Ingredientes brasileiros estudados na cozinha

Não deixe o pêssego amadurecer: ainda verde, ele ganha novos sabores na compota


Técnica de conservação herdada pelos colonizadores amplia safra do pêssego e acentua seus sabores e aromas

Por Neide Rigo
Atualização:

Está aqui uma iguaria que poderia figurar naquelas lojas japonesas que vendem frutas a preço de joia. Aposto que muita gente pensou num doce fino, brilhante, com calda transparente, em pote de cristal e tal. Pensou certo, pode ser tudo isto, mas este doce caipira ainda não conquistou a fama fora da roça.

Sãos, gostosos e salvos. Pêssegos verdes foram colhidos de galhos de árvores perto de casa Foto: Neide Rigo|Estadão

A simples palavra roça ou caipira já faz descer alguns degraus tudo o que temos de melhor no campo. Aliás, campo, campanha, camponês, campestre só soam melhor porque nos remete ao ambiente europeu. Mas, quando nos livrarmos dos preconceitos e principalmente das jequices, vamos descobrir que alguns de nossos pitéus caipiras não perdem em nada para especialidades europeias. Está certo que ganham em açúcar, mas isto dá para corrigir.

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Mesmo porque muito do que temos hoje na culinária caipira tem mãos imigrantes por trás. Caso do pêssego, a começar pela planta (Prunus persica, L.), originária da Ásia e trazida pra cá pelos colonizadores, e terminando pelos preparos. Afinal, não consta de nosso arsenal indígena conservar frutas em caldas de açúcar.

Só quem já passou por guerras e frios infrutuosos pensaria em conservar frutas assim, ainda mais sendo verdes. Comer o que tem e depois o que vem, este é o lema em terras de fartura de frutas e clima generoso. Nas cidades grandes, sim, vamos encontrar frutas de todos os lugares em todas as épocas, mas na roça frutas passaram a ser conservadas em caldas para os períodos de entressafra e também porque é um jeito de aproveitar frutas em estágios não apreciados para o consumo in natura, ampliando a duração da safra e evitando desperdício quando todas as frutas parecem combinar de amadurecer ao mesmo tempo. Assim, figo, pêssego, manga e mamão, principalmente, costumam ser usados para doces em calda, pastosos ou de corte.

Privilégio. Colheita farta é pura sorte de quem tem um pé de pêssego por perto Foto: Neide Rigo| Estadão
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E a técnica ficou não só por necessidade de conservação mas também pelo resultado desejado. Podemos preparar e comer a sobremesa imediatamente só pelo prazer de ter na boca o doce ácido, algo amargo, suculento e perfumado com a própria semente. Eu sou muito mais por uma compota do pêssego verde que do maduro.

No interior do Paraná, no sítio dos meus avós e na casa de vários parentes e conhecidos, os vidros cheios de pêssego verde coincidiam com as férias em época de Natal. A intenção de ampliar a safra, de chegar antes dos passarinhos e ainda dispor de sobremesa deliciosa sempre foi muito clara, mas também pode ter surgido para evitar o desperdício dos pêssegos pequenos que às vezes são colhidos e descartados ainda verdes para melhorar a qualidade das frutas mais promissoras. 

É isto o que acontece com pequenos pêssegos japoneses, estes sim vendidos atualmente como raridade. Só começou recentemente a gourmetização desses pesseguinhos chamados de wakamomo, antes descartados durante a primavera nos pomares em torno de Fukushima e Kyoto para aprimorar as frutas que seriam colhidas no verão. Colhidos ainda mais miúdos do que de costume por aqui, eles hoje são cozidos em xarope de açúcar e servidos como iguaria.

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Os nossos ainda são privilégios dos que têm um pé de pêssego por perto. Estes meus foram pura sorte. Claro que todos os anos eu colho uma pequena quantidade deles numa praça perto de casa (imagino que já tenha se acostumado com esta notícia), porém desta vez a colheita foi mais farta. Para falar a verdade, colhi todas as frutas do pé. Não se assuste com a ruindade de não ter deixado nada para os passarinhos ou transeuntes. Ao meu favor tenho a dizer que o pequeno pessegueiro foi atropelado por uma figueira que se esborrachou no chão depois de uma tempestade. Colhi todos os pêssegos dos galhos mutilados no dia seguinte e aqui estão eles sãos, gostosos e salvos.

Compota de pêssego verde. Doce pronto pode ser servido puro ou acompanhado de sorvete, nata, creme batido, iogurte Foto: Neide Rigo| Estadão

O preparo tem poucos segredos e um deles é que a película tem que ser retirada para que a calda encharque bem a polpa – confira a receita aqui. O outro é que não deve levar nem cravo nem canela e isto aprendi com Dona Olga, minha mãe. É que o tempero vem da própria semente, que não é descartada – nem engolida. É que, como outras frutas da família das rosáceas, as sementes do pêssego têm a mesma substância aromática que dá sabor às amêndoas amargas, às cerejas e às sementes da nêspera, por exemplo. E é aí que está a grande atração deste doce.

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Então, agora é só ir atrás de produtores a quem possa encomendar frutas ainda verdes. A polpa deve estar bem verde e dura. Com o doce pronto, basta servir puro com a calda ou com uma colherada de sorvete, nata, creme batido, iogurte ou usar para fazer receitas que faria com a compota de pêssego maduro. E nhac!

Está aqui uma iguaria que poderia figurar naquelas lojas japonesas que vendem frutas a preço de joia. Aposto que muita gente pensou num doce fino, brilhante, com calda transparente, em pote de cristal e tal. Pensou certo, pode ser tudo isto, mas este doce caipira ainda não conquistou a fama fora da roça.

Sãos, gostosos e salvos. Pêssegos verdes foram colhidos de galhos de árvores perto de casa Foto: Neide Rigo|Estadão

A simples palavra roça ou caipira já faz descer alguns degraus tudo o que temos de melhor no campo. Aliás, campo, campanha, camponês, campestre só soam melhor porque nos remete ao ambiente europeu. Mas, quando nos livrarmos dos preconceitos e principalmente das jequices, vamos descobrir que alguns de nossos pitéus caipiras não perdem em nada para especialidades europeias. Está certo que ganham em açúcar, mas isto dá para corrigir.

Mesmo porque muito do que temos hoje na culinária caipira tem mãos imigrantes por trás. Caso do pêssego, a começar pela planta (Prunus persica, L.), originária da Ásia e trazida pra cá pelos colonizadores, e terminando pelos preparos. Afinal, não consta de nosso arsenal indígena conservar frutas em caldas de açúcar.

Só quem já passou por guerras e frios infrutuosos pensaria em conservar frutas assim, ainda mais sendo verdes. Comer o que tem e depois o que vem, este é o lema em terras de fartura de frutas e clima generoso. Nas cidades grandes, sim, vamos encontrar frutas de todos os lugares em todas as épocas, mas na roça frutas passaram a ser conservadas em caldas para os períodos de entressafra e também porque é um jeito de aproveitar frutas em estágios não apreciados para o consumo in natura, ampliando a duração da safra e evitando desperdício quando todas as frutas parecem combinar de amadurecer ao mesmo tempo. Assim, figo, pêssego, manga e mamão, principalmente, costumam ser usados para doces em calda, pastosos ou de corte.

Privilégio. Colheita farta é pura sorte de quem tem um pé de pêssego por perto Foto: Neide Rigo| Estadão

E a técnica ficou não só por necessidade de conservação mas também pelo resultado desejado. Podemos preparar e comer a sobremesa imediatamente só pelo prazer de ter na boca o doce ácido, algo amargo, suculento e perfumado com a própria semente. Eu sou muito mais por uma compota do pêssego verde que do maduro.

No interior do Paraná, no sítio dos meus avós e na casa de vários parentes e conhecidos, os vidros cheios de pêssego verde coincidiam com as férias em época de Natal. A intenção de ampliar a safra, de chegar antes dos passarinhos e ainda dispor de sobremesa deliciosa sempre foi muito clara, mas também pode ter surgido para evitar o desperdício dos pêssegos pequenos que às vezes são colhidos e descartados ainda verdes para melhorar a qualidade das frutas mais promissoras. 

É isto o que acontece com pequenos pêssegos japoneses, estes sim vendidos atualmente como raridade. Só começou recentemente a gourmetização desses pesseguinhos chamados de wakamomo, antes descartados durante a primavera nos pomares em torno de Fukushima e Kyoto para aprimorar as frutas que seriam colhidas no verão. Colhidos ainda mais miúdos do que de costume por aqui, eles hoje são cozidos em xarope de açúcar e servidos como iguaria.

Os nossos ainda são privilégios dos que têm um pé de pêssego por perto. Estes meus foram pura sorte. Claro que todos os anos eu colho uma pequena quantidade deles numa praça perto de casa (imagino que já tenha se acostumado com esta notícia), porém desta vez a colheita foi mais farta. Para falar a verdade, colhi todas as frutas do pé. Não se assuste com a ruindade de não ter deixado nada para os passarinhos ou transeuntes. Ao meu favor tenho a dizer que o pequeno pessegueiro foi atropelado por uma figueira que se esborrachou no chão depois de uma tempestade. Colhi todos os pêssegos dos galhos mutilados no dia seguinte e aqui estão eles sãos, gostosos e salvos.

Compota de pêssego verde. Doce pronto pode ser servido puro ou acompanhado de sorvete, nata, creme batido, iogurte Foto: Neide Rigo| Estadão

O preparo tem poucos segredos e um deles é que a película tem que ser retirada para que a calda encharque bem a polpa – confira a receita aqui. O outro é que não deve levar nem cravo nem canela e isto aprendi com Dona Olga, minha mãe. É que o tempero vem da própria semente, que não é descartada – nem engolida. É que, como outras frutas da família das rosáceas, as sementes do pêssego têm a mesma substância aromática que dá sabor às amêndoas amargas, às cerejas e às sementes da nêspera, por exemplo. E é aí que está a grande atração deste doce.

Então, agora é só ir atrás de produtores a quem possa encomendar frutas ainda verdes. A polpa deve estar bem verde e dura. Com o doce pronto, basta servir puro com a calda ou com uma colherada de sorvete, nata, creme batido, iogurte ou usar para fazer receitas que faria com a compota de pêssego maduro. E nhac!

Está aqui uma iguaria que poderia figurar naquelas lojas japonesas que vendem frutas a preço de joia. Aposto que muita gente pensou num doce fino, brilhante, com calda transparente, em pote de cristal e tal. Pensou certo, pode ser tudo isto, mas este doce caipira ainda não conquistou a fama fora da roça.

Sãos, gostosos e salvos. Pêssegos verdes foram colhidos de galhos de árvores perto de casa Foto: Neide Rigo|Estadão

A simples palavra roça ou caipira já faz descer alguns degraus tudo o que temos de melhor no campo. Aliás, campo, campanha, camponês, campestre só soam melhor porque nos remete ao ambiente europeu. Mas, quando nos livrarmos dos preconceitos e principalmente das jequices, vamos descobrir que alguns de nossos pitéus caipiras não perdem em nada para especialidades europeias. Está certo que ganham em açúcar, mas isto dá para corrigir.

Mesmo porque muito do que temos hoje na culinária caipira tem mãos imigrantes por trás. Caso do pêssego, a começar pela planta (Prunus persica, L.), originária da Ásia e trazida pra cá pelos colonizadores, e terminando pelos preparos. Afinal, não consta de nosso arsenal indígena conservar frutas em caldas de açúcar.

Só quem já passou por guerras e frios infrutuosos pensaria em conservar frutas assim, ainda mais sendo verdes. Comer o que tem e depois o que vem, este é o lema em terras de fartura de frutas e clima generoso. Nas cidades grandes, sim, vamos encontrar frutas de todos os lugares em todas as épocas, mas na roça frutas passaram a ser conservadas em caldas para os períodos de entressafra e também porque é um jeito de aproveitar frutas em estágios não apreciados para o consumo in natura, ampliando a duração da safra e evitando desperdício quando todas as frutas parecem combinar de amadurecer ao mesmo tempo. Assim, figo, pêssego, manga e mamão, principalmente, costumam ser usados para doces em calda, pastosos ou de corte.

Privilégio. Colheita farta é pura sorte de quem tem um pé de pêssego por perto Foto: Neide Rigo| Estadão

E a técnica ficou não só por necessidade de conservação mas também pelo resultado desejado. Podemos preparar e comer a sobremesa imediatamente só pelo prazer de ter na boca o doce ácido, algo amargo, suculento e perfumado com a própria semente. Eu sou muito mais por uma compota do pêssego verde que do maduro.

No interior do Paraná, no sítio dos meus avós e na casa de vários parentes e conhecidos, os vidros cheios de pêssego verde coincidiam com as férias em época de Natal. A intenção de ampliar a safra, de chegar antes dos passarinhos e ainda dispor de sobremesa deliciosa sempre foi muito clara, mas também pode ter surgido para evitar o desperdício dos pêssegos pequenos que às vezes são colhidos e descartados ainda verdes para melhorar a qualidade das frutas mais promissoras. 

É isto o que acontece com pequenos pêssegos japoneses, estes sim vendidos atualmente como raridade. Só começou recentemente a gourmetização desses pesseguinhos chamados de wakamomo, antes descartados durante a primavera nos pomares em torno de Fukushima e Kyoto para aprimorar as frutas que seriam colhidas no verão. Colhidos ainda mais miúdos do que de costume por aqui, eles hoje são cozidos em xarope de açúcar e servidos como iguaria.

Os nossos ainda são privilégios dos que têm um pé de pêssego por perto. Estes meus foram pura sorte. Claro que todos os anos eu colho uma pequena quantidade deles numa praça perto de casa (imagino que já tenha se acostumado com esta notícia), porém desta vez a colheita foi mais farta. Para falar a verdade, colhi todas as frutas do pé. Não se assuste com a ruindade de não ter deixado nada para os passarinhos ou transeuntes. Ao meu favor tenho a dizer que o pequeno pessegueiro foi atropelado por uma figueira que se esborrachou no chão depois de uma tempestade. Colhi todos os pêssegos dos galhos mutilados no dia seguinte e aqui estão eles sãos, gostosos e salvos.

Compota de pêssego verde. Doce pronto pode ser servido puro ou acompanhado de sorvete, nata, creme batido, iogurte Foto: Neide Rigo| Estadão

O preparo tem poucos segredos e um deles é que a película tem que ser retirada para que a calda encharque bem a polpa – confira a receita aqui. O outro é que não deve levar nem cravo nem canela e isto aprendi com Dona Olga, minha mãe. É que o tempero vem da própria semente, que não é descartada – nem engolida. É que, como outras frutas da família das rosáceas, as sementes do pêssego têm a mesma substância aromática que dá sabor às amêndoas amargas, às cerejas e às sementes da nêspera, por exemplo. E é aí que está a grande atração deste doce.

Então, agora é só ir atrás de produtores a quem possa encomendar frutas ainda verdes. A polpa deve estar bem verde e dura. Com o doce pronto, basta servir puro com a calda ou com uma colherada de sorvete, nata, creme batido, iogurte ou usar para fazer receitas que faria com a compota de pêssego maduro. E nhac!

Está aqui uma iguaria que poderia figurar naquelas lojas japonesas que vendem frutas a preço de joia. Aposto que muita gente pensou num doce fino, brilhante, com calda transparente, em pote de cristal e tal. Pensou certo, pode ser tudo isto, mas este doce caipira ainda não conquistou a fama fora da roça.

Sãos, gostosos e salvos. Pêssegos verdes foram colhidos de galhos de árvores perto de casa Foto: Neide Rigo|Estadão

A simples palavra roça ou caipira já faz descer alguns degraus tudo o que temos de melhor no campo. Aliás, campo, campanha, camponês, campestre só soam melhor porque nos remete ao ambiente europeu. Mas, quando nos livrarmos dos preconceitos e principalmente das jequices, vamos descobrir que alguns de nossos pitéus caipiras não perdem em nada para especialidades europeias. Está certo que ganham em açúcar, mas isto dá para corrigir.

Mesmo porque muito do que temos hoje na culinária caipira tem mãos imigrantes por trás. Caso do pêssego, a começar pela planta (Prunus persica, L.), originária da Ásia e trazida pra cá pelos colonizadores, e terminando pelos preparos. Afinal, não consta de nosso arsenal indígena conservar frutas em caldas de açúcar.

Só quem já passou por guerras e frios infrutuosos pensaria em conservar frutas assim, ainda mais sendo verdes. Comer o que tem e depois o que vem, este é o lema em terras de fartura de frutas e clima generoso. Nas cidades grandes, sim, vamos encontrar frutas de todos os lugares em todas as épocas, mas na roça frutas passaram a ser conservadas em caldas para os períodos de entressafra e também porque é um jeito de aproveitar frutas em estágios não apreciados para o consumo in natura, ampliando a duração da safra e evitando desperdício quando todas as frutas parecem combinar de amadurecer ao mesmo tempo. Assim, figo, pêssego, manga e mamão, principalmente, costumam ser usados para doces em calda, pastosos ou de corte.

Privilégio. Colheita farta é pura sorte de quem tem um pé de pêssego por perto Foto: Neide Rigo| Estadão

E a técnica ficou não só por necessidade de conservação mas também pelo resultado desejado. Podemos preparar e comer a sobremesa imediatamente só pelo prazer de ter na boca o doce ácido, algo amargo, suculento e perfumado com a própria semente. Eu sou muito mais por uma compota do pêssego verde que do maduro.

No interior do Paraná, no sítio dos meus avós e na casa de vários parentes e conhecidos, os vidros cheios de pêssego verde coincidiam com as férias em época de Natal. A intenção de ampliar a safra, de chegar antes dos passarinhos e ainda dispor de sobremesa deliciosa sempre foi muito clara, mas também pode ter surgido para evitar o desperdício dos pêssegos pequenos que às vezes são colhidos e descartados ainda verdes para melhorar a qualidade das frutas mais promissoras. 

É isto o que acontece com pequenos pêssegos japoneses, estes sim vendidos atualmente como raridade. Só começou recentemente a gourmetização desses pesseguinhos chamados de wakamomo, antes descartados durante a primavera nos pomares em torno de Fukushima e Kyoto para aprimorar as frutas que seriam colhidas no verão. Colhidos ainda mais miúdos do que de costume por aqui, eles hoje são cozidos em xarope de açúcar e servidos como iguaria.

Os nossos ainda são privilégios dos que têm um pé de pêssego por perto. Estes meus foram pura sorte. Claro que todos os anos eu colho uma pequena quantidade deles numa praça perto de casa (imagino que já tenha se acostumado com esta notícia), porém desta vez a colheita foi mais farta. Para falar a verdade, colhi todas as frutas do pé. Não se assuste com a ruindade de não ter deixado nada para os passarinhos ou transeuntes. Ao meu favor tenho a dizer que o pequeno pessegueiro foi atropelado por uma figueira que se esborrachou no chão depois de uma tempestade. Colhi todos os pêssegos dos galhos mutilados no dia seguinte e aqui estão eles sãos, gostosos e salvos.

Compota de pêssego verde. Doce pronto pode ser servido puro ou acompanhado de sorvete, nata, creme batido, iogurte Foto: Neide Rigo| Estadão

O preparo tem poucos segredos e um deles é que a película tem que ser retirada para que a calda encharque bem a polpa – confira a receita aqui. O outro é que não deve levar nem cravo nem canela e isto aprendi com Dona Olga, minha mãe. É que o tempero vem da própria semente, que não é descartada – nem engolida. É que, como outras frutas da família das rosáceas, as sementes do pêssego têm a mesma substância aromática que dá sabor às amêndoas amargas, às cerejas e às sementes da nêspera, por exemplo. E é aí que está a grande atração deste doce.

Então, agora é só ir atrás de produtores a quem possa encomendar frutas ainda verdes. A polpa deve estar bem verde e dura. Com o doce pronto, basta servir puro com a calda ou com uma colherada de sorvete, nata, creme batido, iogurte ou usar para fazer receitas que faria com a compota de pêssego maduro. E nhac!

Está aqui uma iguaria que poderia figurar naquelas lojas japonesas que vendem frutas a preço de joia. Aposto que muita gente pensou num doce fino, brilhante, com calda transparente, em pote de cristal e tal. Pensou certo, pode ser tudo isto, mas este doce caipira ainda não conquistou a fama fora da roça.

Sãos, gostosos e salvos. Pêssegos verdes foram colhidos de galhos de árvores perto de casa Foto: Neide Rigo|Estadão

A simples palavra roça ou caipira já faz descer alguns degraus tudo o que temos de melhor no campo. Aliás, campo, campanha, camponês, campestre só soam melhor porque nos remete ao ambiente europeu. Mas, quando nos livrarmos dos preconceitos e principalmente das jequices, vamos descobrir que alguns de nossos pitéus caipiras não perdem em nada para especialidades europeias. Está certo que ganham em açúcar, mas isto dá para corrigir.

Mesmo porque muito do que temos hoje na culinária caipira tem mãos imigrantes por trás. Caso do pêssego, a começar pela planta (Prunus persica, L.), originária da Ásia e trazida pra cá pelos colonizadores, e terminando pelos preparos. Afinal, não consta de nosso arsenal indígena conservar frutas em caldas de açúcar.

Só quem já passou por guerras e frios infrutuosos pensaria em conservar frutas assim, ainda mais sendo verdes. Comer o que tem e depois o que vem, este é o lema em terras de fartura de frutas e clima generoso. Nas cidades grandes, sim, vamos encontrar frutas de todos os lugares em todas as épocas, mas na roça frutas passaram a ser conservadas em caldas para os períodos de entressafra e também porque é um jeito de aproveitar frutas em estágios não apreciados para o consumo in natura, ampliando a duração da safra e evitando desperdício quando todas as frutas parecem combinar de amadurecer ao mesmo tempo. Assim, figo, pêssego, manga e mamão, principalmente, costumam ser usados para doces em calda, pastosos ou de corte.

Privilégio. Colheita farta é pura sorte de quem tem um pé de pêssego por perto Foto: Neide Rigo| Estadão

E a técnica ficou não só por necessidade de conservação mas também pelo resultado desejado. Podemos preparar e comer a sobremesa imediatamente só pelo prazer de ter na boca o doce ácido, algo amargo, suculento e perfumado com a própria semente. Eu sou muito mais por uma compota do pêssego verde que do maduro.

No interior do Paraná, no sítio dos meus avós e na casa de vários parentes e conhecidos, os vidros cheios de pêssego verde coincidiam com as férias em época de Natal. A intenção de ampliar a safra, de chegar antes dos passarinhos e ainda dispor de sobremesa deliciosa sempre foi muito clara, mas também pode ter surgido para evitar o desperdício dos pêssegos pequenos que às vezes são colhidos e descartados ainda verdes para melhorar a qualidade das frutas mais promissoras. 

É isto o que acontece com pequenos pêssegos japoneses, estes sim vendidos atualmente como raridade. Só começou recentemente a gourmetização desses pesseguinhos chamados de wakamomo, antes descartados durante a primavera nos pomares em torno de Fukushima e Kyoto para aprimorar as frutas que seriam colhidas no verão. Colhidos ainda mais miúdos do que de costume por aqui, eles hoje são cozidos em xarope de açúcar e servidos como iguaria.

Os nossos ainda são privilégios dos que têm um pé de pêssego por perto. Estes meus foram pura sorte. Claro que todos os anos eu colho uma pequena quantidade deles numa praça perto de casa (imagino que já tenha se acostumado com esta notícia), porém desta vez a colheita foi mais farta. Para falar a verdade, colhi todas as frutas do pé. Não se assuste com a ruindade de não ter deixado nada para os passarinhos ou transeuntes. Ao meu favor tenho a dizer que o pequeno pessegueiro foi atropelado por uma figueira que se esborrachou no chão depois de uma tempestade. Colhi todos os pêssegos dos galhos mutilados no dia seguinte e aqui estão eles sãos, gostosos e salvos.

Compota de pêssego verde. Doce pronto pode ser servido puro ou acompanhado de sorvete, nata, creme batido, iogurte Foto: Neide Rigo| Estadão

O preparo tem poucos segredos e um deles é que a película tem que ser retirada para que a calda encharque bem a polpa – confira a receita aqui. O outro é que não deve levar nem cravo nem canela e isto aprendi com Dona Olga, minha mãe. É que o tempero vem da própria semente, que não é descartada – nem engolida. É que, como outras frutas da família das rosáceas, as sementes do pêssego têm a mesma substância aromática que dá sabor às amêndoas amargas, às cerejas e às sementes da nêspera, por exemplo. E é aí que está a grande atração deste doce.

Então, agora é só ir atrás de produtores a quem possa encomendar frutas ainda verdes. A polpa deve estar bem verde e dura. Com o doce pronto, basta servir puro com a calda ou com uma colherada de sorvete, nata, creme batido, iogurte ou usar para fazer receitas que faria com a compota de pêssego maduro. E nhac!

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