O encontro da gastronomia com a sustentabilidade

Confundimos ter potencial gastronômico com ser de fato uma potência


Com uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis e um arsenal de ingredientes únicos, passamos a ignorar nossa realidade gastronômica, que ainda é a do pavê

Por Roberto Smeraldi
Atualização:

Éramos o país do molho golf, do estrogonofe, do pavê. Do feijão torrado no café, por sua vez rigorosamente em garrafa térmica. Onde a resposta a “importado ou nacional?” iria classificar o freguês. Um dia alguém nos contou que temos um arsenal de ingredientes únicos no mundo, lá por matos variados, e acreditamos. Meio ufanisticamente, mesmo sem saber exatamente o que isso implicaria.

Apareceram uns meninos que voltaram de viagens e estágios no exterior com entusiasmo e disposição. Surgiu uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis. Uns produtinhos bacanas se infiltraram em gôndolas e bancas de feira. Chegamos a ser ocasionalmente revolucionários: até demos um jeito de comer queijo da Canastra em São Paulo, de vez em quando. Via de regra, agora tomamos café de café, e ainda fresquinho.

  Foto: Amanda Perobelli|Estadão
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Daí passamos a confundir ter potencial com ser potência. Temos vergonha do molho golf e convicção de ter conquistado o mundo. Alguns acham que o conquistamos vendendo soja para quem a transforma em presunto cru. Outros, que o conquistamos com tecnologias autóctones geniais, como a tapioquinha. Óbvio, sempre aparecem estraga-prazeres lembrando que há até tapioca que importamos da Ásia.

Enquanto isso, você viaja pelo Brasil e a realidade aponta infindáveis sobremesas de leite condensado. Churrascos em que a brasa só existe para finalizar e torrar carnes já bem passadas por quilos de sal. Restaurantes nos quais, ao pedir pimenta, lhe trazem tabasco. Risotto que virou acompanhamento, e por isso mesmo mais se parece com purê. Feiras onde a banca de peixe é dominada por salmão e tilápia. Cozinhas exalando odor de margarina. Tacacá com tucupi de glutamato e tartrazina. Enquanto uma legião de influenciadores comemora nossos novos clichês.

Vide o lema do JK, dos cinquenta anos em cinco, só que agora na cozinha. Bastou nos livrarmos do estrogonofe, até mesmo na memória, e já tivemos certeza de ter pulado para o futuro. Esquecemos que uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis também existe em um bairro de Bilbao, Turim ou Cingapura. Que é muito chato e demorado classificar duas mil variedades de cacau, e pior ainda decidir o que fazer com cada uma delas. Que formação do gosto começa quando criança e leva gerações para ter efeito. Enquanto isso, em sete semanas pode-se virar cozinheiro de Instagram.

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Se por acaso um viajante estrangeiro farejar que os novos clichês têm um quê de provinciano, antes de regional; de cafona, antes de caipira; de populista, antes de popular... bem, temos certeza que deve ser porque ele se deparou com um danado de pavê sobrevivente em algum canto. Pois a culpa é, claro, do pavê. Ganha assim novo sentido o bordão inevitável daquele tio no fim do almoço: “mas é pa vê ou...”.

Éramos o país do molho golf, do estrogonofe, do pavê. Do feijão torrado no café, por sua vez rigorosamente em garrafa térmica. Onde a resposta a “importado ou nacional?” iria classificar o freguês. Um dia alguém nos contou que temos um arsenal de ingredientes únicos no mundo, lá por matos variados, e acreditamos. Meio ufanisticamente, mesmo sem saber exatamente o que isso implicaria.

Apareceram uns meninos que voltaram de viagens e estágios no exterior com entusiasmo e disposição. Surgiu uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis. Uns produtinhos bacanas se infiltraram em gôndolas e bancas de feira. Chegamos a ser ocasionalmente revolucionários: até demos um jeito de comer queijo da Canastra em São Paulo, de vez em quando. Via de regra, agora tomamos café de café, e ainda fresquinho.

  Foto: Amanda Perobelli|Estadão

Daí passamos a confundir ter potencial com ser potência. Temos vergonha do molho golf e convicção de ter conquistado o mundo. Alguns acham que o conquistamos vendendo soja para quem a transforma em presunto cru. Outros, que o conquistamos com tecnologias autóctones geniais, como a tapioquinha. Óbvio, sempre aparecem estraga-prazeres lembrando que há até tapioca que importamos da Ásia.

Enquanto isso, você viaja pelo Brasil e a realidade aponta infindáveis sobremesas de leite condensado. Churrascos em que a brasa só existe para finalizar e torrar carnes já bem passadas por quilos de sal. Restaurantes nos quais, ao pedir pimenta, lhe trazem tabasco. Risotto que virou acompanhamento, e por isso mesmo mais se parece com purê. Feiras onde a banca de peixe é dominada por salmão e tilápia. Cozinhas exalando odor de margarina. Tacacá com tucupi de glutamato e tartrazina. Enquanto uma legião de influenciadores comemora nossos novos clichês.

Vide o lema do JK, dos cinquenta anos em cinco, só que agora na cozinha. Bastou nos livrarmos do estrogonofe, até mesmo na memória, e já tivemos certeza de ter pulado para o futuro. Esquecemos que uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis também existe em um bairro de Bilbao, Turim ou Cingapura. Que é muito chato e demorado classificar duas mil variedades de cacau, e pior ainda decidir o que fazer com cada uma delas. Que formação do gosto começa quando criança e leva gerações para ter efeito. Enquanto isso, em sete semanas pode-se virar cozinheiro de Instagram.

Se por acaso um viajante estrangeiro farejar que os novos clichês têm um quê de provinciano, antes de regional; de cafona, antes de caipira; de populista, antes de popular... bem, temos certeza que deve ser porque ele se deparou com um danado de pavê sobrevivente em algum canto. Pois a culpa é, claro, do pavê. Ganha assim novo sentido o bordão inevitável daquele tio no fim do almoço: “mas é pa vê ou...”.

Éramos o país do molho golf, do estrogonofe, do pavê. Do feijão torrado no café, por sua vez rigorosamente em garrafa térmica. Onde a resposta a “importado ou nacional?” iria classificar o freguês. Um dia alguém nos contou que temos um arsenal de ingredientes únicos no mundo, lá por matos variados, e acreditamos. Meio ufanisticamente, mesmo sem saber exatamente o que isso implicaria.

Apareceram uns meninos que voltaram de viagens e estágios no exterior com entusiasmo e disposição. Surgiu uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis. Uns produtinhos bacanas se infiltraram em gôndolas e bancas de feira. Chegamos a ser ocasionalmente revolucionários: até demos um jeito de comer queijo da Canastra em São Paulo, de vez em quando. Via de regra, agora tomamos café de café, e ainda fresquinho.

  Foto: Amanda Perobelli|Estadão

Daí passamos a confundir ter potencial com ser potência. Temos vergonha do molho golf e convicção de ter conquistado o mundo. Alguns acham que o conquistamos vendendo soja para quem a transforma em presunto cru. Outros, que o conquistamos com tecnologias autóctones geniais, como a tapioquinha. Óbvio, sempre aparecem estraga-prazeres lembrando que há até tapioca que importamos da Ásia.

Enquanto isso, você viaja pelo Brasil e a realidade aponta infindáveis sobremesas de leite condensado. Churrascos em que a brasa só existe para finalizar e torrar carnes já bem passadas por quilos de sal. Restaurantes nos quais, ao pedir pimenta, lhe trazem tabasco. Risotto que virou acompanhamento, e por isso mesmo mais se parece com purê. Feiras onde a banca de peixe é dominada por salmão e tilápia. Cozinhas exalando odor de margarina. Tacacá com tucupi de glutamato e tartrazina. Enquanto uma legião de influenciadores comemora nossos novos clichês.

Vide o lema do JK, dos cinquenta anos em cinco, só que agora na cozinha. Bastou nos livrarmos do estrogonofe, até mesmo na memória, e já tivemos certeza de ter pulado para o futuro. Esquecemos que uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis também existe em um bairro de Bilbao, Turim ou Cingapura. Que é muito chato e demorado classificar duas mil variedades de cacau, e pior ainda decidir o que fazer com cada uma delas. Que formação do gosto começa quando criança e leva gerações para ter efeito. Enquanto isso, em sete semanas pode-se virar cozinheiro de Instagram.

Se por acaso um viajante estrangeiro farejar que os novos clichês têm um quê de provinciano, antes de regional; de cafona, antes de caipira; de populista, antes de popular... bem, temos certeza que deve ser porque ele se deparou com um danado de pavê sobrevivente em algum canto. Pois a culpa é, claro, do pavê. Ganha assim novo sentido o bordão inevitável daquele tio no fim do almoço: “mas é pa vê ou...”.

Éramos o país do molho golf, do estrogonofe, do pavê. Do feijão torrado no café, por sua vez rigorosamente em garrafa térmica. Onde a resposta a “importado ou nacional?” iria classificar o freguês. Um dia alguém nos contou que temos um arsenal de ingredientes únicos no mundo, lá por matos variados, e acreditamos. Meio ufanisticamente, mesmo sem saber exatamente o que isso implicaria.

Apareceram uns meninos que voltaram de viagens e estágios no exterior com entusiasmo e disposição. Surgiu uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis. Uns produtinhos bacanas se infiltraram em gôndolas e bancas de feira. Chegamos a ser ocasionalmente revolucionários: até demos um jeito de comer queijo da Canastra em São Paulo, de vez em quando. Via de regra, agora tomamos café de café, e ainda fresquinho.

  Foto: Amanda Perobelli|Estadão

Daí passamos a confundir ter potencial com ser potência. Temos vergonha do molho golf e convicção de ter conquistado o mundo. Alguns acham que o conquistamos vendendo soja para quem a transforma em presunto cru. Outros, que o conquistamos com tecnologias autóctones geniais, como a tapioquinha. Óbvio, sempre aparecem estraga-prazeres lembrando que há até tapioca que importamos da Ásia.

Enquanto isso, você viaja pelo Brasil e a realidade aponta infindáveis sobremesas de leite condensado. Churrascos em que a brasa só existe para finalizar e torrar carnes já bem passadas por quilos de sal. Restaurantes nos quais, ao pedir pimenta, lhe trazem tabasco. Risotto que virou acompanhamento, e por isso mesmo mais se parece com purê. Feiras onde a banca de peixe é dominada por salmão e tilápia. Cozinhas exalando odor de margarina. Tacacá com tucupi de glutamato e tartrazina. Enquanto uma legião de influenciadores comemora nossos novos clichês.

Vide o lema do JK, dos cinquenta anos em cinco, só que agora na cozinha. Bastou nos livrarmos do estrogonofe, até mesmo na memória, e já tivemos certeza de ter pulado para o futuro. Esquecemos que uma dúzia de restaurantes altamente recomendáveis também existe em um bairro de Bilbao, Turim ou Cingapura. Que é muito chato e demorado classificar duas mil variedades de cacau, e pior ainda decidir o que fazer com cada uma delas. Que formação do gosto começa quando criança e leva gerações para ter efeito. Enquanto isso, em sete semanas pode-se virar cozinheiro de Instagram.

Se por acaso um viajante estrangeiro farejar que os novos clichês têm um quê de provinciano, antes de regional; de cafona, antes de caipira; de populista, antes de popular... bem, temos certeza que deve ser porque ele se deparou com um danado de pavê sobrevivente em algum canto. Pois a culpa é, claro, do pavê. Ganha assim novo sentido o bordão inevitável daquele tio no fim do almoço: “mas é pa vê ou...”.

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