso me permite usar outros ingredientes, não só a carne bovina”, analisa.
CHURRAS DELAS
Aline Marinho e Joana Angélica se conheceram em 2016, quando participaram do reality BBQ Brasil - Churrasco na Brasa, exibido no SBT. Depois do programa, as duas juntaram seus conhecimentos e vontade de empreender e criaram o ChurrasDelas. Não demorou para a dupla começar a fazer eventos em cervejarias e bares. Com a experiência, três anos depois as duas já estavam rodando o Brasil, participando de festivais de churrasco. Aline conta que só depois do programa elas perceberam que as mulheres eram sim interessadas pelo tema. “Recebíamos muitas mensagens de gente que queria saber como começar na profissão mas não sabiam como. Pense: quantas vezes você foi a um churrasco e viu uma mulher no comando?”, indaga. Assim, a dupla que já tinha conhecimento técnico, correu atrás para aprender o lado gastronômico da coisa. Deu certo: parrilla argentina, parrilla uruguaia e defumação são algumas especialidades das duas, que descobriram um nicho não só para atuar, como também para dar cursos - até hoje, elas já ensinaram mais de 1000 alunas. As duas também criaram uma empresa de delivery de churrasco congelado, o Cozina Foods, onde empregam mulheres em vulnerabilidade social. “Nossa empresa é totalmente feminina, da parte administrativa até a produção. Quando a gente começou, não tínhamos muitas referências. Agora, quando as mulheres vêem outras mulheres com a mão na massa, elas ficam animadas. E quanto mais de nós nesse movimento, melhor”.
TATIANA BASSI
“Não tem jeito, eu sou apaixonada por fazer churrasco. Essa arte é minha vida”, diz Tatiana Bassi. A frase é o resultado de 50 anos de história, que começou com seu pai, o famoso açougueiro Marcos Bassi, que fazia churrasco à domicílio. “Desde pequena eu o acompanhava e ajudava a carregar carne, espeto e todos os utensílios. E como sempre fui apaixonada por essa arte, foi natural seguir por este caminho”, conta. Hoje, Tatiana é sócia-proprietária do Templo da Carne Marcos Bassi, único restaurante brasileiro citado no documentário Steak Revolution como um dos dez melhores do mundo em carnes. Multitarefa, ela participa de toda a operação da casa, seja na churrasqueira, na loja, ou na dark kitchen, supervisionando as entregas de delivery. Tatiana conta que no início, presenciou uma certa resistência à aceitação de mulheres no meio churrasqueiro. “Não quero generalizar, mas isso ainda existe. Mas acho que os homens estão entendendo que podemos agregar muito a este movimento”, conta ela, que percebe hoje uma maior receptividade, principalmente em eventos ligados ao tema, como o Churrascada. “O festival é uma virada de chave para a nova geração de assadoras. Tem muita mulher boa fazendo churrasco e outras tantas se interessando cada vez mais, querendo aprender e se inspirado no nosso trabalho. É um orgulho para nós“.