Os atos de vandalismo praticados em Brasília na noite desta segunda-feira, 12, podem ser tipificados em diversas espécies penais, mas não como terrorismo. Especialistas consultados pelo Estadão afirmam que o ocorrido pode ser enquadrado como crime contra o patrimônio e a paz pública, por exemplo, ou pela lei que dispõe sobre crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Manifestantes incendiaram oito veículos, sendo cinco ônibus e três carros, e apedrejaram uma delegacia na capital federal, segundo informações do corpo de bombeiros. O estopim para os atos violentos foi a prisão, a pedido do ministro do STF Alexandre de Moraes, do líder indígena bolsonarista José Acácio Serere Xavante. Além disso, horas mais cedo, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) havia sido diplomado na sede do TSE.
A Lei 14.197, que trata da soberania, defesa nacional e ordem pública, foi sancionada em setembro de 2021 pelo presidente Jair Bolsonaro (PL). O feito do texto foi acrescentar um título sobre crimes contra o Estado de Direito ao código penal e revogar a polêmica Lei de Segurança Nacional, redigida durante o regime militar.
A lei descreve os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, espionagem, interrupção do processo eleitoral, violência política, sabotagem, golpe de Estado e contra a soberania e a integridade nacional.
“Há aqui diversos crimes. Há crime de dano, dano qualificado, incêndio, associação criminosa, quando três ou mais pessoas se unem para fazer um incêndio por exemplo. São inúmeras condutas tipificados. O grande desafio é identificar os autores, o que acontecerá por testemunho ou por imagens registradas”, afirmou a desembargadora do Tribunal de Justiça de São Paulo Ivana David.
O criminalista Daniel Bialski, mestre em Processo Penal pela PUC-SP, afirmou que, em tese, os atos poderiam ser enquadrados como “afrontosos à lei antiterrorismo brasileira”, mas que, nesse caso, fazê-lo seria forçar a interpretação da legislação. Isso porque, segundo ele, a intenção do legislador não foi combater protestos referentes à política do País. “Para isso existem outros dispositivos penais muito mais específicos, como o crime contra o patrimônio, contra a paz pública e o crime de periclitação da vida”, afirma.
Leia Também:
Ameaça ao Estado Democrático de Direito
Eis o que diz a lei 14.197, em capítulo sobre a Abolição violenta do Estado Democrático de Direito:
Art. 359-L. Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais. Pena: reclusão, de quatro a oito anos, além da pena correspondente à violência.
Justificativa: Parte da motivação dos protestos é impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva, vitorioso no processo eleitoral, e destituir as instituições democráticas por meio de intervenção militar.
Golpe de Estado
Eis o que diz a lei 14.197, em capítulo sobre tentativa de golpe de Estado:
Art. 359-M. Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído.
Pena: reclusão, de 4 (quatro) a 12 (doze) anos, além da pena correspondente à violência.
Periclitação da vida e crime de dano
Eis como o código penal descreve o crime de periclitação da vida:
Art. 132 do Código Penal: Expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente. Pena: detenção, de três meses a um ano, se o fato não constitui crime mais grave.
Eis como o código penal descreve o crime de dano:
Art. 163 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia. Pena: detenção de um a seis meses ou multa.
Justificativa: os manifestantes atearam fogo a carros e ônibus.
Crime contra o patrimônio
O código penal também estabelece punição para crimes praticados contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público.