Lula volta a comandar País 20 anos depois com indicadores sociais melhores e desafio na educação


Entre o início do primeiro mandato e o novo governo, Brasil avançou em questões importantes, mas cresceu abaixo da média mundial; covid aumentou a evasão escolar

Por Leon Ferrari

Quando ganhou a eleição para presidente pela terceira vez, em outubro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que não existem “dois Brasis”. O discurso fazia referência à apertada vantagem que teve nas urnas sobre Jair Bolsonaro (PL) e à polarização política vivida pelo País e buscava promover a união nacional. Mas, quando comparado o país que Lula assumiu em 2003, para seu primeiro mandato, com o atual quadro que ele terá a partir deste 1.º de janeiro de 2023, não é exagerado afirmar que “dois Brasis” separam essas duas décadas. Lula vai presidir outro país, muito diferente do que ele governou há 20 anos.

Para traçar um paralelo do cenário entre as duas décadas, o Estadão utilizou dados oficiais e de organizações civis e privadas. Mesmo com mudanças de metodologias em algumas pesquisas ao longo do tempo, as estatísticas apresentam uma dimensão das diferenças entre as duas últimas décadas.

Segundo especialistas, Lula encontra um País econômica e demograficamente “menos favorável”, com indicadores sociais melhores, mas que cresceram abaixo da média mundial, e com um cenário internacional não tão bom.

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José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia e professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE) lembra que, no primeiro mandato, Lula assumiu um País com a economia “mais ou menos sob controle do ponto de vista das contas públicas” e no início do “superciclo das commodities”. “Foi um período em que o mundo cresceu muito, principalmente até 2008, e o Brasil se beneficiou muito disso.”

”Atualmente não tem perspectiva disso acontecer. Pelo contrário, a perspectiva para o ano que vem, por exemplo, é de recessão ou de crescimento muito baixo da economia internacional, porque teve complicações novas, como a pandemia e a Guerra na Ucrânia”, completa.

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Antropólogo, Maurício de Almeida Prado, diretor executivo da Plano CDE, empresa de pesquisa e consultoria especializada em classes populares, acrescenta que a vulnerabilidade social diminuiu, porém, o problema não está completamente resolvido. “Vai ser preciso dar apoio à pobreza extrema, porque está melhor que em 2003, mas não está melhor do que há oito anos.”

E, com a melhora das condições sociais básicas, se esforçar para atender a demanda crescente por qualidade nos serviços. “A vida melhorou da porta pra dentro, agora, eu quero que a vida melhore da porta pra fora. Estou com uma geladeira que eu não tinha, com uma lava-roupa, mas quero ter melhor transporte, melhor saúde, melhor educação, melhor segurança. Os desafios são outros.”

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O presidente eleito assume um País com a educação ainda sob efeito da pandemia, após o que Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV) e ex-diretora de Educação do Banco Mundial, considera a “maior crise da história da educação”, que prejudicou a aprendizagem e gerou evasão escolar. “Não dá para subestimar dois anos letivos quase inteiros de crianças com escolas fechadas, sem nenhuma coordenação nacional da resposta educacional a covid.”

Claudia pondera que, nesses 20 anos que se passaram, o País teve avanços importantes no acesso à universalização da educação básica, e ganhos processuais (uma base comum curricular e mais ensino integral) que o colocam em uma “trajetória mais virtuosa”. Porém, vai ser preciso focar na conclusão da trajetória acadêmica e inovar para desenvolver e aprofundar competências digitais.

“O ser humano vai ter de competir com algoritmos. Se não aprender a pensar histórica, matemática, científica e sistematicamente, vai perder essa competição para os robôs.”

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Enquanto o número de matrículas na educação básica (infantil, fundamental e médio) estão menores (-21,6%), o ensino superior está 155% maior, com quase 9 milhões de matriculados em 2021, ante 3,7 milhões em 2002. Em relação ao ciclo básico, apenas as creches cresceram, com o número de alunos indo de 1,15 milhão para 3,4 milhões.

Embora o crescimento do ensino superior seja animador para os especialistas, há uma preocupação com a expansão acelerada do EAD que, alertam, carece de fiscalização. “É importante que nós preparemos as instituições que avaliam a qualidade de ensino superior para olhar critérios adequados para o EAD”, defende Costin.

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A expansão do ensino superior também foi acompanhada por mais diversidade, principalmente graças à Lei de Cotas, que completou dez anos.

População maior e mais velha

Além de maior, Lula encontra em seu terceiro mandato uma população mais velha. Em 2002, quase metade (48,7%) dos habitantes tinha entre zero e 24 anos, e idosos (65 anos ou mais) representava apenas 6 em cada 100 pessoas. Em 2022, etariamente, há maior distribuição, com incremento de 107% no número daqueles com 65 anos ou mais, que passam a ser 1 em cada 10 moradores do País.

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Ao mesmo tempo que o envelhecimento populacional representa uma vitória das políticas de saúde pública e dos avanços da medicina, e deve ser comemorado, impõe desafios ao desenvolvimento econômico. A transição etária, com redução da fecundidade e da mortalidade, cria o que os especialistas chamam de bônus demográfico, quando a população em idade de trabalhar (15 aos 64 anos) é proporcionalmente maior do que a dependente (idosos e crianças). Aproveitar essa janela de oportunidade é essencial para expandir crescimento e fugir da armadilha da renda média.

Conforme José Eustáquio, se em seu primeiro mandato, Lula pegou essa janela de oportunidade se abrindo, agora, no terceiro, chega após o fim de seu auge (período de 2015 a 2020) e quando ela começa a ser fechar - o que deve ocorrer entre 2035 e 2040.

”Todos os países que enriqueceram, enriqueceram antes de envelhecer”, comenta o doutor em Demografia. “Agora quando um país de renda média, igual ao Brasil, se envelhecer antes de enriquecer, vai ficar preso na armadilha da renda média, não vai conseguir dar um pulo para a renda alta.”

Para dar esse pulo, a receita é aproveitar a maior proporção de pessoas em idade de trabalho e crescer mais do que a média mundial. Algo que, segundo José Eustáquio, não acontece desde a década de 1980, quando o País, em um termo criado pelo professor, se tornou “subemergente”.

Meio ambiente

O Brasil que Lula assume agora tem muito menos árvores em pé e muito mais prédios levantados. Levantamento do MapBiomas mostra que enquanto formações florestais (-5,2%) e não florestais naturais (-7,95%) recuaram nesses 20 anos, áreas urbanizadas (+43,3%) e destinadas à agropecuária (+13,9%) cresceram.

As taxas de desmatamento anual da Amazônia Legal e de incremento anual do desmatamento dos demais biomas, tabulados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) por meio do Prodes, mostram que a escala do desmate por ano é menor que em 2002. No entanto, o acumulado de áreas devastadas é maior do que há 20 anos e as perdas anuais cresceram nos últimos quatro anos, principalmente na Amazônia, Cerrado, Pampa e Pantanal, o que eleva a urgência de frear as derrubadas e fortalecer a preservação.”

“Quando você pega o desmatamento total, a situação é muito mais grave atualmente”, avalia José Eustáquio. A urgência, segundo ele, também se acentua quando visto o estado atual do aquecimento global, com temperaturas bem mais acima do período pré-industrial hoje do que em 2002.

Saúde pública

Historicamente, o incremento populacional foi em partes conquistado com a redução e controle das mortes por doenças infecciosas e parasitárias. Com a covid, elas voltaram a liderar o ranking das principais causas de óbito no País. O Brasil ainda está sob efeito da pandemia.

Com o aumento da expectativa de vida e envelhecimento populacional, desde 2002, boa parte do ranking é dominado pelas doenças crônicas não transmissíveis, com destaque às do aparelho circulatório. Mais idoso, o Brasil de 2023 precisa, na visão de especialistas, investir em políticas de envelhecimento saudável, mas também preparar o sistema de saúde para atendimentos de alta complexidade.

Quando ganhou a eleição para presidente pela terceira vez, em outubro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que não existem “dois Brasis”. O discurso fazia referência à apertada vantagem que teve nas urnas sobre Jair Bolsonaro (PL) e à polarização política vivida pelo País e buscava promover a união nacional. Mas, quando comparado o país que Lula assumiu em 2003, para seu primeiro mandato, com o atual quadro que ele terá a partir deste 1.º de janeiro de 2023, não é exagerado afirmar que “dois Brasis” separam essas duas décadas. Lula vai presidir outro país, muito diferente do que ele governou há 20 anos.

Para traçar um paralelo do cenário entre as duas décadas, o Estadão utilizou dados oficiais e de organizações civis e privadas. Mesmo com mudanças de metodologias em algumas pesquisas ao longo do tempo, as estatísticas apresentam uma dimensão das diferenças entre as duas últimas décadas.

Segundo especialistas, Lula encontra um País econômica e demograficamente “menos favorável”, com indicadores sociais melhores, mas que cresceram abaixo da média mundial, e com um cenário internacional não tão bom.

José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia e professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE) lembra que, no primeiro mandato, Lula assumiu um País com a economia “mais ou menos sob controle do ponto de vista das contas públicas” e no início do “superciclo das commodities”. “Foi um período em que o mundo cresceu muito, principalmente até 2008, e o Brasil se beneficiou muito disso.”

”Atualmente não tem perspectiva disso acontecer. Pelo contrário, a perspectiva para o ano que vem, por exemplo, é de recessão ou de crescimento muito baixo da economia internacional, porque teve complicações novas, como a pandemia e a Guerra na Ucrânia”, completa.

Antropólogo, Maurício de Almeida Prado, diretor executivo da Plano CDE, empresa de pesquisa e consultoria especializada em classes populares, acrescenta que a vulnerabilidade social diminuiu, porém, o problema não está completamente resolvido. “Vai ser preciso dar apoio à pobreza extrema, porque está melhor que em 2003, mas não está melhor do que há oito anos.”

E, com a melhora das condições sociais básicas, se esforçar para atender a demanda crescente por qualidade nos serviços. “A vida melhorou da porta pra dentro, agora, eu quero que a vida melhore da porta pra fora. Estou com uma geladeira que eu não tinha, com uma lava-roupa, mas quero ter melhor transporte, melhor saúde, melhor educação, melhor segurança. Os desafios são outros.”

O presidente eleito assume um País com a educação ainda sob efeito da pandemia, após o que Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV) e ex-diretora de Educação do Banco Mundial, considera a “maior crise da história da educação”, que prejudicou a aprendizagem e gerou evasão escolar. “Não dá para subestimar dois anos letivos quase inteiros de crianças com escolas fechadas, sem nenhuma coordenação nacional da resposta educacional a covid.”

Claudia pondera que, nesses 20 anos que se passaram, o País teve avanços importantes no acesso à universalização da educação básica, e ganhos processuais (uma base comum curricular e mais ensino integral) que o colocam em uma “trajetória mais virtuosa”. Porém, vai ser preciso focar na conclusão da trajetória acadêmica e inovar para desenvolver e aprofundar competências digitais.

“O ser humano vai ter de competir com algoritmos. Se não aprender a pensar histórica, matemática, científica e sistematicamente, vai perder essa competição para os robôs.”

Enquanto o número de matrículas na educação básica (infantil, fundamental e médio) estão menores (-21,6%), o ensino superior está 155% maior, com quase 9 milhões de matriculados em 2021, ante 3,7 milhões em 2002. Em relação ao ciclo básico, apenas as creches cresceram, com o número de alunos indo de 1,15 milhão para 3,4 milhões.

Embora o crescimento do ensino superior seja animador para os especialistas, há uma preocupação com a expansão acelerada do EAD que, alertam, carece de fiscalização. “É importante que nós preparemos as instituições que avaliam a qualidade de ensino superior para olhar critérios adequados para o EAD”, defende Costin.

A expansão do ensino superior também foi acompanhada por mais diversidade, principalmente graças à Lei de Cotas, que completou dez anos.

População maior e mais velha

Além de maior, Lula encontra em seu terceiro mandato uma população mais velha. Em 2002, quase metade (48,7%) dos habitantes tinha entre zero e 24 anos, e idosos (65 anos ou mais) representava apenas 6 em cada 100 pessoas. Em 2022, etariamente, há maior distribuição, com incremento de 107% no número daqueles com 65 anos ou mais, que passam a ser 1 em cada 10 moradores do País.

Ao mesmo tempo que o envelhecimento populacional representa uma vitória das políticas de saúde pública e dos avanços da medicina, e deve ser comemorado, impõe desafios ao desenvolvimento econômico. A transição etária, com redução da fecundidade e da mortalidade, cria o que os especialistas chamam de bônus demográfico, quando a população em idade de trabalhar (15 aos 64 anos) é proporcionalmente maior do que a dependente (idosos e crianças). Aproveitar essa janela de oportunidade é essencial para expandir crescimento e fugir da armadilha da renda média.

Conforme José Eustáquio, se em seu primeiro mandato, Lula pegou essa janela de oportunidade se abrindo, agora, no terceiro, chega após o fim de seu auge (período de 2015 a 2020) e quando ela começa a ser fechar - o que deve ocorrer entre 2035 e 2040.

”Todos os países que enriqueceram, enriqueceram antes de envelhecer”, comenta o doutor em Demografia. “Agora quando um país de renda média, igual ao Brasil, se envelhecer antes de enriquecer, vai ficar preso na armadilha da renda média, não vai conseguir dar um pulo para a renda alta.”

Para dar esse pulo, a receita é aproveitar a maior proporção de pessoas em idade de trabalho e crescer mais do que a média mundial. Algo que, segundo José Eustáquio, não acontece desde a década de 1980, quando o País, em um termo criado pelo professor, se tornou “subemergente”.

Meio ambiente

O Brasil que Lula assume agora tem muito menos árvores em pé e muito mais prédios levantados. Levantamento do MapBiomas mostra que enquanto formações florestais (-5,2%) e não florestais naturais (-7,95%) recuaram nesses 20 anos, áreas urbanizadas (+43,3%) e destinadas à agropecuária (+13,9%) cresceram.

As taxas de desmatamento anual da Amazônia Legal e de incremento anual do desmatamento dos demais biomas, tabulados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) por meio do Prodes, mostram que a escala do desmate por ano é menor que em 2002. No entanto, o acumulado de áreas devastadas é maior do que há 20 anos e as perdas anuais cresceram nos últimos quatro anos, principalmente na Amazônia, Cerrado, Pampa e Pantanal, o que eleva a urgência de frear as derrubadas e fortalecer a preservação.”

“Quando você pega o desmatamento total, a situação é muito mais grave atualmente”, avalia José Eustáquio. A urgência, segundo ele, também se acentua quando visto o estado atual do aquecimento global, com temperaturas bem mais acima do período pré-industrial hoje do que em 2002.

Saúde pública

Historicamente, o incremento populacional foi em partes conquistado com a redução e controle das mortes por doenças infecciosas e parasitárias. Com a covid, elas voltaram a liderar o ranking das principais causas de óbito no País. O Brasil ainda está sob efeito da pandemia.

Com o aumento da expectativa de vida e envelhecimento populacional, desde 2002, boa parte do ranking é dominado pelas doenças crônicas não transmissíveis, com destaque às do aparelho circulatório. Mais idoso, o Brasil de 2023 precisa, na visão de especialistas, investir em políticas de envelhecimento saudável, mas também preparar o sistema de saúde para atendimentos de alta complexidade.

Quando ganhou a eleição para presidente pela terceira vez, em outubro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que não existem “dois Brasis”. O discurso fazia referência à apertada vantagem que teve nas urnas sobre Jair Bolsonaro (PL) e à polarização política vivida pelo País e buscava promover a união nacional. Mas, quando comparado o país que Lula assumiu em 2003, para seu primeiro mandato, com o atual quadro que ele terá a partir deste 1.º de janeiro de 2023, não é exagerado afirmar que “dois Brasis” separam essas duas décadas. Lula vai presidir outro país, muito diferente do que ele governou há 20 anos.

Para traçar um paralelo do cenário entre as duas décadas, o Estadão utilizou dados oficiais e de organizações civis e privadas. Mesmo com mudanças de metodologias em algumas pesquisas ao longo do tempo, as estatísticas apresentam uma dimensão das diferenças entre as duas últimas décadas.

Segundo especialistas, Lula encontra um País econômica e demograficamente “menos favorável”, com indicadores sociais melhores, mas que cresceram abaixo da média mundial, e com um cenário internacional não tão bom.

José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia e professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE) lembra que, no primeiro mandato, Lula assumiu um País com a economia “mais ou menos sob controle do ponto de vista das contas públicas” e no início do “superciclo das commodities”. “Foi um período em que o mundo cresceu muito, principalmente até 2008, e o Brasil se beneficiou muito disso.”

”Atualmente não tem perspectiva disso acontecer. Pelo contrário, a perspectiva para o ano que vem, por exemplo, é de recessão ou de crescimento muito baixo da economia internacional, porque teve complicações novas, como a pandemia e a Guerra na Ucrânia”, completa.

Antropólogo, Maurício de Almeida Prado, diretor executivo da Plano CDE, empresa de pesquisa e consultoria especializada em classes populares, acrescenta que a vulnerabilidade social diminuiu, porém, o problema não está completamente resolvido. “Vai ser preciso dar apoio à pobreza extrema, porque está melhor que em 2003, mas não está melhor do que há oito anos.”

E, com a melhora das condições sociais básicas, se esforçar para atender a demanda crescente por qualidade nos serviços. “A vida melhorou da porta pra dentro, agora, eu quero que a vida melhore da porta pra fora. Estou com uma geladeira que eu não tinha, com uma lava-roupa, mas quero ter melhor transporte, melhor saúde, melhor educação, melhor segurança. Os desafios são outros.”

O presidente eleito assume um País com a educação ainda sob efeito da pandemia, após o que Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV) e ex-diretora de Educação do Banco Mundial, considera a “maior crise da história da educação”, que prejudicou a aprendizagem e gerou evasão escolar. “Não dá para subestimar dois anos letivos quase inteiros de crianças com escolas fechadas, sem nenhuma coordenação nacional da resposta educacional a covid.”

Claudia pondera que, nesses 20 anos que se passaram, o País teve avanços importantes no acesso à universalização da educação básica, e ganhos processuais (uma base comum curricular e mais ensino integral) que o colocam em uma “trajetória mais virtuosa”. Porém, vai ser preciso focar na conclusão da trajetória acadêmica e inovar para desenvolver e aprofundar competências digitais.

“O ser humano vai ter de competir com algoritmos. Se não aprender a pensar histórica, matemática, científica e sistematicamente, vai perder essa competição para os robôs.”

Enquanto o número de matrículas na educação básica (infantil, fundamental e médio) estão menores (-21,6%), o ensino superior está 155% maior, com quase 9 milhões de matriculados em 2021, ante 3,7 milhões em 2002. Em relação ao ciclo básico, apenas as creches cresceram, com o número de alunos indo de 1,15 milhão para 3,4 milhões.

Embora o crescimento do ensino superior seja animador para os especialistas, há uma preocupação com a expansão acelerada do EAD que, alertam, carece de fiscalização. “É importante que nós preparemos as instituições que avaliam a qualidade de ensino superior para olhar critérios adequados para o EAD”, defende Costin.

A expansão do ensino superior também foi acompanhada por mais diversidade, principalmente graças à Lei de Cotas, que completou dez anos.

População maior e mais velha

Além de maior, Lula encontra em seu terceiro mandato uma população mais velha. Em 2002, quase metade (48,7%) dos habitantes tinha entre zero e 24 anos, e idosos (65 anos ou mais) representava apenas 6 em cada 100 pessoas. Em 2022, etariamente, há maior distribuição, com incremento de 107% no número daqueles com 65 anos ou mais, que passam a ser 1 em cada 10 moradores do País.

Ao mesmo tempo que o envelhecimento populacional representa uma vitória das políticas de saúde pública e dos avanços da medicina, e deve ser comemorado, impõe desafios ao desenvolvimento econômico. A transição etária, com redução da fecundidade e da mortalidade, cria o que os especialistas chamam de bônus demográfico, quando a população em idade de trabalhar (15 aos 64 anos) é proporcionalmente maior do que a dependente (idosos e crianças). Aproveitar essa janela de oportunidade é essencial para expandir crescimento e fugir da armadilha da renda média.

Conforme José Eustáquio, se em seu primeiro mandato, Lula pegou essa janela de oportunidade se abrindo, agora, no terceiro, chega após o fim de seu auge (período de 2015 a 2020) e quando ela começa a ser fechar - o que deve ocorrer entre 2035 e 2040.

”Todos os países que enriqueceram, enriqueceram antes de envelhecer”, comenta o doutor em Demografia. “Agora quando um país de renda média, igual ao Brasil, se envelhecer antes de enriquecer, vai ficar preso na armadilha da renda média, não vai conseguir dar um pulo para a renda alta.”

Para dar esse pulo, a receita é aproveitar a maior proporção de pessoas em idade de trabalho e crescer mais do que a média mundial. Algo que, segundo José Eustáquio, não acontece desde a década de 1980, quando o País, em um termo criado pelo professor, se tornou “subemergente”.

Meio ambiente

O Brasil que Lula assume agora tem muito menos árvores em pé e muito mais prédios levantados. Levantamento do MapBiomas mostra que enquanto formações florestais (-5,2%) e não florestais naturais (-7,95%) recuaram nesses 20 anos, áreas urbanizadas (+43,3%) e destinadas à agropecuária (+13,9%) cresceram.

As taxas de desmatamento anual da Amazônia Legal e de incremento anual do desmatamento dos demais biomas, tabulados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) por meio do Prodes, mostram que a escala do desmate por ano é menor que em 2002. No entanto, o acumulado de áreas devastadas é maior do que há 20 anos e as perdas anuais cresceram nos últimos quatro anos, principalmente na Amazônia, Cerrado, Pampa e Pantanal, o que eleva a urgência de frear as derrubadas e fortalecer a preservação.”

“Quando você pega o desmatamento total, a situação é muito mais grave atualmente”, avalia José Eustáquio. A urgência, segundo ele, também se acentua quando visto o estado atual do aquecimento global, com temperaturas bem mais acima do período pré-industrial hoje do que em 2002.

Saúde pública

Historicamente, o incremento populacional foi em partes conquistado com a redução e controle das mortes por doenças infecciosas e parasitárias. Com a covid, elas voltaram a liderar o ranking das principais causas de óbito no País. O Brasil ainda está sob efeito da pandemia.

Com o aumento da expectativa de vida e envelhecimento populacional, desde 2002, boa parte do ranking é dominado pelas doenças crônicas não transmissíveis, com destaque às do aparelho circulatório. Mais idoso, o Brasil de 2023 precisa, na visão de especialistas, investir em políticas de envelhecimento saudável, mas também preparar o sistema de saúde para atendimentos de alta complexidade.

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