BRASÍLIA - O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou nesta terça-feira, 24, que o pronunciamento do presidente da República, Jair Bolsonaro, foi grave e cobrou uma liderança "séria, responsável e comprometida com a vida e a saúde da sua população". Ele se pronunciou em nota divulgada pela assessoria de imprensa. O pronunciamento de Bolsonaro também gerou reações de governadores e deputados da oposição, que falam em governo sem direção e pedem a saída do presidente do cargo.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), considerou "equivocado" o pronunciamento e criticou o fato de Bolsonaro usar a estrutura de transmissão para distribuir ataques. "Desde o início desta crise venho pedindo sensatez, equilíbrio e união. O pronunciamento do presidente foi equivocado ao atacar a imprensa, os governadores e especialistas em saúde pública", escreveu o presidente da Câmara em uma rede social.
Maia reafirmou o compromisso de que o Congresso Nacional vote ações para conter a pandemia e auxiliar empresários e trabalhadores na crise econômica. "Precisamos de paz para vencer este desafio", pediu o deputado. Ele também disse que, em respeito a idosos e pessoas em grupo de risco, os brasileiros devem seguir determinações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Para o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, a pandemia exige “solidariedade e co-responsabilidade”. “A experiência internacional e as orientações da Organizaçã Mundial da Saúde (OMS) na luta contra o vírus devem ser rigorosamente seguidas por nós. As agruras da crise, por mais árduas que sejam, não sustentam o luxo da insensatez. Fique em Casa”, escreveu no Twitter.
Logo após o pronunciamento, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), foi ao Twitterdizer que a contraprova do seu resultado para covid-19 deu negativo. Doria cobrou, indiretamente, que outros governantes deem transparência aos resultados de seus exames.
“Além do teste feito no Hospital Albert Einstein, fiz questão de fazer essa contraprova e compartilhar o resultado, seguindo o princípio da transparência e responsabilidade com que estamos enfrentando a pandemia para salvar vidas”, escreveu Doria. Bolsonaro tem negado acesso público aos dois exames que fez para coronavírus e que, segundo diz, deram negativo. No início do mês, ele esteve nos Estados Unidos, com uma comitiva que teve ao menos 23 infectados.
O governador do Rio, Wilson Witzel, também pediu que as pessoas não saiam de casa. "Em tempos de crise e desinformação, reafirmo o mesmo que todas as autoridades de saúde do mundo: fique em casa, lave as mãos e proteja quem você ama. #RJCONTRAOCORONAVÍRUS#FiqueEmCasa
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, afirmou que o discurso do presidente foi "desconectado das orientações dos cientistas, da realidade do mundo e das ações do ministério da Saúde". "Confunde a sociedade, atrapalha o trabalho nos Estados e Municípios, menospreza os efeitos da pandemia. Mostra que estamos sem direção", escreveu o governador em sua conta oficial no Twitter.
“Pronunciamento de hoje mostra que há poucas esperanças de que Bolsonaro possa exercer com responsabilidade e eficiência a Presidência da República. Os danos são imprevisíveis e gravíssimos”, declarou o governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B).
A crítica pública veio um dia após Bolsonaro ter feito um encontro virtual com governadores do Nordeste, na tentativa de melhorar a interlocução com a região.
Waldez Góes, governador do Amapá, foi às redes sociais conclamar a população a não sair às ruas. A publicação ocorreu poucos minutos depois do pronunciamento do presidente. “Precisamos da força coletiva para vencer essa pandemia. Conto também com a colaboração de vocês: fiquem em casa!”, disse.
O governador do Piauí, Wellington Dias (PT), disse que precisou tomar medidas duras em seu Estado e que essas coisas não são feitas por causa de "uma gripezinha".
"Eu aqui no Piauí tive que adotar medidas duras. Medidas como por exemplo suspender cirurgias eletivas – aquelas que estava já marcadas. Cirurgias de casos importantes. Para quê? Seguindo a orientação do ministro da Saúde, o ministro Mandetta, do seu governo e, corretamente, para garantir vagas para quem pudesse precisar. Por conta do coronavírus", afirmou o governador.
A enxurrada de críticas nas redes sociais veio principalmente de deputados da oposição, que aproveitaram a onda de comentários negativos para pedir o afastamento do presidente.
“Bolsonaro não vai parar por conta própria. Tem que ser afastado imediatamente da presidência. Em nome de um projeto alucinado de poder, está querendo nos levar pro precipício junto com ele. Ele é o principal agente de ampliação da contaminação. Não há outra saída”, afirmou o deputado Glauber Braga, do PSOL.
A deputada Dayane Pimentel, do PSL da Bahia, classificou o pronunciamento do presidente como “totalmente infeliz”. “Reabrir escolas e o comércio foram as sugestões dele, indo na contramão do próprio Ministro de Saúde e do mundo. Depois não adianta reclamar dos panelaços”, disse ela, sugerindo:. ‘#FicaEmCasa’.
Já Túlio Gadelha, do PDT, disse que é preciso ignorar completamente o que diz o presidente. “Que falta faz um líder em um momento de crise”, disse ele, seguido por Alessandro Molon, da Rede, para quem Bolsonaro “ultrapassou todos os limites”. “Falou em rede nacional, para 210 milhões de brasileiros, que eles não deveriam se preocupar com um vírus que mata milhares por onde passa. Disse pra voltarmos à normalidade. Não dêem ouvidos! Fiquem em casa! É o que precisamos fazer juntos!”, disse Molon.
Uma nota divulgada pelo PT classificou o pronunciamento do presidente como uma "demonstração de ignorância, má fé e cinismo de um presidente que só pensa em si, no seu poder e de sua família". O comunicado, assinado pela presidente do partido, Gleisi Hoffmann, disse ainda que o gesto de Bolsonaro revela "total desprezo pela vida das pessoas" diante do que a sigla classificou como a mais grave crise sanitária que o mundo moderno já enfrentou. O texto ainda critica o mandatário por ir na contramão de cientistas, de autoridades médicas, da Organização Mundial da Saúde e de "todos os países do mundo".
O deputado Paulinho da Força (Solidariedade) afirmou que a fala do presidente mostra "imensa irresponsabilidade com uma questão tão séria". "As ações do presidente já deixaram de ser irresponsabilidade e tomam viés de loucura ou devaneio. Já que o seu teste de covid-19 deu negativo, segundo afirmações dele mesmo, sugiro que ele faça um teste de sanidade mental", afirmou o parlamentar.
Um dos poucos deputados que se manifestaram a favor do pronunciamento do presidente foi Vitor Hugo (PSL-GO), líder do governo na Câmara. “Excelente pronunciamento do nosso Pres @jairbolsonaro ! A sua visão de estadista e a sua coragem em ir na contramão da histeria coletiva, construída sem critérios racionais, vão salvar as vidas de milhões de brasileiros. SALVAR VIDAS e PROTEGER EMPREGOS!”
Em pronunciamento em rede nacional de TV nesta terça, Bolsonaro voltou a falar em "histeria" em torno da pandemia do novo coronavírus e criticou o fechamento de escolas, entre outras medidas adotadas por governos e municípios.
O mandatário voltou ainda a citar a cloroquina, remédio que ainda não tem a eficácia contra a nova doença, a covid-19. De acordo com dados oficiais atualizados nesta terça pelo Ministério da Saúde, o Brasil contabiliza 46 mortes e 2.201 casos confirmados, um aumento de 16,4% em um dia.
Durante o discurso, moradores de ao menos nove cidades do País bateram panelas contra Bolsonaro.
Leia a nota do presidente do Senado:
"Neste momento grave, o País precisa de uma liderança séria, responsável e comprometida com a vida e a saúde da sua população. Consideramos grave a posição externada pelo presidente da República hoje, em cadeia nacional, de ataque às medidas de contenção ao Covid-19. Posição que está na contramão das ações adotadas em outros países e sugeridas pela própria Organização Mundial da Saúde (OMS).
Reafirmamos e insistimos: não é momento de ataque à imprensa e a outros gestores públicos. É momento de união, de serenidade e equilíbrio, de ouvir os técnicos e profissionais da área para que sejam adotadas as precauções e cautelas necessárias para o controle da situação, antes que seja tarde demais.
A Nação espera do líder do Executivo, mais do que nunca, transparência, seriedade e responsabilidade. O Congresso continuará atuante e atento para colaborar no que for necessário para a superação desta crise." / COLABORARAM BIANCA GOMES, PAULA REVERBEL E RICARDO GALHARDO