Com um nome agressivo e inspiração na cultura punk, uma empresa de São Paulo quer conquistar uma parcela do mercado com um produto um tanto usual: água mineral. A Dane-se quer vender a bebida em latas de alumínio, como se fosse cerveja ou energético, focando no público que busca diminuir o uso de plástico, enquanto consome um produto diferente do comum.
“Eu acredito que este é o melhor nome para uma empresa como a nossa”, afirma o empresário Gregório Machado, 34, fundador da marca e idealizador do projeto. Segundo ele, para além do posicionamento de marca, o nome chama atenção do público e gera engajamento de quem entra em contato com o produto, gostando ou não.
O destaque está na estratégia de divulgação, que focou no ambiente digital, em especial nas redes sociais. A ideia era angariar público para testar a ideia e explorar o mote de ‘dar um dane-se’ tanto para o consumo de plástico, quanto para os problemas da vida — enquanto se consome uma lata de água da marca, é claro.
Para Machado, as estratégias de divulgação de produtos pouco saudáveis, como cervejas, energéticos ou refrigerantes, sempre focaram em campanhas mais descoladas e na criação de um estilo de vida para quem consome o produto. A ideia dele é trazer esse mesmo movimento para algo mais simples, mas essencial: água mineral.
A água por si só não tem um diferencial específico, já que a empresa usou para o primeiro lote uma fonte do Paraná que também envasa outras marcas de água. A produção das latas foi feita em pedido único e não há uma fábrica de propriedade da Dane-se.
Qualquer semelhança com a americana Liquid Death não é mera coincidência. A startup também vende água enlatada e tem crescido muito nos EUA, se tornando unicórnio (quando a companhia é avaliada em mais de US$ 1 bilhão) em março. Por lá, a pegada descolada e a irreverência na venda do produto funcionaram, e Machado quis emular o movimento por aqui.
Empresa cresce nas redes mesmo sem ter produto à venda
Até aqui a estratégia tem funcionado. A página da Dane-se, criada em fevereiro de 2023, soma 100 mil seguidores no Instagram, muito mais do que qualquer uma de suas concorrentes e sem o produto estar disponível para quem deseja comprá-lo.
O primeiro lote esgotou pouco mais de duas semanas depois de entrar no catálogo da Amazon, em outubro do ano passado. E o lucro das vendas se juntou a um aporte de R$ 500 mil que Machado conseguiu com familiares e amigos para financiar a empreitada.
O próximo lote, que deve chegar ao mercado em cerca de 2 meses, contará com 60 mil latas — de água com e sem gás — e também será usado para venda em restaurantes, barbearias e estúdios de tatuagem, a fim de tornar a marca mais conhecida. Com isso, a Dane-se quer faturar R$ 150 mil e investir num outro lote de cerca de 1 milhão de unidades. Para evitar negociações desfavoráveis, a companhia não pretende ir para as gôndolas dos supermercados, pelo menos por enquanto.
“A gente nasce com o pensamento de ser rentável o tempo todo”, diz Machado ao comentar os planos da companhia. Se tudo ocorrer como planejado, segundo ele, a Dane-se deve atingir um faturamento de R$ 3 milhões no final deste ano, diz o empreendedor.
Além da Dane-se, o empresário já comanda a própria rede de pizzarias, Pizza Makers, desde o final de 2016. Ele apostou na ideia da marca de água com um investimento inicial de R$ 150 mil, proveniente de recursos próprios.
Confira também
Estratégia de lançamento usada já é adotada por startups
“Se eu tivesse colocado meu produto ali (no Instagram), e não tivesse tido retorno nenhum, saberia que não daria certo”, afirma Machado sobre a estratégia de lançamento da Dane-se. O empresário contratou uma agência de marketing para a criação da identidade visual e o planejamento de um cronograma de publicação.
Postagens do produto são intercaladas com vídeos curtos do próprio empresário em diferentes situações, nas quais promove o mote da empresa e a própria estratégia de divulgação da marca.
Segundo Érika Buzo Martins, professora de marketing da ESPM, a ideia de criar uma marca e divulgá-la antes mesmo de se ter o próprio produto não é nova. O movimento, chamado de método ágil, é adotado por startups há anos e até mesmo recomendado para quem quer empreender neste formato.
“A recomendação é que se faça, por exemplo, um Instagram com um link para que as pessoas se cadastrem e, no lançamento do produto, recebam alguma bonificação por serem uma das primeiras inscritas”, explica Martins. “Fazendo essa fumaça, o empreendedor consegue sentir se o produto é realmente interessante”, complementa.
Para a professora, um dos principais diferenciais da empresa está na postura adotada pela marca para a venda do produto, o que a distancia de outros concorrentes, como a Mamba Water ou a Minalba. “A ousadia da empresa é vincular esse nome a um produto como água”, afirma.
A Mamba Water tem como um dos sócios o surfista Pedro Scooby e já é comercializada no varejo, mas tem menos de 15% da quantidade de seguidores que a Dane-se no Instagram, por exemplo. Já a Minalba, que vende água em garrafas plásticas e enlatadas, tem uma comunicação mais conservadora, em linha com outras companhias de venda de água.
“Eu não considero nenhuma dessas marcas como nossos concorrentes. Acredito que meu concorrente hoje é tudo o que a pessoa vê no feed das redes sociais dele”, afirma Machado. Para ele, a comunicação das empresas tem que sair do lugar-comum do anúncio clássico e gerar conteúdo para as pessoas. As vendas vêm como consequência.
Se a fala é mais uma jogada de marketing da empresa ou uma aposta certeira, só o tempo dirá. Fato é que a Dane-se cresce a passos largos nas redes. Quando a reportagem conversou com Machado, a companhia tinha pouco mais de 20 mil seguidores, número que quintuplicou nas últimas semanas.
“Hoje você não consegue comprar o produto dele, então isso pode causar frustração”, pontua Martins, citando que a demora em entrar no mercado pode dar brecha para que grandes indústrias repliquem o modelo de comunicação. Só que colocando as latas de água nas prateleiras rapidamente.