Restaurantes de São Paulo se rendem ao caruru para celebrar a festa de Cosme e Damião


O banquete regado a azeite de dendê, obrigatório na Bahia em 27 de setembro, será servido em ao menos 9 casas paulistanas nos próximos dias

Por Ana Paula Boni

Não importa em que dia da semana caia, o 27 de setembro na Bahia é quase feriado. É dia de festa em que as pessoas se perguntam onde comer o caruru de Cosme e Damião, pois é quando praticantes e simpatizantes do candomblé montam, em casa ou restaurante, um banquete de oferenda que inclui receitas como acarajé, caruru e vatapá.

Em São Paulo, cozinheiros praticantes da culinária baiana ou simpatizantes da festa farão suas homenagens – e é a chance de provar as iguarias desse banquete (gratuito ou não).

E o que vai nele? Segundo a tradição, caruru (cozido de quiabos), xinxim de galinha (guisado), vatapá (purê de pão) e feijão-fradinho – sendo que essas receitas levam azeite de dendê e a mistura de camarão seco, castanha-de-caju e amendoim batidos –, além de arroz branco, canjica (que na Bahia é chamada de mugunzá, feito de milho branco), feijão preto, farofa de dendê, acarajé, abará (similar ao acarajé, mas cozido em vez de frito), banana-da-terra frita e rolete de cana.

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“O candomblé é uma religião alimentar, todo orixá é oferendado com comida. E, para a oferenda ser aceita você precisa comer parte dela”, explica Diego de Oxóssi, editor da Arole Cultural e babalorixá (sacerdote espiritual do candomblé), dando conta do porquê de toda essa comilança.

Prato de caruru do Pão de Festa, com vatapá (amarelo à esq.), caruru (verde à dir.) e xinxim de galinha no topo Foto: Vivan Elblaus

Tanto na Bahia quanto por aqui, porém, as mesas adaptam seus pratos, não servindo necessariamente todas as receitas. Também não restringem a festa ao dia 27/9. No restaurante Na Cozinha,as comemorações começaram no dia 14 e vão até o fim do mês. Ali, a homenagem é feita há 10 anos, desde que a casa foi aberta por Carlos Ribeiro.

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“Antes eu fazia só no dia 27, mas há quatro anos passei a fazer a festa em três fins de semana seguidos”, conta o chef, autor do livro Comida de Santo que se Come (ed. Arole Cultural).

Mas o que os santos católicos Cosme e Damião têm a ver com uma festa do candomblé? Irmãos árabes nascidos no século 4 e filhos de cristãos, os dois eram médicos, porém não foram adotados pelo candomblé pelo trabalho com caridade e cura, e sim por serem gêmeos. Numa época em que negros na Bahia não podiam reverenciar publicamente o candomblé, Cosme e Damião serviram, no sincretismo religioso, como representação dos gêmeos Taiwo e Kehinde (chamados de Ibeji, que representa um único orixá gêmeo), filhos de Xangô e Iansã.

Pois é com os orixás, e não com os santos católicos, que entra a comilança de dendê no dia 27 de setembro. Como conta o livro Cozinhando História (Fundação Pierre Verger, 2015), das autoras Josmara Fregoneze, Marlene Jesus da Costa e Nancy de Souza, Xangô andava irritado porque Exu vivia roubando seu prato de amalá (semelhante ao caruru, mas carregado na pimenta). Taiwo e Kehinde falaram ao pai que iam dar um jeito em Exu.

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Depois de uma aposta em que cansaram o orixá de tanto dançar, os dois conseguiram a promessa de Exu de nunca mais roubar o amalá. Em troca, Xangô perguntou o que eles queriam de recompensa. Disseram ao pai que, quando tivesse amalá, que deixasse um pouco para eles sem pimenta – o caruru.

A festa do caruru de sete meninos retratada por Pierre Verger em Salvador, entre 1948 e 1952; essa foto está no livro 'Cozinhando História', publicado em 2015 pela Fundação Pierre Verger Foto: Pierre Verger|Fundação Pierre Verger

Os sete meninos

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A tradição estendeu a oferenda dos gêmeos para também Idhoú, Alabá, Talabí, Adoká e Adosú. Isso explica porque o caruru de Cosme e Damião (também chamado de caruru de sete meninos) deve ser ofertado a sete crianças. Como elas adoram rapadura, cana e todo tipo de doce, um banquete tradicional tem muita guloseima.

É assim que Luísa Inês Saliba prepara sua festa há 15 anos na Rota do Acarajé, com uma mesa que inclui bolos, pirulitos e brinquedos para distribuir a qualquer criança que passe pela calçada. Neste ano, a festa está marcada para o dia 3/10, após uma reza às 18h no próprio restaurante.

Ali, além do banquete (gratuito), Luísa segue à risca a tradição de colocar sete quiabos inteiros dentro do caruru. Quem pegar um deles deve manter a tradição e, no ano seguinte, oferecer seu próprio banquete a sete crianças.

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É nesses moldes que também vai ser a festa na Casa de Ieda, quando a baiana Ieda de Matos vai servir, pelo primeiro ano, as crianças a partir do meio-dia do dia 23/9, abrindo ao público pagante a partir das 13h.

Já n’A Baianeira, a primeira edição da festa será no dia 20 de outubro, quando também haverá um altar montado em homenagem aos gêmeos. A chef Manuelle Ferraz conta que aprendeu a tradição cozinhando junto com uma amiga baiana que faz o caruru há mais de duas décadas. 

“Essa história me liga muito à minha avó paterna, mineira, que fazia vatapá. Eu tinha a memória do prato, mas nunca fazia, até aprender os rituais com Taís, há dois anos. Foi quando entrei mesmo nesse mundo que sempre me interessou.”

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Bolo repleto de guloseimas na mesa de oferenda da Rota do Acarajé Foto: Rildo Barros

ONDE COMER

A Baianeira Dia 20/10, a partir das 12h, R$ 50 (valor estimado). É a primeira edição do restaurante. R. Dona Elisa, 117, Barra Funda, tel. 2538-0844.

Bebo Sim Dia 29/9, a partir das 13h, R$ 48. O bar faz o caruru desde 2015, no seu Tabulêro Sim, que fica na calçada; é do mesmo dono do Benedita. Av. Prof. Alfonso Bovero, 1.107, Perdizes, tel. 2713-2828.

Benedita Dias 27/9, 29 e 30, no almoço, R$ 56. Restaurante faz sua 2ª edição do caruru, com comida do chef Rodrigo Isaías. R. Havaí, 258, Perdizes, tel. 3875-4764.

Casa de Ieda Dia 23/9, às 13h, R$ 48,90 (prato completo). Primeira edição da festa, às 12h abre para uma refeição com crianças; público normal a partir das 13h. R. Ferreira de Araújo, 841, Pinheiros, tel. 4323-9158.

Na Cozinha Dias 20, 21, 22, 27, 28 e 29, no almoço, R$ 48,90. É a 10ª edição; prato inclui bobó frito de camarão feito na fôrma de empada, que já tem no menu fixo da casa. R. Haddock Lobo, 955, Jardins, tel. 3063-5377.

Pão de Festa Dia 27/9, no almoço, R$ 40. Faz caruru há 20 anos, e há alguns anos o prato está no menu fixo do almoço de sábado e domingo (R$ 55); no dia 27, o prato tem preço especial. R. Araguari, 84, Moema, tel. 5531-3823.

Rota do Acarajé Dia 3/10, a partir das 18h. Gratuito. Faz o caruru há 15 anos; no menu fixo tem o prato caruru de Cosme, com caruru e camarões grelhados. R. Martim Francisco, 529, Santa Cecília, tel. 3668-6222.

Sotero De 25/9 a 30/9, almoço e jantar, R$ 52,90 (prato completo com xinxim de galinha ou moqueca de peixe). No menu fixo tem o prato de moqueca de peixe com vatapá, caruru e farofa (R$ 72,90). R. Barão de Tatuí, 282, Santa Cecília, tel. 3666-3066.

Tabuleiro do Acarajé Dia 27/9, a partir das 18h. Gratuito (contribuições para o próximo ano são bem-vindas). Serve o caruru gratuito desde que abriu, em 2013. R. Dr. Cesário Mota Júnior, 611, Vila Buarque, tel. 4301-4363.

No prato que o chef Carlos Ribeiro serve no Na Cozinha tem até bobó em forma de empada Foto: Carlos Ribeiro

Não importa em que dia da semana caia, o 27 de setembro na Bahia é quase feriado. É dia de festa em que as pessoas se perguntam onde comer o caruru de Cosme e Damião, pois é quando praticantes e simpatizantes do candomblé montam, em casa ou restaurante, um banquete de oferenda que inclui receitas como acarajé, caruru e vatapá.

Em São Paulo, cozinheiros praticantes da culinária baiana ou simpatizantes da festa farão suas homenagens – e é a chance de provar as iguarias desse banquete (gratuito ou não).

E o que vai nele? Segundo a tradição, caruru (cozido de quiabos), xinxim de galinha (guisado), vatapá (purê de pão) e feijão-fradinho – sendo que essas receitas levam azeite de dendê e a mistura de camarão seco, castanha-de-caju e amendoim batidos –, além de arroz branco, canjica (que na Bahia é chamada de mugunzá, feito de milho branco), feijão preto, farofa de dendê, acarajé, abará (similar ao acarajé, mas cozido em vez de frito), banana-da-terra frita e rolete de cana.

“O candomblé é uma religião alimentar, todo orixá é oferendado com comida. E, para a oferenda ser aceita você precisa comer parte dela”, explica Diego de Oxóssi, editor da Arole Cultural e babalorixá (sacerdote espiritual do candomblé), dando conta do porquê de toda essa comilança.

Prato de caruru do Pão de Festa, com vatapá (amarelo à esq.), caruru (verde à dir.) e xinxim de galinha no topo Foto: Vivan Elblaus

Tanto na Bahia quanto por aqui, porém, as mesas adaptam seus pratos, não servindo necessariamente todas as receitas. Também não restringem a festa ao dia 27/9. No restaurante Na Cozinha,as comemorações começaram no dia 14 e vão até o fim do mês. Ali, a homenagem é feita há 10 anos, desde que a casa foi aberta por Carlos Ribeiro.

“Antes eu fazia só no dia 27, mas há quatro anos passei a fazer a festa em três fins de semana seguidos”, conta o chef, autor do livro Comida de Santo que se Come (ed. Arole Cultural).

Mas o que os santos católicos Cosme e Damião têm a ver com uma festa do candomblé? Irmãos árabes nascidos no século 4 e filhos de cristãos, os dois eram médicos, porém não foram adotados pelo candomblé pelo trabalho com caridade e cura, e sim por serem gêmeos. Numa época em que negros na Bahia não podiam reverenciar publicamente o candomblé, Cosme e Damião serviram, no sincretismo religioso, como representação dos gêmeos Taiwo e Kehinde (chamados de Ibeji, que representa um único orixá gêmeo), filhos de Xangô e Iansã.

Pois é com os orixás, e não com os santos católicos, que entra a comilança de dendê no dia 27 de setembro. Como conta o livro Cozinhando História (Fundação Pierre Verger, 2015), das autoras Josmara Fregoneze, Marlene Jesus da Costa e Nancy de Souza, Xangô andava irritado porque Exu vivia roubando seu prato de amalá (semelhante ao caruru, mas carregado na pimenta). Taiwo e Kehinde falaram ao pai que iam dar um jeito em Exu.

Depois de uma aposta em que cansaram o orixá de tanto dançar, os dois conseguiram a promessa de Exu de nunca mais roubar o amalá. Em troca, Xangô perguntou o que eles queriam de recompensa. Disseram ao pai que, quando tivesse amalá, que deixasse um pouco para eles sem pimenta – o caruru.

A festa do caruru de sete meninos retratada por Pierre Verger em Salvador, entre 1948 e 1952; essa foto está no livro 'Cozinhando História', publicado em 2015 pela Fundação Pierre Verger Foto: Pierre Verger|Fundação Pierre Verger

Os sete meninos

A tradição estendeu a oferenda dos gêmeos para também Idhoú, Alabá, Talabí, Adoká e Adosú. Isso explica porque o caruru de Cosme e Damião (também chamado de caruru de sete meninos) deve ser ofertado a sete crianças. Como elas adoram rapadura, cana e todo tipo de doce, um banquete tradicional tem muita guloseima.

É assim que Luísa Inês Saliba prepara sua festa há 15 anos na Rota do Acarajé, com uma mesa que inclui bolos, pirulitos e brinquedos para distribuir a qualquer criança que passe pela calçada. Neste ano, a festa está marcada para o dia 3/10, após uma reza às 18h no próprio restaurante.

Ali, além do banquete (gratuito), Luísa segue à risca a tradição de colocar sete quiabos inteiros dentro do caruru. Quem pegar um deles deve manter a tradição e, no ano seguinte, oferecer seu próprio banquete a sete crianças.

É nesses moldes que também vai ser a festa na Casa de Ieda, quando a baiana Ieda de Matos vai servir, pelo primeiro ano, as crianças a partir do meio-dia do dia 23/9, abrindo ao público pagante a partir das 13h.

Já n’A Baianeira, a primeira edição da festa será no dia 20 de outubro, quando também haverá um altar montado em homenagem aos gêmeos. A chef Manuelle Ferraz conta que aprendeu a tradição cozinhando junto com uma amiga baiana que faz o caruru há mais de duas décadas. 

“Essa história me liga muito à minha avó paterna, mineira, que fazia vatapá. Eu tinha a memória do prato, mas nunca fazia, até aprender os rituais com Taís, há dois anos. Foi quando entrei mesmo nesse mundo que sempre me interessou.”

Bolo repleto de guloseimas na mesa de oferenda da Rota do Acarajé Foto: Rildo Barros

ONDE COMER

A Baianeira Dia 20/10, a partir das 12h, R$ 50 (valor estimado). É a primeira edição do restaurante. R. Dona Elisa, 117, Barra Funda, tel. 2538-0844.

Bebo Sim Dia 29/9, a partir das 13h, R$ 48. O bar faz o caruru desde 2015, no seu Tabulêro Sim, que fica na calçada; é do mesmo dono do Benedita. Av. Prof. Alfonso Bovero, 1.107, Perdizes, tel. 2713-2828.

Benedita Dias 27/9, 29 e 30, no almoço, R$ 56. Restaurante faz sua 2ª edição do caruru, com comida do chef Rodrigo Isaías. R. Havaí, 258, Perdizes, tel. 3875-4764.

Casa de Ieda Dia 23/9, às 13h, R$ 48,90 (prato completo). Primeira edição da festa, às 12h abre para uma refeição com crianças; público normal a partir das 13h. R. Ferreira de Araújo, 841, Pinheiros, tel. 4323-9158.

Na Cozinha Dias 20, 21, 22, 27, 28 e 29, no almoço, R$ 48,90. É a 10ª edição; prato inclui bobó frito de camarão feito na fôrma de empada, que já tem no menu fixo da casa. R. Haddock Lobo, 955, Jardins, tel. 3063-5377.

Pão de Festa Dia 27/9, no almoço, R$ 40. Faz caruru há 20 anos, e há alguns anos o prato está no menu fixo do almoço de sábado e domingo (R$ 55); no dia 27, o prato tem preço especial. R. Araguari, 84, Moema, tel. 5531-3823.

Rota do Acarajé Dia 3/10, a partir das 18h. Gratuito. Faz o caruru há 15 anos; no menu fixo tem o prato caruru de Cosme, com caruru e camarões grelhados. R. Martim Francisco, 529, Santa Cecília, tel. 3668-6222.

Sotero De 25/9 a 30/9, almoço e jantar, R$ 52,90 (prato completo com xinxim de galinha ou moqueca de peixe). No menu fixo tem o prato de moqueca de peixe com vatapá, caruru e farofa (R$ 72,90). R. Barão de Tatuí, 282, Santa Cecília, tel. 3666-3066.

Tabuleiro do Acarajé Dia 27/9, a partir das 18h. Gratuito (contribuições para o próximo ano são bem-vindas). Serve o caruru gratuito desde que abriu, em 2013. R. Dr. Cesário Mota Júnior, 611, Vila Buarque, tel. 4301-4363.

No prato que o chef Carlos Ribeiro serve no Na Cozinha tem até bobó em forma de empada Foto: Carlos Ribeiro

Não importa em que dia da semana caia, o 27 de setembro na Bahia é quase feriado. É dia de festa em que as pessoas se perguntam onde comer o caruru de Cosme e Damião, pois é quando praticantes e simpatizantes do candomblé montam, em casa ou restaurante, um banquete de oferenda que inclui receitas como acarajé, caruru e vatapá.

Em São Paulo, cozinheiros praticantes da culinária baiana ou simpatizantes da festa farão suas homenagens – e é a chance de provar as iguarias desse banquete (gratuito ou não).

E o que vai nele? Segundo a tradição, caruru (cozido de quiabos), xinxim de galinha (guisado), vatapá (purê de pão) e feijão-fradinho – sendo que essas receitas levam azeite de dendê e a mistura de camarão seco, castanha-de-caju e amendoim batidos –, além de arroz branco, canjica (que na Bahia é chamada de mugunzá, feito de milho branco), feijão preto, farofa de dendê, acarajé, abará (similar ao acarajé, mas cozido em vez de frito), banana-da-terra frita e rolete de cana.

“O candomblé é uma religião alimentar, todo orixá é oferendado com comida. E, para a oferenda ser aceita você precisa comer parte dela”, explica Diego de Oxóssi, editor da Arole Cultural e babalorixá (sacerdote espiritual do candomblé), dando conta do porquê de toda essa comilança.

Prato de caruru do Pão de Festa, com vatapá (amarelo à esq.), caruru (verde à dir.) e xinxim de galinha no topo Foto: Vivan Elblaus

Tanto na Bahia quanto por aqui, porém, as mesas adaptam seus pratos, não servindo necessariamente todas as receitas. Também não restringem a festa ao dia 27/9. No restaurante Na Cozinha,as comemorações começaram no dia 14 e vão até o fim do mês. Ali, a homenagem é feita há 10 anos, desde que a casa foi aberta por Carlos Ribeiro.

“Antes eu fazia só no dia 27, mas há quatro anos passei a fazer a festa em três fins de semana seguidos”, conta o chef, autor do livro Comida de Santo que se Come (ed. Arole Cultural).

Mas o que os santos católicos Cosme e Damião têm a ver com uma festa do candomblé? Irmãos árabes nascidos no século 4 e filhos de cristãos, os dois eram médicos, porém não foram adotados pelo candomblé pelo trabalho com caridade e cura, e sim por serem gêmeos. Numa época em que negros na Bahia não podiam reverenciar publicamente o candomblé, Cosme e Damião serviram, no sincretismo religioso, como representação dos gêmeos Taiwo e Kehinde (chamados de Ibeji, que representa um único orixá gêmeo), filhos de Xangô e Iansã.

Pois é com os orixás, e não com os santos católicos, que entra a comilança de dendê no dia 27 de setembro. Como conta o livro Cozinhando História (Fundação Pierre Verger, 2015), das autoras Josmara Fregoneze, Marlene Jesus da Costa e Nancy de Souza, Xangô andava irritado porque Exu vivia roubando seu prato de amalá (semelhante ao caruru, mas carregado na pimenta). Taiwo e Kehinde falaram ao pai que iam dar um jeito em Exu.

Depois de uma aposta em que cansaram o orixá de tanto dançar, os dois conseguiram a promessa de Exu de nunca mais roubar o amalá. Em troca, Xangô perguntou o que eles queriam de recompensa. Disseram ao pai que, quando tivesse amalá, que deixasse um pouco para eles sem pimenta – o caruru.

A festa do caruru de sete meninos retratada por Pierre Verger em Salvador, entre 1948 e 1952; essa foto está no livro 'Cozinhando História', publicado em 2015 pela Fundação Pierre Verger Foto: Pierre Verger|Fundação Pierre Verger

Os sete meninos

A tradição estendeu a oferenda dos gêmeos para também Idhoú, Alabá, Talabí, Adoká e Adosú. Isso explica porque o caruru de Cosme e Damião (também chamado de caruru de sete meninos) deve ser ofertado a sete crianças. Como elas adoram rapadura, cana e todo tipo de doce, um banquete tradicional tem muita guloseima.

É assim que Luísa Inês Saliba prepara sua festa há 15 anos na Rota do Acarajé, com uma mesa que inclui bolos, pirulitos e brinquedos para distribuir a qualquer criança que passe pela calçada. Neste ano, a festa está marcada para o dia 3/10, após uma reza às 18h no próprio restaurante.

Ali, além do banquete (gratuito), Luísa segue à risca a tradição de colocar sete quiabos inteiros dentro do caruru. Quem pegar um deles deve manter a tradição e, no ano seguinte, oferecer seu próprio banquete a sete crianças.

É nesses moldes que também vai ser a festa na Casa de Ieda, quando a baiana Ieda de Matos vai servir, pelo primeiro ano, as crianças a partir do meio-dia do dia 23/9, abrindo ao público pagante a partir das 13h.

Já n’A Baianeira, a primeira edição da festa será no dia 20 de outubro, quando também haverá um altar montado em homenagem aos gêmeos. A chef Manuelle Ferraz conta que aprendeu a tradição cozinhando junto com uma amiga baiana que faz o caruru há mais de duas décadas. 

“Essa história me liga muito à minha avó paterna, mineira, que fazia vatapá. Eu tinha a memória do prato, mas nunca fazia, até aprender os rituais com Taís, há dois anos. Foi quando entrei mesmo nesse mundo que sempre me interessou.”

Bolo repleto de guloseimas na mesa de oferenda da Rota do Acarajé Foto: Rildo Barros

ONDE COMER

A Baianeira Dia 20/10, a partir das 12h, R$ 50 (valor estimado). É a primeira edição do restaurante. R. Dona Elisa, 117, Barra Funda, tel. 2538-0844.

Bebo Sim Dia 29/9, a partir das 13h, R$ 48. O bar faz o caruru desde 2015, no seu Tabulêro Sim, que fica na calçada; é do mesmo dono do Benedita. Av. Prof. Alfonso Bovero, 1.107, Perdizes, tel. 2713-2828.

Benedita Dias 27/9, 29 e 30, no almoço, R$ 56. Restaurante faz sua 2ª edição do caruru, com comida do chef Rodrigo Isaías. R. Havaí, 258, Perdizes, tel. 3875-4764.

Casa de Ieda Dia 23/9, às 13h, R$ 48,90 (prato completo). Primeira edição da festa, às 12h abre para uma refeição com crianças; público normal a partir das 13h. R. Ferreira de Araújo, 841, Pinheiros, tel. 4323-9158.

Na Cozinha Dias 20, 21, 22, 27, 28 e 29, no almoço, R$ 48,90. É a 10ª edição; prato inclui bobó frito de camarão feito na fôrma de empada, que já tem no menu fixo da casa. R. Haddock Lobo, 955, Jardins, tel. 3063-5377.

Pão de Festa Dia 27/9, no almoço, R$ 40. Faz caruru há 20 anos, e há alguns anos o prato está no menu fixo do almoço de sábado e domingo (R$ 55); no dia 27, o prato tem preço especial. R. Araguari, 84, Moema, tel. 5531-3823.

Rota do Acarajé Dia 3/10, a partir das 18h. Gratuito. Faz o caruru há 15 anos; no menu fixo tem o prato caruru de Cosme, com caruru e camarões grelhados. R. Martim Francisco, 529, Santa Cecília, tel. 3668-6222.

Sotero De 25/9 a 30/9, almoço e jantar, R$ 52,90 (prato completo com xinxim de galinha ou moqueca de peixe). No menu fixo tem o prato de moqueca de peixe com vatapá, caruru e farofa (R$ 72,90). R. Barão de Tatuí, 282, Santa Cecília, tel. 3666-3066.

Tabuleiro do Acarajé Dia 27/9, a partir das 18h. Gratuito (contribuições para o próximo ano são bem-vindas). Serve o caruru gratuito desde que abriu, em 2013. R. Dr. Cesário Mota Júnior, 611, Vila Buarque, tel. 4301-4363.

No prato que o chef Carlos Ribeiro serve no Na Cozinha tem até bobó em forma de empada Foto: Carlos Ribeiro

Não importa em que dia da semana caia, o 27 de setembro na Bahia é quase feriado. É dia de festa em que as pessoas se perguntam onde comer o caruru de Cosme e Damião, pois é quando praticantes e simpatizantes do candomblé montam, em casa ou restaurante, um banquete de oferenda que inclui receitas como acarajé, caruru e vatapá.

Em São Paulo, cozinheiros praticantes da culinária baiana ou simpatizantes da festa farão suas homenagens – e é a chance de provar as iguarias desse banquete (gratuito ou não).

E o que vai nele? Segundo a tradição, caruru (cozido de quiabos), xinxim de galinha (guisado), vatapá (purê de pão) e feijão-fradinho – sendo que essas receitas levam azeite de dendê e a mistura de camarão seco, castanha-de-caju e amendoim batidos –, além de arroz branco, canjica (que na Bahia é chamada de mugunzá, feito de milho branco), feijão preto, farofa de dendê, acarajé, abará (similar ao acarajé, mas cozido em vez de frito), banana-da-terra frita e rolete de cana.

“O candomblé é uma religião alimentar, todo orixá é oferendado com comida. E, para a oferenda ser aceita você precisa comer parte dela”, explica Diego de Oxóssi, editor da Arole Cultural e babalorixá (sacerdote espiritual do candomblé), dando conta do porquê de toda essa comilança.

Prato de caruru do Pão de Festa, com vatapá (amarelo à esq.), caruru (verde à dir.) e xinxim de galinha no topo Foto: Vivan Elblaus

Tanto na Bahia quanto por aqui, porém, as mesas adaptam seus pratos, não servindo necessariamente todas as receitas. Também não restringem a festa ao dia 27/9. No restaurante Na Cozinha,as comemorações começaram no dia 14 e vão até o fim do mês. Ali, a homenagem é feita há 10 anos, desde que a casa foi aberta por Carlos Ribeiro.

“Antes eu fazia só no dia 27, mas há quatro anos passei a fazer a festa em três fins de semana seguidos”, conta o chef, autor do livro Comida de Santo que se Come (ed. Arole Cultural).

Mas o que os santos católicos Cosme e Damião têm a ver com uma festa do candomblé? Irmãos árabes nascidos no século 4 e filhos de cristãos, os dois eram médicos, porém não foram adotados pelo candomblé pelo trabalho com caridade e cura, e sim por serem gêmeos. Numa época em que negros na Bahia não podiam reverenciar publicamente o candomblé, Cosme e Damião serviram, no sincretismo religioso, como representação dos gêmeos Taiwo e Kehinde (chamados de Ibeji, que representa um único orixá gêmeo), filhos de Xangô e Iansã.

Pois é com os orixás, e não com os santos católicos, que entra a comilança de dendê no dia 27 de setembro. Como conta o livro Cozinhando História (Fundação Pierre Verger, 2015), das autoras Josmara Fregoneze, Marlene Jesus da Costa e Nancy de Souza, Xangô andava irritado porque Exu vivia roubando seu prato de amalá (semelhante ao caruru, mas carregado na pimenta). Taiwo e Kehinde falaram ao pai que iam dar um jeito em Exu.

Depois de uma aposta em que cansaram o orixá de tanto dançar, os dois conseguiram a promessa de Exu de nunca mais roubar o amalá. Em troca, Xangô perguntou o que eles queriam de recompensa. Disseram ao pai que, quando tivesse amalá, que deixasse um pouco para eles sem pimenta – o caruru.

A festa do caruru de sete meninos retratada por Pierre Verger em Salvador, entre 1948 e 1952; essa foto está no livro 'Cozinhando História', publicado em 2015 pela Fundação Pierre Verger Foto: Pierre Verger|Fundação Pierre Verger

Os sete meninos

A tradição estendeu a oferenda dos gêmeos para também Idhoú, Alabá, Talabí, Adoká e Adosú. Isso explica porque o caruru de Cosme e Damião (também chamado de caruru de sete meninos) deve ser ofertado a sete crianças. Como elas adoram rapadura, cana e todo tipo de doce, um banquete tradicional tem muita guloseima.

É assim que Luísa Inês Saliba prepara sua festa há 15 anos na Rota do Acarajé, com uma mesa que inclui bolos, pirulitos e brinquedos para distribuir a qualquer criança que passe pela calçada. Neste ano, a festa está marcada para o dia 3/10, após uma reza às 18h no próprio restaurante.

Ali, além do banquete (gratuito), Luísa segue à risca a tradição de colocar sete quiabos inteiros dentro do caruru. Quem pegar um deles deve manter a tradição e, no ano seguinte, oferecer seu próprio banquete a sete crianças.

É nesses moldes que também vai ser a festa na Casa de Ieda, quando a baiana Ieda de Matos vai servir, pelo primeiro ano, as crianças a partir do meio-dia do dia 23/9, abrindo ao público pagante a partir das 13h.

Já n’A Baianeira, a primeira edição da festa será no dia 20 de outubro, quando também haverá um altar montado em homenagem aos gêmeos. A chef Manuelle Ferraz conta que aprendeu a tradição cozinhando junto com uma amiga baiana que faz o caruru há mais de duas décadas. 

“Essa história me liga muito à minha avó paterna, mineira, que fazia vatapá. Eu tinha a memória do prato, mas nunca fazia, até aprender os rituais com Taís, há dois anos. Foi quando entrei mesmo nesse mundo que sempre me interessou.”

Bolo repleto de guloseimas na mesa de oferenda da Rota do Acarajé Foto: Rildo Barros

ONDE COMER

A Baianeira Dia 20/10, a partir das 12h, R$ 50 (valor estimado). É a primeira edição do restaurante. R. Dona Elisa, 117, Barra Funda, tel. 2538-0844.

Bebo Sim Dia 29/9, a partir das 13h, R$ 48. O bar faz o caruru desde 2015, no seu Tabulêro Sim, que fica na calçada; é do mesmo dono do Benedita. Av. Prof. Alfonso Bovero, 1.107, Perdizes, tel. 2713-2828.

Benedita Dias 27/9, 29 e 30, no almoço, R$ 56. Restaurante faz sua 2ª edição do caruru, com comida do chef Rodrigo Isaías. R. Havaí, 258, Perdizes, tel. 3875-4764.

Casa de Ieda Dia 23/9, às 13h, R$ 48,90 (prato completo). Primeira edição da festa, às 12h abre para uma refeição com crianças; público normal a partir das 13h. R. Ferreira de Araújo, 841, Pinheiros, tel. 4323-9158.

Na Cozinha Dias 20, 21, 22, 27, 28 e 29, no almoço, R$ 48,90. É a 10ª edição; prato inclui bobó frito de camarão feito na fôrma de empada, que já tem no menu fixo da casa. R. Haddock Lobo, 955, Jardins, tel. 3063-5377.

Pão de Festa Dia 27/9, no almoço, R$ 40. Faz caruru há 20 anos, e há alguns anos o prato está no menu fixo do almoço de sábado e domingo (R$ 55); no dia 27, o prato tem preço especial. R. Araguari, 84, Moema, tel. 5531-3823.

Rota do Acarajé Dia 3/10, a partir das 18h. Gratuito. Faz o caruru há 15 anos; no menu fixo tem o prato caruru de Cosme, com caruru e camarões grelhados. R. Martim Francisco, 529, Santa Cecília, tel. 3668-6222.

Sotero De 25/9 a 30/9, almoço e jantar, R$ 52,90 (prato completo com xinxim de galinha ou moqueca de peixe). No menu fixo tem o prato de moqueca de peixe com vatapá, caruru e farofa (R$ 72,90). R. Barão de Tatuí, 282, Santa Cecília, tel. 3666-3066.

Tabuleiro do Acarajé Dia 27/9, a partir das 18h. Gratuito (contribuições para o próximo ano são bem-vindas). Serve o caruru gratuito desde que abriu, em 2013. R. Dr. Cesário Mota Júnior, 611, Vila Buarque, tel. 4301-4363.

No prato que o chef Carlos Ribeiro serve no Na Cozinha tem até bobó em forma de empada Foto: Carlos Ribeiro

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