Histórias e experiências sobre o café

Opinião|Muito além dos defeitos romantizados


Os riscos de se deseducar o consumidor

Por Ensei Neto

Defeito é defeito.

Não se deve romantizar o que é ruim, porque trata-se de um desserviço.

Xícaras de café. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal
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Recebo frequentemente cafés para avaliar ou apenas conhecer, vindo de diretamente de produtores e pequenas torrefações.

O que tem me deixado espantado é a piora da percepção de qualidade nestes últimos anos de profissionais que lidam com controle de qualidade e torrefação, certamente influenciados por um pequeno mas estridente movimento de produção de cafés denominados como "exóticos".

Quando consultamos o bom e sempre necessário dicionário da língua portuguesa, encontramos para "exótico" significados como "não natural do local; excêntrico, esquisito; malfeito".

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A fermentação no café é algo bastante antigo, presente o princípio de sua história como produto. Obviamente, existem processos bem conduzidos, levando a resultados excepcionais em se tratando de notas de aroma e sabor. Por exemplo, um caso clássico é o café da região de Yergachef, que tinha a exuberante e inconfundível presença do limão siciliano.

Processo fermentativo. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Diferentemente da uva para produção do vinho, no caso do café fermenta-se somente a polpa que fica entre as sementes e a casca externa. Se a semente do café fermentar, morre, criando o chamado Defeito Capital, que é considerado como defeito importante, e que são dois os principais: o Podre, que é consequência da morte da semente, e o Acético, quando a polpa sofre transformação alcoólica e, em seguida, torna-se avinagrada ao final.

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A presença do vinagre nos grãos de café é defeito grave ou capital, e é no mínimo irresponsável afirmar que "o brasileiro deveria aceitar o acético no café".

Costumo dizer que ceviche se faz com peixe, não com grãos de café.

Grãos apodrecidos conferem, em baixa concentração, o mesmo sabor da dipirona, classificado também como amargor medicinal, enquanto em concentrações maiores fica mais evidente o creosol, substância que pode ser extraída da fração pesada do petróleo ou da decomposição de matéria orgânica, que recebe no mercado a denominação de bebida Rio e Riozona, a depender da intensidade.

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O creosol foi empregado pela primeira vez em 1870 como bactericida no Hospital Real de Londres, tornando mais seguras as cirurgias. É esta substância a responsável pela "dor de estômago" de cafés muito ruins ou com grãos apodrecidos, mortos antes da torra.

Grãos de frutos colhidos verdes ou imaturos conferem sensação física conhecida como adstringência, sensação percebida quando se come um caqui ou banana verde. A adstringência é resultado combinado da ação de dois receptores, que funcionam como sensores do nosso corpo, um que reconhece a deformação do tecido do corpo e outro, dor.

A adstringência, de forma simplista, é percepção de dor, por isso sempre é incômoda.

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Há uma confusão recorrente de se identificar a adstringência provocada por grãos de frutos verdes como presença de ácido málico em cafés brasileiros, o que é quase sempre um equívoco. Em treinamentos com grãos de origens de grande altitude, como o norte da Guatemala e regiões colombianas, um dos efeitos do ácido málico é, além de discreta adstringência na gengiva, a salivação que é sempre provocada por ácidos. Portanto, se a boca fica ressecada, a acidez foi suplantada por alguém que é adstringente.

Os três defeitos capitais formam a sigla PVA, que identifica os que afetam definitivamente a bebida. Por esta razão, lotes de café que apresentam esses sabores são considerados de baixa qualidade e com problemas críticos, razão pela qual empresas exportadoras e importadoras não aceitam para aquisição.

Espresso, naked. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal
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Temos de orientar o mercado corretamente, com informações de boa qualidade e honestas. É a forma de educar o consumidor e fazer com que ele compreenda o que são excelentes cafés, ajudando o mercado a crescer saudável.

Lembrete final: confie sempre em seus sentidos. Ninguém percebe as coisas como você, porque somos indivíduos.

 

 

Defeito é defeito.

Não se deve romantizar o que é ruim, porque trata-se de um desserviço.

Xícaras de café. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Recebo frequentemente cafés para avaliar ou apenas conhecer, vindo de diretamente de produtores e pequenas torrefações.

O que tem me deixado espantado é a piora da percepção de qualidade nestes últimos anos de profissionais que lidam com controle de qualidade e torrefação, certamente influenciados por um pequeno mas estridente movimento de produção de cafés denominados como "exóticos".

Quando consultamos o bom e sempre necessário dicionário da língua portuguesa, encontramos para "exótico" significados como "não natural do local; excêntrico, esquisito; malfeito".

A fermentação no café é algo bastante antigo, presente o princípio de sua história como produto. Obviamente, existem processos bem conduzidos, levando a resultados excepcionais em se tratando de notas de aroma e sabor. Por exemplo, um caso clássico é o café da região de Yergachef, que tinha a exuberante e inconfundível presença do limão siciliano.

Processo fermentativo. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Diferentemente da uva para produção do vinho, no caso do café fermenta-se somente a polpa que fica entre as sementes e a casca externa. Se a semente do café fermentar, morre, criando o chamado Defeito Capital, que é considerado como defeito importante, e que são dois os principais: o Podre, que é consequência da morte da semente, e o Acético, quando a polpa sofre transformação alcoólica e, em seguida, torna-se avinagrada ao final.

A presença do vinagre nos grãos de café é defeito grave ou capital, e é no mínimo irresponsável afirmar que "o brasileiro deveria aceitar o acético no café".

Costumo dizer que ceviche se faz com peixe, não com grãos de café.

Grãos apodrecidos conferem, em baixa concentração, o mesmo sabor da dipirona, classificado também como amargor medicinal, enquanto em concentrações maiores fica mais evidente o creosol, substância que pode ser extraída da fração pesada do petróleo ou da decomposição de matéria orgânica, que recebe no mercado a denominação de bebida Rio e Riozona, a depender da intensidade.

O creosol foi empregado pela primeira vez em 1870 como bactericida no Hospital Real de Londres, tornando mais seguras as cirurgias. É esta substância a responsável pela "dor de estômago" de cafés muito ruins ou com grãos apodrecidos, mortos antes da torra.

Grãos de frutos colhidos verdes ou imaturos conferem sensação física conhecida como adstringência, sensação percebida quando se come um caqui ou banana verde. A adstringência é resultado combinado da ação de dois receptores, que funcionam como sensores do nosso corpo, um que reconhece a deformação do tecido do corpo e outro, dor.

A adstringência, de forma simplista, é percepção de dor, por isso sempre é incômoda.

Há uma confusão recorrente de se identificar a adstringência provocada por grãos de frutos verdes como presença de ácido málico em cafés brasileiros, o que é quase sempre um equívoco. Em treinamentos com grãos de origens de grande altitude, como o norte da Guatemala e regiões colombianas, um dos efeitos do ácido málico é, além de discreta adstringência na gengiva, a salivação que é sempre provocada por ácidos. Portanto, se a boca fica ressecada, a acidez foi suplantada por alguém que é adstringente.

Os três defeitos capitais formam a sigla PVA, que identifica os que afetam definitivamente a bebida. Por esta razão, lotes de café que apresentam esses sabores são considerados de baixa qualidade e com problemas críticos, razão pela qual empresas exportadoras e importadoras não aceitam para aquisição.

Espresso, naked. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Temos de orientar o mercado corretamente, com informações de boa qualidade e honestas. É a forma de educar o consumidor e fazer com que ele compreenda o que são excelentes cafés, ajudando o mercado a crescer saudável.

Lembrete final: confie sempre em seus sentidos. Ninguém percebe as coisas como você, porque somos indivíduos.

 

 

Defeito é defeito.

Não se deve romantizar o que é ruim, porque trata-se de um desserviço.

Xícaras de café. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Recebo frequentemente cafés para avaliar ou apenas conhecer, vindo de diretamente de produtores e pequenas torrefações.

O que tem me deixado espantado é a piora da percepção de qualidade nestes últimos anos de profissionais que lidam com controle de qualidade e torrefação, certamente influenciados por um pequeno mas estridente movimento de produção de cafés denominados como "exóticos".

Quando consultamos o bom e sempre necessário dicionário da língua portuguesa, encontramos para "exótico" significados como "não natural do local; excêntrico, esquisito; malfeito".

A fermentação no café é algo bastante antigo, presente o princípio de sua história como produto. Obviamente, existem processos bem conduzidos, levando a resultados excepcionais em se tratando de notas de aroma e sabor. Por exemplo, um caso clássico é o café da região de Yergachef, que tinha a exuberante e inconfundível presença do limão siciliano.

Processo fermentativo. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Diferentemente da uva para produção do vinho, no caso do café fermenta-se somente a polpa que fica entre as sementes e a casca externa. Se a semente do café fermentar, morre, criando o chamado Defeito Capital, que é considerado como defeito importante, e que são dois os principais: o Podre, que é consequência da morte da semente, e o Acético, quando a polpa sofre transformação alcoólica e, em seguida, torna-se avinagrada ao final.

A presença do vinagre nos grãos de café é defeito grave ou capital, e é no mínimo irresponsável afirmar que "o brasileiro deveria aceitar o acético no café".

Costumo dizer que ceviche se faz com peixe, não com grãos de café.

Grãos apodrecidos conferem, em baixa concentração, o mesmo sabor da dipirona, classificado também como amargor medicinal, enquanto em concentrações maiores fica mais evidente o creosol, substância que pode ser extraída da fração pesada do petróleo ou da decomposição de matéria orgânica, que recebe no mercado a denominação de bebida Rio e Riozona, a depender da intensidade.

O creosol foi empregado pela primeira vez em 1870 como bactericida no Hospital Real de Londres, tornando mais seguras as cirurgias. É esta substância a responsável pela "dor de estômago" de cafés muito ruins ou com grãos apodrecidos, mortos antes da torra.

Grãos de frutos colhidos verdes ou imaturos conferem sensação física conhecida como adstringência, sensação percebida quando se come um caqui ou banana verde. A adstringência é resultado combinado da ação de dois receptores, que funcionam como sensores do nosso corpo, um que reconhece a deformação do tecido do corpo e outro, dor.

A adstringência, de forma simplista, é percepção de dor, por isso sempre é incômoda.

Há uma confusão recorrente de se identificar a adstringência provocada por grãos de frutos verdes como presença de ácido málico em cafés brasileiros, o que é quase sempre um equívoco. Em treinamentos com grãos de origens de grande altitude, como o norte da Guatemala e regiões colombianas, um dos efeitos do ácido málico é, além de discreta adstringência na gengiva, a salivação que é sempre provocada por ácidos. Portanto, se a boca fica ressecada, a acidez foi suplantada por alguém que é adstringente.

Os três defeitos capitais formam a sigla PVA, que identifica os que afetam definitivamente a bebida. Por esta razão, lotes de café que apresentam esses sabores são considerados de baixa qualidade e com problemas críticos, razão pela qual empresas exportadoras e importadoras não aceitam para aquisição.

Espresso, naked. Foto: Ensei Neto/Arquivo Pessoal

Temos de orientar o mercado corretamente, com informações de boa qualidade e honestas. É a forma de educar o consumidor e fazer com que ele compreenda o que são excelentes cafés, ajudando o mercado a crescer saudável.

Lembrete final: confie sempre em seus sentidos. Ninguém percebe as coisas como você, porque somos indivíduos.

 

 

Opinião por Ensei Neto

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