Restaurantes renomados apostam em (caprichados) menus vegetarianos


Atentos à demanda - e preocupados com as questões do planeta -, chefs que sempre trabalharam com carnes criam menus 100% vegetarianos

Por Danielle Nagase
Atualização:

Espaguete fresco com molho de tomate e manjericão. Essa é a descrição da única opção vegetariana oferecida pel’A Casa do Porco em seu cardápio de estreia, lá em 2015. Nada muito tentador e, talvez, decepcionante para quem, mesmo sem comer carne, criou expectativas para provar a comida de Jefferson Rueda. Talvez você esteja pensando: porca miséria! O próprio nome do restaurante dá pistas de que não se trata de um lugar indicado para vegetarianos. Quiçá não fosse mesmo. Em abril, porém, de olho nas voltas que mundo dá, o chef lançou o primeiro menu-degustação sem carne da história do restaurante.

No lugar do porco San Zé, nhoque de batata-docetostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa e seus acompanhamentos Foto: Mauro Holanda

“Antes de oficializar o menu vegetariano, a gente até se virava bem ao adaptar os pratos da degustação tradicional. Mas quando uma pessoa da mesa pedia a versão sem carne e as demais, não, faltava sintonia, não dava liga. E isso me incomodava”, conta o chef. Para resolver esse impasse, além de se debruçar na criação de dois “banquetes gastronômicos” distintos - um onívoro e outro vegetariano -, Jeffin tratou de espelhar a apresentação de ambos para que ninguém se sinta diferente à mesa.

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O famoso sushi de papada com tucupi negro e ameixa em conserva é, à primeira vista, tal e qual a sua versão sem porco, feita com uma tira de cogumelo Titãs. O codeguim vira um embutido de berinjela, mas ninguém diz antes de levar à boca. O tartare de porco, tutano e cogumelo é igualzinho ao tartare de nabo. Idem para o queijo de coalho com goiabada e picles de cebola roxa que veste a mesma roupa que o torresmo de pancetta. Mas e o porco San Zé, estrela da casa? Vira um nhoque de batata-doce, que é tostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa por seis horas.

Vegano. No lugar do tartare de porco, tutano e cogumelo é tartare de nabo Foto: Mauro Holanda

Se as aparências enganam, à boca, o novo menu sem porco (R$ 165) não deixa dúvidas: vale (e muito) até para quem come carne - as receitas vegetarianas, cuja maioria dos ingredientes vêm de São José do Rio Pardo, diretamente do sítio Rueda, têm zero ar de improviso e, em termos de sabor e textura, não ficam para trás se comparadas a seus pares do cardápio onívoro. “O vegetarianismo é uma tendência. Eles (os vegetarianos) estão em todo lugar e devem ser bem servidos em todos os restaurantes, não só nos que seguem essa proposta”, crava Jeffin.

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Original. Tartare de porco, tutano e cogumelo Foto: Mauro Holanda

Movimento semelhante - de chefs que, até então, não eram associados à gastronomia baseada em vegetais - vem acontecendo no mundo todo. Não só pela demanda cada vez maior de clientes que pararam ou diminuíram o consumo de carne, por diversas razões, mas também por conta da insustentabilidade do sistema alimentar global, escancarada com a pandemia.

Daniel Humm, do Eleven Madison Park, em Nova York, se viu obrigado a repensar a proposta da casa durante os duros meses de lockdown. Acabou fazendo, a si mesmo, a promessa (ousada) de não servir mais carnes nem frutos do mar no restaurante numa possível reabertura. E cumpriu: em maio, o chef colocou em cartaz um menu 100% vegetariano. “As pessoas vêm ao Eleven Madison Park em busca de experiência, de um momento mágico e, para mim, não precisa ter carne ou peixe para isso”, explica Humm no vídeo postado nas redes sociais da casa (@elevenmadisonpark). “E se a gente mostrar que não precisa mesmo, talvez possamos inspirar outras pessoas a fazer o mesmo.”

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Com três estrelas Michelin, o restaurante foi eleito o melhor do mundo em 2017, pelo 50 Best. Entre os esforços para a mudança (que mexeu, inclusive, nas refeições dos funcionários), destaque para a consultoria prestada por dois chefs shojin, que passaram três meses no restaurante para compartilhar seus conhecimentos sobre a culinária dos mosteiros budistas de Kyoto do século VII, baseada em vegetais. 

Para além da cozinha, publicações de culinária têm feito apostas semelhantes. Citando dados da Organização das Nações Unidas para a Agricultura - os quais afirmam que 14,5% das emissões globais de gases de efeito vem pecuária -, o site Epicurious, do mesmo grupo da revista Bon Appétit, decidiu, em abril, não publicar mais receitas com carne, além de eliminar do seu banco as que já foram publicadas.

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Reino vegetal

À frente do 31 Restaurante, que abriu oficialmente em janeiro, o chef Raphael Vieira levanta a bandeira da alimentação consciente, sustentável e harmoniosa com o planeta. A cozinha, apesar de não se definir vegetariana, volta seus holofotes para os vegetais - pelo menos 80% dos ingredientes do cardápio, que muda diariamente, é de origem vegetal. “Trabalhamos com o melhor que temos no dia”, conta Raphael. E o melhor, nem sempre - ou nunca - tem carne.

Menu vegetariano do novorestaurante 31 Foto: Gabriela Queiro
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O menu-degustação, com 14 etapas (R$ 120), apresenta grande parte dos vegetais em sua forma original, com sabor e textura potencializados por técnicas de fermentação, desidratação, sem muita intervenção - referência que o chef adquiriu na cozinha de Dan Barber, onde trabalhou. Chances de provar o minirabanete, crocante, com kouso de beterraba, o alho-poró com soro de leite e óleo de dill, a cebola tostada com óleo de nirá e água de fermentados, a batata doce com a saborosa manteiga noisette de amburana. A versão reduzida do menu, com cinco passos (R$ 85), pode ser pedida na versão vegana. No delivery, destaque para as caixas vegetariana e vegana, com cinco entradas, dois pratos principais e sobremesa. 

Giovanna Grossi, do Animus, também decidiu oficializar seu menu vegetariano. Desde janeiro, é possível escolher entre a versão tradicional ou a vegetariana, ambas com seis passos. “Sempre adaptamos os pratos conforme as restrições dos clientes, mas sentia que não era o bastante. Eles não ficavam 100% satisfeitos. Oferecer um cardápio baseado em vegetais, sem que eles tenham que pedir por isso, os fazem se sentir importantes”, comenta a chef.

Spatzle de cogumelos com cerveja preta e gema do restaurante Animus Foto: Thays Bittar
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O menu vegetal segue a mesma cadência do onívoro: couvert, snacks, drinque-aperitivo. Na hora das porções principais, em vez de mandar dois vegetais, dois pescados e duas carnes, Giovanna manda seis pequenos pratos só com vegetais. A ordem em que as receitas chegam à mesa respeita as intensidades de sabor, do mais suave, como a abobrinha grelhada, creme de milho tostado e tomates caramelizados, ao mais intenso, caso da berinjela preparada na brasa, com arroz vermelho cremoso e pesto.

À la carte

Com o trabalho que faz próxima a adolescentes, elaborando o cardápio de escolas, Morena Leite, do Capim Santo percebeu que cada vez mais jovens têm migrado para o veganismo. Atenta a esse movimento, decidiu criar um menu 100% vegano, com entradas, pratos principais e sobremesas para receber esse público.

Moqueca de banana-da-terra vegana do restauranteCapim Santo Foto: Mario Rodrigues

O papilote de verdes, com edamame, fava, vagem, brócolis e ervilha torta, gergelim negro e shoyu de coco (R$ 44) abre alas para a moqueca de banana, palmito e castanha de caju, servida com arroz de coco e farofa de dendê (R$ 56). Às quartas e aos sábados, dá para pedir a feijoada de legumes frescos e tofu defumado (R$ 79). De sobremesa, cuscuz de tapioca com leite de coco e manga (R$ 26). 

* preços checados em julho de 2021 

Espaguete fresco com molho de tomate e manjericão. Essa é a descrição da única opção vegetariana oferecida pel’A Casa do Porco em seu cardápio de estreia, lá em 2015. Nada muito tentador e, talvez, decepcionante para quem, mesmo sem comer carne, criou expectativas para provar a comida de Jefferson Rueda. Talvez você esteja pensando: porca miséria! O próprio nome do restaurante dá pistas de que não se trata de um lugar indicado para vegetarianos. Quiçá não fosse mesmo. Em abril, porém, de olho nas voltas que mundo dá, o chef lançou o primeiro menu-degustação sem carne da história do restaurante.

No lugar do porco San Zé, nhoque de batata-docetostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa e seus acompanhamentos Foto: Mauro Holanda

“Antes de oficializar o menu vegetariano, a gente até se virava bem ao adaptar os pratos da degustação tradicional. Mas quando uma pessoa da mesa pedia a versão sem carne e as demais, não, faltava sintonia, não dava liga. E isso me incomodava”, conta o chef. Para resolver esse impasse, além de se debruçar na criação de dois “banquetes gastronômicos” distintos - um onívoro e outro vegetariano -, Jeffin tratou de espelhar a apresentação de ambos para que ninguém se sinta diferente à mesa.

O famoso sushi de papada com tucupi negro e ameixa em conserva é, à primeira vista, tal e qual a sua versão sem porco, feita com uma tira de cogumelo Titãs. O codeguim vira um embutido de berinjela, mas ninguém diz antes de levar à boca. O tartare de porco, tutano e cogumelo é igualzinho ao tartare de nabo. Idem para o queijo de coalho com goiabada e picles de cebola roxa que veste a mesma roupa que o torresmo de pancetta. Mas e o porco San Zé, estrela da casa? Vira um nhoque de batata-doce, que é tostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa por seis horas.

Vegano. No lugar do tartare de porco, tutano e cogumelo é tartare de nabo Foto: Mauro Holanda

Se as aparências enganam, à boca, o novo menu sem porco (R$ 165) não deixa dúvidas: vale (e muito) até para quem come carne - as receitas vegetarianas, cuja maioria dos ingredientes vêm de São José do Rio Pardo, diretamente do sítio Rueda, têm zero ar de improviso e, em termos de sabor e textura, não ficam para trás se comparadas a seus pares do cardápio onívoro. “O vegetarianismo é uma tendência. Eles (os vegetarianos) estão em todo lugar e devem ser bem servidos em todos os restaurantes, não só nos que seguem essa proposta”, crava Jeffin.

Original. Tartare de porco, tutano e cogumelo Foto: Mauro Holanda

Movimento semelhante - de chefs que, até então, não eram associados à gastronomia baseada em vegetais - vem acontecendo no mundo todo. Não só pela demanda cada vez maior de clientes que pararam ou diminuíram o consumo de carne, por diversas razões, mas também por conta da insustentabilidade do sistema alimentar global, escancarada com a pandemia.

Daniel Humm, do Eleven Madison Park, em Nova York, se viu obrigado a repensar a proposta da casa durante os duros meses de lockdown. Acabou fazendo, a si mesmo, a promessa (ousada) de não servir mais carnes nem frutos do mar no restaurante numa possível reabertura. E cumpriu: em maio, o chef colocou em cartaz um menu 100% vegetariano. “As pessoas vêm ao Eleven Madison Park em busca de experiência, de um momento mágico e, para mim, não precisa ter carne ou peixe para isso”, explica Humm no vídeo postado nas redes sociais da casa (@elevenmadisonpark). “E se a gente mostrar que não precisa mesmo, talvez possamos inspirar outras pessoas a fazer o mesmo.”

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Com três estrelas Michelin, o restaurante foi eleito o melhor do mundo em 2017, pelo 50 Best. Entre os esforços para a mudança (que mexeu, inclusive, nas refeições dos funcionários), destaque para a consultoria prestada por dois chefs shojin, que passaram três meses no restaurante para compartilhar seus conhecimentos sobre a culinária dos mosteiros budistas de Kyoto do século VII, baseada em vegetais. 

Para além da cozinha, publicações de culinária têm feito apostas semelhantes. Citando dados da Organização das Nações Unidas para a Agricultura - os quais afirmam que 14,5% das emissões globais de gases de efeito vem pecuária -, o site Epicurious, do mesmo grupo da revista Bon Appétit, decidiu, em abril, não publicar mais receitas com carne, além de eliminar do seu banco as que já foram publicadas.

Reino vegetal

À frente do 31 Restaurante, que abriu oficialmente em janeiro, o chef Raphael Vieira levanta a bandeira da alimentação consciente, sustentável e harmoniosa com o planeta. A cozinha, apesar de não se definir vegetariana, volta seus holofotes para os vegetais - pelo menos 80% dos ingredientes do cardápio, que muda diariamente, é de origem vegetal. “Trabalhamos com o melhor que temos no dia”, conta Raphael. E o melhor, nem sempre - ou nunca - tem carne.

Menu vegetariano do novorestaurante 31 Foto: Gabriela Queiro

O menu-degustação, com 14 etapas (R$ 120), apresenta grande parte dos vegetais em sua forma original, com sabor e textura potencializados por técnicas de fermentação, desidratação, sem muita intervenção - referência que o chef adquiriu na cozinha de Dan Barber, onde trabalhou. Chances de provar o minirabanete, crocante, com kouso de beterraba, o alho-poró com soro de leite e óleo de dill, a cebola tostada com óleo de nirá e água de fermentados, a batata doce com a saborosa manteiga noisette de amburana. A versão reduzida do menu, com cinco passos (R$ 85), pode ser pedida na versão vegana. No delivery, destaque para as caixas vegetariana e vegana, com cinco entradas, dois pratos principais e sobremesa. 

Giovanna Grossi, do Animus, também decidiu oficializar seu menu vegetariano. Desde janeiro, é possível escolher entre a versão tradicional ou a vegetariana, ambas com seis passos. “Sempre adaptamos os pratos conforme as restrições dos clientes, mas sentia que não era o bastante. Eles não ficavam 100% satisfeitos. Oferecer um cardápio baseado em vegetais, sem que eles tenham que pedir por isso, os fazem se sentir importantes”, comenta a chef.

Spatzle de cogumelos com cerveja preta e gema do restaurante Animus Foto: Thays Bittar

O menu vegetal segue a mesma cadência do onívoro: couvert, snacks, drinque-aperitivo. Na hora das porções principais, em vez de mandar dois vegetais, dois pescados e duas carnes, Giovanna manda seis pequenos pratos só com vegetais. A ordem em que as receitas chegam à mesa respeita as intensidades de sabor, do mais suave, como a abobrinha grelhada, creme de milho tostado e tomates caramelizados, ao mais intenso, caso da berinjela preparada na brasa, com arroz vermelho cremoso e pesto.

À la carte

Com o trabalho que faz próxima a adolescentes, elaborando o cardápio de escolas, Morena Leite, do Capim Santo percebeu que cada vez mais jovens têm migrado para o veganismo. Atenta a esse movimento, decidiu criar um menu 100% vegano, com entradas, pratos principais e sobremesas para receber esse público.

Moqueca de banana-da-terra vegana do restauranteCapim Santo Foto: Mario Rodrigues

O papilote de verdes, com edamame, fava, vagem, brócolis e ervilha torta, gergelim negro e shoyu de coco (R$ 44) abre alas para a moqueca de banana, palmito e castanha de caju, servida com arroz de coco e farofa de dendê (R$ 56). Às quartas e aos sábados, dá para pedir a feijoada de legumes frescos e tofu defumado (R$ 79). De sobremesa, cuscuz de tapioca com leite de coco e manga (R$ 26). 

* preços checados em julho de 2021 

Espaguete fresco com molho de tomate e manjericão. Essa é a descrição da única opção vegetariana oferecida pel’A Casa do Porco em seu cardápio de estreia, lá em 2015. Nada muito tentador e, talvez, decepcionante para quem, mesmo sem comer carne, criou expectativas para provar a comida de Jefferson Rueda. Talvez você esteja pensando: porca miséria! O próprio nome do restaurante dá pistas de que não se trata de um lugar indicado para vegetarianos. Quiçá não fosse mesmo. Em abril, porém, de olho nas voltas que mundo dá, o chef lançou o primeiro menu-degustação sem carne da história do restaurante.

No lugar do porco San Zé, nhoque de batata-docetostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa e seus acompanhamentos Foto: Mauro Holanda

“Antes de oficializar o menu vegetariano, a gente até se virava bem ao adaptar os pratos da degustação tradicional. Mas quando uma pessoa da mesa pedia a versão sem carne e as demais, não, faltava sintonia, não dava liga. E isso me incomodava”, conta o chef. Para resolver esse impasse, além de se debruçar na criação de dois “banquetes gastronômicos” distintos - um onívoro e outro vegetariano -, Jeffin tratou de espelhar a apresentação de ambos para que ninguém se sinta diferente à mesa.

O famoso sushi de papada com tucupi negro e ameixa em conserva é, à primeira vista, tal e qual a sua versão sem porco, feita com uma tira de cogumelo Titãs. O codeguim vira um embutido de berinjela, mas ninguém diz antes de levar à boca. O tartare de porco, tutano e cogumelo é igualzinho ao tartare de nabo. Idem para o queijo de coalho com goiabada e picles de cebola roxa que veste a mesma roupa que o torresmo de pancetta. Mas e o porco San Zé, estrela da casa? Vira um nhoque de batata-doce, que é tostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa por seis horas.

Vegano. No lugar do tartare de porco, tutano e cogumelo é tartare de nabo Foto: Mauro Holanda

Se as aparências enganam, à boca, o novo menu sem porco (R$ 165) não deixa dúvidas: vale (e muito) até para quem come carne - as receitas vegetarianas, cuja maioria dos ingredientes vêm de São José do Rio Pardo, diretamente do sítio Rueda, têm zero ar de improviso e, em termos de sabor e textura, não ficam para trás se comparadas a seus pares do cardápio onívoro. “O vegetarianismo é uma tendência. Eles (os vegetarianos) estão em todo lugar e devem ser bem servidos em todos os restaurantes, não só nos que seguem essa proposta”, crava Jeffin.

Original. Tartare de porco, tutano e cogumelo Foto: Mauro Holanda

Movimento semelhante - de chefs que, até então, não eram associados à gastronomia baseada em vegetais - vem acontecendo no mundo todo. Não só pela demanda cada vez maior de clientes que pararam ou diminuíram o consumo de carne, por diversas razões, mas também por conta da insustentabilidade do sistema alimentar global, escancarada com a pandemia.

Daniel Humm, do Eleven Madison Park, em Nova York, se viu obrigado a repensar a proposta da casa durante os duros meses de lockdown. Acabou fazendo, a si mesmo, a promessa (ousada) de não servir mais carnes nem frutos do mar no restaurante numa possível reabertura. E cumpriu: em maio, o chef colocou em cartaz um menu 100% vegetariano. “As pessoas vêm ao Eleven Madison Park em busca de experiência, de um momento mágico e, para mim, não precisa ter carne ou peixe para isso”, explica Humm no vídeo postado nas redes sociais da casa (@elevenmadisonpark). “E se a gente mostrar que não precisa mesmo, talvez possamos inspirar outras pessoas a fazer o mesmo.”

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Com três estrelas Michelin, o restaurante foi eleito o melhor do mundo em 2017, pelo 50 Best. Entre os esforços para a mudança (que mexeu, inclusive, nas refeições dos funcionários), destaque para a consultoria prestada por dois chefs shojin, que passaram três meses no restaurante para compartilhar seus conhecimentos sobre a culinária dos mosteiros budistas de Kyoto do século VII, baseada em vegetais. 

Para além da cozinha, publicações de culinária têm feito apostas semelhantes. Citando dados da Organização das Nações Unidas para a Agricultura - os quais afirmam que 14,5% das emissões globais de gases de efeito vem pecuária -, o site Epicurious, do mesmo grupo da revista Bon Appétit, decidiu, em abril, não publicar mais receitas com carne, além de eliminar do seu banco as que já foram publicadas.

Reino vegetal

À frente do 31 Restaurante, que abriu oficialmente em janeiro, o chef Raphael Vieira levanta a bandeira da alimentação consciente, sustentável e harmoniosa com o planeta. A cozinha, apesar de não se definir vegetariana, volta seus holofotes para os vegetais - pelo menos 80% dos ingredientes do cardápio, que muda diariamente, é de origem vegetal. “Trabalhamos com o melhor que temos no dia”, conta Raphael. E o melhor, nem sempre - ou nunca - tem carne.

Menu vegetariano do novorestaurante 31 Foto: Gabriela Queiro

O menu-degustação, com 14 etapas (R$ 120), apresenta grande parte dos vegetais em sua forma original, com sabor e textura potencializados por técnicas de fermentação, desidratação, sem muita intervenção - referência que o chef adquiriu na cozinha de Dan Barber, onde trabalhou. Chances de provar o minirabanete, crocante, com kouso de beterraba, o alho-poró com soro de leite e óleo de dill, a cebola tostada com óleo de nirá e água de fermentados, a batata doce com a saborosa manteiga noisette de amburana. A versão reduzida do menu, com cinco passos (R$ 85), pode ser pedida na versão vegana. No delivery, destaque para as caixas vegetariana e vegana, com cinco entradas, dois pratos principais e sobremesa. 

Giovanna Grossi, do Animus, também decidiu oficializar seu menu vegetariano. Desde janeiro, é possível escolher entre a versão tradicional ou a vegetariana, ambas com seis passos. “Sempre adaptamos os pratos conforme as restrições dos clientes, mas sentia que não era o bastante. Eles não ficavam 100% satisfeitos. Oferecer um cardápio baseado em vegetais, sem que eles tenham que pedir por isso, os fazem se sentir importantes”, comenta a chef.

Spatzle de cogumelos com cerveja preta e gema do restaurante Animus Foto: Thays Bittar

O menu vegetal segue a mesma cadência do onívoro: couvert, snacks, drinque-aperitivo. Na hora das porções principais, em vez de mandar dois vegetais, dois pescados e duas carnes, Giovanna manda seis pequenos pratos só com vegetais. A ordem em que as receitas chegam à mesa respeita as intensidades de sabor, do mais suave, como a abobrinha grelhada, creme de milho tostado e tomates caramelizados, ao mais intenso, caso da berinjela preparada na brasa, com arroz vermelho cremoso e pesto.

À la carte

Com o trabalho que faz próxima a adolescentes, elaborando o cardápio de escolas, Morena Leite, do Capim Santo percebeu que cada vez mais jovens têm migrado para o veganismo. Atenta a esse movimento, decidiu criar um menu 100% vegano, com entradas, pratos principais e sobremesas para receber esse público.

Moqueca de banana-da-terra vegana do restauranteCapim Santo Foto: Mario Rodrigues

O papilote de verdes, com edamame, fava, vagem, brócolis e ervilha torta, gergelim negro e shoyu de coco (R$ 44) abre alas para a moqueca de banana, palmito e castanha de caju, servida com arroz de coco e farofa de dendê (R$ 56). Às quartas e aos sábados, dá para pedir a feijoada de legumes frescos e tofu defumado (R$ 79). De sobremesa, cuscuz de tapioca com leite de coco e manga (R$ 26). 

* preços checados em julho de 2021 

Espaguete fresco com molho de tomate e manjericão. Essa é a descrição da única opção vegetariana oferecida pel’A Casa do Porco em seu cardápio de estreia, lá em 2015. Nada muito tentador e, talvez, decepcionante para quem, mesmo sem comer carne, criou expectativas para provar a comida de Jefferson Rueda. Talvez você esteja pensando: porca miséria! O próprio nome do restaurante dá pistas de que não se trata de um lugar indicado para vegetarianos. Quiçá não fosse mesmo. Em abril, porém, de olho nas voltas que mundo dá, o chef lançou o primeiro menu-degustação sem carne da história do restaurante.

No lugar do porco San Zé, nhoque de batata-docetostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa e seus acompanhamentos Foto: Mauro Holanda

“Antes de oficializar o menu vegetariano, a gente até se virava bem ao adaptar os pratos da degustação tradicional. Mas quando uma pessoa da mesa pedia a versão sem carne e as demais, não, faltava sintonia, não dava liga. E isso me incomodava”, conta o chef. Para resolver esse impasse, além de se debruçar na criação de dois “banquetes gastronômicos” distintos - um onívoro e outro vegetariano -, Jeffin tratou de espelhar a apresentação de ambos para que ninguém se sinta diferente à mesa.

O famoso sushi de papada com tucupi negro e ameixa em conserva é, à primeira vista, tal e qual a sua versão sem porco, feita com uma tira de cogumelo Titãs. O codeguim vira um embutido de berinjela, mas ninguém diz antes de levar à boca. O tartare de porco, tutano e cogumelo é igualzinho ao tartare de nabo. Idem para o queijo de coalho com goiabada e picles de cebola roxa que veste a mesma roupa que o torresmo de pancetta. Mas e o porco San Zé, estrela da casa? Vira um nhoque de batata-doce, que é tostado e achatadinho para lembrar as fatias do porco caipira assado na brasa por seis horas.

Vegano. No lugar do tartare de porco, tutano e cogumelo é tartare de nabo Foto: Mauro Holanda

Se as aparências enganam, à boca, o novo menu sem porco (R$ 165) não deixa dúvidas: vale (e muito) até para quem come carne - as receitas vegetarianas, cuja maioria dos ingredientes vêm de São José do Rio Pardo, diretamente do sítio Rueda, têm zero ar de improviso e, em termos de sabor e textura, não ficam para trás se comparadas a seus pares do cardápio onívoro. “O vegetarianismo é uma tendência. Eles (os vegetarianos) estão em todo lugar e devem ser bem servidos em todos os restaurantes, não só nos que seguem essa proposta”, crava Jeffin.

Original. Tartare de porco, tutano e cogumelo Foto: Mauro Holanda

Movimento semelhante - de chefs que, até então, não eram associados à gastronomia baseada em vegetais - vem acontecendo no mundo todo. Não só pela demanda cada vez maior de clientes que pararam ou diminuíram o consumo de carne, por diversas razões, mas também por conta da insustentabilidade do sistema alimentar global, escancarada com a pandemia.

Daniel Humm, do Eleven Madison Park, em Nova York, se viu obrigado a repensar a proposta da casa durante os duros meses de lockdown. Acabou fazendo, a si mesmo, a promessa (ousada) de não servir mais carnes nem frutos do mar no restaurante numa possível reabertura. E cumpriu: em maio, o chef colocou em cartaz um menu 100% vegetariano. “As pessoas vêm ao Eleven Madison Park em busca de experiência, de um momento mágico e, para mim, não precisa ter carne ou peixe para isso”, explica Humm no vídeo postado nas redes sociais da casa (@elevenmadisonpark). “E se a gente mostrar que não precisa mesmo, talvez possamos inspirar outras pessoas a fazer o mesmo.”

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Com três estrelas Michelin, o restaurante foi eleito o melhor do mundo em 2017, pelo 50 Best. Entre os esforços para a mudança (que mexeu, inclusive, nas refeições dos funcionários), destaque para a consultoria prestada por dois chefs shojin, que passaram três meses no restaurante para compartilhar seus conhecimentos sobre a culinária dos mosteiros budistas de Kyoto do século VII, baseada em vegetais. 

Para além da cozinha, publicações de culinária têm feito apostas semelhantes. Citando dados da Organização das Nações Unidas para a Agricultura - os quais afirmam que 14,5% das emissões globais de gases de efeito vem pecuária -, o site Epicurious, do mesmo grupo da revista Bon Appétit, decidiu, em abril, não publicar mais receitas com carne, além de eliminar do seu banco as que já foram publicadas.

Reino vegetal

À frente do 31 Restaurante, que abriu oficialmente em janeiro, o chef Raphael Vieira levanta a bandeira da alimentação consciente, sustentável e harmoniosa com o planeta. A cozinha, apesar de não se definir vegetariana, volta seus holofotes para os vegetais - pelo menos 80% dos ingredientes do cardápio, que muda diariamente, é de origem vegetal. “Trabalhamos com o melhor que temos no dia”, conta Raphael. E o melhor, nem sempre - ou nunca - tem carne.

Menu vegetariano do novorestaurante 31 Foto: Gabriela Queiro

O menu-degustação, com 14 etapas (R$ 120), apresenta grande parte dos vegetais em sua forma original, com sabor e textura potencializados por técnicas de fermentação, desidratação, sem muita intervenção - referência que o chef adquiriu na cozinha de Dan Barber, onde trabalhou. Chances de provar o minirabanete, crocante, com kouso de beterraba, o alho-poró com soro de leite e óleo de dill, a cebola tostada com óleo de nirá e água de fermentados, a batata doce com a saborosa manteiga noisette de amburana. A versão reduzida do menu, com cinco passos (R$ 85), pode ser pedida na versão vegana. No delivery, destaque para as caixas vegetariana e vegana, com cinco entradas, dois pratos principais e sobremesa. 

Giovanna Grossi, do Animus, também decidiu oficializar seu menu vegetariano. Desde janeiro, é possível escolher entre a versão tradicional ou a vegetariana, ambas com seis passos. “Sempre adaptamos os pratos conforme as restrições dos clientes, mas sentia que não era o bastante. Eles não ficavam 100% satisfeitos. Oferecer um cardápio baseado em vegetais, sem que eles tenham que pedir por isso, os fazem se sentir importantes”, comenta a chef.

Spatzle de cogumelos com cerveja preta e gema do restaurante Animus Foto: Thays Bittar

O menu vegetal segue a mesma cadência do onívoro: couvert, snacks, drinque-aperitivo. Na hora das porções principais, em vez de mandar dois vegetais, dois pescados e duas carnes, Giovanna manda seis pequenos pratos só com vegetais. A ordem em que as receitas chegam à mesa respeita as intensidades de sabor, do mais suave, como a abobrinha grelhada, creme de milho tostado e tomates caramelizados, ao mais intenso, caso da berinjela preparada na brasa, com arroz vermelho cremoso e pesto.

À la carte

Com o trabalho que faz próxima a adolescentes, elaborando o cardápio de escolas, Morena Leite, do Capim Santo percebeu que cada vez mais jovens têm migrado para o veganismo. Atenta a esse movimento, decidiu criar um menu 100% vegano, com entradas, pratos principais e sobremesas para receber esse público.

Moqueca de banana-da-terra vegana do restauranteCapim Santo Foto: Mario Rodrigues

O papilote de verdes, com edamame, fava, vagem, brócolis e ervilha torta, gergelim negro e shoyu de coco (R$ 44) abre alas para a moqueca de banana, palmito e castanha de caju, servida com arroz de coco e farofa de dendê (R$ 56). Às quartas e aos sábados, dá para pedir a feijoada de legumes frescos e tofu defumado (R$ 79). De sobremesa, cuscuz de tapioca com leite de coco e manga (R$ 26). 

* preços checados em julho de 2021 

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