Josué Rios - Colunista do Jornal da Tarde
O sr. Furtado, o Consumidor, pergunta se o Código de Defesa do Consumidor (CDC) também se aplica aos produtos usados. Respondo que sim e logo percebo o interesse do meu amigo. Qual? Membros da ilustre família Furtado compraram carros usados e, para não fugir à saga que os persegue nas relações de consumo, acabaram se dando mal.
O irmão mais velho, Toninho Furtado, comprou um caminhão com 20 anos de uso para trabalhar como feirante. A irmã, a Júlia Furtado, comprou um seminovo de passeio e o Furtado Júnior, o caçula da família, adquiriu um veículo utilitário para ganhar o pão fazendo pequenos fretes.
No caso do caminhão adquirido por Toninho Furtado, a loja que fez a venda informou que o carro "encontrava-se em perfeitas condições de uso". Mas após dois meses de batente, o caminhão apresentou problemas no câmbio e na suspensão, cujo valor do conserto beirava a metade do preço total do veículo, e a empresa vendedora recusou-se a consertar ou pagar pelo reparo.
Motivo: para empresa, o veículo vendido foi vistoriado, e o consumidor sabia que estava comprando um carro com mais de 20 anos de uso e viu o estado em que se encontrava o bem. Além disso, a empresa informou que nem mesmo deu garantia de câmbio e motor, como é o costume na venda de carros usados.
Ao julgar um caso idêntico ao do irmão do Sr. Furtado, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina não aceitou os mesmos argumentos de uma revendedora de caminhões e condenou a empresa a arcar com o custo do conserto do veículo do consumidor catarinense. O mesmo direito, claro, poderá ser reconhecido pela Justiça paulista ao irmão do Sr. Furtado.
Voltando ao julgamento do TJ de Santa Catarina, os desembargadores de sua 3ª Câmara Cível deixaram claro que veículo usado não quer dizer veículo imprestável para o uso a que se destina.
E o fato "de o caminhão movimentar-se em terrenos íngremes e de contar com mais de 30 anos de uso não exime o vendedor da responsabilidade pelo vício oculto", afirmaram os magistrados da Corte catarinense (apelação 2002.025227-7).
Ainda segundo o tribunal citado, o fato de a revenda do caminhão não ter dado nenhuma garantia por escrito ao consumidor não retira deste o direito ao reparo do veículo. Isto porque, além da garantia dada espontaneamente pela empresa, que se chama "garantia contratual", existe a garantia de qualidade que todo produto de consumo deve ter - e que é dada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), a chamada "garantia lega".
Dessa forma, com base nesta última - e independentemente de a empresa fornecer ou não a garantia contratual -, o comprador de um produto usado também está amparado no caso de adquirir uma "bomba" que foi vendida com um defeito não percebido aos olhos do cidadão leigo . Esse é o chamado defeito oculto.
Mas anote: neste caso, uma vez percebido o defeito pelo consumidor, este tem o prazo de 90 dias para solicitar que a empresa vendedora do carro realize o reparo sem nenhuma cobrança.
Além da obrigação de ressarcir o gasto com o conserto, a empresa de automóvel também está obrigada a indenizar perdas sofridas pelo consumidor durante o tempo em que este não pode utilizar o veículo quebrado para fins profissionais, como é o caso do caminhão do irmão do sr. Furtado.
E conforme a intensidade dos transtornos sofridos pelo comprador do usado, cujo conserto foi negado, há também o direito de ser indenizado por dano moral.
Aliás, os carros adquiridos pela irmã e pelo filho do sr. Furtado também lhes trouxeram dores de cabeça. Mas o assunto fica para o próximo sábado, na série sobre problemas e direitos de quem compra o carro usado. Até lá!