RIO - A manhã seguinte ao dia da operação da Polícia Federal contra o governador Wilson Witzel foi de movimentação política. Na Assembleia Legislativa do Rio, a Alerj, dois pedidos de impeachment foram apresentados contra o mandatário, alvo de mandados de busca e apreensão por suspeitas de envolvimento com a corrupção na Saúde em meio à pandemia. A Alerj, segundo apurou o Estadão, deve acatar os pedidos. Com isso, o ex-juiz seria a obrigado a se defender não só no Judiciário, mas também no Legislativo.
O presidente da Assembleia, André Ceciliano (PT), limitou-se a dizer que a Casa não vai ficar inerte. Três pedidos de impeachment já haviam sido apresentados durante o mandato de Witzel, mas eram muito mais baseados em ilações do que em fatos concretos. A avaliação é de que os protocolados nesta quarta-feira têm mais riqueza de detalhes e justificam pelo menos a abertura do processo.
“A Alerj tem ajudado muito (o governo), mas algumas coisas têm limites. A Assembleia vai fazer o papel dela”, apontou o presidente. Apesar de petista, Ceciliano é pragmático e já articulou pró-governo em episódios como o desembarque do PSL, quando a base precisou ser remontada - base esta que carece de solidez.
Apesar de o presidente não cravar que vai aceitar a abertura do processo, o andamento já é tido como certo nos bastidores. O rito, que envolve passagem por comissões, deve demorar cerca de 20 dias.
Os pedidos apresentados têm como base a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que autorizou os mandados de busca e apreensão - ao todo, foram levados três celulares e três computadores de Witzel. Um dos documentos é assinado pelos tucanos Luiz Paulo, o decano da Alerj, e Lucinha. Ambos são críticos ao atual diretório do PSDB no Rio, comandado pelo empresário Paulo Marinho e próximo a Witzel.
O documento cita como crime de responsabilidade o mau uso do dinheiro público, que configuraria improbidade administrativa. "O fundamento está na própria exposição de motivos do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Estão listados indícios muito robustos de que o governador está envolvido em crimes contra o erário público estadual, e quem diz isso é o ministro Benedito Gonçalves, do STJ, e o Ministério Público Federal”, aponta Luiz Paulo. Na justificativa para a abertura do processo, os parlamentares dizem ainda que "gostariam" que o governador tivesse condições de finalizar seu mandato. "No entanto, a situação se revela alarmante, com a existência de corrupção governamental em pleno período de pandemia, crime que poderia ser considerado como hediondo."
Outro pedido vem de um grupo que, durante a eleição e no início do governo, era aliada de Witzel: os bolsonaristas. Atualmente no Republicanos, o ex-líder do PSL na Casa, Dr. Serginho, afirma que os fatos apontados pelo Ministério Público são gravíssimos e exigem o afastamento do governador.
“O governador não possui condições morais e políticas para permanecer à frente do Executivo”, diz Serginho. Alana Passos (PSL), por sua vez, pede que Ceciliano bote o pedido em votação "o mais rápido possível." O documento é assinado ainda por Anderson Moraes (PSL), Coronel Salema (sem partido), Filippe Poubel (PSL), Márcio Gualberto (PSL) e Renato Zaca (sem partido). Os que permanecem no PSL o fazem por mero entrave burocrático que impediu a desfiliação. O Republicanos, por sua vez, é o abrigo temporário dos políticos que pretendem integrar o Aliança Pelo Brasil, partido projetado pela família Bolsonaro.
Antes da implosão do PSL, o ex-partido do presidente da República tinha 12 deputados na Alerj - a maior bancada, com folga - e ancorava a base governista. Foi então que chegaram duas crises: a dos bolsonaristas com Witzel, que tirou da base de sustentação do governador seus principais parceiros na eleição de 2018; e a interna do próprio PSL, que promoveu a divisão da legenda. Naquele momento, por volta de setembro do ano passado, Ceciliano e o governo atuaram para formar consenso em projetos específicos na Casa, como a aprovação das contas do ex-governador Luiz Fernando Pezão.A avaliação de uma fonte ouvida pelo Estadão, porém, é de que Witzel não tem nenhum grupo fiel ao qual se apegar na Alerj - um grupo que esteja disposto a protegê-lo com unhas e dentes. E isso pode custar caro numa eventual abertura de impeachment.
Procurado, o governador não comentou sobre os pedidos de afastamento apresentados na Assembleia Legislativa.