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Opinião|A desigualdade de gênero/raça na política e o papel das instituições


O enfrentamento à violência política de gênero e raça exige um esforço coletivo e constante. Trata-se de transformar estruturas e mentalidades para que todas as mulheres possam participar da vida política de forma plena, segura e livre, entendendo que a pluralidade no poder cria um ambiente menos permissivo para práticas discriminatórias e violências

Por Fernanda Perregil e Claudia Patrícia Luna

Antes de mais nada não há democracia sem a participação de mulheres na política, em qualquer instituição!

No panorama atual existe uma violência de gênero que insiste em excluir as mulheres do espaço político, seja na esfera pública ou privada, no sentido de impedir, restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade (artigo 326-B do Código Eleitoral - incluído pela Lei nº13.834, de 2019). Esta violência é considerada uma das causas de sub-representação das mulheres no sistema político e eleitoral, nos espaços de poder e decisão e prejudica a plena democracia no país.

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De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)[1], apesar das mulheres constituírem 51,1% da população e 52,62% do eleitorado, a filiação aos partidos políticos são predominantemente do gênero masculino, já que dos filiados, 8.493.990 são homens, representando 53,8% do total, enquanto 7.284.431 são mulheres (46,2%).

Apesar da diferença de filiados por gênero não ser tão expressiva, a representatividade das mulheres na política é bem desigual, já que nas últimas eleições de 2022, das 9.891 mulheres que se candidataram, somente 311 foram eleitas, ou seja, apenas 18,2% do total de pessoas eleitas, deste 32% eram mulheres negras, sendo apenas 4 candidaturas de mulheres indígenas.

Embora exista a obrigação (PEC 18/21) para que os partidos políticos destinem no mínimo 30% do fundo eleitoral e da parcela do fundo partidário às campanhas eleitorais de mulheres, e o mesmo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, com um modelo semelhante para candidaturas de pessoas negras, na prática ainda é possível verificar que os partidos priorizam investir em candidaturas de homens brancos, fruto de uma ideia de que confiança e assertividade estão associadas à figura masculina.

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Lembrando da experiência das “candidaturas laranjas”, à medida em que existem algumas candidaturas de mulheres fomentadas internamente apenas para preenchimento desta reserva mínima e usadas para desviar dinheiro do fundo eleitoral.

Como mencionado pelo ONMP[2], “mapear as candidaturas de mulheres e pessoas negras é importante, embora seja insuficiente para absorver as assimetrias de gênero e raça4/5 na representação política. Após a institucionalização de diversos mecanismos e a adoção de maneiras distintas de driblar os incentivos eleitorais, é óbvio que não basta aumentar o volume de candidaturas de pessoas negras e mulheres, mantendo-se o cenário de um patamar de competitividade baixo. Para ser bem-sucedida, uma candidatura precisa de investimento partidário, redes de apoio, recursos financeiros e visibilidade – o que, em sua maioria, é o modus operandi facilitado a homens brancos”.

Desde 2019 a Comissão Gestora de Política de Gênero do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) administra um canal informativo do TSE Mulheres[3] que monitora a atuação das mulheres na política, o qual indicou que, entre 2016 e 2022, o Brasil teve, em média, 52% do eleitorado constituído por mulheres, 33% de candidaturas femininas e apenas 15% de eleitas.

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Outra fonte de dados, o segmento “Mulheres nos parlamentos” compila dados obtidos pela União Interparlamentar com base em informações fornecidas pelos parlamentos nacionais de quase 190 países, e demonstrou que, em 2022, o Brasil ocupou a posição 129ª, com apenas 17,7% de assentos ocupados por mulheres na Câmara dos Deputados. Dos países do G20[4], o Brasil ainda ficou atrás da Arábia Saudita e da Rússia no ranking de representatividade feminina nos parlamentos nacionais.

Por tudo isso, a situação da violência contra as mulheres na política é marcada pelo menosprezo e pela discriminação ao longo de anos, este tipo de violência perpassa a vida das mulheres ao concorrem ou quando já eleitas.

Na condição de candidatas, as mulheres sofrem violência política de gênero, principalmente, por meio de ameaças, interrupções frequentes em sua fala para criar um ambiente de descrédito e impedir que se manifestem, questionamentos sobre suas capacidades, práticas intimidatórias ou que visem desqualificá-las, violação da sua intimidade e privacidade por meio de divulgação de fotos íntimas ou dados pessoais, até mesmo montagens, assédio sexual e objetificação de seus corpos, difamação atribuindo-lhe um ato ofensivo à reputação e honra, além do desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas.

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Quando eleitas, as mulheres sofrem ainda outras violências, ao não serem indicadas para cargos de liderança em comissões ou grupos de trabalho, serem constantemente interrompidas em suas falas, ao serem excluídas de debates, desconsideração de suas opiniões e ideias em reuniões de trabalho, questionamentos sobre sua aparência física e forma de se vestir, além de serem questionadas sobre suas vidas privadas (relacionamentos, sexualidade ou maternidade).

Importante destacar, que os efeitos da violência política de gênero recaem de modo mais intenso sobre os corpos que destoam daqueles que tradicionalmente ocuparam e ocupam os espaços de poder.

Isso significa dizer que, quaisquer corpos que sejam diversos do padrão homem / branco / cis hétero/ rico, (corpos de mulheres negras, indígenas, travestis) estarão, efetivamente, sujeitos à violência política racial e de gênero.

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De modo que, não é possível abordar a violência política de gênero sem desconsiderar seus impactos, a partir de sua dimensão racial.

Segundo dados da Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça no Brasil - 2 anos da Lei 14.192/2021, observa-se o contexto de maior acirramento de violências, quando da aprovação do referido instrumento legal que, exclui a expressão gênero de seu texto e tenta manter a palavra sexo, numa evidente exclusão de seu alcance protetivo, de mulheres travestis e transexuais.

Ao trazermos para a análise da referida lei, a dimensão racial combinada a de gênero, e seu caráter interseccional, observamos que o cenário político, numa exata reprodução do que ocorre na sociedade, é naturalmente mais violento com mulheres, sobretudo, mulheres negras, vez que destoam do padrão dominante, quando ocupantes desse espaço de poder.

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Corpos negros, travestis, com deficiência, não correspondentes ao padrão branco/ masculino/cis hétero, não seriam considerados aptos, e tampouco aceitos a ocupar o espaço da política.

A partir dessa leitura, todos os episódios de violência política de gênero e raça, trazem como raiz, o fato de corpos historicamente impossíveis, improváveis e impensáveis, ocuparem aquele espaço de poder!

A violência simbólica na qual persiste um machismo discursivo também é muito comum nos espaços políticos, provocando um ambiente de verdadeira hostilidade, silenciamento, deslegitimação e exclusão das mulheres destes espaços.

Além das consequências de exclusão, para estas mulheres existem outras implicações na saúde mental e psicológica como a ocorrência do transtorno de ansiedade, depressão, síndrome de burnout, isolamento social e emocional, transtorno de estresse pós-traumático, e no âmbito social a própria manutenção da cultura de silenciamento e retrocesso nos direitos das mulheres.

Por isso, é de suma importância que as Instituições entendam seu papel no combate à violência política de gênero promovam ativamente uma democracia de raça / gênero em suas estruturas internas e externas, principalmente devido ao aumento da violência nestes espaços, praticada de forma sistemática e reiterada, colocando-as em rota de colisão por meio de debates que ambicionam o retrocesso e a sonegação de direitos, mesmo aqueles já consagrados em nosso ordenamento jurídico, como foi o caso do ressurgimento da ideia do PL 1904/2024, que buscava a criminalização do aborto legal.

É papel das instituições públicas e privadas a criação de meios para assegurar uma democracia de gênero não só para permitir a participação de mulheres na política, mas para garantir que estas mulheres não sejam violentadas e passem a sofrer toda sorte de agressões, erguendo um sistema de educação, conscientização e responsabilização de seus agressores.

Por tudo isso, as mulheres que atuam na política precisam contar com redes de apoio entre si e com pessoas aliadas. As redes de apoio fornecem suporte emocional, estratégico e, quando necessário, um espaço seguro para denunciarem a violência. É nesse sentido, que os movimentos sociais e organizações não governamentais também desempenham um papel fundamental ao dar visibilidade a esses casos e pressionar por mudanças.

A mídia tem um papel central tanto na perpetuação, como na erradicação da violência política de gênero, devendo a cobertura midiática expor os casos com seriedade e não reproduzir estereótipos de gênero ou que culpabilize às vítimas.

Por fim, é crucial que existam leis que reconheçam e punam a violência política de gênero, como a criação de marcos legais que protejam as mulheres que participam da política e garantam que as agressões sejam adequadamente investigadas e punidas, obrigando as instituições a criarem comitês de ética, ouvidorias e um compliance interno de prevenção e combate.

O enfrentamento à violência política de gênero e raça exige um esforço coletivo e constante. Trata-se de transformar estruturas e mentalidades para que todas as mulheres possam participar da vida política de forma plena, segura e livre, entendendo que a pluralidade no poder cria um ambiente menos permissivo para práticas discriminatórias e violências, o contrário disso apenas mantém um status quo de exclusão e subjugação, além de uma existência a partir do homem, cuja ideia não é possível mais conviver!

Por fim, não há que se falar em democracia e poder, sem a garantia de representatividade de gênero e raça nos espaços de poder e decisão!!

Nada sobre nós, sem nós!

1 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

2 Eleições, gênero e raça: o que o pleito de 2022 nos ensina1 Carlos Machado, Pedro Paulo de Assis, Danusa Marques e Viviane Gonçalves Freitas* - ONMP – Observatório Nacional da Mulher na Política.

3 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

4 https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/04/09/representatividade-feminina-parlamentos-nacionais-levantamento.htm

5 Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça, uma análise da Lei 14.192/2021 – Instituto Marielle Franco – RJ – 2023 - https://www.violenciapolitica.org/2023

Antes de mais nada não há democracia sem a participação de mulheres na política, em qualquer instituição!

No panorama atual existe uma violência de gênero que insiste em excluir as mulheres do espaço político, seja na esfera pública ou privada, no sentido de impedir, restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade (artigo 326-B do Código Eleitoral - incluído pela Lei nº13.834, de 2019). Esta violência é considerada uma das causas de sub-representação das mulheres no sistema político e eleitoral, nos espaços de poder e decisão e prejudica a plena democracia no país.

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)[1], apesar das mulheres constituírem 51,1% da população e 52,62% do eleitorado, a filiação aos partidos políticos são predominantemente do gênero masculino, já que dos filiados, 8.493.990 são homens, representando 53,8% do total, enquanto 7.284.431 são mulheres (46,2%).

Apesar da diferença de filiados por gênero não ser tão expressiva, a representatividade das mulheres na política é bem desigual, já que nas últimas eleições de 2022, das 9.891 mulheres que se candidataram, somente 311 foram eleitas, ou seja, apenas 18,2% do total de pessoas eleitas, deste 32% eram mulheres negras, sendo apenas 4 candidaturas de mulheres indígenas.

Embora exista a obrigação (PEC 18/21) para que os partidos políticos destinem no mínimo 30% do fundo eleitoral e da parcela do fundo partidário às campanhas eleitorais de mulheres, e o mesmo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, com um modelo semelhante para candidaturas de pessoas negras, na prática ainda é possível verificar que os partidos priorizam investir em candidaturas de homens brancos, fruto de uma ideia de que confiança e assertividade estão associadas à figura masculina.

Lembrando da experiência das “candidaturas laranjas”, à medida em que existem algumas candidaturas de mulheres fomentadas internamente apenas para preenchimento desta reserva mínima e usadas para desviar dinheiro do fundo eleitoral.

Como mencionado pelo ONMP[2], “mapear as candidaturas de mulheres e pessoas negras é importante, embora seja insuficiente para absorver as assimetrias de gênero e raça4/5 na representação política. Após a institucionalização de diversos mecanismos e a adoção de maneiras distintas de driblar os incentivos eleitorais, é óbvio que não basta aumentar o volume de candidaturas de pessoas negras e mulheres, mantendo-se o cenário de um patamar de competitividade baixo. Para ser bem-sucedida, uma candidatura precisa de investimento partidário, redes de apoio, recursos financeiros e visibilidade – o que, em sua maioria, é o modus operandi facilitado a homens brancos”.

Desde 2019 a Comissão Gestora de Política de Gênero do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) administra um canal informativo do TSE Mulheres[3] que monitora a atuação das mulheres na política, o qual indicou que, entre 2016 e 2022, o Brasil teve, em média, 52% do eleitorado constituído por mulheres, 33% de candidaturas femininas e apenas 15% de eleitas.

Outra fonte de dados, o segmento “Mulheres nos parlamentos” compila dados obtidos pela União Interparlamentar com base em informações fornecidas pelos parlamentos nacionais de quase 190 países, e demonstrou que, em 2022, o Brasil ocupou a posição 129ª, com apenas 17,7% de assentos ocupados por mulheres na Câmara dos Deputados. Dos países do G20[4], o Brasil ainda ficou atrás da Arábia Saudita e da Rússia no ranking de representatividade feminina nos parlamentos nacionais.

Por tudo isso, a situação da violência contra as mulheres na política é marcada pelo menosprezo e pela discriminação ao longo de anos, este tipo de violência perpassa a vida das mulheres ao concorrem ou quando já eleitas.

Na condição de candidatas, as mulheres sofrem violência política de gênero, principalmente, por meio de ameaças, interrupções frequentes em sua fala para criar um ambiente de descrédito e impedir que se manifestem, questionamentos sobre suas capacidades, práticas intimidatórias ou que visem desqualificá-las, violação da sua intimidade e privacidade por meio de divulgação de fotos íntimas ou dados pessoais, até mesmo montagens, assédio sexual e objetificação de seus corpos, difamação atribuindo-lhe um ato ofensivo à reputação e honra, além do desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas.

Quando eleitas, as mulheres sofrem ainda outras violências, ao não serem indicadas para cargos de liderança em comissões ou grupos de trabalho, serem constantemente interrompidas em suas falas, ao serem excluídas de debates, desconsideração de suas opiniões e ideias em reuniões de trabalho, questionamentos sobre sua aparência física e forma de se vestir, além de serem questionadas sobre suas vidas privadas (relacionamentos, sexualidade ou maternidade).

Importante destacar, que os efeitos da violência política de gênero recaem de modo mais intenso sobre os corpos que destoam daqueles que tradicionalmente ocuparam e ocupam os espaços de poder.

Isso significa dizer que, quaisquer corpos que sejam diversos do padrão homem / branco / cis hétero/ rico, (corpos de mulheres negras, indígenas, travestis) estarão, efetivamente, sujeitos à violência política racial e de gênero.

De modo que, não é possível abordar a violência política de gênero sem desconsiderar seus impactos, a partir de sua dimensão racial.

Segundo dados da Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça no Brasil - 2 anos da Lei 14.192/2021, observa-se o contexto de maior acirramento de violências, quando da aprovação do referido instrumento legal que, exclui a expressão gênero de seu texto e tenta manter a palavra sexo, numa evidente exclusão de seu alcance protetivo, de mulheres travestis e transexuais.

Ao trazermos para a análise da referida lei, a dimensão racial combinada a de gênero, e seu caráter interseccional, observamos que o cenário político, numa exata reprodução do que ocorre na sociedade, é naturalmente mais violento com mulheres, sobretudo, mulheres negras, vez que destoam do padrão dominante, quando ocupantes desse espaço de poder.

Corpos negros, travestis, com deficiência, não correspondentes ao padrão branco/ masculino/cis hétero, não seriam considerados aptos, e tampouco aceitos a ocupar o espaço da política.

A partir dessa leitura, todos os episódios de violência política de gênero e raça, trazem como raiz, o fato de corpos historicamente impossíveis, improváveis e impensáveis, ocuparem aquele espaço de poder!

A violência simbólica na qual persiste um machismo discursivo também é muito comum nos espaços políticos, provocando um ambiente de verdadeira hostilidade, silenciamento, deslegitimação e exclusão das mulheres destes espaços.

Além das consequências de exclusão, para estas mulheres existem outras implicações na saúde mental e psicológica como a ocorrência do transtorno de ansiedade, depressão, síndrome de burnout, isolamento social e emocional, transtorno de estresse pós-traumático, e no âmbito social a própria manutenção da cultura de silenciamento e retrocesso nos direitos das mulheres.

Por isso, é de suma importância que as Instituições entendam seu papel no combate à violência política de gênero promovam ativamente uma democracia de raça / gênero em suas estruturas internas e externas, principalmente devido ao aumento da violência nestes espaços, praticada de forma sistemática e reiterada, colocando-as em rota de colisão por meio de debates que ambicionam o retrocesso e a sonegação de direitos, mesmo aqueles já consagrados em nosso ordenamento jurídico, como foi o caso do ressurgimento da ideia do PL 1904/2024, que buscava a criminalização do aborto legal.

É papel das instituições públicas e privadas a criação de meios para assegurar uma democracia de gênero não só para permitir a participação de mulheres na política, mas para garantir que estas mulheres não sejam violentadas e passem a sofrer toda sorte de agressões, erguendo um sistema de educação, conscientização e responsabilização de seus agressores.

Por tudo isso, as mulheres que atuam na política precisam contar com redes de apoio entre si e com pessoas aliadas. As redes de apoio fornecem suporte emocional, estratégico e, quando necessário, um espaço seguro para denunciarem a violência. É nesse sentido, que os movimentos sociais e organizações não governamentais também desempenham um papel fundamental ao dar visibilidade a esses casos e pressionar por mudanças.

A mídia tem um papel central tanto na perpetuação, como na erradicação da violência política de gênero, devendo a cobertura midiática expor os casos com seriedade e não reproduzir estereótipos de gênero ou que culpabilize às vítimas.

Por fim, é crucial que existam leis que reconheçam e punam a violência política de gênero, como a criação de marcos legais que protejam as mulheres que participam da política e garantam que as agressões sejam adequadamente investigadas e punidas, obrigando as instituições a criarem comitês de ética, ouvidorias e um compliance interno de prevenção e combate.

O enfrentamento à violência política de gênero e raça exige um esforço coletivo e constante. Trata-se de transformar estruturas e mentalidades para que todas as mulheres possam participar da vida política de forma plena, segura e livre, entendendo que a pluralidade no poder cria um ambiente menos permissivo para práticas discriminatórias e violências, o contrário disso apenas mantém um status quo de exclusão e subjugação, além de uma existência a partir do homem, cuja ideia não é possível mais conviver!

Por fim, não há que se falar em democracia e poder, sem a garantia de representatividade de gênero e raça nos espaços de poder e decisão!!

Nada sobre nós, sem nós!

1 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

2 Eleições, gênero e raça: o que o pleito de 2022 nos ensina1 Carlos Machado, Pedro Paulo de Assis, Danusa Marques e Viviane Gonçalves Freitas* - ONMP – Observatório Nacional da Mulher na Política.

3 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

4 https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/04/09/representatividade-feminina-parlamentos-nacionais-levantamento.htm

5 Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça, uma análise da Lei 14.192/2021 – Instituto Marielle Franco – RJ – 2023 - https://www.violenciapolitica.org/2023

Antes de mais nada não há democracia sem a participação de mulheres na política, em qualquer instituição!

No panorama atual existe uma violência de gênero que insiste em excluir as mulheres do espaço político, seja na esfera pública ou privada, no sentido de impedir, restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade (artigo 326-B do Código Eleitoral - incluído pela Lei nº13.834, de 2019). Esta violência é considerada uma das causas de sub-representação das mulheres no sistema político e eleitoral, nos espaços de poder e decisão e prejudica a plena democracia no país.

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)[1], apesar das mulheres constituírem 51,1% da população e 52,62% do eleitorado, a filiação aos partidos políticos são predominantemente do gênero masculino, já que dos filiados, 8.493.990 são homens, representando 53,8% do total, enquanto 7.284.431 são mulheres (46,2%).

Apesar da diferença de filiados por gênero não ser tão expressiva, a representatividade das mulheres na política é bem desigual, já que nas últimas eleições de 2022, das 9.891 mulheres que se candidataram, somente 311 foram eleitas, ou seja, apenas 18,2% do total de pessoas eleitas, deste 32% eram mulheres negras, sendo apenas 4 candidaturas de mulheres indígenas.

Embora exista a obrigação (PEC 18/21) para que os partidos políticos destinem no mínimo 30% do fundo eleitoral e da parcela do fundo partidário às campanhas eleitorais de mulheres, e o mesmo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, com um modelo semelhante para candidaturas de pessoas negras, na prática ainda é possível verificar que os partidos priorizam investir em candidaturas de homens brancos, fruto de uma ideia de que confiança e assertividade estão associadas à figura masculina.

Lembrando da experiência das “candidaturas laranjas”, à medida em que existem algumas candidaturas de mulheres fomentadas internamente apenas para preenchimento desta reserva mínima e usadas para desviar dinheiro do fundo eleitoral.

Como mencionado pelo ONMP[2], “mapear as candidaturas de mulheres e pessoas negras é importante, embora seja insuficiente para absorver as assimetrias de gênero e raça4/5 na representação política. Após a institucionalização de diversos mecanismos e a adoção de maneiras distintas de driblar os incentivos eleitorais, é óbvio que não basta aumentar o volume de candidaturas de pessoas negras e mulheres, mantendo-se o cenário de um patamar de competitividade baixo. Para ser bem-sucedida, uma candidatura precisa de investimento partidário, redes de apoio, recursos financeiros e visibilidade – o que, em sua maioria, é o modus operandi facilitado a homens brancos”.

Desde 2019 a Comissão Gestora de Política de Gênero do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) administra um canal informativo do TSE Mulheres[3] que monitora a atuação das mulheres na política, o qual indicou que, entre 2016 e 2022, o Brasil teve, em média, 52% do eleitorado constituído por mulheres, 33% de candidaturas femininas e apenas 15% de eleitas.

Outra fonte de dados, o segmento “Mulheres nos parlamentos” compila dados obtidos pela União Interparlamentar com base em informações fornecidas pelos parlamentos nacionais de quase 190 países, e demonstrou que, em 2022, o Brasil ocupou a posição 129ª, com apenas 17,7% de assentos ocupados por mulheres na Câmara dos Deputados. Dos países do G20[4], o Brasil ainda ficou atrás da Arábia Saudita e da Rússia no ranking de representatividade feminina nos parlamentos nacionais.

Por tudo isso, a situação da violência contra as mulheres na política é marcada pelo menosprezo e pela discriminação ao longo de anos, este tipo de violência perpassa a vida das mulheres ao concorrem ou quando já eleitas.

Na condição de candidatas, as mulheres sofrem violência política de gênero, principalmente, por meio de ameaças, interrupções frequentes em sua fala para criar um ambiente de descrédito e impedir que se manifestem, questionamentos sobre suas capacidades, práticas intimidatórias ou que visem desqualificá-las, violação da sua intimidade e privacidade por meio de divulgação de fotos íntimas ou dados pessoais, até mesmo montagens, assédio sexual e objetificação de seus corpos, difamação atribuindo-lhe um ato ofensivo à reputação e honra, além do desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas.

Quando eleitas, as mulheres sofrem ainda outras violências, ao não serem indicadas para cargos de liderança em comissões ou grupos de trabalho, serem constantemente interrompidas em suas falas, ao serem excluídas de debates, desconsideração de suas opiniões e ideias em reuniões de trabalho, questionamentos sobre sua aparência física e forma de se vestir, além de serem questionadas sobre suas vidas privadas (relacionamentos, sexualidade ou maternidade).

Importante destacar, que os efeitos da violência política de gênero recaem de modo mais intenso sobre os corpos que destoam daqueles que tradicionalmente ocuparam e ocupam os espaços de poder.

Isso significa dizer que, quaisquer corpos que sejam diversos do padrão homem / branco / cis hétero/ rico, (corpos de mulheres negras, indígenas, travestis) estarão, efetivamente, sujeitos à violência política racial e de gênero.

De modo que, não é possível abordar a violência política de gênero sem desconsiderar seus impactos, a partir de sua dimensão racial.

Segundo dados da Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça no Brasil - 2 anos da Lei 14.192/2021, observa-se o contexto de maior acirramento de violências, quando da aprovação do referido instrumento legal que, exclui a expressão gênero de seu texto e tenta manter a palavra sexo, numa evidente exclusão de seu alcance protetivo, de mulheres travestis e transexuais.

Ao trazermos para a análise da referida lei, a dimensão racial combinada a de gênero, e seu caráter interseccional, observamos que o cenário político, numa exata reprodução do que ocorre na sociedade, é naturalmente mais violento com mulheres, sobretudo, mulheres negras, vez que destoam do padrão dominante, quando ocupantes desse espaço de poder.

Corpos negros, travestis, com deficiência, não correspondentes ao padrão branco/ masculino/cis hétero, não seriam considerados aptos, e tampouco aceitos a ocupar o espaço da política.

A partir dessa leitura, todos os episódios de violência política de gênero e raça, trazem como raiz, o fato de corpos historicamente impossíveis, improváveis e impensáveis, ocuparem aquele espaço de poder!

A violência simbólica na qual persiste um machismo discursivo também é muito comum nos espaços políticos, provocando um ambiente de verdadeira hostilidade, silenciamento, deslegitimação e exclusão das mulheres destes espaços.

Além das consequências de exclusão, para estas mulheres existem outras implicações na saúde mental e psicológica como a ocorrência do transtorno de ansiedade, depressão, síndrome de burnout, isolamento social e emocional, transtorno de estresse pós-traumático, e no âmbito social a própria manutenção da cultura de silenciamento e retrocesso nos direitos das mulheres.

Por isso, é de suma importância que as Instituições entendam seu papel no combate à violência política de gênero promovam ativamente uma democracia de raça / gênero em suas estruturas internas e externas, principalmente devido ao aumento da violência nestes espaços, praticada de forma sistemática e reiterada, colocando-as em rota de colisão por meio de debates que ambicionam o retrocesso e a sonegação de direitos, mesmo aqueles já consagrados em nosso ordenamento jurídico, como foi o caso do ressurgimento da ideia do PL 1904/2024, que buscava a criminalização do aborto legal.

É papel das instituições públicas e privadas a criação de meios para assegurar uma democracia de gênero não só para permitir a participação de mulheres na política, mas para garantir que estas mulheres não sejam violentadas e passem a sofrer toda sorte de agressões, erguendo um sistema de educação, conscientização e responsabilização de seus agressores.

Por tudo isso, as mulheres que atuam na política precisam contar com redes de apoio entre si e com pessoas aliadas. As redes de apoio fornecem suporte emocional, estratégico e, quando necessário, um espaço seguro para denunciarem a violência. É nesse sentido, que os movimentos sociais e organizações não governamentais também desempenham um papel fundamental ao dar visibilidade a esses casos e pressionar por mudanças.

A mídia tem um papel central tanto na perpetuação, como na erradicação da violência política de gênero, devendo a cobertura midiática expor os casos com seriedade e não reproduzir estereótipos de gênero ou que culpabilize às vítimas.

Por fim, é crucial que existam leis que reconheçam e punam a violência política de gênero, como a criação de marcos legais que protejam as mulheres que participam da política e garantam que as agressões sejam adequadamente investigadas e punidas, obrigando as instituições a criarem comitês de ética, ouvidorias e um compliance interno de prevenção e combate.

O enfrentamento à violência política de gênero e raça exige um esforço coletivo e constante. Trata-se de transformar estruturas e mentalidades para que todas as mulheres possam participar da vida política de forma plena, segura e livre, entendendo que a pluralidade no poder cria um ambiente menos permissivo para práticas discriminatórias e violências, o contrário disso apenas mantém um status quo de exclusão e subjugação, além de uma existência a partir do homem, cuja ideia não é possível mais conviver!

Por fim, não há que se falar em democracia e poder, sem a garantia de representatividade de gênero e raça nos espaços de poder e decisão!!

Nada sobre nós, sem nós!

1 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

2 Eleições, gênero e raça: o que o pleito de 2022 nos ensina1 Carlos Machado, Pedro Paulo de Assis, Danusa Marques e Viviane Gonçalves Freitas* - ONMP – Observatório Nacional da Mulher na Política.

3 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

4 https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/04/09/representatividade-feminina-parlamentos-nacionais-levantamento.htm

5 Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça, uma análise da Lei 14.192/2021 – Instituto Marielle Franco – RJ – 2023 - https://www.violenciapolitica.org/2023

Antes de mais nada não há democracia sem a participação de mulheres na política, em qualquer instituição!

No panorama atual existe uma violência de gênero que insiste em excluir as mulheres do espaço político, seja na esfera pública ou privada, no sentido de impedir, restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade (artigo 326-B do Código Eleitoral - incluído pela Lei nº13.834, de 2019). Esta violência é considerada uma das causas de sub-representação das mulheres no sistema político e eleitoral, nos espaços de poder e decisão e prejudica a plena democracia no país.

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)[1], apesar das mulheres constituírem 51,1% da população e 52,62% do eleitorado, a filiação aos partidos políticos são predominantemente do gênero masculino, já que dos filiados, 8.493.990 são homens, representando 53,8% do total, enquanto 7.284.431 são mulheres (46,2%).

Apesar da diferença de filiados por gênero não ser tão expressiva, a representatividade das mulheres na política é bem desigual, já que nas últimas eleições de 2022, das 9.891 mulheres que se candidataram, somente 311 foram eleitas, ou seja, apenas 18,2% do total de pessoas eleitas, deste 32% eram mulheres negras, sendo apenas 4 candidaturas de mulheres indígenas.

Embora exista a obrigação (PEC 18/21) para que os partidos políticos destinem no mínimo 30% do fundo eleitoral e da parcela do fundo partidário às campanhas eleitorais de mulheres, e o mesmo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, com um modelo semelhante para candidaturas de pessoas negras, na prática ainda é possível verificar que os partidos priorizam investir em candidaturas de homens brancos, fruto de uma ideia de que confiança e assertividade estão associadas à figura masculina.

Lembrando da experiência das “candidaturas laranjas”, à medida em que existem algumas candidaturas de mulheres fomentadas internamente apenas para preenchimento desta reserva mínima e usadas para desviar dinheiro do fundo eleitoral.

Como mencionado pelo ONMP[2], “mapear as candidaturas de mulheres e pessoas negras é importante, embora seja insuficiente para absorver as assimetrias de gênero e raça4/5 na representação política. Após a institucionalização de diversos mecanismos e a adoção de maneiras distintas de driblar os incentivos eleitorais, é óbvio que não basta aumentar o volume de candidaturas de pessoas negras e mulheres, mantendo-se o cenário de um patamar de competitividade baixo. Para ser bem-sucedida, uma candidatura precisa de investimento partidário, redes de apoio, recursos financeiros e visibilidade – o que, em sua maioria, é o modus operandi facilitado a homens brancos”.

Desde 2019 a Comissão Gestora de Política de Gênero do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) administra um canal informativo do TSE Mulheres[3] que monitora a atuação das mulheres na política, o qual indicou que, entre 2016 e 2022, o Brasil teve, em média, 52% do eleitorado constituído por mulheres, 33% de candidaturas femininas e apenas 15% de eleitas.

Outra fonte de dados, o segmento “Mulheres nos parlamentos” compila dados obtidos pela União Interparlamentar com base em informações fornecidas pelos parlamentos nacionais de quase 190 países, e demonstrou que, em 2022, o Brasil ocupou a posição 129ª, com apenas 17,7% de assentos ocupados por mulheres na Câmara dos Deputados. Dos países do G20[4], o Brasil ainda ficou atrás da Arábia Saudita e da Rússia no ranking de representatividade feminina nos parlamentos nacionais.

Por tudo isso, a situação da violência contra as mulheres na política é marcada pelo menosprezo e pela discriminação ao longo de anos, este tipo de violência perpassa a vida das mulheres ao concorrem ou quando já eleitas.

Na condição de candidatas, as mulheres sofrem violência política de gênero, principalmente, por meio de ameaças, interrupções frequentes em sua fala para criar um ambiente de descrédito e impedir que se manifestem, questionamentos sobre suas capacidades, práticas intimidatórias ou que visem desqualificá-las, violação da sua intimidade e privacidade por meio de divulgação de fotos íntimas ou dados pessoais, até mesmo montagens, assédio sexual e objetificação de seus corpos, difamação atribuindo-lhe um ato ofensivo à reputação e honra, além do desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas.

Quando eleitas, as mulheres sofrem ainda outras violências, ao não serem indicadas para cargos de liderança em comissões ou grupos de trabalho, serem constantemente interrompidas em suas falas, ao serem excluídas de debates, desconsideração de suas opiniões e ideias em reuniões de trabalho, questionamentos sobre sua aparência física e forma de se vestir, além de serem questionadas sobre suas vidas privadas (relacionamentos, sexualidade ou maternidade).

Importante destacar, que os efeitos da violência política de gênero recaem de modo mais intenso sobre os corpos que destoam daqueles que tradicionalmente ocuparam e ocupam os espaços de poder.

Isso significa dizer que, quaisquer corpos que sejam diversos do padrão homem / branco / cis hétero/ rico, (corpos de mulheres negras, indígenas, travestis) estarão, efetivamente, sujeitos à violência política racial e de gênero.

De modo que, não é possível abordar a violência política de gênero sem desconsiderar seus impactos, a partir de sua dimensão racial.

Segundo dados da Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça no Brasil - 2 anos da Lei 14.192/2021, observa-se o contexto de maior acirramento de violências, quando da aprovação do referido instrumento legal que, exclui a expressão gênero de seu texto e tenta manter a palavra sexo, numa evidente exclusão de seu alcance protetivo, de mulheres travestis e transexuais.

Ao trazermos para a análise da referida lei, a dimensão racial combinada a de gênero, e seu caráter interseccional, observamos que o cenário político, numa exata reprodução do que ocorre na sociedade, é naturalmente mais violento com mulheres, sobretudo, mulheres negras, vez que destoam do padrão dominante, quando ocupantes desse espaço de poder.

Corpos negros, travestis, com deficiência, não correspondentes ao padrão branco/ masculino/cis hétero, não seriam considerados aptos, e tampouco aceitos a ocupar o espaço da política.

A partir dessa leitura, todos os episódios de violência política de gênero e raça, trazem como raiz, o fato de corpos historicamente impossíveis, improváveis e impensáveis, ocuparem aquele espaço de poder!

A violência simbólica na qual persiste um machismo discursivo também é muito comum nos espaços políticos, provocando um ambiente de verdadeira hostilidade, silenciamento, deslegitimação e exclusão das mulheres destes espaços.

Além das consequências de exclusão, para estas mulheres existem outras implicações na saúde mental e psicológica como a ocorrência do transtorno de ansiedade, depressão, síndrome de burnout, isolamento social e emocional, transtorno de estresse pós-traumático, e no âmbito social a própria manutenção da cultura de silenciamento e retrocesso nos direitos das mulheres.

Por isso, é de suma importância que as Instituições entendam seu papel no combate à violência política de gênero promovam ativamente uma democracia de raça / gênero em suas estruturas internas e externas, principalmente devido ao aumento da violência nestes espaços, praticada de forma sistemática e reiterada, colocando-as em rota de colisão por meio de debates que ambicionam o retrocesso e a sonegação de direitos, mesmo aqueles já consagrados em nosso ordenamento jurídico, como foi o caso do ressurgimento da ideia do PL 1904/2024, que buscava a criminalização do aborto legal.

É papel das instituições públicas e privadas a criação de meios para assegurar uma democracia de gênero não só para permitir a participação de mulheres na política, mas para garantir que estas mulheres não sejam violentadas e passem a sofrer toda sorte de agressões, erguendo um sistema de educação, conscientização e responsabilização de seus agressores.

Por tudo isso, as mulheres que atuam na política precisam contar com redes de apoio entre si e com pessoas aliadas. As redes de apoio fornecem suporte emocional, estratégico e, quando necessário, um espaço seguro para denunciarem a violência. É nesse sentido, que os movimentos sociais e organizações não governamentais também desempenham um papel fundamental ao dar visibilidade a esses casos e pressionar por mudanças.

A mídia tem um papel central tanto na perpetuação, como na erradicação da violência política de gênero, devendo a cobertura midiática expor os casos com seriedade e não reproduzir estereótipos de gênero ou que culpabilize às vítimas.

Por fim, é crucial que existam leis que reconheçam e punam a violência política de gênero, como a criação de marcos legais que protejam as mulheres que participam da política e garantam que as agressões sejam adequadamente investigadas e punidas, obrigando as instituições a criarem comitês de ética, ouvidorias e um compliance interno de prevenção e combate.

O enfrentamento à violência política de gênero e raça exige um esforço coletivo e constante. Trata-se de transformar estruturas e mentalidades para que todas as mulheres possam participar da vida política de forma plena, segura e livre, entendendo que a pluralidade no poder cria um ambiente menos permissivo para práticas discriminatórias e violências, o contrário disso apenas mantém um status quo de exclusão e subjugação, além de uma existência a partir do homem, cuja ideia não é possível mais conviver!

Por fim, não há que se falar em democracia e poder, sem a garantia de representatividade de gênero e raça nos espaços de poder e decisão!!

Nada sobre nós, sem nós!

1 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

2 Eleições, gênero e raça: o que o pleito de 2022 nos ensina1 Carlos Machado, Pedro Paulo de Assis, Danusa Marques e Viviane Gonçalves Freitas* - ONMP – Observatório Nacional da Mulher na Política.

3 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

4 https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/04/09/representatividade-feminina-parlamentos-nacionais-levantamento.htm

5 Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça, uma análise da Lei 14.192/2021 – Instituto Marielle Franco – RJ – 2023 - https://www.violenciapolitica.org/2023

Antes de mais nada não há democracia sem a participação de mulheres na política, em qualquer instituição!

No panorama atual existe uma violência de gênero que insiste em excluir as mulheres do espaço político, seja na esfera pública ou privada, no sentido de impedir, restringir seu acesso ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade (artigo 326-B do Código Eleitoral - incluído pela Lei nº13.834, de 2019). Esta violência é considerada uma das causas de sub-representação das mulheres no sistema político e eleitoral, nos espaços de poder e decisão e prejudica a plena democracia no país.

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE)[1], apesar das mulheres constituírem 51,1% da população e 52,62% do eleitorado, a filiação aos partidos políticos são predominantemente do gênero masculino, já que dos filiados, 8.493.990 são homens, representando 53,8% do total, enquanto 7.284.431 são mulheres (46,2%).

Apesar da diferença de filiados por gênero não ser tão expressiva, a representatividade das mulheres na política é bem desigual, já que nas últimas eleições de 2022, das 9.891 mulheres que se candidataram, somente 311 foram eleitas, ou seja, apenas 18,2% do total de pessoas eleitas, deste 32% eram mulheres negras, sendo apenas 4 candidaturas de mulheres indígenas.

Embora exista a obrigação (PEC 18/21) para que os partidos políticos destinem no mínimo 30% do fundo eleitoral e da parcela do fundo partidário às campanhas eleitorais de mulheres, e o mesmo percentual de tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão, com um modelo semelhante para candidaturas de pessoas negras, na prática ainda é possível verificar que os partidos priorizam investir em candidaturas de homens brancos, fruto de uma ideia de que confiança e assertividade estão associadas à figura masculina.

Lembrando da experiência das “candidaturas laranjas”, à medida em que existem algumas candidaturas de mulheres fomentadas internamente apenas para preenchimento desta reserva mínima e usadas para desviar dinheiro do fundo eleitoral.

Como mencionado pelo ONMP[2], “mapear as candidaturas de mulheres e pessoas negras é importante, embora seja insuficiente para absorver as assimetrias de gênero e raça4/5 na representação política. Após a institucionalização de diversos mecanismos e a adoção de maneiras distintas de driblar os incentivos eleitorais, é óbvio que não basta aumentar o volume de candidaturas de pessoas negras e mulheres, mantendo-se o cenário de um patamar de competitividade baixo. Para ser bem-sucedida, uma candidatura precisa de investimento partidário, redes de apoio, recursos financeiros e visibilidade – o que, em sua maioria, é o modus operandi facilitado a homens brancos”.

Desde 2019 a Comissão Gestora de Política de Gênero do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) administra um canal informativo do TSE Mulheres[3] que monitora a atuação das mulheres na política, o qual indicou que, entre 2016 e 2022, o Brasil teve, em média, 52% do eleitorado constituído por mulheres, 33% de candidaturas femininas e apenas 15% de eleitas.

Outra fonte de dados, o segmento “Mulheres nos parlamentos” compila dados obtidos pela União Interparlamentar com base em informações fornecidas pelos parlamentos nacionais de quase 190 países, e demonstrou que, em 2022, o Brasil ocupou a posição 129ª, com apenas 17,7% de assentos ocupados por mulheres na Câmara dos Deputados. Dos países do G20[4], o Brasil ainda ficou atrás da Arábia Saudita e da Rússia no ranking de representatividade feminina nos parlamentos nacionais.

Por tudo isso, a situação da violência contra as mulheres na política é marcada pelo menosprezo e pela discriminação ao longo de anos, este tipo de violência perpassa a vida das mulheres ao concorrem ou quando já eleitas.

Na condição de candidatas, as mulheres sofrem violência política de gênero, principalmente, por meio de ameaças, interrupções frequentes em sua fala para criar um ambiente de descrédito e impedir que se manifestem, questionamentos sobre suas capacidades, práticas intimidatórias ou que visem desqualificá-las, violação da sua intimidade e privacidade por meio de divulgação de fotos íntimas ou dados pessoais, até mesmo montagens, assédio sexual e objetificação de seus corpos, difamação atribuindo-lhe um ato ofensivo à reputação e honra, além do desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas.

Quando eleitas, as mulheres sofrem ainda outras violências, ao não serem indicadas para cargos de liderança em comissões ou grupos de trabalho, serem constantemente interrompidas em suas falas, ao serem excluídas de debates, desconsideração de suas opiniões e ideias em reuniões de trabalho, questionamentos sobre sua aparência física e forma de se vestir, além de serem questionadas sobre suas vidas privadas (relacionamentos, sexualidade ou maternidade).

Importante destacar, que os efeitos da violência política de gênero recaem de modo mais intenso sobre os corpos que destoam daqueles que tradicionalmente ocuparam e ocupam os espaços de poder.

Isso significa dizer que, quaisquer corpos que sejam diversos do padrão homem / branco / cis hétero/ rico, (corpos de mulheres negras, indígenas, travestis) estarão, efetivamente, sujeitos à violência política racial e de gênero.

De modo que, não é possível abordar a violência política de gênero sem desconsiderar seus impactos, a partir de sua dimensão racial.

Segundo dados da Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça no Brasil - 2 anos da Lei 14.192/2021, observa-se o contexto de maior acirramento de violências, quando da aprovação do referido instrumento legal que, exclui a expressão gênero de seu texto e tenta manter a palavra sexo, numa evidente exclusão de seu alcance protetivo, de mulheres travestis e transexuais.

Ao trazermos para a análise da referida lei, a dimensão racial combinada a de gênero, e seu caráter interseccional, observamos que o cenário político, numa exata reprodução do que ocorre na sociedade, é naturalmente mais violento com mulheres, sobretudo, mulheres negras, vez que destoam do padrão dominante, quando ocupantes desse espaço de poder.

Corpos negros, travestis, com deficiência, não correspondentes ao padrão branco/ masculino/cis hétero, não seriam considerados aptos, e tampouco aceitos a ocupar o espaço da política.

A partir dessa leitura, todos os episódios de violência política de gênero e raça, trazem como raiz, o fato de corpos historicamente impossíveis, improváveis e impensáveis, ocuparem aquele espaço de poder!

A violência simbólica na qual persiste um machismo discursivo também é muito comum nos espaços políticos, provocando um ambiente de verdadeira hostilidade, silenciamento, deslegitimação e exclusão das mulheres destes espaços.

Além das consequências de exclusão, para estas mulheres existem outras implicações na saúde mental e psicológica como a ocorrência do transtorno de ansiedade, depressão, síndrome de burnout, isolamento social e emocional, transtorno de estresse pós-traumático, e no âmbito social a própria manutenção da cultura de silenciamento e retrocesso nos direitos das mulheres.

Por isso, é de suma importância que as Instituições entendam seu papel no combate à violência política de gênero promovam ativamente uma democracia de raça / gênero em suas estruturas internas e externas, principalmente devido ao aumento da violência nestes espaços, praticada de forma sistemática e reiterada, colocando-as em rota de colisão por meio de debates que ambicionam o retrocesso e a sonegação de direitos, mesmo aqueles já consagrados em nosso ordenamento jurídico, como foi o caso do ressurgimento da ideia do PL 1904/2024, que buscava a criminalização do aborto legal.

É papel das instituições públicas e privadas a criação de meios para assegurar uma democracia de gênero não só para permitir a participação de mulheres na política, mas para garantir que estas mulheres não sejam violentadas e passem a sofrer toda sorte de agressões, erguendo um sistema de educação, conscientização e responsabilização de seus agressores.

Por tudo isso, as mulheres que atuam na política precisam contar com redes de apoio entre si e com pessoas aliadas. As redes de apoio fornecem suporte emocional, estratégico e, quando necessário, um espaço seguro para denunciarem a violência. É nesse sentido, que os movimentos sociais e organizações não governamentais também desempenham um papel fundamental ao dar visibilidade a esses casos e pressionar por mudanças.

A mídia tem um papel central tanto na perpetuação, como na erradicação da violência política de gênero, devendo a cobertura midiática expor os casos com seriedade e não reproduzir estereótipos de gênero ou que culpabilize às vítimas.

Por fim, é crucial que existam leis que reconheçam e punam a violência política de gênero, como a criação de marcos legais que protejam as mulheres que participam da política e garantam que as agressões sejam adequadamente investigadas e punidas, obrigando as instituições a criarem comitês de ética, ouvidorias e um compliance interno de prevenção e combate.

O enfrentamento à violência política de gênero e raça exige um esforço coletivo e constante. Trata-se de transformar estruturas e mentalidades para que todas as mulheres possam participar da vida política de forma plena, segura e livre, entendendo que a pluralidade no poder cria um ambiente menos permissivo para práticas discriminatórias e violências, o contrário disso apenas mantém um status quo de exclusão e subjugação, além de uma existência a partir do homem, cuja ideia não é possível mais conviver!

Por fim, não há que se falar em democracia e poder, sem a garantia de representatividade de gênero e raça nos espaços de poder e decisão!!

Nada sobre nós, sem nós!

1 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

2 Eleições, gênero e raça: o que o pleito de 2022 nos ensina1 Carlos Machado, Pedro Paulo de Assis, Danusa Marques e Viviane Gonçalves Freitas* - ONMP – Observatório Nacional da Mulher na Política.

3 https://www.justicaeleitoral.jus.br/tse-mulheres/

4 https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/04/09/representatividade-feminina-parlamentos-nacionais-levantamento.htm

5 Pesquisa sobre Violência Política de Gênero e Raça, uma análise da Lei 14.192/2021 – Instituto Marielle Franco – RJ – 2023 - https://www.violenciapolitica.org/2023

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Opinião por Fernanda Perregil
Claudia Patrícia Luna

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