Escrever, editar e lançar um livro em apenas seis meses. Realizar o feito por vias normais, por intermédio de uma editora convencional pode não ser o melhor caminho. Foi com esse pensamento que, em uma madrugada de fevereiro deste ano, a jornalista Chris Fuscaldo decidiu que iria publicar seu livro Discografia Mutante: Álbuns Que Revolucionaram a Música Brasileira por conta própria e em duas línguas, português e inglês. Com o melhor estilo ‘faça você mesmo’ e financiamento adquirido por meio de crowdfunding, em agosto deste ano o livro estava impresso e no mercado, exatamente seis meses após aquela madrugada de fevereiro.
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Antes. Contar a história do trio Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias, os Mutantes, não foi um desejo repentino. A jornalista já havia realizado uma pesquisa intensa sobre a banda, em 2012, para a produção de seu trabalho de conclusão de curso (TCC) na universidade.
“Eu tinha uma pesquisa enorme sobre a banda e continuei reunindo material depois do TCC. Achei, então, que isso daria um baita livro. Na época em que tive a ideia, já tinha me planejado para fazer um doutorado nos Estados Unidos, em outubro deste ano. Pensei que lançar o livro lá também seria ótimo, porque os Mutantes são uma banda super bombada no país. Mas como eu conseguiria uma editora para lançar o livro em tão pouco tempo? Entendi que se não o fizesse sozinha, não o lançaria antes de viajar”, conta Chris.
Em 2016, a jornalista já havia se aventurado no processo de publicar um livro, o Discografia Legionária, que conta a trajetória da banda Legião Urbana e que foi lançado pela editora Leya. Para o novo projeto, o tempo foi decisivo para que Chris optasse pela forma independente. Além do doutorado, ela tinha como meta lançá-lo ainda em 2018, ano de celebração de 50 anos do álbum Os Mutantes, o primeiro da banda.
Durante. Com intenso trabalho de pesquisa sobre os Mutantes já realizado, a jornalista ainda fez entrevistas com técnicos de som que tiveram contato com a banda e teve conversas constantes com Sérgio Dias, único membro fundador que segue à frente dos Mutantes. Para escrever o texto final, um total de 246 páginas, Chris demorou incríveis dois meses.
O próximo passo foi produzir um vídeo para divulgar o livro em uma plataforma de crowdfunding e, assim, conseguir financiamento para materializá-lo. O objetivo da escritora era arrecadar cerca de R$ 38 mil. “Esse valor incluía os 13% destinados para a plataforma, o salário de um assistente que me ajudaria na divulgação do livro, orçamentos de diagramação, revisão, tradução, revisão da tradução e o envio dos livros vendidos. Aprendi muita coisa fazendo toda essa parte de logística.”
Chris também conseguiu parcerias com o canal de televisão Canal Brasil, a empresa de pôsteres PsicoBr e a gravadora Polysom para conseguir materiais que seriam entregues como brindes aos fãs que contribuíssem no financiamento.
Para divulgar o projeto, a escritora distribuiu panfletos em filas de shows dos Mutantes e de Arnaldo Baptista, hoje em carreira solo. Quando Rita Lee lançou seu livro, Chris também foi até a fila de autógrafos para contar sobre o Discografia Mutante aos fãs da cantora.
“Todo dia eu fazia um post nas redes sociais e pedia para que os admiradores dos Mutantes e da psicodelia replicassem o conteúdo.” Ao todo, Chris arrecadou R$ 46 mil, resultado da contribuição de fãs brasileiros e de países como Escócia, França, Espanha, Peru, Inglaterra, Holanda e EUA. “O diagramador até brincou e disse que nunca havia trabalhado com pagamento antecipado. Consegui lançar o livro sem dever para ninguém. Quando o dinheiro entrou, paguei todo mundo e ainda trabalhei dois meses com um excedente do valor arrecadado.”
A intensa divulgação não teve resultado apenas no financiamento. Antes mesmo do lançamento do livro, realizado nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro no mês de agosto, Chris já havia vendido 515 dos 1000 exemplares que foram para a gráfica. Atualmente, ela segue comercializando a biografia em seu site oficial pelo valor de R$ 80 e, segundo ela, vende cerca de um exemplar por dia.
Depois. Já nos EUA para cursar o doutorado, a jornalista pretende escrever mais duas biografias, publicadas, desta vez, por editoras. Chris trabalha há 11 anos em um livro sobre a carreira do cantor Zé Ramalho. Ela também deseja publicar em 2019 um livro sobre a vida e a carreira do cantor Belchior, que faleceu em 2017.
Mesmo com a ideia de trabalhar em parceria com editoras “por conta do giro que elas têm e pelo volume de cópias”, a escritora não descarta a forma independente que adotou no projeto da biografia dos Mutantes. “Se eu tiver uma nova ideia e uma editora levar mais de dois meses para aprová-la, eu tento de novo fazer crowdfunding”, afirma de forma assertiva.