BRASÍLIA - A Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu o direito de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na hora que bem entender, destituir membros da Comissão de Ética Pública da Presidência da República. Há um mês o petista dispensou, em um ato sem precedentes, três dos sete integrantes do colegiado. Eles haviam sido nomeados no ano passado pelo então presidente Jair Bolsonaro e, em tese, teriam mandatos até 2025. Um deles, o advogado João Henrique Freitas, entrou com um mandado de segurança na Suprema Corte contra o decreto do governo federal que o dispensou.
As dispensas de Lula ocorreram logo após o Estadão revelar que o colegiado beneficiou ex-ministros de Bolsonaro. Ao mesmo tempo que concedeu quarentena remunerada a aliados que sequer apresentaram proposta de emprego, a Comissão liberou ministros a trabalharem em empresas que mantêm relação com as pastas que chefiavam.
Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal obtido pelo Estadão, a AGU sustenta que a legislação brasileira não estabelece regra específica para a destituição dos membros da Comissão de Ética. O órgão argumenta, contudo, que a função pública de conselheiro se enquadra na atuação de “agente honorífico” e que, portanto, “não há qualquer expectativa de estabilidade ou preservação de mandato” quando não previsto legalmente.
Além disso, a AGU explicou que o conselheiro precisa ter uma “relação de confiança” com o presidente da República. “Sendo a função desempenhada pelos membros da CEP [Comissão de Ética Pública] uma atividade estreitamente ligada ao presidente da República, nada mais natural que tais agentes ostentem a ‘confiança’ deste último para permanecerem na nobre função honorífica”.
O documento, enviado pelo ministro-chefe da AGU Jorge Messias, usa como base uma nota elaborada em fevereiro deste ano pela Secretaria Especial para Assuntos Jurídicos da Casa Civil. O caso será analisado pelo ministro do STF Roberto Barroso.
Na petição inicial, o advogado destituído da Comissão de Ética argumentou que o presidente cometeu “ofensas” à Constituição ao dispensá-lo. “Trata-se de ato manifestamente nulo e abusivo eis que não preenchidos os requisitos fundamentais da moralidade, motivação e finalidade”, argumentou. O advogado ainda afirmou que a Administração Pública deve “fundamentar o ato praticado, bem como o dever de revelar os pressupostos de fato”. Freitas já advogou para o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e atualmente assessora o ex-presidente Bolsonaro.
No último dia 10 de fevereiro, Barroso negou pedido de liminar do advogado. Sem entrar no mérito, o magistrado afirmou que a comissão foi criada por decreto, inexistindo qualquer previsão constitucional ou legal de estabilidade de seus membros, como ocorre, por exemplo, com as agências reguladoras.
Quarentenas
Nessa terça-feira, 28, a Comissão de Ética Pública concedeu quarentena remunerada para o ex-comandante da Marinha, almirante Almir Garnier Santos. O órgão identificou potencial conflito de interesse caso o oficial fosse agora para a iniciativa privada, em razão de informações privilegiadas que ele alega possuir. A quarentena tem duração de seis meses e, por todo esse tempo, Garnier receberá seu salário normalmente. O ex-ministro da Ciência e da Tecnologia, José Gustavo Sampaio Gontijo – que substituiu o astronauta Marcos Pontes no comando da pasta – também foi agraciado com o benefício.
Garnier e Gontijo se juntam a pelo menos outros 12 ex-ministros de Bolsonaro que estão em quarentena remunerada. São eles: Marcelo Queiroga (Saúde), Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), Paulo Guedes (Economia), Adolfo Sachsida (Minas e Energia), Joaquim Leite (Meio Ambiente), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral), Victor Godoy (Educação), Célio Faria Júnior (Secretaria de Governo), Ronaldo Vieira Bento (Cidadania), Marcos Montes Cordeiro (Agricultura), Carlos Brito (Turismo) e Daniel de Oliveira Duarte Ferreira (Desenvolvimento Regional).