BRASÍLIA - Numa sessão que se estende por mais de 17 horas, a base aliada finalmente conseguiu aprovar, no Congresso Nacional, o texto principal do projeto de lei que altera a meta do superávit primário, a economia mínima que o governo central precisa fazer para o pagamento dos juros da dívida pública. Agora, deputados e senadores analisam quatro destaques, que são dispositivos que podem promover modificações na redação. Os aliados do Planalto contam com sua maioria para rejeitá-los e confirmar o teor do texto principal. Desde as 10 horas 30 minutos da manhã desta quarta-feira (3), parlamentares da base e da oposição se digladiam e trocam acusações no Plenário Ulysses Guimarães, na Câmara. O PSDB e o DEM têm alegado que a presidente Dilma Rousseff "chantageou" o Congresso com promessas de emendas e pediu uma "anistia" ao Legislativo, enquanto que o PT argumentou que as mudanças nas regras da política fiscal servem para garantir os investimentos e o baixo nível de desemprego. "Esse é o debate da eleição, quando a presidente Dilma disse que não faríamos política fiscal às custas do desemprego", declarou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). "Não queremos que o País fique com dinheiro na poupança precisando de investimentos", afirmou o senador Wellington Dias (PT), eleito governador do Piauí. "Não podemos avalizar essa irresponsabilidade fiscal de forma alguma", rebateu o líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE). "O que ela (Dilma) quer é apenas se livrar da consequência de ter infringido a lei orçamentária", acrescentou o líder do PSDB no Senado, Aloysio Nunes (SP). O senador Aécio Neves (MG) subiu na tribuna para atacar o projeto que altera a meta fiscal, momento no qual foi vaiado por petistas. Ao citar o decreto de Dilma editado na segunda-feira (1º) que condicionou a liberação de emendas parlamentares à aprovação da mudança da meta do superávit primário, Aécio disse que a presidente estava colocando o Congresso de "cócoras". 'Aperto'. Com um déficit fiscal acumulado e diante da impossibilidade de cumprir a economia mínima para o pagamento de juros da dívida pública prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em vigor, de R$ 49 bilhões, a equipe econômica enviou ao Legislativo um projeto de lei que permite que sejam descontados da meta todos os gastos com o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) e as desonerações de impostos. Na prática, a medida abre uma brecha para que a legislação seja dada como alcançada mesmo em caso de um resultado fiscal negativo ao final do ano. O presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), foi o maior avalista da aprovação do projeto no Congresso, ao comandar por mais de 17 horas de discussões e contornar a obstrução realizada pela oposição. Deixando claro ser o fiel da balança da governabilidade num tema considerado vital pelo Planalto, os peemedebistas esperam garantir mais espaço no novo ministério de Dilma. A meta do partido é comandar seis pastas e está na mira do PMDB manter o Ministério de Minas e Energia e emplacar um indicado na Integração Nacional. Tumulto. Na manhã desta quarta-feira, a reunião do Congresso começou ainda sob o clima de confronto que marcou a tentativa anterior de votação da proposta, anteontem à noite. Na ocasião, um grupo de cerca de 30 manifestantes vaiavam os pronunciamentos de governistas quando Renan, alegando que o público atuava de forma "partidarizada", determinou que as galerias fossem esvaziadas. Deputados oposicionistas correram ao local para evitar a remoção e instalou-se uma confusão generalizada, com agressões entre parlamentares, seguranças do Senado e manifestantes. O impasse fez com que Renan suspendesse a sessão, retomada no dia seguinte, mas com as galerias fechadas ao público. Boa parte da reunião que ocorreu ontem e nesta madrugada, por sua vez, foi destinada a analisar dois vetos presidenciais que estavam trancando a pauta. A apreciação desses dispositivos, ao final mantidos, era pré-requisito para que a proposta que modifica as regras da política fiscal entrasse na pauta de votações. Depois disso, os parlamentares ainda se debruçaram sobre um projeto de lei que abriu R$ 248 milhões em créditos para que a União cumpra uma decisão judicial e pague pensões a aposentados e pensionistas do Fundo Aerus, das extintas empresas aéreas Varig e Transbrasil. Com todo esse périplo, o projeto de lei que flexibiliza a meta de superávit só entrou efetivamente em deliberação depois das 23 horas desta quarta-feira, após uma determinação de Renan que invalidou uma série de requerimentos da oposição que visavam atravancar a votação.