Os sabores do mundo

Opinião|No Oka, em Paris, o nosso querido feijão preto ganha status de alta gastronomia


Feijão, picanha e outros ingredientes brasileiros são atração no menu degustação do Oka, em Paris, restaurante com estrela Michelin do chef brasileiro Raphael Rego

Por Gisele Rech

De um lado para outro, o chef Raphael Rego se divide entre os dois espaços que comanda no 17º Arrondissement. A cozinha compartilhada entre o Oka, uma estrela Michelin, e o Fogo, o restaurante especializado em carnes na brasa, é o coração onde pulsa a criatividade do brasileiro radicado em Paris. Em comum, além do espaço onde são preparadas as refeições, os dois restaurantes compartilham de alguns ingredientes, como a picanha, a farinha de mandioca e o feijão. E é nesse último que vou me ater em um primeiro momento.

É que ver um ingrediente tão comum à mesa do brasileiro, na sua parceria perfeita com o arroz, em uma versão fine dining, surpreende e afaga ao mesmo tempo. O gostinho do feijão bem temperado, em texturas diferentes, aparece pela primeira vez na abertura do menu degustação do Oka em um dos snacks: a tartelete com recheio de feijão e farofa  mostra que sim, o ingrediente pode ter pinta de alta gastronomia, quando revestido de técnicas apuradas.

O feijãp á um toque especial à tartelete na abertura no menu fining dining do Oka. Foto: Gisele Rech
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O segundo momento em que o feijão reina é no prato que entrega tudo no nome: Picanha comme une feijoada, onde um generoso naco do nobre corte com nuances defumados  é servido acompanhado por uma mousse generosamente aerada de tutu preparada no sifão e um feijão manteiga em uma versão mais, digamos, natural e farinha d'água. A couve não fica de fora e surge recheada e enfeitada, ladeada por pimentas brasileiras - destaque à pimenta biquinho.

Aliás, apesar do texto focar inicialmente no feijão, a assinatura de Raphael Rego é prestigiar os ingredientes brasileiros com o melhor da técnica francesa, tão afeita à alta cozinha. É assim no brioche com creme de mandioca e tartare de dourado, na tapioca com requeijão caseiro e carne seca de picanha ou no morille - o fungo de tamanho generoso e cheio de ranhuras -  recheado com creme que leva castanha de baru.

Raphael Rego comanda o Oka e o Fogo em Paris. Foto: Gisele Rech
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No campo das sobremesas, o destaque, sem dúvida, é o prato que mescla chocolate, tão estimado pelos franceses, com a mucilagem, a polpa branca do cacau. Para acompanhar, suco de cacau, com aquele leve azedinho. As referências aos ingredientes brasileiros, boa parte produzido em território francês, também está na outra casa do chef, o irmão mais novo do Oka: o Fogo.

A sobremesa de chocolate e mucilagem do cacau é um ponto alto do menu degustação do Oka. Foto: Reprodução/Instagram

Fogo

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Nossa viagem gastronômica em Paris começou pelo Fogo, em plena noite de uma segunda-feira parisiense e com casa cheia.  Ao que parece, os pratos feitos na brasa, tão característicos do churrasco brasileiro, caíram na graça dos franceses. Sim, a clientela por lá é essencialmente local e o ambiente descontraída deixa todos tão à vontade que as conversas em francês são ouvidas em um tom acima do que é usual em Paris.

O clima é festivo, o que reflete muito do que é feito na cozinha, aberta para o salão. Quem comanda a grelha é o também brasileiro Carlos Araújo, braço direito de Rego na cozinha do Fogo. No menu, é claro, a picanha é a estrela. "A carne vem da Normandia, onde encontramos fornecedores que oferecem um produto que remete muito à qualidade do corte que vemos no Brasil", explica o chef. Mas, o espaço é democrático: também tem peixe do dia feito na brasa e, é claro, os vegetais e legumes super frescos levados ao fogo.

A picanha maturada do Fogo é da Normandia e o peixe fresco da costa francesa. Foto: Gisele Rech
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A carne na versão maturada é preparada na brasa e servida com a parceira infalível da farofa bem crocante e de um feijão mais encorpado, basicamente um tutu. O "algo a mais" vem direto da terra, ou da horta, que os franceses chamam de potager. "O acompanhamento de verduras e legumes, também preparados na brasa, variam conforme a oferta dos nosso produtores. A ideia é sempre ter algo muito fresco".

Picanha com tutu de feijão, farofa e chimichurri com pimentas brasileiras. Foto: Gisele Rech

Da picanha, o chef também faz um presunto com textura de jamón. Dos embutidos feitos na casa, também sai a feijoada que ganha uma versão de terrine e o revestimento no estilo croute. Por fim, e não menos importante, tem até uma linda versão do brasileiríssimo Romeu & Julieta de sobremesa.

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Potager, a horta

Para garantir o sotaque brasileiro no menu, entra em cena os produtores da região, que abraçaram o desafio de cultivar alguns ingredientes que dão o diferencial da carta dos dois espaços. Em outra frente, Raphael trabalha com uma empresa que importa ingredientes do Brasil, como a mucilagem, a polpa do cacau usada em uma das sobremesas do menu degustação do Oka destacada ali em cima.

Uma das recentes parcerias do chef é com o produtor Marc Faragoni, da Maraicher Biologique. A pouco mais de uma hora de Paris, a pequena porção de terra é profícua na produção orgânica. "A preocupação é manter um cultivo sem químicos, para garantir uma produto saboroso e que faz bem à saúde", diz o produtor. Boa parte do que o chef usa no restaurante vem de Marc e de outros produtores que levam a cabo a mesma filosofia de cultivo.

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Recentemente, a dupla iniciou experiência com alguns produtos bem brasileiros, como as pimentas. "A expectativa é de que, logo logo, possamos colher e levar à mesa no Oka e no Fogo", diz o chef. Enquanto isso não acontece, aproveitamos os produtos super naturais, tirados na melhor da sua fase na época. A nossa visita terminou, inclusive, com uma breve prova da primeira leva de morangos da estação, com aqueles frescor da fruta que acabou de ser tirada da terra. Nada mal para fechar muito bem a experiência nos restaurantes fraco-brasileiros.

Serviço

Oka (uma estrela Michelin) Fogo Endereço: 8 Rue Meissonier (17e Arrondissement), Paris - França Mais informações: @oka.paris e @fogo.paris17

Gisele Rech (esta que vos escreve) e Marc Faragoni, produtor da Maraicher Biologique. 

 

De um lado para outro, o chef Raphael Rego se divide entre os dois espaços que comanda no 17º Arrondissement. A cozinha compartilhada entre o Oka, uma estrela Michelin, e o Fogo, o restaurante especializado em carnes na brasa, é o coração onde pulsa a criatividade do brasileiro radicado em Paris. Em comum, além do espaço onde são preparadas as refeições, os dois restaurantes compartilham de alguns ingredientes, como a picanha, a farinha de mandioca e o feijão. E é nesse último que vou me ater em um primeiro momento.

É que ver um ingrediente tão comum à mesa do brasileiro, na sua parceria perfeita com o arroz, em uma versão fine dining, surpreende e afaga ao mesmo tempo. O gostinho do feijão bem temperado, em texturas diferentes, aparece pela primeira vez na abertura do menu degustação do Oka em um dos snacks: a tartelete com recheio de feijão e farofa  mostra que sim, o ingrediente pode ter pinta de alta gastronomia, quando revestido de técnicas apuradas.

O feijãp á um toque especial à tartelete na abertura no menu fining dining do Oka. Foto: Gisele Rech

O segundo momento em que o feijão reina é no prato que entrega tudo no nome: Picanha comme une feijoada, onde um generoso naco do nobre corte com nuances defumados  é servido acompanhado por uma mousse generosamente aerada de tutu preparada no sifão e um feijão manteiga em uma versão mais, digamos, natural e farinha d'água. A couve não fica de fora e surge recheada e enfeitada, ladeada por pimentas brasileiras - destaque à pimenta biquinho.

Aliás, apesar do texto focar inicialmente no feijão, a assinatura de Raphael Rego é prestigiar os ingredientes brasileiros com o melhor da técnica francesa, tão afeita à alta cozinha. É assim no brioche com creme de mandioca e tartare de dourado, na tapioca com requeijão caseiro e carne seca de picanha ou no morille - o fungo de tamanho generoso e cheio de ranhuras -  recheado com creme que leva castanha de baru.

Raphael Rego comanda o Oka e o Fogo em Paris. Foto: Gisele Rech

No campo das sobremesas, o destaque, sem dúvida, é o prato que mescla chocolate, tão estimado pelos franceses, com a mucilagem, a polpa branca do cacau. Para acompanhar, suco de cacau, com aquele leve azedinho. As referências aos ingredientes brasileiros, boa parte produzido em território francês, também está na outra casa do chef, o irmão mais novo do Oka: o Fogo.

A sobremesa de chocolate e mucilagem do cacau é um ponto alto do menu degustação do Oka. Foto: Reprodução/Instagram

Fogo

Nossa viagem gastronômica em Paris começou pelo Fogo, em plena noite de uma segunda-feira parisiense e com casa cheia.  Ao que parece, os pratos feitos na brasa, tão característicos do churrasco brasileiro, caíram na graça dos franceses. Sim, a clientela por lá é essencialmente local e o ambiente descontraída deixa todos tão à vontade que as conversas em francês são ouvidas em um tom acima do que é usual em Paris.

O clima é festivo, o que reflete muito do que é feito na cozinha, aberta para o salão. Quem comanda a grelha é o também brasileiro Carlos Araújo, braço direito de Rego na cozinha do Fogo. No menu, é claro, a picanha é a estrela. "A carne vem da Normandia, onde encontramos fornecedores que oferecem um produto que remete muito à qualidade do corte que vemos no Brasil", explica o chef. Mas, o espaço é democrático: também tem peixe do dia feito na brasa e, é claro, os vegetais e legumes super frescos levados ao fogo.

A picanha maturada do Fogo é da Normandia e o peixe fresco da costa francesa. Foto: Gisele Rech

A carne na versão maturada é preparada na brasa e servida com a parceira infalível da farofa bem crocante e de um feijão mais encorpado, basicamente um tutu. O "algo a mais" vem direto da terra, ou da horta, que os franceses chamam de potager. "O acompanhamento de verduras e legumes, também preparados na brasa, variam conforme a oferta dos nosso produtores. A ideia é sempre ter algo muito fresco".

Picanha com tutu de feijão, farofa e chimichurri com pimentas brasileiras. Foto: Gisele Rech

Da picanha, o chef também faz um presunto com textura de jamón. Dos embutidos feitos na casa, também sai a feijoada que ganha uma versão de terrine e o revestimento no estilo croute. Por fim, e não menos importante, tem até uma linda versão do brasileiríssimo Romeu & Julieta de sobremesa.

Potager, a horta

Para garantir o sotaque brasileiro no menu, entra em cena os produtores da região, que abraçaram o desafio de cultivar alguns ingredientes que dão o diferencial da carta dos dois espaços. Em outra frente, Raphael trabalha com uma empresa que importa ingredientes do Brasil, como a mucilagem, a polpa do cacau usada em uma das sobremesas do menu degustação do Oka destacada ali em cima.

Uma das recentes parcerias do chef é com o produtor Marc Faragoni, da Maraicher Biologique. A pouco mais de uma hora de Paris, a pequena porção de terra é profícua na produção orgânica. "A preocupação é manter um cultivo sem químicos, para garantir uma produto saboroso e que faz bem à saúde", diz o produtor. Boa parte do que o chef usa no restaurante vem de Marc e de outros produtores que levam a cabo a mesma filosofia de cultivo.

Recentemente, a dupla iniciou experiência com alguns produtos bem brasileiros, como as pimentas. "A expectativa é de que, logo logo, possamos colher e levar à mesa no Oka e no Fogo", diz o chef. Enquanto isso não acontece, aproveitamos os produtos super naturais, tirados na melhor da sua fase na época. A nossa visita terminou, inclusive, com uma breve prova da primeira leva de morangos da estação, com aqueles frescor da fruta que acabou de ser tirada da terra. Nada mal para fechar muito bem a experiência nos restaurantes fraco-brasileiros.

Serviço

Oka (uma estrela Michelin) Fogo Endereço: 8 Rue Meissonier (17e Arrondissement), Paris - França Mais informações: @oka.paris e @fogo.paris17

Gisele Rech (esta que vos escreve) e Marc Faragoni, produtor da Maraicher Biologique. 

 

De um lado para outro, o chef Raphael Rego se divide entre os dois espaços que comanda no 17º Arrondissement. A cozinha compartilhada entre o Oka, uma estrela Michelin, e o Fogo, o restaurante especializado em carnes na brasa, é o coração onde pulsa a criatividade do brasileiro radicado em Paris. Em comum, além do espaço onde são preparadas as refeições, os dois restaurantes compartilham de alguns ingredientes, como a picanha, a farinha de mandioca e o feijão. E é nesse último que vou me ater em um primeiro momento.

É que ver um ingrediente tão comum à mesa do brasileiro, na sua parceria perfeita com o arroz, em uma versão fine dining, surpreende e afaga ao mesmo tempo. O gostinho do feijão bem temperado, em texturas diferentes, aparece pela primeira vez na abertura do menu degustação do Oka em um dos snacks: a tartelete com recheio de feijão e farofa  mostra que sim, o ingrediente pode ter pinta de alta gastronomia, quando revestido de técnicas apuradas.

O feijãp á um toque especial à tartelete na abertura no menu fining dining do Oka. Foto: Gisele Rech

O segundo momento em que o feijão reina é no prato que entrega tudo no nome: Picanha comme une feijoada, onde um generoso naco do nobre corte com nuances defumados  é servido acompanhado por uma mousse generosamente aerada de tutu preparada no sifão e um feijão manteiga em uma versão mais, digamos, natural e farinha d'água. A couve não fica de fora e surge recheada e enfeitada, ladeada por pimentas brasileiras - destaque à pimenta biquinho.

Aliás, apesar do texto focar inicialmente no feijão, a assinatura de Raphael Rego é prestigiar os ingredientes brasileiros com o melhor da técnica francesa, tão afeita à alta cozinha. É assim no brioche com creme de mandioca e tartare de dourado, na tapioca com requeijão caseiro e carne seca de picanha ou no morille - o fungo de tamanho generoso e cheio de ranhuras -  recheado com creme que leva castanha de baru.

Raphael Rego comanda o Oka e o Fogo em Paris. Foto: Gisele Rech

No campo das sobremesas, o destaque, sem dúvida, é o prato que mescla chocolate, tão estimado pelos franceses, com a mucilagem, a polpa branca do cacau. Para acompanhar, suco de cacau, com aquele leve azedinho. As referências aos ingredientes brasileiros, boa parte produzido em território francês, também está na outra casa do chef, o irmão mais novo do Oka: o Fogo.

A sobremesa de chocolate e mucilagem do cacau é um ponto alto do menu degustação do Oka. Foto: Reprodução/Instagram

Fogo

Nossa viagem gastronômica em Paris começou pelo Fogo, em plena noite de uma segunda-feira parisiense e com casa cheia.  Ao que parece, os pratos feitos na brasa, tão característicos do churrasco brasileiro, caíram na graça dos franceses. Sim, a clientela por lá é essencialmente local e o ambiente descontraída deixa todos tão à vontade que as conversas em francês são ouvidas em um tom acima do que é usual em Paris.

O clima é festivo, o que reflete muito do que é feito na cozinha, aberta para o salão. Quem comanda a grelha é o também brasileiro Carlos Araújo, braço direito de Rego na cozinha do Fogo. No menu, é claro, a picanha é a estrela. "A carne vem da Normandia, onde encontramos fornecedores que oferecem um produto que remete muito à qualidade do corte que vemos no Brasil", explica o chef. Mas, o espaço é democrático: também tem peixe do dia feito na brasa e, é claro, os vegetais e legumes super frescos levados ao fogo.

A picanha maturada do Fogo é da Normandia e o peixe fresco da costa francesa. Foto: Gisele Rech

A carne na versão maturada é preparada na brasa e servida com a parceira infalível da farofa bem crocante e de um feijão mais encorpado, basicamente um tutu. O "algo a mais" vem direto da terra, ou da horta, que os franceses chamam de potager. "O acompanhamento de verduras e legumes, também preparados na brasa, variam conforme a oferta dos nosso produtores. A ideia é sempre ter algo muito fresco".

Picanha com tutu de feijão, farofa e chimichurri com pimentas brasileiras. Foto: Gisele Rech

Da picanha, o chef também faz um presunto com textura de jamón. Dos embutidos feitos na casa, também sai a feijoada que ganha uma versão de terrine e o revestimento no estilo croute. Por fim, e não menos importante, tem até uma linda versão do brasileiríssimo Romeu & Julieta de sobremesa.

Potager, a horta

Para garantir o sotaque brasileiro no menu, entra em cena os produtores da região, que abraçaram o desafio de cultivar alguns ingredientes que dão o diferencial da carta dos dois espaços. Em outra frente, Raphael trabalha com uma empresa que importa ingredientes do Brasil, como a mucilagem, a polpa do cacau usada em uma das sobremesas do menu degustação do Oka destacada ali em cima.

Uma das recentes parcerias do chef é com o produtor Marc Faragoni, da Maraicher Biologique. A pouco mais de uma hora de Paris, a pequena porção de terra é profícua na produção orgânica. "A preocupação é manter um cultivo sem químicos, para garantir uma produto saboroso e que faz bem à saúde", diz o produtor. Boa parte do que o chef usa no restaurante vem de Marc e de outros produtores que levam a cabo a mesma filosofia de cultivo.

Recentemente, a dupla iniciou experiência com alguns produtos bem brasileiros, como as pimentas. "A expectativa é de que, logo logo, possamos colher e levar à mesa no Oka e no Fogo", diz o chef. Enquanto isso não acontece, aproveitamos os produtos super naturais, tirados na melhor da sua fase na época. A nossa visita terminou, inclusive, com uma breve prova da primeira leva de morangos da estação, com aqueles frescor da fruta que acabou de ser tirada da terra. Nada mal para fechar muito bem a experiência nos restaurantes fraco-brasileiros.

Serviço

Oka (uma estrela Michelin) Fogo Endereço: 8 Rue Meissonier (17e Arrondissement), Paris - França Mais informações: @oka.paris e @fogo.paris17

Gisele Rech (esta que vos escreve) e Marc Faragoni, produtor da Maraicher Biologique. 

 

De um lado para outro, o chef Raphael Rego se divide entre os dois espaços que comanda no 17º Arrondissement. A cozinha compartilhada entre o Oka, uma estrela Michelin, e o Fogo, o restaurante especializado em carnes na brasa, é o coração onde pulsa a criatividade do brasileiro radicado em Paris. Em comum, além do espaço onde são preparadas as refeições, os dois restaurantes compartilham de alguns ingredientes, como a picanha, a farinha de mandioca e o feijão. E é nesse último que vou me ater em um primeiro momento.

É que ver um ingrediente tão comum à mesa do brasileiro, na sua parceria perfeita com o arroz, em uma versão fine dining, surpreende e afaga ao mesmo tempo. O gostinho do feijão bem temperado, em texturas diferentes, aparece pela primeira vez na abertura do menu degustação do Oka em um dos snacks: a tartelete com recheio de feijão e farofa  mostra que sim, o ingrediente pode ter pinta de alta gastronomia, quando revestido de técnicas apuradas.

O feijãp á um toque especial à tartelete na abertura no menu fining dining do Oka. Foto: Gisele Rech

O segundo momento em que o feijão reina é no prato que entrega tudo no nome: Picanha comme une feijoada, onde um generoso naco do nobre corte com nuances defumados  é servido acompanhado por uma mousse generosamente aerada de tutu preparada no sifão e um feijão manteiga em uma versão mais, digamos, natural e farinha d'água. A couve não fica de fora e surge recheada e enfeitada, ladeada por pimentas brasileiras - destaque à pimenta biquinho.

Aliás, apesar do texto focar inicialmente no feijão, a assinatura de Raphael Rego é prestigiar os ingredientes brasileiros com o melhor da técnica francesa, tão afeita à alta cozinha. É assim no brioche com creme de mandioca e tartare de dourado, na tapioca com requeijão caseiro e carne seca de picanha ou no morille - o fungo de tamanho generoso e cheio de ranhuras -  recheado com creme que leva castanha de baru.

Raphael Rego comanda o Oka e o Fogo em Paris. Foto: Gisele Rech

No campo das sobremesas, o destaque, sem dúvida, é o prato que mescla chocolate, tão estimado pelos franceses, com a mucilagem, a polpa branca do cacau. Para acompanhar, suco de cacau, com aquele leve azedinho. As referências aos ingredientes brasileiros, boa parte produzido em território francês, também está na outra casa do chef, o irmão mais novo do Oka: o Fogo.

A sobremesa de chocolate e mucilagem do cacau é um ponto alto do menu degustação do Oka. Foto: Reprodução/Instagram

Fogo

Nossa viagem gastronômica em Paris começou pelo Fogo, em plena noite de uma segunda-feira parisiense e com casa cheia.  Ao que parece, os pratos feitos na brasa, tão característicos do churrasco brasileiro, caíram na graça dos franceses. Sim, a clientela por lá é essencialmente local e o ambiente descontraída deixa todos tão à vontade que as conversas em francês são ouvidas em um tom acima do que é usual em Paris.

O clima é festivo, o que reflete muito do que é feito na cozinha, aberta para o salão. Quem comanda a grelha é o também brasileiro Carlos Araújo, braço direito de Rego na cozinha do Fogo. No menu, é claro, a picanha é a estrela. "A carne vem da Normandia, onde encontramos fornecedores que oferecem um produto que remete muito à qualidade do corte que vemos no Brasil", explica o chef. Mas, o espaço é democrático: também tem peixe do dia feito na brasa e, é claro, os vegetais e legumes super frescos levados ao fogo.

A picanha maturada do Fogo é da Normandia e o peixe fresco da costa francesa. Foto: Gisele Rech

A carne na versão maturada é preparada na brasa e servida com a parceira infalível da farofa bem crocante e de um feijão mais encorpado, basicamente um tutu. O "algo a mais" vem direto da terra, ou da horta, que os franceses chamam de potager. "O acompanhamento de verduras e legumes, também preparados na brasa, variam conforme a oferta dos nosso produtores. A ideia é sempre ter algo muito fresco".

Picanha com tutu de feijão, farofa e chimichurri com pimentas brasileiras. Foto: Gisele Rech

Da picanha, o chef também faz um presunto com textura de jamón. Dos embutidos feitos na casa, também sai a feijoada que ganha uma versão de terrine e o revestimento no estilo croute. Por fim, e não menos importante, tem até uma linda versão do brasileiríssimo Romeu & Julieta de sobremesa.

Potager, a horta

Para garantir o sotaque brasileiro no menu, entra em cena os produtores da região, que abraçaram o desafio de cultivar alguns ingredientes que dão o diferencial da carta dos dois espaços. Em outra frente, Raphael trabalha com uma empresa que importa ingredientes do Brasil, como a mucilagem, a polpa do cacau usada em uma das sobremesas do menu degustação do Oka destacada ali em cima.

Uma das recentes parcerias do chef é com o produtor Marc Faragoni, da Maraicher Biologique. A pouco mais de uma hora de Paris, a pequena porção de terra é profícua na produção orgânica. "A preocupação é manter um cultivo sem químicos, para garantir uma produto saboroso e que faz bem à saúde", diz o produtor. Boa parte do que o chef usa no restaurante vem de Marc e de outros produtores que levam a cabo a mesma filosofia de cultivo.

Recentemente, a dupla iniciou experiência com alguns produtos bem brasileiros, como as pimentas. "A expectativa é de que, logo logo, possamos colher e levar à mesa no Oka e no Fogo", diz o chef. Enquanto isso não acontece, aproveitamos os produtos super naturais, tirados na melhor da sua fase na época. A nossa visita terminou, inclusive, com uma breve prova da primeira leva de morangos da estação, com aqueles frescor da fruta que acabou de ser tirada da terra. Nada mal para fechar muito bem a experiência nos restaurantes fraco-brasileiros.

Serviço

Oka (uma estrela Michelin) Fogo Endereço: 8 Rue Meissonier (17e Arrondissement), Paris - França Mais informações: @oka.paris e @fogo.paris17

Gisele Rech (esta que vos escreve) e Marc Faragoni, produtor da Maraicher Biologique. 

 

Opinião por Gisele Rech

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