O ex-governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite confia que a convenção do PSDB será a “formalização” de um entendimento político que pode reverter a escolha de João Doria como pré-candidato do partido à Presidência.
Aos 37 anos e após deixar o Palácio Piratini, sede do governo gaúcho, Leite iniciou uma agenda paralela de articulações na chamada terceira via. Em entrevista ao Estadão, ele defendeu o desprendimento dos nomes colocados neste campo e admitiu a possibilidade de a pré-candidata do MDB, Simone Tebet, liderar uma candidatura de centro. A seguir, os principais trechos da entrevista.
O sr. diz que respeita o resultado das prévias, mas, ao mesmo tempo, afirma que o processo soberano no partido é a convenção. Como pretende demonstrar que tem mais viabilidade eleitoral que o ex-governador João Doria?
A convenção será a formalização do que o entendimento político promover. Não se trata de uma disputa sobre se as prévias valem mais que a convenção ou o que vale formalmente. Se nós tivermos que partir para um enfrentamento do ponto de vista técnico-jurídico é porque a política não cumpriu seu papel. O sentimento apresentado há pouco mais de um mês pelo governador João Doria foi de disposição, por amor ao Brasil, de promover o entendimento, que é maior do que ele mesmo, como foi dito literalmente na sua manifestação no banco BTG Pactual. Temos que estar todos abertos ao sentar à mesa. Existem muitas pessoas que entendem que devo liderar esse projeto. Houve um chamamento no próprio partido. Se eu quisesse simplesmente ser candidato, eu tinha um caminho que me assegurava isso.
Mas o sr. também não tem índice de intenção de voto significativo nas pesquisas...
Tem partidos políticos que estão conversando – o MDB, o União Brasil e o PSDB. Deve haver uma convergência entre esses partidos. As pesquisas são um instrumento importante, mas sempre haverá a subjetividade da análise, que vai muito além da intenção de voto. Ela passa pela rejeição aos candidatos – que limita a capacidade de crescimento – e pelo humor do eleitor.
A possibilidade de ser vice numa chapa com a Simone Tebet está na mesa?
Nada pode ser descartado por ninguém neste momento. Nós temos que sentar à mesa com a humildade de reconhecer que, eventualmente, outra candidatura pode aglutinar forças. Isso, eventualmente, envolve a possibilidade de nem ser candidato. Meu papel pode ser outro. Muitas pessoas entendem que eu devo liderar o processo, e me sinto em total condição para isso. Me sinto preparado. Não me faltam disposição e vontade. Mas a renúncia me abriu todas as possibilidades sem me tirar nenhuma delas do ponto de vista formal.
Quem são essas “muitas pessoas”? Qual é o seu grupo político hoje?
Quando se falava da possibilidade de eu sair do PSDB, houve uma carta assinada por mais de 20 lideranças. Boa parte delas está dentro de um grupo político que entende que eu deveria ter vencido as prévias. Há também lideranças empresariais e líderes de movimentos que têm me provocado. As pessoas aguardam os movimentos que vêm da política.
Atrair outros partidos não é algo urgente para um projeto viável de centro?
Não tenho preocupação com o tempo, desde que estejamos no caminho certo. Tem um ditado que diz: “se você quer mais rápido, vá sozinho; se quer ir mais longe, vá com alguém”. A gente quer ir mais longe e usar a pista toda para promover a aglutinação de forças.
Como a instabilidade no PSDB atrapalha esse processo?
O PSDB sempre liderou e teve candidatos à Presidência em todas as eleições desde a redemocratização. É o partido sobre o qual mais recai a expectativa de candidatura.
Antes de deixar o governo, Doria chamou de golpe qualquer tentativa de revogar as prévias. O presidente do PSDB, Bruno Araújo, pressionado por ele, divulgou uma carta na qual disse que o resultado das prévias será mantido. O que essa carta significa?
Se um juiz é chamado a homologar um acordo judicialmente, mas não faz isso, o que acontece? Não tem validade. A convenção do PSDB é, segundo o estatuto do PSDB, chamada a homologar ou não o resultado das prévias. Mas, antes do ponto de vista formal, a política deverá promover o entendimento. Não sei que sentimentos estiveram envolvidos na semana passada no momento que o governador apresentou sua renúncia. Prefiro acreditar que, na decisão que se encaminhará sobre candidaturas, prevalecerá o sentimento que ele (Doria) externou naquele evento no BTG Pactual, de amor pelo Brasil, e não a aspiração individual. É legítimo que o partido aspire, mas nem por isso ele deve impor sua candidatura.
Em última instância, então, a convenção é que vai decidir o nome do PSDB. Não é o que entende a ala vitoriosa nas prévias...
É o que a lei eleitoral determina: as candidaturas serão definidas no âmbito das convenções partidárias. Mas o que interessa é a candidatura se viabilizar politicamente, não juridicamente. E isso acontece pela aglutinação de forças, e não em um processo judicial.
Espera ajuda financeira do PSDB para se apresentar?
O partido me convocou para participar de um processo de mobilização nacional. Estou atendendo essa convocação.
Qual o papel agora de Sérgio Moro nesse debate sobre a eleição presidencial?
Ele protagonizou um processo importante da Operação Lava Jato, através da Lava Jato. Protagonizou uma posição relevante no ambiente político. Isso o torna uma peça importante nesse tabuleiro.
O sr. fala em pacificar o Brasil. Alckmin, em 2018, tentou a bandeira da conciliação, mas ela não encantou...
Era outro ambiente. O Brasil vinha do ápice da Lava Jato e do impeachment da presidente (Dilma Rousseff). Era um ambiente que gerou aversão à política. Hoje experimentamos o efeito da antipolítica. É outro ambiente político e serão outros candidatos. Estou me apresentando também como uma mudança geracional.
A definição de uma base programática não deveria ser o ponto central nas conversas do centro?
Foi como eu guiei minha condução para governador. Fomos promovendo uma agenda convergente. Agora, diante da situação polarizada na eleição nacional, a expectativa é muito grande sobre quem vai liderar o projeto. Já há uma certa percepção sobre qual a agenda que nos reúne, com eventuais divergências pontuais. A gente tem um modelo tão fragmentado que, no momento da eleição, precisamos discutir como promover convergência.
O centro político pode até não chegar ao 2.º turno, mas será decisivo para a vitória de um dos candidatos. Como trabalhar isso?
Todo trabalho é para viabilizar a eleição, mas, sem dúvida, é bem mais que resultados imediatos, é ajudar a empurrar a agenda do País na direção correta. Os efeitos produzidos por uma candidatura centrada e honesta vão para além de uma eleição imediata. Elas ajudam a semear os corações e mentes dos brasileiros. A agenda acaba sendo assimilada em maior ou menor grau pelo governo eleito.