Castanha de baru, baunilha do cerrado: como as mulheres cervejeiras estão conquistando o mercado


Com cervejas autorais, tradição e ativismo, empreendedoras quebram teto de vidro do setor, dominam mercado nacional e conquistam apreciadores da bebida no mundo todo

Por Bruna Klingspiegel

“Não é uma cervejaria para mulher. É só cerveja”, diz Luiza Tolosa, dona da cervejaria Dádiva, eleita por dois anos consecutivos (2019/20) como a melhor do Brasil, segundo o site Rate Beer. Apesar de minoria no mercado cervejeiro, mulheres como ela têm conquistado os consumidores mais exigentes e se destacado internacionalmente com criatividade, ativismo e qualidade.

Enquanto a Dádiva usa rótulos como ferramenta para chamar a atenção ao combate à desigualdade de gênero, a niteroiense Noi diversifica e expande os negócios da família. Já a Japas Cervejaria traz a identidade nipo-brasileira para as cervejas artesanais, o que levou quatro amigas a se destacarem no mercado americano com produção de cervejas únicas em Nova York.

Em comum, as empresas fazem parte da pequena parcela de 11% de cervejarias artesanais comandadas por mulheres, segundo pesquisa do DataSebrae em parceria com a Associação Brasileira de Cervejarias Artesanais (Abracerva). As empreendedoras reconhecem evolução no mercado, com um número cada vez maior de mulheres na produção da bebida, mas apontam a necessidade de acelerar ainda mais esse movimento.

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Beatrice Signor, Bianca e Barbara Buzin, sócias da Noi Cervejaria Foto: Alexander Landau

A partir de sua vivência no mercado cervejeiro, com mais de 15 anos de atuação, Bárbara Buzin, diretora da cervejaria Noi, relata que a presença feminina em cursos no setor, por exemplo, era extremamente limitada, chegando a ter apenas duas mulheres para cada 48 homens. No entanto, nos últimos anos, ela tem notado uma mudança significativa nesse cenário, com salas de aula apresentando uma presença feminina de até 50%.

“Se as pessoas nos veem nos eventos, a gente ‘tá’ ali trocando o barril, carregando gás. Nossa presença vai trazendo normalidade para o assunto. Estamos começando a chegar a esse lugar que também é nosso por direito”, afirma.

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Segundo o presidente da Abracerva, Gilberto Tarantino, a conscientização é um trabalho de educação constante. Ele destaca a importância de colocar cada vez mais mulheres no mercado de trabalho, mas ressalta que é preciso trabalhar de maneira organizada, capacitando profissionais para sobreviver financeiramente a longo prazo. “Tem muita gente que não faz ideia de como as mulheres estão presentes nesse segmento. Ainda há muito espaço para crescer no mercado.”

Preconceito

Com mais de 75 prêmios nacionais e internacionais, a Noi é gerenciada por três mulheres: as irmãs Bárbara e Bianca Buzin e Beatrice Signor, que desde pequenas trabalhavam juntas nos negócios gastronômicos que pertenciam à família. Formadas em administração, as três receberam a responsabilidade de cuidar da cervejaria criada pelo pai das irmãs, um ano após a fundação, em 2008.

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Na linha de frente da produção e há 15 anos no mercado, Bárbara viu uma evolução muito grande em relação à presença das mulheres no setor, mas relata que ainda é subestimada e questionada sobre sua capacidade e conhecimento. “Eu vou aos eventos e as pessoas me questionam o tempo todo se sou a filha ou a esposa do dono. Preciso me impor o tempo todo, é uma mistura de desprezo e desrespeito”, conta.

Destaque no mercado nacional, Luiza Tolosa compartilha do mesmo sentimento. A necessidade de provar sua experiência e conhecimentos é constante tanto no contato com o público como no contato com outros cervejeiros. “Preciso apresentar meu currículo antes de falar”, diz a empreendedora com experiência no mundo corporativo e no mercado financeiro. “O mercado quer nos rotular de uma coisa ou outra, mas a gente sempre quis fazer uma cerveja que atendesse públicos diferentes. Cerveja não tem gênero e é isso que queremos passar”, diz Luiza.

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Transformação

Antes, quando se falava em cervejas artesanais, a primeira imagem que vinha à mente das pessoas era a de homens barbudos segurando garrafas com rótulos pretos, decorados com caveiras, dragões, animais assustadores e outros símbolos tipicamente masculinos. No entanto, cervejarias como a Dádiva e a Japas transformaram essa bebida em uma ferramenta de ativismo e em uma maneira de promover discussões sérias por meio da identidade visual.

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Em 2021, por exemplo, a Dádiva lançou a cerveja 3/4 que apresenta a desigualdade salarial entre homens e mulheres. A cerveja foi embalada em duas latas diferentes: uma com 473 ml, representando o salário dos homens, e outra com 350 ml, representando o rendimento das mulheres. Para Luiza Tolosa, é importante utilizar esse espaço para colocar o dedo em algumas feridas e levar os valores da marca de forma prática e direta.

“O ativismo é importante, mas precisa ter um lastro. Colocamos nas latas os valores que estão enraizados na empresa, que estão no dia a dia do negócio”, diz.

Luiza Tolosa, sócia-fundadora da Cervejaria Dádiva. Foto: Claus Lehmann
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No caso da Japas, cervejaria nipo-brasileira e criada por quatro mulheres, os rótulos também funcionam como uma expressão da identidade da marca e das sócias. O Japão, que é uma cultura supertradicional, explica a diretora Yumi Shimada. Possivelmente, diz ela, para eles é muito diferente saberem que existem quatro mulheres por trás de uma marca de cerveja.

No Brasil, surpreende que sejam quatro mulheres descendentes de japoneses por trás da mesma empresa. “A gente levanta discussões só de existir, mas também tentamos imprimir isso nas nossas cervejas e nos nossos rótulos”, diz Shimada. “Cada bebida tem sua história, relembramos os antepassados, celebramos nossa identidade e olhamos para o futuro.”

Internacionalização

Quatro mulheres nipo-brasileiras – Maíra Kimura, Yumi Shimada, Fernanda Ueno e Tânia Matsuoka – se uniram graças à paixão pela cerveja para fundar a Cervejaria Japas.

Além da produção das bebidas, elas também criaram uma marca de roupas e acessórios chamada Arigatou by Japas e a Kurafato, uma feira de produtos artesanais nipo-brasileira contemporânea.

“A marca fala muito sobre nós. Desde os ingredientes até a identidade visual é tudo sobre nós, nossa história”, diz Kimura.

Com a cerveja, a marca alçou voos mais altos. O conhecimento multidisciplinar da equipe – algumas das sócias são mestres cervejeiras, sommeliers e/ou publicitárias – deu às donas um olhar 360º do negócio que logo se tornou um diferencial competitivo.

Em pouco tempo, a Japas se tornou uma marca forte possibilitando que ela vislumbrasse espaço em um dos mercados mais competitivos de cerveja artesanal do mundo: os Estados Unidos.

Ao incorporarem sua identidade cultural, elas desenvolveram cervejas únicas que combinam elementos da cultura japonesa e brasileira, como o wasabi e a jabuticaba. O estranhamento positivo do mercado americano, explica Fernanda, fez com que a cervejaria se destacasse.

“Não é só mais uma marca fazendo pilsen, ipa e sour. A gente também faz isso, mas colocar nosso lado autoral transparece para o mercado. Tem muita autenticidade no que a gente tá fazendo”, explica.

Maíra Kimura, Yumi Shimada, Fernanda Ueno e Tânia Matsuoka, sócias da Japas Cervejaria. Foto: Bruno Fujii

Todas as cervejas produzidas no Brasil, também são produzidas nos EUA desde 2019, explica Uono. Com um mercado muito mais maduro, hoje em dia a venda das bebidas no país americano é maior do que aqui no País.

Para se ter uma ideia, as vendas no país são quase 8 vezes o volume que vendem aqui. A previsão é que a companhia também chegue à Europa e à Ásia, com produtos iguais ou o mais semelhantes aos produzidos no Brasil.

A diversidade dos ingredientes e a qualidade da bebida também levou as cervejas produzidas pela Dádiva para a Europa. Desde 2018 comercializando seus produtos, durante o período de 2019 a 2022, houve um aumento significativo no envio das cervejas para países como Holanda, Dinamarca, Suécia, Suíça, Bélgica, França, Finlândia, Luxemburgo, dentre outros.

Esse volume de envio triplicou nesse período. Entre os rótulos mais buscados estão as cervejas com ingredientes típicos brasileiros como castanha de baru, baunilha do cerrado e cumaru, goiaba e maracujá.

No segundo semestre de 2022, Luiza Tolosa explica que ocorreu uma interrupção causada pelos impactos da Guerra da Ucrânia. Como resultado, estão sendo traçadas novas estratégias e novas rotas para este ano.

“Não é uma cervejaria para mulher. É só cerveja”, diz Luiza Tolosa, dona da cervejaria Dádiva, eleita por dois anos consecutivos (2019/20) como a melhor do Brasil, segundo o site Rate Beer. Apesar de minoria no mercado cervejeiro, mulheres como ela têm conquistado os consumidores mais exigentes e se destacado internacionalmente com criatividade, ativismo e qualidade.

Enquanto a Dádiva usa rótulos como ferramenta para chamar a atenção ao combate à desigualdade de gênero, a niteroiense Noi diversifica e expande os negócios da família. Já a Japas Cervejaria traz a identidade nipo-brasileira para as cervejas artesanais, o que levou quatro amigas a se destacarem no mercado americano com produção de cervejas únicas em Nova York.

Em comum, as empresas fazem parte da pequena parcela de 11% de cervejarias artesanais comandadas por mulheres, segundo pesquisa do DataSebrae em parceria com a Associação Brasileira de Cervejarias Artesanais (Abracerva). As empreendedoras reconhecem evolução no mercado, com um número cada vez maior de mulheres na produção da bebida, mas apontam a necessidade de acelerar ainda mais esse movimento.

Beatrice Signor, Bianca e Barbara Buzin, sócias da Noi Cervejaria Foto: Alexander Landau

A partir de sua vivência no mercado cervejeiro, com mais de 15 anos de atuação, Bárbara Buzin, diretora da cervejaria Noi, relata que a presença feminina em cursos no setor, por exemplo, era extremamente limitada, chegando a ter apenas duas mulheres para cada 48 homens. No entanto, nos últimos anos, ela tem notado uma mudança significativa nesse cenário, com salas de aula apresentando uma presença feminina de até 50%.

“Se as pessoas nos veem nos eventos, a gente ‘tá’ ali trocando o barril, carregando gás. Nossa presença vai trazendo normalidade para o assunto. Estamos começando a chegar a esse lugar que também é nosso por direito”, afirma.

Segundo o presidente da Abracerva, Gilberto Tarantino, a conscientização é um trabalho de educação constante. Ele destaca a importância de colocar cada vez mais mulheres no mercado de trabalho, mas ressalta que é preciso trabalhar de maneira organizada, capacitando profissionais para sobreviver financeiramente a longo prazo. “Tem muita gente que não faz ideia de como as mulheres estão presentes nesse segmento. Ainda há muito espaço para crescer no mercado.”

Preconceito

Com mais de 75 prêmios nacionais e internacionais, a Noi é gerenciada por três mulheres: as irmãs Bárbara e Bianca Buzin e Beatrice Signor, que desde pequenas trabalhavam juntas nos negócios gastronômicos que pertenciam à família. Formadas em administração, as três receberam a responsabilidade de cuidar da cervejaria criada pelo pai das irmãs, um ano após a fundação, em 2008.

Na linha de frente da produção e há 15 anos no mercado, Bárbara viu uma evolução muito grande em relação à presença das mulheres no setor, mas relata que ainda é subestimada e questionada sobre sua capacidade e conhecimento. “Eu vou aos eventos e as pessoas me questionam o tempo todo se sou a filha ou a esposa do dono. Preciso me impor o tempo todo, é uma mistura de desprezo e desrespeito”, conta.

Destaque no mercado nacional, Luiza Tolosa compartilha do mesmo sentimento. A necessidade de provar sua experiência e conhecimentos é constante tanto no contato com o público como no contato com outros cervejeiros. “Preciso apresentar meu currículo antes de falar”, diz a empreendedora com experiência no mundo corporativo e no mercado financeiro. “O mercado quer nos rotular de uma coisa ou outra, mas a gente sempre quis fazer uma cerveja que atendesse públicos diferentes. Cerveja não tem gênero e é isso que queremos passar”, diz Luiza.

Transformação

Antes, quando se falava em cervejas artesanais, a primeira imagem que vinha à mente das pessoas era a de homens barbudos segurando garrafas com rótulos pretos, decorados com caveiras, dragões, animais assustadores e outros símbolos tipicamente masculinos. No entanto, cervejarias como a Dádiva e a Japas transformaram essa bebida em uma ferramenta de ativismo e em uma maneira de promover discussões sérias por meio da identidade visual.

Em 2021, por exemplo, a Dádiva lançou a cerveja 3/4 que apresenta a desigualdade salarial entre homens e mulheres. A cerveja foi embalada em duas latas diferentes: uma com 473 ml, representando o salário dos homens, e outra com 350 ml, representando o rendimento das mulheres. Para Luiza Tolosa, é importante utilizar esse espaço para colocar o dedo em algumas feridas e levar os valores da marca de forma prática e direta.

“O ativismo é importante, mas precisa ter um lastro. Colocamos nas latas os valores que estão enraizados na empresa, que estão no dia a dia do negócio”, diz.

Luiza Tolosa, sócia-fundadora da Cervejaria Dádiva. Foto: Claus Lehmann

No caso da Japas, cervejaria nipo-brasileira e criada por quatro mulheres, os rótulos também funcionam como uma expressão da identidade da marca e das sócias. O Japão, que é uma cultura supertradicional, explica a diretora Yumi Shimada. Possivelmente, diz ela, para eles é muito diferente saberem que existem quatro mulheres por trás de uma marca de cerveja.

No Brasil, surpreende que sejam quatro mulheres descendentes de japoneses por trás da mesma empresa. “A gente levanta discussões só de existir, mas também tentamos imprimir isso nas nossas cervejas e nos nossos rótulos”, diz Shimada. “Cada bebida tem sua história, relembramos os antepassados, celebramos nossa identidade e olhamos para o futuro.”

Internacionalização

Quatro mulheres nipo-brasileiras – Maíra Kimura, Yumi Shimada, Fernanda Ueno e Tânia Matsuoka – se uniram graças à paixão pela cerveja para fundar a Cervejaria Japas.

Além da produção das bebidas, elas também criaram uma marca de roupas e acessórios chamada Arigatou by Japas e a Kurafato, uma feira de produtos artesanais nipo-brasileira contemporânea.

“A marca fala muito sobre nós. Desde os ingredientes até a identidade visual é tudo sobre nós, nossa história”, diz Kimura.

Com a cerveja, a marca alçou voos mais altos. O conhecimento multidisciplinar da equipe – algumas das sócias são mestres cervejeiras, sommeliers e/ou publicitárias – deu às donas um olhar 360º do negócio que logo se tornou um diferencial competitivo.

Em pouco tempo, a Japas se tornou uma marca forte possibilitando que ela vislumbrasse espaço em um dos mercados mais competitivos de cerveja artesanal do mundo: os Estados Unidos.

Ao incorporarem sua identidade cultural, elas desenvolveram cervejas únicas que combinam elementos da cultura japonesa e brasileira, como o wasabi e a jabuticaba. O estranhamento positivo do mercado americano, explica Fernanda, fez com que a cervejaria se destacasse.

“Não é só mais uma marca fazendo pilsen, ipa e sour. A gente também faz isso, mas colocar nosso lado autoral transparece para o mercado. Tem muita autenticidade no que a gente tá fazendo”, explica.

Maíra Kimura, Yumi Shimada, Fernanda Ueno e Tânia Matsuoka, sócias da Japas Cervejaria. Foto: Bruno Fujii

Todas as cervejas produzidas no Brasil, também são produzidas nos EUA desde 2019, explica Uono. Com um mercado muito mais maduro, hoje em dia a venda das bebidas no país americano é maior do que aqui no País.

Para se ter uma ideia, as vendas no país são quase 8 vezes o volume que vendem aqui. A previsão é que a companhia também chegue à Europa e à Ásia, com produtos iguais ou o mais semelhantes aos produzidos no Brasil.

A diversidade dos ingredientes e a qualidade da bebida também levou as cervejas produzidas pela Dádiva para a Europa. Desde 2018 comercializando seus produtos, durante o período de 2019 a 2022, houve um aumento significativo no envio das cervejas para países como Holanda, Dinamarca, Suécia, Suíça, Bélgica, França, Finlândia, Luxemburgo, dentre outros.

Esse volume de envio triplicou nesse período. Entre os rótulos mais buscados estão as cervejas com ingredientes típicos brasileiros como castanha de baru, baunilha do cerrado e cumaru, goiaba e maracujá.

No segundo semestre de 2022, Luiza Tolosa explica que ocorreu uma interrupção causada pelos impactos da Guerra da Ucrânia. Como resultado, estão sendo traçadas novas estratégias e novas rotas para este ano.

“Não é uma cervejaria para mulher. É só cerveja”, diz Luiza Tolosa, dona da cervejaria Dádiva, eleita por dois anos consecutivos (2019/20) como a melhor do Brasil, segundo o site Rate Beer. Apesar de minoria no mercado cervejeiro, mulheres como ela têm conquistado os consumidores mais exigentes e se destacado internacionalmente com criatividade, ativismo e qualidade.

Enquanto a Dádiva usa rótulos como ferramenta para chamar a atenção ao combate à desigualdade de gênero, a niteroiense Noi diversifica e expande os negócios da família. Já a Japas Cervejaria traz a identidade nipo-brasileira para as cervejas artesanais, o que levou quatro amigas a se destacarem no mercado americano com produção de cervejas únicas em Nova York.

Em comum, as empresas fazem parte da pequena parcela de 11% de cervejarias artesanais comandadas por mulheres, segundo pesquisa do DataSebrae em parceria com a Associação Brasileira de Cervejarias Artesanais (Abracerva). As empreendedoras reconhecem evolução no mercado, com um número cada vez maior de mulheres na produção da bebida, mas apontam a necessidade de acelerar ainda mais esse movimento.

Beatrice Signor, Bianca e Barbara Buzin, sócias da Noi Cervejaria Foto: Alexander Landau

A partir de sua vivência no mercado cervejeiro, com mais de 15 anos de atuação, Bárbara Buzin, diretora da cervejaria Noi, relata que a presença feminina em cursos no setor, por exemplo, era extremamente limitada, chegando a ter apenas duas mulheres para cada 48 homens. No entanto, nos últimos anos, ela tem notado uma mudança significativa nesse cenário, com salas de aula apresentando uma presença feminina de até 50%.

“Se as pessoas nos veem nos eventos, a gente ‘tá’ ali trocando o barril, carregando gás. Nossa presença vai trazendo normalidade para o assunto. Estamos começando a chegar a esse lugar que também é nosso por direito”, afirma.

Segundo o presidente da Abracerva, Gilberto Tarantino, a conscientização é um trabalho de educação constante. Ele destaca a importância de colocar cada vez mais mulheres no mercado de trabalho, mas ressalta que é preciso trabalhar de maneira organizada, capacitando profissionais para sobreviver financeiramente a longo prazo. “Tem muita gente que não faz ideia de como as mulheres estão presentes nesse segmento. Ainda há muito espaço para crescer no mercado.”

Preconceito

Com mais de 75 prêmios nacionais e internacionais, a Noi é gerenciada por três mulheres: as irmãs Bárbara e Bianca Buzin e Beatrice Signor, que desde pequenas trabalhavam juntas nos negócios gastronômicos que pertenciam à família. Formadas em administração, as três receberam a responsabilidade de cuidar da cervejaria criada pelo pai das irmãs, um ano após a fundação, em 2008.

Na linha de frente da produção e há 15 anos no mercado, Bárbara viu uma evolução muito grande em relação à presença das mulheres no setor, mas relata que ainda é subestimada e questionada sobre sua capacidade e conhecimento. “Eu vou aos eventos e as pessoas me questionam o tempo todo se sou a filha ou a esposa do dono. Preciso me impor o tempo todo, é uma mistura de desprezo e desrespeito”, conta.

Destaque no mercado nacional, Luiza Tolosa compartilha do mesmo sentimento. A necessidade de provar sua experiência e conhecimentos é constante tanto no contato com o público como no contato com outros cervejeiros. “Preciso apresentar meu currículo antes de falar”, diz a empreendedora com experiência no mundo corporativo e no mercado financeiro. “O mercado quer nos rotular de uma coisa ou outra, mas a gente sempre quis fazer uma cerveja que atendesse públicos diferentes. Cerveja não tem gênero e é isso que queremos passar”, diz Luiza.

Transformação

Antes, quando se falava em cervejas artesanais, a primeira imagem que vinha à mente das pessoas era a de homens barbudos segurando garrafas com rótulos pretos, decorados com caveiras, dragões, animais assustadores e outros símbolos tipicamente masculinos. No entanto, cervejarias como a Dádiva e a Japas transformaram essa bebida em uma ferramenta de ativismo e em uma maneira de promover discussões sérias por meio da identidade visual.

Em 2021, por exemplo, a Dádiva lançou a cerveja 3/4 que apresenta a desigualdade salarial entre homens e mulheres. A cerveja foi embalada em duas latas diferentes: uma com 473 ml, representando o salário dos homens, e outra com 350 ml, representando o rendimento das mulheres. Para Luiza Tolosa, é importante utilizar esse espaço para colocar o dedo em algumas feridas e levar os valores da marca de forma prática e direta.

“O ativismo é importante, mas precisa ter um lastro. Colocamos nas latas os valores que estão enraizados na empresa, que estão no dia a dia do negócio”, diz.

Luiza Tolosa, sócia-fundadora da Cervejaria Dádiva. Foto: Claus Lehmann

No caso da Japas, cervejaria nipo-brasileira e criada por quatro mulheres, os rótulos também funcionam como uma expressão da identidade da marca e das sócias. O Japão, que é uma cultura supertradicional, explica a diretora Yumi Shimada. Possivelmente, diz ela, para eles é muito diferente saberem que existem quatro mulheres por trás de uma marca de cerveja.

No Brasil, surpreende que sejam quatro mulheres descendentes de japoneses por trás da mesma empresa. “A gente levanta discussões só de existir, mas também tentamos imprimir isso nas nossas cervejas e nos nossos rótulos”, diz Shimada. “Cada bebida tem sua história, relembramos os antepassados, celebramos nossa identidade e olhamos para o futuro.”

Internacionalização

Quatro mulheres nipo-brasileiras – Maíra Kimura, Yumi Shimada, Fernanda Ueno e Tânia Matsuoka – se uniram graças à paixão pela cerveja para fundar a Cervejaria Japas.

Além da produção das bebidas, elas também criaram uma marca de roupas e acessórios chamada Arigatou by Japas e a Kurafato, uma feira de produtos artesanais nipo-brasileira contemporânea.

“A marca fala muito sobre nós. Desde os ingredientes até a identidade visual é tudo sobre nós, nossa história”, diz Kimura.

Com a cerveja, a marca alçou voos mais altos. O conhecimento multidisciplinar da equipe – algumas das sócias são mestres cervejeiras, sommeliers e/ou publicitárias – deu às donas um olhar 360º do negócio que logo se tornou um diferencial competitivo.

Em pouco tempo, a Japas se tornou uma marca forte possibilitando que ela vislumbrasse espaço em um dos mercados mais competitivos de cerveja artesanal do mundo: os Estados Unidos.

Ao incorporarem sua identidade cultural, elas desenvolveram cervejas únicas que combinam elementos da cultura japonesa e brasileira, como o wasabi e a jabuticaba. O estranhamento positivo do mercado americano, explica Fernanda, fez com que a cervejaria se destacasse.

“Não é só mais uma marca fazendo pilsen, ipa e sour. A gente também faz isso, mas colocar nosso lado autoral transparece para o mercado. Tem muita autenticidade no que a gente tá fazendo”, explica.

Maíra Kimura, Yumi Shimada, Fernanda Ueno e Tânia Matsuoka, sócias da Japas Cervejaria. Foto: Bruno Fujii

Todas as cervejas produzidas no Brasil, também são produzidas nos EUA desde 2019, explica Uono. Com um mercado muito mais maduro, hoje em dia a venda das bebidas no país americano é maior do que aqui no País.

Para se ter uma ideia, as vendas no país são quase 8 vezes o volume que vendem aqui. A previsão é que a companhia também chegue à Europa e à Ásia, com produtos iguais ou o mais semelhantes aos produzidos no Brasil.

A diversidade dos ingredientes e a qualidade da bebida também levou as cervejas produzidas pela Dádiva para a Europa. Desde 2018 comercializando seus produtos, durante o período de 2019 a 2022, houve um aumento significativo no envio das cervejas para países como Holanda, Dinamarca, Suécia, Suíça, Bélgica, França, Finlândia, Luxemburgo, dentre outros.

Esse volume de envio triplicou nesse período. Entre os rótulos mais buscados estão as cervejas com ingredientes típicos brasileiros como castanha de baru, baunilha do cerrado e cumaru, goiaba e maracujá.

No segundo semestre de 2022, Luiza Tolosa explica que ocorreu uma interrupção causada pelos impactos da Guerra da Ucrânia. Como resultado, estão sendo traçadas novas estratégias e novas rotas para este ano.

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