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A desmilitarização da polícia e outros mantras


Por Tatiana A. de Andrade Dornelles
Tatiana A. de Andrade Dornelles. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Não sendo militar e não trabalhando em alguma área afim, por que interessaria a leitura de um livro chamado Hierarquia e Disciplina São Garantias Constitucionais: Fundamentos para a Diferenciação do Direito Militar? Aparentemente, não haveria interesse em uma obra desta temática. Bom, o ditado popular se aplica aqui: as aparências enganam.

É o que demonstra o promotor do Ministério Público Militar Adriano Alves-Marreiros em seu novo livro, lançado em meio à pandemia, pela Editora Educação Direito e Alta Cultura. A obra é uma bonita edição de um pouco mais de 200 páginas, de fácil leitura, muito informativa e que nos deixa com uma grande reflexão: quantos mantras nós repetimos sem fazer a devida reflexão sobre a ideia?

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A tese central do livro está estampada no título. O autor traz fatos e argumentos para comprovar sua afirmação de que a hierarquia e a disciplina são garantias constitucionais. Quem não leu o livro se pergunta: garantia constitucional para quem? Para os indivíduos e para a sociedade, é o que o autor responde, cumprindo magistralmente o que promete ao leitor na introdução.

É verdade que nosso passado, nem mais tão recente, costuma provocar receios diante da palavra autoridade. Esta reação é pavlovicamente estimulada em nossos currículos escolares e costuma afetar especialmente aos mais jovens, embora tenham vivenciado apenas governos considerados democráticos. Autoridade é quase imediatamente associada a autoritarismo; hierarquia, a tirania; disciplina, a adestramento canino. Não que a ideia de autoridade, hierarquia e disciplina estejam livres de serem deturpadas e tornarem-se algum abuso de poder. Mas o abuso não lhes é inerente.

A hierarquia e a disciplina são os fundamentos para variadas restrições impostas ao corpo militar, tanto das polícias militares estaduais quanto das forças militares federais. Estas restrições não são arbitrárias. São instrumentos indispensáveis à democracia. O grupo a quem são dirigidas não é um grupo de funcionários públicos qualquer: é o braço armado da nação. E a necessidade do controle do braço armado do Estado, com restrições e deveres fundamentados especialmente da hierarquia e disciplina, como mostra o autor logo no primeiro capítulo, está prevista em legislações nacionais e nos principais tratados internacionais de direitos humanos e políticos.

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A hierarquia e a disciplina do braço armado do Estado afetam a todos. Mas esta realidade só costuma ser percebida pela sociedade quando existe a quebra destes dois valores. O capítulo dois comprova que o livro do Promotor Adriano interessa ao público em geral. É neste capítulo que são relatadas as diversas greves ou manifestações das polícias militares estaduais desde o ano de 1997, além da única greve militar federal: a dos controladores de voo da força aérea brasileira. O autor apresenta informações sobre estes eventos desconhecidas do público em geral e capazes de deixar assustado qualquer um que valorize a democracia.

O autor demonstra que os erros no manejo do primeiro movimento grevista de 1997, e a repetição dos mesmos erros nos demais movimentos, levaram à formação de um padrão incentivado de comportamento. Este padrão foi responsável pelas crises policiais das duas décadas seguintes. A última crise analisada foi o movimento que criou o caos no estado do Espírito Santo por vinte e dois dias, em 2017. Mas o padrão ainda persiste, e o último, tentou-se resolver de forma inovadora: com uma retroescavadeira.

Demonstra o autor que o erro maior, em síntese, foi não fazer valer as normas da hierarquia e disciplina - e, especialmente, não fazer valer a punição pela quebra destas normas. Aconteceu o contrário: anistia, benefícios e, especialmente, a promoção política das lideranças grevistas. O potencial político do movimento foi explorado ao máximo por partidos políticos de situação e de oposição. As lideranças grevistas foram aliciadas a se alistarem - e muitos foram eleitos. Candidatos a governador foram pedir a benção e apoio destes líderes. O Estado não mais comandava a polícia. A polícia, e na verdade sua base, comandava o Estado. É difícil não reconhecer a subversão da lógica democrática.

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O mesmo não ocorreu com a greve militar federal, o movimento dos controladores de voo conhecido como "Apagão Aéreo". Houve também tentativa de manipulação política, cujo resultado poderia ser o mesmo que incentiva as greves das polícias nos estados. Mas a condução foi diferente dos casos estaduais. Como órgão independente e especializado, o Ministério Público Militar da União garantiu a ordem democrática e o estado de direito. Atuou para impedir a impunidade das lideranças do motim e, assim, devolveu ao Estado seu braço armado. No âmbito federal não houve mais movimentos deste gênero, que provocam caos e insegurança.

Afirma o autor que muitas das demandas das forças militares são justas. Um dos exemplos é um aparente descaso de defensores dos direitos humanos com a vida e as dificuldades dos agentes policiais. Porém, afirma também o autor que existem outros meios de reivindicação - especialmente com o auxílio dos ministérios públicos.

A desmilitarização da polícia. A desmilitarização é o principal mantra derrubado nesta obra. Por que se diz mantra? Pois é repetido e repetido e repassado, mais como um ritual do que como uma conclusão chegada após uma reflexão. E esta reflexão é necessária.

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Primeiro: não existe uma sintonia entre os fins e os meios. Quem pede a desmilitarização das polícias usualmente justifica sua pretensão alegando a existência de violência policial. Quem pensa assim, no entanto, não consegue explicar como uma coisa levaria a outra: o trabalho em si da polícia ostensiva uniformizada e que combate o crime seria o mesmo. Na realidade, a ausência da hierarquia e disciplina militar resultaria em um corpo de homens armados mais difícil de comandar e em uma menor responsabilização do comando e, subsequentemente, do Estado diante eventuais abusos cometidos. O efeito, no final das contas, tenderia a ser exatamente o contrário do pretendido.

O enfrentamento dos eventuais abusos e violência policial passa sobretudo pela plena accountability da atividade policial e pela previsão de regras de comportamento policial claras, como defendi em artigo sobre abordagem policial[1].

Para finalizar, um debate praticamente inexistente. A desmilitarização e consequente possibilidade de plena sindicalização da força policial conferiria a centrais sindicais o exercício de certo controle político sobre homens armados em número superior às próprias Forças Armadas brasileiras. De forma mais clara: do que todo o contingente das Forças Armadas brasileiras. É um ponto que merece ao menos alguma ponderação. Para esta e outras e reflexões: Hierarquia e Disciplina São Garantias Constitucionais: Fundamentos para a Diferenciação do Direito Militar, do promotor da Justiça Militar Adriano Alves-Marreiro.

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*Tatiana A. de Andrade Dornelles, mestre em Criminologia, especialista em Segurança Pública, procuradora da República e autora da obra Transmulheres nos Presídios Femininos: o debate omitido sobre a mulher presa (em vias de publicação)

[1] DORNELLES, T. A. DE A. Abordagem Policial e Accountability : uma aproximação do Interacionismo Simbólico de G . H . Mead ao controle externo da atividade policial. Revista do Ministério Público Militar, v. Ano XLV, n. 32, 2020. (DORNELLES, 2020)

Tatiana A. de Andrade Dornelles. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Não sendo militar e não trabalhando em alguma área afim, por que interessaria a leitura de um livro chamado Hierarquia e Disciplina São Garantias Constitucionais: Fundamentos para a Diferenciação do Direito Militar? Aparentemente, não haveria interesse em uma obra desta temática. Bom, o ditado popular se aplica aqui: as aparências enganam.

É o que demonstra o promotor do Ministério Público Militar Adriano Alves-Marreiros em seu novo livro, lançado em meio à pandemia, pela Editora Educação Direito e Alta Cultura. A obra é uma bonita edição de um pouco mais de 200 páginas, de fácil leitura, muito informativa e que nos deixa com uma grande reflexão: quantos mantras nós repetimos sem fazer a devida reflexão sobre a ideia?

A tese central do livro está estampada no título. O autor traz fatos e argumentos para comprovar sua afirmação de que a hierarquia e a disciplina são garantias constitucionais. Quem não leu o livro se pergunta: garantia constitucional para quem? Para os indivíduos e para a sociedade, é o que o autor responde, cumprindo magistralmente o que promete ao leitor na introdução.

É verdade que nosso passado, nem mais tão recente, costuma provocar receios diante da palavra autoridade. Esta reação é pavlovicamente estimulada em nossos currículos escolares e costuma afetar especialmente aos mais jovens, embora tenham vivenciado apenas governos considerados democráticos. Autoridade é quase imediatamente associada a autoritarismo; hierarquia, a tirania; disciplina, a adestramento canino. Não que a ideia de autoridade, hierarquia e disciplina estejam livres de serem deturpadas e tornarem-se algum abuso de poder. Mas o abuso não lhes é inerente.

A hierarquia e a disciplina são os fundamentos para variadas restrições impostas ao corpo militar, tanto das polícias militares estaduais quanto das forças militares federais. Estas restrições não são arbitrárias. São instrumentos indispensáveis à democracia. O grupo a quem são dirigidas não é um grupo de funcionários públicos qualquer: é o braço armado da nação. E a necessidade do controle do braço armado do Estado, com restrições e deveres fundamentados especialmente da hierarquia e disciplina, como mostra o autor logo no primeiro capítulo, está prevista em legislações nacionais e nos principais tratados internacionais de direitos humanos e políticos.

A hierarquia e a disciplina do braço armado do Estado afetam a todos. Mas esta realidade só costuma ser percebida pela sociedade quando existe a quebra destes dois valores. O capítulo dois comprova que o livro do Promotor Adriano interessa ao público em geral. É neste capítulo que são relatadas as diversas greves ou manifestações das polícias militares estaduais desde o ano de 1997, além da única greve militar federal: a dos controladores de voo da força aérea brasileira. O autor apresenta informações sobre estes eventos desconhecidas do público em geral e capazes de deixar assustado qualquer um que valorize a democracia.

O autor demonstra que os erros no manejo do primeiro movimento grevista de 1997, e a repetição dos mesmos erros nos demais movimentos, levaram à formação de um padrão incentivado de comportamento. Este padrão foi responsável pelas crises policiais das duas décadas seguintes. A última crise analisada foi o movimento que criou o caos no estado do Espírito Santo por vinte e dois dias, em 2017. Mas o padrão ainda persiste, e o último, tentou-se resolver de forma inovadora: com uma retroescavadeira.

Demonstra o autor que o erro maior, em síntese, foi não fazer valer as normas da hierarquia e disciplina - e, especialmente, não fazer valer a punição pela quebra destas normas. Aconteceu o contrário: anistia, benefícios e, especialmente, a promoção política das lideranças grevistas. O potencial político do movimento foi explorado ao máximo por partidos políticos de situação e de oposição. As lideranças grevistas foram aliciadas a se alistarem - e muitos foram eleitos. Candidatos a governador foram pedir a benção e apoio destes líderes. O Estado não mais comandava a polícia. A polícia, e na verdade sua base, comandava o Estado. É difícil não reconhecer a subversão da lógica democrática.

O mesmo não ocorreu com a greve militar federal, o movimento dos controladores de voo conhecido como "Apagão Aéreo". Houve também tentativa de manipulação política, cujo resultado poderia ser o mesmo que incentiva as greves das polícias nos estados. Mas a condução foi diferente dos casos estaduais. Como órgão independente e especializado, o Ministério Público Militar da União garantiu a ordem democrática e o estado de direito. Atuou para impedir a impunidade das lideranças do motim e, assim, devolveu ao Estado seu braço armado. No âmbito federal não houve mais movimentos deste gênero, que provocam caos e insegurança.

Afirma o autor que muitas das demandas das forças militares são justas. Um dos exemplos é um aparente descaso de defensores dos direitos humanos com a vida e as dificuldades dos agentes policiais. Porém, afirma também o autor que existem outros meios de reivindicação - especialmente com o auxílio dos ministérios públicos.

A desmilitarização da polícia. A desmilitarização é o principal mantra derrubado nesta obra. Por que se diz mantra? Pois é repetido e repetido e repassado, mais como um ritual do que como uma conclusão chegada após uma reflexão. E esta reflexão é necessária.

Primeiro: não existe uma sintonia entre os fins e os meios. Quem pede a desmilitarização das polícias usualmente justifica sua pretensão alegando a existência de violência policial. Quem pensa assim, no entanto, não consegue explicar como uma coisa levaria a outra: o trabalho em si da polícia ostensiva uniformizada e que combate o crime seria o mesmo. Na realidade, a ausência da hierarquia e disciplina militar resultaria em um corpo de homens armados mais difícil de comandar e em uma menor responsabilização do comando e, subsequentemente, do Estado diante eventuais abusos cometidos. O efeito, no final das contas, tenderia a ser exatamente o contrário do pretendido.

O enfrentamento dos eventuais abusos e violência policial passa sobretudo pela plena accountability da atividade policial e pela previsão de regras de comportamento policial claras, como defendi em artigo sobre abordagem policial[1].

Para finalizar, um debate praticamente inexistente. A desmilitarização e consequente possibilidade de plena sindicalização da força policial conferiria a centrais sindicais o exercício de certo controle político sobre homens armados em número superior às próprias Forças Armadas brasileiras. De forma mais clara: do que todo o contingente das Forças Armadas brasileiras. É um ponto que merece ao menos alguma ponderação. Para esta e outras e reflexões: Hierarquia e Disciplina São Garantias Constitucionais: Fundamentos para a Diferenciação do Direito Militar, do promotor da Justiça Militar Adriano Alves-Marreiro.

*Tatiana A. de Andrade Dornelles, mestre em Criminologia, especialista em Segurança Pública, procuradora da República e autora da obra Transmulheres nos Presídios Femininos: o debate omitido sobre a mulher presa (em vias de publicação)

[1] DORNELLES, T. A. DE A. Abordagem Policial e Accountability : uma aproximação do Interacionismo Simbólico de G . H . Mead ao controle externo da atividade policial. Revista do Ministério Público Militar, v. Ano XLV, n. 32, 2020. (DORNELLES, 2020)

Tatiana A. de Andrade Dornelles. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Não sendo militar e não trabalhando em alguma área afim, por que interessaria a leitura de um livro chamado Hierarquia e Disciplina São Garantias Constitucionais: Fundamentos para a Diferenciação do Direito Militar? Aparentemente, não haveria interesse em uma obra desta temática. Bom, o ditado popular se aplica aqui: as aparências enganam.

É o que demonstra o promotor do Ministério Público Militar Adriano Alves-Marreiros em seu novo livro, lançado em meio à pandemia, pela Editora Educação Direito e Alta Cultura. A obra é uma bonita edição de um pouco mais de 200 páginas, de fácil leitura, muito informativa e que nos deixa com uma grande reflexão: quantos mantras nós repetimos sem fazer a devida reflexão sobre a ideia?

A tese central do livro está estampada no título. O autor traz fatos e argumentos para comprovar sua afirmação de que a hierarquia e a disciplina são garantias constitucionais. Quem não leu o livro se pergunta: garantia constitucional para quem? Para os indivíduos e para a sociedade, é o que o autor responde, cumprindo magistralmente o que promete ao leitor na introdução.

É verdade que nosso passado, nem mais tão recente, costuma provocar receios diante da palavra autoridade. Esta reação é pavlovicamente estimulada em nossos currículos escolares e costuma afetar especialmente aos mais jovens, embora tenham vivenciado apenas governos considerados democráticos. Autoridade é quase imediatamente associada a autoritarismo; hierarquia, a tirania; disciplina, a adestramento canino. Não que a ideia de autoridade, hierarquia e disciplina estejam livres de serem deturpadas e tornarem-se algum abuso de poder. Mas o abuso não lhes é inerente.

A hierarquia e a disciplina são os fundamentos para variadas restrições impostas ao corpo militar, tanto das polícias militares estaduais quanto das forças militares federais. Estas restrições não são arbitrárias. São instrumentos indispensáveis à democracia. O grupo a quem são dirigidas não é um grupo de funcionários públicos qualquer: é o braço armado da nação. E a necessidade do controle do braço armado do Estado, com restrições e deveres fundamentados especialmente da hierarquia e disciplina, como mostra o autor logo no primeiro capítulo, está prevista em legislações nacionais e nos principais tratados internacionais de direitos humanos e políticos.

A hierarquia e a disciplina do braço armado do Estado afetam a todos. Mas esta realidade só costuma ser percebida pela sociedade quando existe a quebra destes dois valores. O capítulo dois comprova que o livro do Promotor Adriano interessa ao público em geral. É neste capítulo que são relatadas as diversas greves ou manifestações das polícias militares estaduais desde o ano de 1997, além da única greve militar federal: a dos controladores de voo da força aérea brasileira. O autor apresenta informações sobre estes eventos desconhecidas do público em geral e capazes de deixar assustado qualquer um que valorize a democracia.

O autor demonstra que os erros no manejo do primeiro movimento grevista de 1997, e a repetição dos mesmos erros nos demais movimentos, levaram à formação de um padrão incentivado de comportamento. Este padrão foi responsável pelas crises policiais das duas décadas seguintes. A última crise analisada foi o movimento que criou o caos no estado do Espírito Santo por vinte e dois dias, em 2017. Mas o padrão ainda persiste, e o último, tentou-se resolver de forma inovadora: com uma retroescavadeira.

Demonstra o autor que o erro maior, em síntese, foi não fazer valer as normas da hierarquia e disciplina - e, especialmente, não fazer valer a punição pela quebra destas normas. Aconteceu o contrário: anistia, benefícios e, especialmente, a promoção política das lideranças grevistas. O potencial político do movimento foi explorado ao máximo por partidos políticos de situação e de oposição. As lideranças grevistas foram aliciadas a se alistarem - e muitos foram eleitos. Candidatos a governador foram pedir a benção e apoio destes líderes. O Estado não mais comandava a polícia. A polícia, e na verdade sua base, comandava o Estado. É difícil não reconhecer a subversão da lógica democrática.

O mesmo não ocorreu com a greve militar federal, o movimento dos controladores de voo conhecido como "Apagão Aéreo". Houve também tentativa de manipulação política, cujo resultado poderia ser o mesmo que incentiva as greves das polícias nos estados. Mas a condução foi diferente dos casos estaduais. Como órgão independente e especializado, o Ministério Público Militar da União garantiu a ordem democrática e o estado de direito. Atuou para impedir a impunidade das lideranças do motim e, assim, devolveu ao Estado seu braço armado. No âmbito federal não houve mais movimentos deste gênero, que provocam caos e insegurança.

Afirma o autor que muitas das demandas das forças militares são justas. Um dos exemplos é um aparente descaso de defensores dos direitos humanos com a vida e as dificuldades dos agentes policiais. Porém, afirma também o autor que existem outros meios de reivindicação - especialmente com o auxílio dos ministérios públicos.

A desmilitarização da polícia. A desmilitarização é o principal mantra derrubado nesta obra. Por que se diz mantra? Pois é repetido e repetido e repassado, mais como um ritual do que como uma conclusão chegada após uma reflexão. E esta reflexão é necessária.

Primeiro: não existe uma sintonia entre os fins e os meios. Quem pede a desmilitarização das polícias usualmente justifica sua pretensão alegando a existência de violência policial. Quem pensa assim, no entanto, não consegue explicar como uma coisa levaria a outra: o trabalho em si da polícia ostensiva uniformizada e que combate o crime seria o mesmo. Na realidade, a ausência da hierarquia e disciplina militar resultaria em um corpo de homens armados mais difícil de comandar e em uma menor responsabilização do comando e, subsequentemente, do Estado diante eventuais abusos cometidos. O efeito, no final das contas, tenderia a ser exatamente o contrário do pretendido.

O enfrentamento dos eventuais abusos e violência policial passa sobretudo pela plena accountability da atividade policial e pela previsão de regras de comportamento policial claras, como defendi em artigo sobre abordagem policial[1].

Para finalizar, um debate praticamente inexistente. A desmilitarização e consequente possibilidade de plena sindicalização da força policial conferiria a centrais sindicais o exercício de certo controle político sobre homens armados em número superior às próprias Forças Armadas brasileiras. De forma mais clara: do que todo o contingente das Forças Armadas brasileiras. É um ponto que merece ao menos alguma ponderação. Para esta e outras e reflexões: Hierarquia e Disciplina São Garantias Constitucionais: Fundamentos para a Diferenciação do Direito Militar, do promotor da Justiça Militar Adriano Alves-Marreiro.

*Tatiana A. de Andrade Dornelles, mestre em Criminologia, especialista em Segurança Pública, procuradora da República e autora da obra Transmulheres nos Presídios Femininos: o debate omitido sobre a mulher presa (em vias de publicação)

[1] DORNELLES, T. A. DE A. Abordagem Policial e Accountability : uma aproximação do Interacionismo Simbólico de G . H . Mead ao controle externo da atividade policial. Revista do Ministério Público Militar, v. Ano XLV, n. 32, 2020. (DORNELLES, 2020)

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