Os rastros de destruição deixados pelas agressões à democracia brasileira no dia 08 de janeiro de 2023 ainda são enormes. Um ano após os ataques aos Prédios dos Três Poderes, desferidos por apoiadores do ex-presidente da República, que não reconheciam a legitimidade das eleições, depredando e destruindo as sedes do Judiciário, do Legislativo e do Executivo, ainda carrega o sentimento de reconstrução.
Uma restauração não apenas do patrimônio público, do material, mas da simbologia, de saber que a intenção era a de dar um golpe contra a Nação, contra o Estado Democrático de Direito.
Um triste dia, mas que deve ser lembrado, que não saia da memória do brasileiro e do mundo. Que esteja estampado, para que nunca mais ocorra. Que desperte a consciência e sirva de exemplo para que outras tentativas não aconteçam, pois todos estarão vigilantes.
A sociedade, como um todo, seus representantes, juristas, professores, advogados, continuam a demonstrar força para agir diante de possíveis manifestações antidemocráticas. Papel a ser exercido por instituições como a Faculdade de Direito da USP, que (ainda em 2022) promoveu manifesto em defesa da democracia, com a leitura da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros, no Pátio das Arcadas; e que em 09 de janeiro de 2023, um dia após os atentados, reuniu centenas de pessoas em seu Salão Nobre para um novo ato pela democracia brasileira.
Afinal, como disse o professor Ricardo Lewandowski, à época ministro do Supremo Tribunal Federal e vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral: “A Democracia Brasileira, felizmente, sobreviveu”.
Neste primeiro ano, professores e juristas gravaram alguns depoimentos relembrando os trabalhos realizados, e ratificando a posição da FDUSP em Defesa do Estado Democrático de Direito, Sempre. Os vídeos podem ser assistidos pelo Canal do YouTube.
Para o diretor da SanFran, professor Celso Fernandes Campilongo, o 8 de janeiro de 2023 foi um dia trágico, triste para a história da democracia brasileira, para a história do Brasil. “No próprio dia 8 do ano passado, que caiu em um domingo, no momento em que começaram a aparecer as primeiras cenas na televisão de ocupação de prédios públicos, de depredação, de ataques ao patrimônio histórico, imediatamente comecei a receber ligações de diversos professores da faculdade que me cobravam se a Faculdade iria fazer alguma coisa contra o que estava acontecendo. Organizamos o ato no Salão Nobre o mais rápido possível”, lembrou.
O docente assinala que essa polarização, com o discurso de ódio e de violência, leva a aberrações como essas: de um ataque impensável, em outras épocas, à democracia. “Sem democracia não existe Estado de Direito. Sem Estado de Direito, não existe garantia das liberdades. Sem Estado de Direito, não existe a garantia de políticas públicas que possam desenvolver a igualdade. O 8 de janeiro representou a negação de tudo isso, que são bandeiras importantes na tradição da Faculdade de Direito.”
Celso Lafer, Jurista e Professor Emérito da FDUSP, acredita que a manifestação na Faculdade sobre o 8 de janeiro é uma recuperação das lutas democráticas. Ele acentuou que, no 11 de agosto de 2022 a preocupação era com as defesas da democracia e das regras do jogo democrático, mas que o 08 de janeiro de 23 é o resultado de uma sociedade pluralizada. “O Brasil saiu das eleições de 2022, uma sociedade dividida. Não apenas em torno de opções políticas, mas uma sociedade forjada em bolhas que não se comunicava e que ignorava o significado do processo democrático, das novas instituições e da eleição”, afirmou.
A vice-diretora da FDUSP, professora Ana Elisa Bechara, ressalta que há um ano o Brasil viveu um dos episódios mais horríveis da sua história, com a tentativa de golpe de estado, a partir de atos de violência extrema contra as instituições democráticas. “A simbologia da invasão e destruição dos prédios dos poderes executivos, legislativos e judiciários em Brasília, chocou a todos nós, brasileiros, que assistíamos tristes a tudo, sem conseguir acreditar como era possível o tamanho do ataque à democracia, depois de tudo que a história nos ensinou”, diz, acrescentando que o episódio de barbárie deixou muitas lições.
Bechara, uma das juristas que leu à Carta de 22, adiciona que nas duas ocasiões – eleições de 2022 e atentados de 2023 – “a Academia representou uma ponte importante que possibilitou a união de diversos setores sociais em torno da defesa de um valor comum a todos, que é a defesa da democracia”.
O professor Oscar Vilhena Vieira, diretor da FGV Direito, diz que a regra básica do jogo democrático é que aquele que é derrotado numa eleição vá para casa (aceite o resultado), e aquele que assume o poder não faça um ato de retaliação em relação aos derrotados. “O que nós assistimos no dia 8 de janeiro, claramente, foi um ato de infidelidade muito clara à democracia e à constituição brasileira”, acredita.
“Por quê? Porque um grupo de pessoas quis contestar o resultado daquilo que foi decidido pela maioria nas urnas. Felizmente os que habitam as instituições brasileiras, ainda que possam ter agido com a ambiguidade em alguns momentos, no 8 de janeiro se uniram em torno da defesa da democracia, das instituições”.”
Para a professora Maria Paula Dallari Bucci, os ataques aos Três Poderes mostraram o tamanho do risco que sofrem as instituições. Ela adiciona que a democracia é frágil e resvala em todas as partes do mundo, lembrando que, nos Estados Unidos, o presidente que também patrocinou ataques semelhantes, ainda tem forte chance de ganhar as eleições em 2024.
“A lição que fica é sobre a importância da frente ampla na defesa dos valores e das práticas da democracia. Sem ela, não conseguiremos superar os desafios do presente.”
Dimas Ramalho, conselheiro no Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, destaca que nesse momento deve-se reiterar o compromisso intransigente de defesa da democracia, do Estado Democrático de Direito e das instituições. “Essa é a grande missão”.”
Belisario dos Santos Júnior, ex-Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo, reforça que os atentados de 8 de janeiro de 2023 constituíram o governo autoritário do ex-presidente Jair Bolsonaro. “Ele sempre foi a favor da Ditadura Militar. Em seu governo, fez plataformas contra a democracia, contra a urna eletrônica, contra as eleições. Enfim, até o fim do seu governo, ele tentou reverter uma situação que as urnas haviam decretado inexoravelmente”.”
Eunice Prudente, professora de Direitos Humanos da FDUSP e secretária de Justiça da Cidade de São Paulo, acentua: “Louvemos o 8 de janeiro, dia da democracia”. A docente acrescenta que a diversidade étnico-racial tem especificidades muito graves, que necessitam de políticas públicas, somente possíveis numa democracia.
Para Flavio Bierrenbach, ex-ministro do Superior Tribunal Militar, a maior preocupação que o planeta tem hoje diz respeito à sustentabilidade ambiental. “No Brasil nós não temos só esse problema. No Brasil nós temos um problema da sustentabilidade da democracia. A democracia precisa ser sustentada, porque ela é frágil”, adverte.
Antonio Roque Citadini, conselheiro do TCE-SP, afirma que o 8 de janeiro de 2023 é uma mancha para o País. “Nesse dia, ficou claro que as forças antidemocráticas conspiravam contra o Estado de Direito. A Faculdade de Direito da USP teve uma reação pronta na defesa das instituições e do Estado Democrático de Direito”.”
Fernando Facury Scaff, professor da FDUSP, adiciona que muitas pessoas pensam que o 8 de janeiro de 23 foi um passeio no parque, uma brincadeira, uma singela manifestação democrática contra as eleições. “Não foi nada disso. Foi uma tentativa de golpe, manifestada por diversas mentes da sociedade, diversas pessoas que manipularam outras que foram à praça para desequilibrar o sistema e o novo governo que estava assumindo.”
Conforme destaca o professor Alysson Mascaro, as sociedades do mundo passam tanto por momentos de esperança, de transformação, ao mesmo tempo que se confrontam com momentos e circunstâncias de regressão, de destruição da situação existente. “O 8 de janeiro de 2023 é uma dessas páginas tristes de nossa história para o Brasil, bem como para o mundo. História na qual tantas vezes estas páginas tristes foram olvidadas, foram esquecidas, foram apagadas, ou foram mal combatidas, ou não foram enfrentadas com o devido vigor e com a devida energia.”
Antonella Galindo, vice-diretora da Faculdade de Direito do Recife, reforça o compromisso, enquanto docente e cidadã brasileira; enquanto profissional do Direito; com a democracia. “No 08 de janeiro de 2023, vimos a tentativa de um golpe de Estado, um vandalismo terrível dos prédios públicos em Brasília, com essa finalidade de provocar confusão e tumulto”.”
De acordo com o professor Conrado Hubner Mendes, o 8 de janeiro simboliza um momento crucial e culminante de um projeto de ruptura da democracia brasileira, que mobilizou, por meio de milícias digitais, muita gente para causar um grau de desordem e de instabilidade política que justificasse um decreto de intervenção que já estava pronto. “Por várias razões, o 8 de janeiro não foi bem-sucedido. Entre elas, uma atuação importante do Ministério da Justiça, da Presidência República e do Supremo Tribunal Federal.”
O constitucionalista José Afonso da Silva adiciona que o 08 de janeiro foi uma sucessão de incompetências. “O Bolsonaro ficou, o governo dele todo falando sobre a ideia de dar um golpe. Quem vai dar golpe, não fica se manifestando que vai dar golpe”, diz. Ele defende que seja cumprida a Constituição.
Por sua vez, Elival Ramos, professor de Direito Constitucional, afirma que o triste evento de 8 de janeiro deve servir de reflexão para todos. “A democracia não é feita simplesmente da energia envolvida na participação política, que é muito péssima. A participação política é, de fato, um elemento essencial da democracia”.
O professor Gustavo Monaco lembra que, há um ano, as instituições da República foram colocadas à prova. “Inúmeros ataques orquestrados, perpetrados contra os Três Poderes, colocaram em xeque a democracia brasileira. A democracia brasileira continua a salvo graças à vigilância de todos e de cada um de nós.”
Conforme José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça, devem ser responsabilizados não apenas todos aqueles que participaram diretamente dos ataques, como os que deram sustentação logística, financeira e ideológica na tentativa do golpe. Ele acrescenta que o 8 de janeiro de 2023 é um marco doloroso na história do País, pois a democracia esteve em risco. “Vi a violência perpetrada contra a sede dos Três Poderes que trouxe o grande medo de recairmos em mais uma ditadura.”
Para o professor José Eduardo Faria, o Brasil aprendeu muito com os erros cometidos no passado. “A afronta, no dia 8 de janeiro de 2023, contra as instituições democráticas, mostrou o preço que o País pagou por ter contemporizado a punição dos militares golpistas em atentados anteriores.”
Por sua vez, o professor José Reinaldo Lima Lopes, afirma que o 8 de janeiro marcou o auge de um processo, infelizmente longo, na história brasileira, que começou em 2016 com o golpe parlamentar. “Esse processo resultou nesses atos incivis, violentos...”.
O promotor de Justiça Luiz Marrey, salienta que neste 8 de janeiro, o Brasil comemora o dia em que a democracia venceu o projeto de ditadura que setores autoritários queriam instalar no País. “A ideia de golpe já vinha sendo articulada há tempos e ficou evidente. Havia a percepção que queriam um pretexto para justificar a ruptura constitucional.”
Em sua fala, a professora Nina Ranieri frisa que, no dia 08 de janeiro de 2023, todos assistiram atônicos e indignados aos ataques criminosos cometidos contra os poderes do Estado brasileiro. “O ataque era contra a democracia, contra a ordem constitucional, contra o Estado Democrático de Direito. Felizmente, prevaleceu a democracia, prevaleceram as instituições democráticas, com o amplo apoio do povo brasileiro que, desde 1985, vive o período democrático mais longo de toda a sua história.”
Nuno Coelho, diretor da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP, adiciona que no 8 de janeiro de 2023, o País foi abalado pela tentativa violenta de um novo golpe de Estado. “Depois de quatro anos de um governo abertamente corrupto e responsável pela morte de centenas de milhares de brasileiros, nós não podemos dizer que ficamos surpreendidos com a violência de que os inimigos do Estado de Direito são capazes no Brasil.”
Para a docente Marta Saad, após um ano dos lamentáveis episódios, é crucial reafirmar com veemência a importância da democracia e das instituições. “São as instituições que garantem a estabilidade e o equilíbrio democrático. E a força da democracia reside exatamente na união cívica, no respeito à diversidade de ideias e, também, na responsabilidade pela preservação da paz pública.”
O docente Mauricio Zanoide de Moraes, reforça: “Salve a democracia brasileira, salve o dia 8 de janeiro de 2023, que mostrou para todos os incautos e desavisados que a cidadania brasileira, a grande maioria do povo brasileiro, sabe defender as suas instituições”.
De acordo com o docente Otavio Pinto e Silva, a data está definitivamente marcada na memória, em razão dos execráveis ataques realizados às sedes dos Poderes, quando foram invadidos e vandalizados os prédios do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. “Foi um domingo de infâmia que não poderá jamais ser esquecido, de modo que toda a comunidade acadêmica da Faculdade de Direito da USP se une para (um ano depois) relembrar os acontecimentos e reafirmar a defesa intransigente da ordem democrática.”
A presidente da OAB-SP, Patrícia Vanzolini, lembra que a sociedade brasileira assistia amedrontada, estarrecida, a um ataque direto à democracia, promovida pelos atos golpistas de 8 de janeiro. “Dentre os muitos aspectos desse triste episódio da história do Brasil, quero destacar a importância das instituições.”
O professor Rafael Mafei, por sua vez, fortalece que esse 8 de janeiro lembra um ano de uma data triste da história recente do Brasil. “Um dia em que brasileiros, insuflados por lideranças políticas antidemocráticas, irresponsáveis, inconsequentes, partiram para cima de instituições de governo, do legislativo e do judiciário e promoveram uma inaceitável destruição na frustrada esperança de promover um estado de coisas que levasse a uma intervenção militar e a um golpe de estado.”
Para Paulo Henrique Pereira, presidente da Associação dos Antigos Alunos da FDUSP, no marco de um ano dos acontecimentos de oito em janeiro, a comunidade jurídica sai à rua dizendo em alto e bom som que o Direito não admite esse tipo de ação. “Infelizmente, a história dos golpes no Brasil não é uma história recente. A nossa República foi atacada quase toda década por novas tentativas e por golpes que se consumaram. Por isso, que nós marquemos este 8 de janeiro com mais uma data para celebrar a democracia”.
O juiz federal Ricardo Nascimento, um dos organizamos da leitura na FDUSP da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros, lembrou que mais de um milhão de pessoas afirmaram o seu compromisso com a democracia e com o respeito às eleições. “No dia 8 de janeiro de 2023, nossa democracia sofreu um ataque sem precedentes, mas a sociedade e nossas instituições responderam com rapidez e com força.”
A professora Susana Henriques da Costa acredita que seja o momento de reflexão sobre qual o papel da Universidade, especialmente na proteção da democracia do Brasil. “Para além dos ataques às instituições que nós sofremos, é importante parar para pensar em mecanismos e ferramentas para que possamos enfrentar, de forma mais premente, questões estruturantes e permanentes, que há muito tempo atacam a nossa democracia.”
De acordo com o docente Tércio Sampaio Ferraz Junior, a democracia tem preço e a destruição ocorrida no dia 8 de janeiro mostra isso. “Mas é um preço que se paga, é um preço que se enfrenta, é um preço que não pode deixar-se passar. Viva a democracia!”.
Thiago Pinheiro Lima, procurador do Ministério Público de Contas junto ao TCE-SP, adiciona que a sociedade evolui ao relembrar momentos importantes da sua história. E o 8 de janeiro será um marco em defesa da democracia. “A despeito daquelas cenas chocantes e das violações aos símbolos nacionais, as instituições atuaram prontamente para evitar a tentativa de golpe”.”
Diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP, Vidal Serrano Nunes Júnior, ressalta que o 8 de janeiro é um dia de reflexão, um dia de triste, onde atos golpistas desvaneceram em grande parte a memória democrática. “Mas, ao mesmo tempo, quer dizer, um dia de comemoração, porque ali houve o triunfo da vontade popular, o triunfo da democracia, o triunfo das nossas instituições.”
Na mesma direção, Torquato Castro Júnior, diretor da Faculdade de Direito do Recife, confessa ter ficado muito mexido com o episódio, algo quase inexplicável. “Ficamos (e estamos) estupefatos que, em pleno Século XXI, tenha havido uma tentativa de golpe de Estado no Brasil. Isso é quase incompreensível se não tivesse enredado em acontecimentos já evidentes na política nacional de extremismo, intolerância e desrespeitos às instituições.”
*Kaco Bovi, assessor de comunicação da Faculdade de Direito da USP