Nascida no Rio de Janeiro, Rosane de Oliveira Leite se instalou em Salvador já casada, aos 17 anos, acompanhando o marido que havia sido transferido por conta do trabalho. A mãe e a irmã a seguiram depois, servindo como porto seguro para a jovem. Em setembro de 2009, porém, a mãe morreu e, sete meses depois, a irmã. Num espaço de tempo, ela ficou viúva, casou-se novamente e teve filhos.
Mas teve uma época em que ficou “pirada”, diz, “triste com a natureza”. A filha, percebendo-a deprimida, sugeriu que Rose fosse passar um tempo na Ilha de Maré, uma vez que ela gostava de praia. Por lá ficou do Natal de 2010 ao carnaval de 2011, se encantou pelo lugar e decidiu morar ali.
“Comecei a andar pela Maré e vi a necessidade das mulheres marisqueiras, porque, para elas catarem um quilo de siri para vender, tinham de ter uma bacia de dez quilos de siri na casca ainda. Entendi que é muito sacrificado”, conta.
Já familiarizada com o artesanato, Rose percebeu que a atividade poderia ser uma alternativa de renda mais viável a essas mulheres, com maior rendimento e menos risco. Então, se dispôs a ensiná-las.
Nas andanças pela ilha, notou outra coisa: escamas grandes de peixes, conchas de ostras e mariscos sendo desperdiçadas, criando uma atmosfera de mau cheiro. Ela já tinha visto na internet que esse material poderia ser usado no artesanato, mas até então ninguém tinha ensinado a técnica. Disposta, ela começou a testar.
Era preciso beneficiar esses insumos de modo que as conchas perdessem o cheiro, ficassem mais lisas e pudessem ser usadas. Rose utilizou água sanitária, água e sabão e viu que levava sete dias até o recurso ficar propício ao uso. Depois, mais sete dias para recortar, tingir, pintar e montar até chegar ao produto final.
As conchas de ostras e mariscos ficam menos tempo na água sanitária, mas precisam de lixamento, porque são muito afiadas. Para que esse trabalho ocorra, o apoio mútuo se faz necessário. Os próprios pescadores dão as escamas de peixes para ela, enquanto ela mesma recolhe as conchas.
São brincos, colares, chaveiros, porta-guardanapos e itens de decoração feitos com o que seria descartado após a pesca e a mariscagem. Ao postar os primeiros resultados nas redes sociais, o boca a boca funcionou. Ela passou a vender os produtos e ensinar a técnica.
Apoio
Logo, Rose compreendeu que tinha um negócio em mãos e, por meio de consultorias do Sebrae, aprendeu a precificar as joias e divulgá-las melhor. Outra oportunidade que surgiu com o empreendimento foi ampliar o ensino do artesanato e do uso sustentável de materiais que seriam desperdiçados.
Ela faz parte do Instituto de Pesca Artesanal da Ilha de Maré, que a levou ao Centro de Referência de Assistência Social (Cras) para dar aulas de forma voluntária. “É prazeroso, eu faço com amor, porque eu sei que através de lá eu vou fazer todo mundo conhecer esse trabalho”, diz.
Mesmo assim, são projetos pontuais, e ela espera que a iniciativa ganhe amplitude. “O que mais precisa aqui é apoio de entidades, do governo, do Estado para fazer esse trabalho, expor, aproveitar a matéria-prima e educar a população”, deseja.
O Cras também a levou para apresentar o trabalho dela em escolas, mostrando a importância do reaproveitamento das escamas e da preservação do meio ambiente. Rose é convidada para expor em feiras e fazer workshops, ensinando comunidades ribeirinhas. “Foi um trabalho que me tirou do fundo do poço.”