Antes de Bolsonaro, ex-presidentes foram alvo de especulações sobre interferência na PF


Polícia Federal se torna epicentro de crises políticas; caso do atual presidente, no entanto, é mais grave, apontam especialistas

Por Bianca Gomes
Atualização:

A Polícia Federal se tornou epicentro de crises políticas nos governos das últimas duas décadas, segundo especialistas ouvidos pelo Estado. Tendo como caso mais grave e recente o de Bolsonaro, único a ser formalmente investigado, acusações de tentativas de interferência política no órgão aparecem também em governos como os de Temer, Lula e FHC.

Jair Bolsonaro foi acusado por Sérgio Moro de tentarinterferir politicamente no comando da Polícia Federal Foto: Isac Nóbrega / PR

Para o advogado e professor de direito Welington Arruda, é natural que a Polícia Federal se torne epicentro de crises em quase todos os mandatos, dada a capacidade do órgão de produzir inteligência e relatórios de investigação. “Controlar a PF é uma forma que governantes têm de evitar problemas criminais, investigações e ainda controlar os adversários políticos a partir de dossiês.”

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Acesso a relatórios de inteligência da Polícia Federal é o que está no escopo das acusações de Sérgio Moro a Bolsonaro. Segundo o ex-juiz, o mandatário estaria preocupado com inquéritos em curso no STF, o que o presidente nega. 

Apesar de outros mandatários terem sido acusados de interferência na PF, especialistas são unânimes em afirmar que Bolsonaro é o caso mais grave, justamente pelas acusações terem partido do seu próprio ministro da Justiça

“A interferência em governos anteriores nunca passou de especulação”, diz Daniella Meggiolaro, advogada criminalista e presidente da comissão de direito penal da OAB/SP. “Agora, temos um ex-ministro da Justiça afirmando categoricamente que foi compelido a nomear um superintendente que pudesse transmitir informações especiais e interferir nas conduções das investigações.”

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Em todos os demais casos de presidentes, mesmo que noticiados na imprensa, não havia um apontamento tão expresso e forte como esse, diz Welington Arruda. “Especialmente pelo fato de ficar claro que há inegável interesse do presidente Bolsonaro em controlar a PF no Rio de Janeiro, local onde tem sua base e tem as acusações mais graves contra seu clã familiar.”

Caso mais recente depois de Bolsonaro, a nomeação de Fernando Segovia para a chefia da Polícia Federal, durante o governo de Michel Temer, foi cercada de desconfiança e atribuída à indicação de emedebistas investigados.

O delegado durou pouco menos de quatro meses no cargo. Sua trajetória foi desgastada sobretudo pela entrevista em que afirmou não haver provas contra o presidente em inquérito conduzido pela PF, além de uma declaração controversa na qual questiona se uma única mala seria suficiente para comprovar que Temer havia praticado corrupção.  

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“Causou um grande desconforto entre Policiais Federais e a própria classe jurídica como um todo. Era como se Segovia estivesse advogando para o Presidente. Então precisou ser substituído pelo Rogério Galloro”, diz Arruda. 

A troca de Lula no comando da PF e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), em 2007, também foi alvo de críticas. Foi dito que ex-presidente desejava ter mais informações sobre as operações da corporação e não achava o trabalho da Abin eficiente, o que ele negou. 

Outro episódio envolvendo o chefe do executivo federal e a PF foi no governo de Fernando Henrique Cardoso. Em depoimento sobre o Dossiê Cayman – conjunto de documentos falsos que atribuía a FHC e ministros a posse de contas bancárias em paraíso fiscal –, o ex-diretor-geral da PF,  Vicente Chelotti, afirmou ter recebido ordens do presidente para omitir um documento que isentava ele, Serra e Covas, mas não inocentava Sérgio Motta.

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As investigações mostraram que o documento era forjado e nenhum dos nomes era vinculado a suposta empresa denominada CHJ. Mas a declaração de Chelotti evidenciou interferência do presidente na corporação.

A demissão de Chelotti em março de 1999 se deu após divulgação de grampo telefônico em que ele dizia se considerar “colado à cadeira” por ter FHC “nas mãos”. 

Autonomia

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O protagonismo que a PF ganhou nos últimos anos está ligada ao seu fortalecimento durante o primeiro mandato do governo Lula, diz o advogado e professor do Mackenzie Humberto Fabretti. “A PF recebeu uma atenção muito grande do governo. A carreira foi completamente renovada e reestruturada e ganhou liberdade. Nesse momento é que ela começa efetivamente a investigar uma série de irregulares.”

Segundo Fabretti, a tentativa de interferência sempre existe, seja o governo que for. “Apesar da PF ser um órgão de Estado, não esteja para servir governo, a cúpula é definida pelo ministro da Justiça, que dá uma escolha do presidente.” 

Diante desse cenário, Rodrigo Pardal, professor de direito penal do Damásio Educacional, reforça a necessidade de manter a corporação afastada de ingerências políticas.

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“A Polícia Federal, enquanto órgão permanente, não pode ficar à mercê de um chefe de Estado, qualquer que seja ele”, afirma o professor. “A PF serve ao cidadão e não se trata evidentemente de ‘órgão xerife’ a serviço de qualquer chefe de Estado. Qualquer raciocínio que destoe disse macula a instituição.”

A Polícia Federal se tornou epicentro de crises políticas nos governos das últimas duas décadas, segundo especialistas ouvidos pelo Estado. Tendo como caso mais grave e recente o de Bolsonaro, único a ser formalmente investigado, acusações de tentativas de interferência política no órgão aparecem também em governos como os de Temer, Lula e FHC.

Jair Bolsonaro foi acusado por Sérgio Moro de tentarinterferir politicamente no comando da Polícia Federal Foto: Isac Nóbrega / PR

Para o advogado e professor de direito Welington Arruda, é natural que a Polícia Federal se torne epicentro de crises em quase todos os mandatos, dada a capacidade do órgão de produzir inteligência e relatórios de investigação. “Controlar a PF é uma forma que governantes têm de evitar problemas criminais, investigações e ainda controlar os adversários políticos a partir de dossiês.”

Acesso a relatórios de inteligência da Polícia Federal é o que está no escopo das acusações de Sérgio Moro a Bolsonaro. Segundo o ex-juiz, o mandatário estaria preocupado com inquéritos em curso no STF, o que o presidente nega. 

Apesar de outros mandatários terem sido acusados de interferência na PF, especialistas são unânimes em afirmar que Bolsonaro é o caso mais grave, justamente pelas acusações terem partido do seu próprio ministro da Justiça

“A interferência em governos anteriores nunca passou de especulação”, diz Daniella Meggiolaro, advogada criminalista e presidente da comissão de direito penal da OAB/SP. “Agora, temos um ex-ministro da Justiça afirmando categoricamente que foi compelido a nomear um superintendente que pudesse transmitir informações especiais e interferir nas conduções das investigações.”

Em todos os demais casos de presidentes, mesmo que noticiados na imprensa, não havia um apontamento tão expresso e forte como esse, diz Welington Arruda. “Especialmente pelo fato de ficar claro que há inegável interesse do presidente Bolsonaro em controlar a PF no Rio de Janeiro, local onde tem sua base e tem as acusações mais graves contra seu clã familiar.”

Caso mais recente depois de Bolsonaro, a nomeação de Fernando Segovia para a chefia da Polícia Federal, durante o governo de Michel Temer, foi cercada de desconfiança e atribuída à indicação de emedebistas investigados.

O delegado durou pouco menos de quatro meses no cargo. Sua trajetória foi desgastada sobretudo pela entrevista em que afirmou não haver provas contra o presidente em inquérito conduzido pela PF, além de uma declaração controversa na qual questiona se uma única mala seria suficiente para comprovar que Temer havia praticado corrupção.  

“Causou um grande desconforto entre Policiais Federais e a própria classe jurídica como um todo. Era como se Segovia estivesse advogando para o Presidente. Então precisou ser substituído pelo Rogério Galloro”, diz Arruda. 

A troca de Lula no comando da PF e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), em 2007, também foi alvo de críticas. Foi dito que ex-presidente desejava ter mais informações sobre as operações da corporação e não achava o trabalho da Abin eficiente, o que ele negou. 

Outro episódio envolvendo o chefe do executivo federal e a PF foi no governo de Fernando Henrique Cardoso. Em depoimento sobre o Dossiê Cayman – conjunto de documentos falsos que atribuía a FHC e ministros a posse de contas bancárias em paraíso fiscal –, o ex-diretor-geral da PF,  Vicente Chelotti, afirmou ter recebido ordens do presidente para omitir um documento que isentava ele, Serra e Covas, mas não inocentava Sérgio Motta.

As investigações mostraram que o documento era forjado e nenhum dos nomes era vinculado a suposta empresa denominada CHJ. Mas a declaração de Chelotti evidenciou interferência do presidente na corporação.

A demissão de Chelotti em março de 1999 se deu após divulgação de grampo telefônico em que ele dizia se considerar “colado à cadeira” por ter FHC “nas mãos”. 

Autonomia

O protagonismo que a PF ganhou nos últimos anos está ligada ao seu fortalecimento durante o primeiro mandato do governo Lula, diz o advogado e professor do Mackenzie Humberto Fabretti. “A PF recebeu uma atenção muito grande do governo. A carreira foi completamente renovada e reestruturada e ganhou liberdade. Nesse momento é que ela começa efetivamente a investigar uma série de irregulares.”

Segundo Fabretti, a tentativa de interferência sempre existe, seja o governo que for. “Apesar da PF ser um órgão de Estado, não esteja para servir governo, a cúpula é definida pelo ministro da Justiça, que dá uma escolha do presidente.” 

Diante desse cenário, Rodrigo Pardal, professor de direito penal do Damásio Educacional, reforça a necessidade de manter a corporação afastada de ingerências políticas.

“A Polícia Federal, enquanto órgão permanente, não pode ficar à mercê de um chefe de Estado, qualquer que seja ele”, afirma o professor. “A PF serve ao cidadão e não se trata evidentemente de ‘órgão xerife’ a serviço de qualquer chefe de Estado. Qualquer raciocínio que destoe disse macula a instituição.”

A Polícia Federal se tornou epicentro de crises políticas nos governos das últimas duas décadas, segundo especialistas ouvidos pelo Estado. Tendo como caso mais grave e recente o de Bolsonaro, único a ser formalmente investigado, acusações de tentativas de interferência política no órgão aparecem também em governos como os de Temer, Lula e FHC.

Jair Bolsonaro foi acusado por Sérgio Moro de tentarinterferir politicamente no comando da Polícia Federal Foto: Isac Nóbrega / PR

Para o advogado e professor de direito Welington Arruda, é natural que a Polícia Federal se torne epicentro de crises em quase todos os mandatos, dada a capacidade do órgão de produzir inteligência e relatórios de investigação. “Controlar a PF é uma forma que governantes têm de evitar problemas criminais, investigações e ainda controlar os adversários políticos a partir de dossiês.”

Acesso a relatórios de inteligência da Polícia Federal é o que está no escopo das acusações de Sérgio Moro a Bolsonaro. Segundo o ex-juiz, o mandatário estaria preocupado com inquéritos em curso no STF, o que o presidente nega. 

Apesar de outros mandatários terem sido acusados de interferência na PF, especialistas são unânimes em afirmar que Bolsonaro é o caso mais grave, justamente pelas acusações terem partido do seu próprio ministro da Justiça

“A interferência em governos anteriores nunca passou de especulação”, diz Daniella Meggiolaro, advogada criminalista e presidente da comissão de direito penal da OAB/SP. “Agora, temos um ex-ministro da Justiça afirmando categoricamente que foi compelido a nomear um superintendente que pudesse transmitir informações especiais e interferir nas conduções das investigações.”

Em todos os demais casos de presidentes, mesmo que noticiados na imprensa, não havia um apontamento tão expresso e forte como esse, diz Welington Arruda. “Especialmente pelo fato de ficar claro que há inegável interesse do presidente Bolsonaro em controlar a PF no Rio de Janeiro, local onde tem sua base e tem as acusações mais graves contra seu clã familiar.”

Caso mais recente depois de Bolsonaro, a nomeação de Fernando Segovia para a chefia da Polícia Federal, durante o governo de Michel Temer, foi cercada de desconfiança e atribuída à indicação de emedebistas investigados.

O delegado durou pouco menos de quatro meses no cargo. Sua trajetória foi desgastada sobretudo pela entrevista em que afirmou não haver provas contra o presidente em inquérito conduzido pela PF, além de uma declaração controversa na qual questiona se uma única mala seria suficiente para comprovar que Temer havia praticado corrupção.  

“Causou um grande desconforto entre Policiais Federais e a própria classe jurídica como um todo. Era como se Segovia estivesse advogando para o Presidente. Então precisou ser substituído pelo Rogério Galloro”, diz Arruda. 

A troca de Lula no comando da PF e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), em 2007, também foi alvo de críticas. Foi dito que ex-presidente desejava ter mais informações sobre as operações da corporação e não achava o trabalho da Abin eficiente, o que ele negou. 

Outro episódio envolvendo o chefe do executivo federal e a PF foi no governo de Fernando Henrique Cardoso. Em depoimento sobre o Dossiê Cayman – conjunto de documentos falsos que atribuía a FHC e ministros a posse de contas bancárias em paraíso fiscal –, o ex-diretor-geral da PF,  Vicente Chelotti, afirmou ter recebido ordens do presidente para omitir um documento que isentava ele, Serra e Covas, mas não inocentava Sérgio Motta.

As investigações mostraram que o documento era forjado e nenhum dos nomes era vinculado a suposta empresa denominada CHJ. Mas a declaração de Chelotti evidenciou interferência do presidente na corporação.

A demissão de Chelotti em março de 1999 se deu após divulgação de grampo telefônico em que ele dizia se considerar “colado à cadeira” por ter FHC “nas mãos”. 

Autonomia

O protagonismo que a PF ganhou nos últimos anos está ligada ao seu fortalecimento durante o primeiro mandato do governo Lula, diz o advogado e professor do Mackenzie Humberto Fabretti. “A PF recebeu uma atenção muito grande do governo. A carreira foi completamente renovada e reestruturada e ganhou liberdade. Nesse momento é que ela começa efetivamente a investigar uma série de irregulares.”

Segundo Fabretti, a tentativa de interferência sempre existe, seja o governo que for. “Apesar da PF ser um órgão de Estado, não esteja para servir governo, a cúpula é definida pelo ministro da Justiça, que dá uma escolha do presidente.” 

Diante desse cenário, Rodrigo Pardal, professor de direito penal do Damásio Educacional, reforça a necessidade de manter a corporação afastada de ingerências políticas.

“A Polícia Federal, enquanto órgão permanente, não pode ficar à mercê de um chefe de Estado, qualquer que seja ele”, afirma o professor. “A PF serve ao cidadão e não se trata evidentemente de ‘órgão xerife’ a serviço de qualquer chefe de Estado. Qualquer raciocínio que destoe disse macula a instituição.”

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