Sustentável, restaurante Corrutela mira no futuro com pé no passado


Com moinho de pedra e fazendo tudo na casa do zero pelos métodos tradicionais, o Corrutela, que abre em breve em São Paulo, comprova a teoria de que a vanguarda da gastronomia está na volta ao passado

Por Renata Mesquita

Cesar Costa quer transformar o rumo da gastronomia da cidade. A afirmação pode parecer exagerada, ainda mais se tratando de um nome pouco conhecido, mas faz todo sentido quando se olha de perto o trabalho desse jovem chef que está prestes a inaugurar seu primeiro restaurante. 

O chef César Costa, que comanda o Corrutela, na VIla Madalena Foto: Nilton Fukuda|Estadão

O Corrutela, que abre as portas no final do mês próximo ao Beco do Batman, tem entre suas principais premissas banir a palavra lixo de suas instalações. Para isso uma composteira com capacidade para 30 kg foi instalada logo na entrada do moderno salão, a vista de todos. Ela vai trabalhar enquanto os pratos coloridos finalizados por uma equipe de millennials (ninguém da equipe da cozinha tem mais de 30) saem da cozinha aberta. Já nos fundos da casa uma engenhoca com tecnologia israelense lava panelas e assadeiras sem produtos químicos ou esforço manual (e assim economiza milhares de litros de água no final do mês). Ah, e 25% da energia é solar, claro. Além de trabalhar apenas com canudos de metal.

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A cozinha da nova casa, que já está funcionando em soft opening, segue um loop. Todos os dias os produtos, frescos e quase sempre orgânicos (apenas o leite não é), chegam ao restaurante e fazem o mesmo trajeto: são higienizados, vão para a câmara refrigerada, são preparados e servidos. O descarte vai para a composteira, as sobras de ingredientes viram comida dos funcionário no dia seguinte. Nenhum produto volta para trás. 

O cardápio enxuto ajuda na operação. Mas, ainda assim, o chef que é o responsável pelas compras não perde a chance de maximizar o aproveitamento dos produtos, além de dedicar atenção especial às embalagens. Prefere as grandes, retornáveis -- o leite fresco chega em galões de 30 litros -- e depois de uma briga boa, eliminou o plástico que costuma embalar verduras e legumes. 

Com um pé no futuro e outro no passado Cesar encontrou uma forma de entregar o melhor produto e ao mesmo tempo economizar nas embalagens e, de quebra, no preço dos insumos. Ele não compra a farinha e sim o trigo, que mói na cozinha de preparação antes de usar no preparo dos pães; o milho crioulo (comprado de uma produção agroflorestal da Bahia) também é moído ali antes de ser usado para fazer polenta. O chocolate 70% cacau da musse também é feito na casa-- ele compra e torra as amêndoas, antes de colocar num equipamento que faz a conchagem e transforma os nibs de cacau em chocolate. Esse equipamento e o moinho trazido de Minas dividem o espaço com um Thermomix e uma Pacojet, ícones da cozinha de vanguarda. 

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Simples, granulada e saborosa, a polenta é resultado do produto fresco e de origem, combinada com cogumelos assados, ovo poché e folhas de mostarda Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Mas esta é só a ponta do trabalho de vanguarda do chef de 27 anos que passou a maior parte da sua carreira lá fora. 

Depois de breve passagem pelo D.O.M., Cesar foi para os Estados Unidos trabalhar no Chez Panisse, com Alice Waters, a grande dama da cozinha de produto,e precursora, nos anos 1970, da defesa do produto local e sazonal. Chegou ali aos 20 anos. A semente estava plantada. De lá seguiu para a Dinamarca para trabalhar com outro chef de olho na vanguarda, Christian Puglisi do estrelado Relae. A experiência final que moldou o que hoje é o Corrutela foi fora da cozinha, no trabalho com Miles Irving, -- o papa britânico das pancs, autor de The forager handook a guide to edible plants of britain. Espécie de Neide Rigo local.

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De volta ao País, ainda em 2016, ele rodou mais de 14 mil quilômetros ao lado de Luiz Simões, amigo e sócio na casa, pelo Sul do Brasil atrás de produtos frescos de qualidade, orgânicos e conscientes -- que hoje são a base e também o ápice da cozinha do Corrutela. 

Mas o trabalho de Cesar extrapola a seleção de bons produtos -- ação já corriqueira entre chefs hoje. Ele põe o produtor no centro das atenções. E colabora para o desenvolvimento de produtores e a formação de uma cadeia justa e sustentável. Um exemplo? Ele não achou um trigo orgânico que seguisse tais preceitos, então desenvolveu uma relação comprodutores do Paraná. Mas, como teria de comprar quantidades maiores que sua demanda, contatou outros chefs para repartir o trigo. Hoje a marca paranaense, chamada Biôganica, está consolidada, e fornece para chefs que compartilham dos ideias de Cesar, como Paola Carosella. Com a chef do Arturito ele faz um trabalho semelhante, com cogumelos selvagens de Serra Catarinense, e que foram tema de reportagem do Paladar no ano passado em expedição liderada por ele e a colunista Neide Rigo. 

Do zero. Moinho de pedra trazido de Minas, onde César refina a o trigo e o milho para fazer o pão e a polenta, respectivamente. Foto: Nilton Fukuda|Estadão
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Cesar coloca em evidência um novo papel do chef de cozinha em que a preocupação com o impacto vai além do desperdício de alimentos ou do lixo e inclui toda a cadeia, além da participação ativa no desenvolvimento de boas práticas, tanto no manejo agroflorestal como na remuneração justa dos produtores. Nas próximas semanas o Corrutela deve receber a certificação da SRA, Sustainable Restaurant Association, consultoria inglesa que avalia e classifica restaurantes ao redor do mundo seguindo premissas sustentáveis, e que vão além só do quesito ambiental, mas também sociais, como o fair trade, a responsabilidade pela comunidade que o restaurante está inserido assim como com seus empregados e com o que é servido aos clientes. A casa é a segunda na América Latina a conquistar a certificação, ao lado do Pujol, no México.

Cesar não inventou a roda, ele faz parte de uma geração de chefs que pensam além do prato. No Silo, primeiro restaurante zero waste do Reino Unido, do chef Douglas McMaster, a composteira já faz as vezes de centro das atenções no salão assim como um moinho. César, inclusive passou por lá no ano passado para aprender com McMaster, que vem ao Brasil em outubro, a convite dele, assim como Miles, participar do seminário sobre PANCs no Sesc Pompéia do qual Costa é co-curador da ao lado da colunista do Paladar Neide Rigo.

  Foto: Nilton Fukuda|Estadão
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Mas nada disso é motivo para descuidar da comida, garante o chef. “Não posso dar mais atenção para a sustentabilidade que para a qualidade da comida”, diz.E a comida da nova casa vale, sim, a pena, como você pode conferir abaixo. 

E A COMIDA DO CORRUTELA?

“A comida do Corrutela é a coalizão de vários trabalhos legais e bem feitos, não tem como dar errado”, afirma o chef. “A musse de chocolate, por exemplo, é a junção do ovo da vila Yamaguishi, que tem a galinha tratada da melhor forma, com o leite da Fazenda Atalaia que produz o queijo Tulha, premiado lá fora, que chega fresco no restaurante e o cacau do Ernest Götsch. Juntamos o trabalho excelente dessas pessoas aqui.” É daí que vem a explicação do nome, Corrutela é um entreposto entre o campo e a cidade. 

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Sobremesa de chocolate e menta. Musse é feita do zero na casa, desde a torra das amêndoas de cacau. Simples que surpreende Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Existe sim uma grande verdade na afirmação do chef. Mas existe também por trás de cada prato muito técnica e uma equipe afiada, que está com ele há mais de um ano, muito antes da casa abrir -- o projeto ficou embargado por oito meses.

O tartar de carne (único prato de carne vermelha no menu) segue receita dinamarquesa, é moído congelado (com as peças do moedor congeladas também) e fica na geladeira resfriando até a hora de ser servido, quase em temperatura ambiente. O resultado é uma textura fofa e muito leve, servida com emulsão cremosa de ovo poché e trigo crocante. A influência e a estética nórdicas e a essência do Chez Panisse são bem evidentes no menu, uma união improvável e que funciona. 

Todos os dias o menu muda um pouco, são sempre duas opções de sequências, herbívoro e onívoro, cada uma com três sugestões de entradas, um principal e uma sobremesa (R$ 95). Que o chef pede que sejam seguidas e não misturadas. Mas os pratos podem ser pedidos a la carte também. 

Entre as opções de entrada do menu herbívoro. Berinjela assada, coalhada de kefir, maçã e rabanete Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Nele reinam os ingredientes simples: beterraba, cebola, berinjela, cogumelos, folhas -- e assim são apresentados no cardápio, sem grandes explicações (aliás, não se preocupe, você só terá explicação, se pedir). Mas que chegam a frente do cliente em pratos expressivos e sempre com um elemento supresa. 

Outro ponto alto do cardápio são os produtos fermentados. Da cremosa manteiga produzida com nata e kefir que acompanha o tal pão da casa feito com a farinha fresca, à coalhada também, servida com uma berinjela assada. Os peixes e frutos do mar vêm do vizinho Cauê Tessuto. São servidos tanto frescos como curados na casa.  

Além da cozinha aberta de onde é possível ver a equipe de perto trabalhando, um outro balcão divide a casa, o do bar. Com carta de coquetéis assinada por Danilo Nakamura, consultor d’Casa do Porco e do Bar do Jiquitaia, com drinques onde brilham produtos frescos e fermentados, como no Mango Collins (R$ 30) que combina gim, manjerição, kombucha de manga. A carta de vinhos é assinada pela dupla Daniela Bravin e Cássia Campos e surpreende pela divisão feita por solos, não regiões ou países. 

O pão e a manteiga da casa. Produzidos do começo ao fim ali Foto: Nilton Fukuda|Estadão

SERVIÇO

CORRUTELA

R. Medeiros de Albuquerque, 256, Vila Madalena  Inauguração: 30 de maio Horário de funcionamento: 19h/23h (dom.; 13h/16h; fecha segunda e terça) 

Cesar Costa quer transformar o rumo da gastronomia da cidade. A afirmação pode parecer exagerada, ainda mais se tratando de um nome pouco conhecido, mas faz todo sentido quando se olha de perto o trabalho desse jovem chef que está prestes a inaugurar seu primeiro restaurante. 

O chef César Costa, que comanda o Corrutela, na VIla Madalena Foto: Nilton Fukuda|Estadão

O Corrutela, que abre as portas no final do mês próximo ao Beco do Batman, tem entre suas principais premissas banir a palavra lixo de suas instalações. Para isso uma composteira com capacidade para 30 kg foi instalada logo na entrada do moderno salão, a vista de todos. Ela vai trabalhar enquanto os pratos coloridos finalizados por uma equipe de millennials (ninguém da equipe da cozinha tem mais de 30) saem da cozinha aberta. Já nos fundos da casa uma engenhoca com tecnologia israelense lava panelas e assadeiras sem produtos químicos ou esforço manual (e assim economiza milhares de litros de água no final do mês). Ah, e 25% da energia é solar, claro. Além de trabalhar apenas com canudos de metal.

A cozinha da nova casa, que já está funcionando em soft opening, segue um loop. Todos os dias os produtos, frescos e quase sempre orgânicos (apenas o leite não é), chegam ao restaurante e fazem o mesmo trajeto: são higienizados, vão para a câmara refrigerada, são preparados e servidos. O descarte vai para a composteira, as sobras de ingredientes viram comida dos funcionário no dia seguinte. Nenhum produto volta para trás. 

O cardápio enxuto ajuda na operação. Mas, ainda assim, o chef que é o responsável pelas compras não perde a chance de maximizar o aproveitamento dos produtos, além de dedicar atenção especial às embalagens. Prefere as grandes, retornáveis -- o leite fresco chega em galões de 30 litros -- e depois de uma briga boa, eliminou o plástico que costuma embalar verduras e legumes. 

Com um pé no futuro e outro no passado Cesar encontrou uma forma de entregar o melhor produto e ao mesmo tempo economizar nas embalagens e, de quebra, no preço dos insumos. Ele não compra a farinha e sim o trigo, que mói na cozinha de preparação antes de usar no preparo dos pães; o milho crioulo (comprado de uma produção agroflorestal da Bahia) também é moído ali antes de ser usado para fazer polenta. O chocolate 70% cacau da musse também é feito na casa-- ele compra e torra as amêndoas, antes de colocar num equipamento que faz a conchagem e transforma os nibs de cacau em chocolate. Esse equipamento e o moinho trazido de Minas dividem o espaço com um Thermomix e uma Pacojet, ícones da cozinha de vanguarda. 

Simples, granulada e saborosa, a polenta é resultado do produto fresco e de origem, combinada com cogumelos assados, ovo poché e folhas de mostarda Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Mas esta é só a ponta do trabalho de vanguarda do chef de 27 anos que passou a maior parte da sua carreira lá fora. 

Depois de breve passagem pelo D.O.M., Cesar foi para os Estados Unidos trabalhar no Chez Panisse, com Alice Waters, a grande dama da cozinha de produto,e precursora, nos anos 1970, da defesa do produto local e sazonal. Chegou ali aos 20 anos. A semente estava plantada. De lá seguiu para a Dinamarca para trabalhar com outro chef de olho na vanguarda, Christian Puglisi do estrelado Relae. A experiência final que moldou o que hoje é o Corrutela foi fora da cozinha, no trabalho com Miles Irving, -- o papa britânico das pancs, autor de The forager handook a guide to edible plants of britain. Espécie de Neide Rigo local.

De volta ao País, ainda em 2016, ele rodou mais de 14 mil quilômetros ao lado de Luiz Simões, amigo e sócio na casa, pelo Sul do Brasil atrás de produtos frescos de qualidade, orgânicos e conscientes -- que hoje são a base e também o ápice da cozinha do Corrutela. 

Mas o trabalho de Cesar extrapola a seleção de bons produtos -- ação já corriqueira entre chefs hoje. Ele põe o produtor no centro das atenções. E colabora para o desenvolvimento de produtores e a formação de uma cadeia justa e sustentável. Um exemplo? Ele não achou um trigo orgânico que seguisse tais preceitos, então desenvolveu uma relação comprodutores do Paraná. Mas, como teria de comprar quantidades maiores que sua demanda, contatou outros chefs para repartir o trigo. Hoje a marca paranaense, chamada Biôganica, está consolidada, e fornece para chefs que compartilham dos ideias de Cesar, como Paola Carosella. Com a chef do Arturito ele faz um trabalho semelhante, com cogumelos selvagens de Serra Catarinense, e que foram tema de reportagem do Paladar no ano passado em expedição liderada por ele e a colunista Neide Rigo. 

Do zero. Moinho de pedra trazido de Minas, onde César refina a o trigo e o milho para fazer o pão e a polenta, respectivamente. Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Cesar coloca em evidência um novo papel do chef de cozinha em que a preocupação com o impacto vai além do desperdício de alimentos ou do lixo e inclui toda a cadeia, além da participação ativa no desenvolvimento de boas práticas, tanto no manejo agroflorestal como na remuneração justa dos produtores. Nas próximas semanas o Corrutela deve receber a certificação da SRA, Sustainable Restaurant Association, consultoria inglesa que avalia e classifica restaurantes ao redor do mundo seguindo premissas sustentáveis, e que vão além só do quesito ambiental, mas também sociais, como o fair trade, a responsabilidade pela comunidade que o restaurante está inserido assim como com seus empregados e com o que é servido aos clientes. A casa é a segunda na América Latina a conquistar a certificação, ao lado do Pujol, no México.

Cesar não inventou a roda, ele faz parte de uma geração de chefs que pensam além do prato. No Silo, primeiro restaurante zero waste do Reino Unido, do chef Douglas McMaster, a composteira já faz as vezes de centro das atenções no salão assim como um moinho. César, inclusive passou por lá no ano passado para aprender com McMaster, que vem ao Brasil em outubro, a convite dele, assim como Miles, participar do seminário sobre PANCs no Sesc Pompéia do qual Costa é co-curador da ao lado da colunista do Paladar Neide Rigo.

  Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Mas nada disso é motivo para descuidar da comida, garante o chef. “Não posso dar mais atenção para a sustentabilidade que para a qualidade da comida”, diz.E a comida da nova casa vale, sim, a pena, como você pode conferir abaixo. 

E A COMIDA DO CORRUTELA?

“A comida do Corrutela é a coalizão de vários trabalhos legais e bem feitos, não tem como dar errado”, afirma o chef. “A musse de chocolate, por exemplo, é a junção do ovo da vila Yamaguishi, que tem a galinha tratada da melhor forma, com o leite da Fazenda Atalaia que produz o queijo Tulha, premiado lá fora, que chega fresco no restaurante e o cacau do Ernest Götsch. Juntamos o trabalho excelente dessas pessoas aqui.” É daí que vem a explicação do nome, Corrutela é um entreposto entre o campo e a cidade. 

Sobremesa de chocolate e menta. Musse é feita do zero na casa, desde a torra das amêndoas de cacau. Simples que surpreende Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Existe sim uma grande verdade na afirmação do chef. Mas existe também por trás de cada prato muito técnica e uma equipe afiada, que está com ele há mais de um ano, muito antes da casa abrir -- o projeto ficou embargado por oito meses.

O tartar de carne (único prato de carne vermelha no menu) segue receita dinamarquesa, é moído congelado (com as peças do moedor congeladas também) e fica na geladeira resfriando até a hora de ser servido, quase em temperatura ambiente. O resultado é uma textura fofa e muito leve, servida com emulsão cremosa de ovo poché e trigo crocante. A influência e a estética nórdicas e a essência do Chez Panisse são bem evidentes no menu, uma união improvável e que funciona. 

Todos os dias o menu muda um pouco, são sempre duas opções de sequências, herbívoro e onívoro, cada uma com três sugestões de entradas, um principal e uma sobremesa (R$ 95). Que o chef pede que sejam seguidas e não misturadas. Mas os pratos podem ser pedidos a la carte também. 

Entre as opções de entrada do menu herbívoro. Berinjela assada, coalhada de kefir, maçã e rabanete Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Nele reinam os ingredientes simples: beterraba, cebola, berinjela, cogumelos, folhas -- e assim são apresentados no cardápio, sem grandes explicações (aliás, não se preocupe, você só terá explicação, se pedir). Mas que chegam a frente do cliente em pratos expressivos e sempre com um elemento supresa. 

Outro ponto alto do cardápio são os produtos fermentados. Da cremosa manteiga produzida com nata e kefir que acompanha o tal pão da casa feito com a farinha fresca, à coalhada também, servida com uma berinjela assada. Os peixes e frutos do mar vêm do vizinho Cauê Tessuto. São servidos tanto frescos como curados na casa.  

Além da cozinha aberta de onde é possível ver a equipe de perto trabalhando, um outro balcão divide a casa, o do bar. Com carta de coquetéis assinada por Danilo Nakamura, consultor d’Casa do Porco e do Bar do Jiquitaia, com drinques onde brilham produtos frescos e fermentados, como no Mango Collins (R$ 30) que combina gim, manjerição, kombucha de manga. A carta de vinhos é assinada pela dupla Daniela Bravin e Cássia Campos e surpreende pela divisão feita por solos, não regiões ou países. 

O pão e a manteiga da casa. Produzidos do começo ao fim ali Foto: Nilton Fukuda|Estadão

SERVIÇO

CORRUTELA

R. Medeiros de Albuquerque, 256, Vila Madalena  Inauguração: 30 de maio Horário de funcionamento: 19h/23h (dom.; 13h/16h; fecha segunda e terça) 

Cesar Costa quer transformar o rumo da gastronomia da cidade. A afirmação pode parecer exagerada, ainda mais se tratando de um nome pouco conhecido, mas faz todo sentido quando se olha de perto o trabalho desse jovem chef que está prestes a inaugurar seu primeiro restaurante. 

O chef César Costa, que comanda o Corrutela, na VIla Madalena Foto: Nilton Fukuda|Estadão

O Corrutela, que abre as portas no final do mês próximo ao Beco do Batman, tem entre suas principais premissas banir a palavra lixo de suas instalações. Para isso uma composteira com capacidade para 30 kg foi instalada logo na entrada do moderno salão, a vista de todos. Ela vai trabalhar enquanto os pratos coloridos finalizados por uma equipe de millennials (ninguém da equipe da cozinha tem mais de 30) saem da cozinha aberta. Já nos fundos da casa uma engenhoca com tecnologia israelense lava panelas e assadeiras sem produtos químicos ou esforço manual (e assim economiza milhares de litros de água no final do mês). Ah, e 25% da energia é solar, claro. Além de trabalhar apenas com canudos de metal.

A cozinha da nova casa, que já está funcionando em soft opening, segue um loop. Todos os dias os produtos, frescos e quase sempre orgânicos (apenas o leite não é), chegam ao restaurante e fazem o mesmo trajeto: são higienizados, vão para a câmara refrigerada, são preparados e servidos. O descarte vai para a composteira, as sobras de ingredientes viram comida dos funcionário no dia seguinte. Nenhum produto volta para trás. 

O cardápio enxuto ajuda na operação. Mas, ainda assim, o chef que é o responsável pelas compras não perde a chance de maximizar o aproveitamento dos produtos, além de dedicar atenção especial às embalagens. Prefere as grandes, retornáveis -- o leite fresco chega em galões de 30 litros -- e depois de uma briga boa, eliminou o plástico que costuma embalar verduras e legumes. 

Com um pé no futuro e outro no passado Cesar encontrou uma forma de entregar o melhor produto e ao mesmo tempo economizar nas embalagens e, de quebra, no preço dos insumos. Ele não compra a farinha e sim o trigo, que mói na cozinha de preparação antes de usar no preparo dos pães; o milho crioulo (comprado de uma produção agroflorestal da Bahia) também é moído ali antes de ser usado para fazer polenta. O chocolate 70% cacau da musse também é feito na casa-- ele compra e torra as amêndoas, antes de colocar num equipamento que faz a conchagem e transforma os nibs de cacau em chocolate. Esse equipamento e o moinho trazido de Minas dividem o espaço com um Thermomix e uma Pacojet, ícones da cozinha de vanguarda. 

Simples, granulada e saborosa, a polenta é resultado do produto fresco e de origem, combinada com cogumelos assados, ovo poché e folhas de mostarda Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Mas esta é só a ponta do trabalho de vanguarda do chef de 27 anos que passou a maior parte da sua carreira lá fora. 

Depois de breve passagem pelo D.O.M., Cesar foi para os Estados Unidos trabalhar no Chez Panisse, com Alice Waters, a grande dama da cozinha de produto,e precursora, nos anos 1970, da defesa do produto local e sazonal. Chegou ali aos 20 anos. A semente estava plantada. De lá seguiu para a Dinamarca para trabalhar com outro chef de olho na vanguarda, Christian Puglisi do estrelado Relae. A experiência final que moldou o que hoje é o Corrutela foi fora da cozinha, no trabalho com Miles Irving, -- o papa britânico das pancs, autor de The forager handook a guide to edible plants of britain. Espécie de Neide Rigo local.

De volta ao País, ainda em 2016, ele rodou mais de 14 mil quilômetros ao lado de Luiz Simões, amigo e sócio na casa, pelo Sul do Brasil atrás de produtos frescos de qualidade, orgânicos e conscientes -- que hoje são a base e também o ápice da cozinha do Corrutela. 

Mas o trabalho de Cesar extrapola a seleção de bons produtos -- ação já corriqueira entre chefs hoje. Ele põe o produtor no centro das atenções. E colabora para o desenvolvimento de produtores e a formação de uma cadeia justa e sustentável. Um exemplo? Ele não achou um trigo orgânico que seguisse tais preceitos, então desenvolveu uma relação comprodutores do Paraná. Mas, como teria de comprar quantidades maiores que sua demanda, contatou outros chefs para repartir o trigo. Hoje a marca paranaense, chamada Biôganica, está consolidada, e fornece para chefs que compartilham dos ideias de Cesar, como Paola Carosella. Com a chef do Arturito ele faz um trabalho semelhante, com cogumelos selvagens de Serra Catarinense, e que foram tema de reportagem do Paladar no ano passado em expedição liderada por ele e a colunista Neide Rigo. 

Do zero. Moinho de pedra trazido de Minas, onde César refina a o trigo e o milho para fazer o pão e a polenta, respectivamente. Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Cesar coloca em evidência um novo papel do chef de cozinha em que a preocupação com o impacto vai além do desperdício de alimentos ou do lixo e inclui toda a cadeia, além da participação ativa no desenvolvimento de boas práticas, tanto no manejo agroflorestal como na remuneração justa dos produtores. Nas próximas semanas o Corrutela deve receber a certificação da SRA, Sustainable Restaurant Association, consultoria inglesa que avalia e classifica restaurantes ao redor do mundo seguindo premissas sustentáveis, e que vão além só do quesito ambiental, mas também sociais, como o fair trade, a responsabilidade pela comunidade que o restaurante está inserido assim como com seus empregados e com o que é servido aos clientes. A casa é a segunda na América Latina a conquistar a certificação, ao lado do Pujol, no México.

Cesar não inventou a roda, ele faz parte de uma geração de chefs que pensam além do prato. No Silo, primeiro restaurante zero waste do Reino Unido, do chef Douglas McMaster, a composteira já faz as vezes de centro das atenções no salão assim como um moinho. César, inclusive passou por lá no ano passado para aprender com McMaster, que vem ao Brasil em outubro, a convite dele, assim como Miles, participar do seminário sobre PANCs no Sesc Pompéia do qual Costa é co-curador da ao lado da colunista do Paladar Neide Rigo.

  Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Mas nada disso é motivo para descuidar da comida, garante o chef. “Não posso dar mais atenção para a sustentabilidade que para a qualidade da comida”, diz.E a comida da nova casa vale, sim, a pena, como você pode conferir abaixo. 

E A COMIDA DO CORRUTELA?

“A comida do Corrutela é a coalizão de vários trabalhos legais e bem feitos, não tem como dar errado”, afirma o chef. “A musse de chocolate, por exemplo, é a junção do ovo da vila Yamaguishi, que tem a galinha tratada da melhor forma, com o leite da Fazenda Atalaia que produz o queijo Tulha, premiado lá fora, que chega fresco no restaurante e o cacau do Ernest Götsch. Juntamos o trabalho excelente dessas pessoas aqui.” É daí que vem a explicação do nome, Corrutela é um entreposto entre o campo e a cidade. 

Sobremesa de chocolate e menta. Musse é feita do zero na casa, desde a torra das amêndoas de cacau. Simples que surpreende Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Existe sim uma grande verdade na afirmação do chef. Mas existe também por trás de cada prato muito técnica e uma equipe afiada, que está com ele há mais de um ano, muito antes da casa abrir -- o projeto ficou embargado por oito meses.

O tartar de carne (único prato de carne vermelha no menu) segue receita dinamarquesa, é moído congelado (com as peças do moedor congeladas também) e fica na geladeira resfriando até a hora de ser servido, quase em temperatura ambiente. O resultado é uma textura fofa e muito leve, servida com emulsão cremosa de ovo poché e trigo crocante. A influência e a estética nórdicas e a essência do Chez Panisse são bem evidentes no menu, uma união improvável e que funciona. 

Todos os dias o menu muda um pouco, são sempre duas opções de sequências, herbívoro e onívoro, cada uma com três sugestões de entradas, um principal e uma sobremesa (R$ 95). Que o chef pede que sejam seguidas e não misturadas. Mas os pratos podem ser pedidos a la carte também. 

Entre as opções de entrada do menu herbívoro. Berinjela assada, coalhada de kefir, maçã e rabanete Foto: Nilton Fukuda|Estadão

Nele reinam os ingredientes simples: beterraba, cebola, berinjela, cogumelos, folhas -- e assim são apresentados no cardápio, sem grandes explicações (aliás, não se preocupe, você só terá explicação, se pedir). Mas que chegam a frente do cliente em pratos expressivos e sempre com um elemento supresa. 

Outro ponto alto do cardápio são os produtos fermentados. Da cremosa manteiga produzida com nata e kefir que acompanha o tal pão da casa feito com a farinha fresca, à coalhada também, servida com uma berinjela assada. Os peixes e frutos do mar vêm do vizinho Cauê Tessuto. São servidos tanto frescos como curados na casa.  

Além da cozinha aberta de onde é possível ver a equipe de perto trabalhando, um outro balcão divide a casa, o do bar. Com carta de coquetéis assinada por Danilo Nakamura, consultor d’Casa do Porco e do Bar do Jiquitaia, com drinques onde brilham produtos frescos e fermentados, como no Mango Collins (R$ 30) que combina gim, manjerição, kombucha de manga. A carta de vinhos é assinada pela dupla Daniela Bravin e Cássia Campos e surpreende pela divisão feita por solos, não regiões ou países. 

O pão e a manteiga da casa. Produzidos do começo ao fim ali Foto: Nilton Fukuda|Estadão

SERVIÇO

CORRUTELA

R. Medeiros de Albuquerque, 256, Vila Madalena  Inauguração: 30 de maio Horário de funcionamento: 19h/23h (dom.; 13h/16h; fecha segunda e terça) 

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