O que têm em comum o injera etíope, os hoppers do Sri Lanka, os idlis e dosas indianos com os manauês de fubá de arroz e abóbora do Vale do Paraíba e os bolos de arroz do Centro-Oeste? Todos são pães chatos ou bolos sem trigo e levedados naturalmente. Com exceção do injera, feito com farinha de teff (um grão miúdo como painço), os outros são de arroz.
Quando se pensa em levedar massas, é difícil fugir das cadeias de glúten – proteína presente especialmente no trigo, mas também no centeio, na aveia e na cevada, responsável pela elasticidade da farinha e pelo aprisionamento das bolhas de gás carbônico formado na fermentação. Mas os preparos à base de arroz provam que o trigo nem sempre foi onipresente. Nem o fermento químico, principal benfeitor dos bolos fofos.
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A maciez é conferida pela levedura Saccharomyces cerevisiae, presente naturalmente na farinha de trigo e no fermento, mas também no arroz.
As leveduras obtêm energia através do açúcar, gerando álcool e gás carbônico que transformam o mingau liso em massa volumosa e cheia de bolhas. Mas não é só. Durante a fermentação, ocorrem processos enzimáticos que inibem o desenvolvimento de micro-organismos indesejados, aumentam o sabor e o valor nutricional.
Variações. O bolo também fica simpático em forminhas menores. FOTOS: Tiago Queiroz/Estadão
Embora já houvesse arroz nativo no Brasil, no Pantanal, a espécie que comemos no dia a dia (Oriza sativa) veio da Ásia. E o arroz vermelho (O. glaberrima) consumido especialmente no Nordeste, mas também no Sul entre os quilombolas, é originário da África Ocidental.
Assim, não se sabe exatamente onde surgiu o bolo feito com arroz branco do Centro-Oeste, assado em folhas de bananeira. O fato é que, dependendo do lugar, das posses ou do gosto da cozinheira, a receita pode levar coco e queijo, ou, simplesmente, os ingredientes de todo bolo, como ovos, açúcar, manteiga e leite ou coalhada.
Os bolinhos do Vale do Paraíba, chamados de manauê, cuja receita está no livro do No Fundo do Tacho, de João Rural, levam, além de fubá de arroz, abóbora cozida e banha.
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Assim como o levain de trigo, uma parte desse fermento pode ser guardada para o próximo bolo, apressando o processo que pode demorar até três dias, dependendo da temperatura ambiente. No passado, o bolo era feito em cuias que nunca eram lavadas para conservar as leveduras. Tigelas de madeira ou cerâmica não esmaltada também funcionam bem para esse fim.
Em variações testadas e aprovadas, o liquidificador foi usado em vez do pilão para triturar o arroz; o kefir entrou no lugar da coalhada, pois apressa a fermentação; e a massa foi aproveitada para fazer panquecas.
Ter um alimento fermentando na cozinha faz você acordar curioso para conferir se a própria criação também já se levantou. Se sim, é só completar a receita, levar ao forno, de preferência em forma forrada com folha de bananeira, e se preparar para sentir o perfume.