A tragédia em Brumadinho completou um ano e, nesse período, além do trabalho do MP que resultou na denúncia apresentada há poucos dias, outras medidas surgiram como resposta à legítima indignação da sociedade, com destaque especial para a legislação relacionada à segurança de barragens, que passou por forte recrudescimento.
Em nível federal, a Agência Nacional de Mineração (ANM) publicou medidas com o objetivo de assegurar a estabilidade de barragens de rejeito de mineração, proibiu a utilização do método de alteamento à montante (usado em Mariana e Brumadinho), definiu as estruturas que devem ser removidas da Zona de Autossalvamento (região do vale à jusante, onde não há tempo suficiente para uma intervenção das autoridades em caso de emergências), determinou a instalação de sirenes fora da mancha de inundação e estabeleceu a obrigatoriedade da Declaração de Estabilidade (documento elaborado por auditoria independente e apresentado periodicamente à fiscalização) também ser assinada pelo presidente da empresa. Esta última medida visa a combater a chamada "cegueira deliberada", condição em que a empresa intencionalmente coloca-se em situação de desconhecimento sobre os fatos de modo a se eximir de uma eventual responsabilização penal.
Com o mesmo propósito de delinear o rastro para a responsabilização dos representantes do topo da empresa, a Política Estadual de Segurança de Barragens de Minas Gerais (aplicável a todo tipo de barragem, não apenas de mineração) estabeleceu a obrigatoriedade de deliberação dos membros do Conselho de Administração quanto aos relatórios de auditorias técnicas de segurança e planos de ações emergenciais.
A Lei mineira também estabeleceu uma série de restrições à atividade de mineração. Provavelmente, uma das que mais impactará os cofres das mineradoras é a caução ambiental, cujo objetivo é assegurar recursos para a recuperação socioambiental em casos de acidentes e desativação de barragens.
Mais recentemente, em 30 de janeiro, a ANM publicou uma resolução orientando as hipóteses em que se aplica a aprovação tácita introduzida pela Lei de Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019) aos atos exarados pela agência. Em resumo, a aprovação tácita se aplica somente a pedidos burocráticos como cópias de mapas, certidões, alvarás para pesquisas, cessões e transferências de direitos. Não se admitiu a aprovação tácita para lavra e operação de barragens, por exemplo.
Além dessas medidas que já estão em vigor, há outros projetos de lei que também pretendem ser uma resposta jurídica aos trágicos eventos de 25 de janeiro de 2019. Foram aventadas, no Congresso, propostas para exclusão de isenção fiscal para a atividade mineral e até mesmo a criação de uma Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens. Contudo, a proposta mais emblemática é o PL 2787/2019, que tipifica o crime de ecocídio e impõe a quem der causa a desastres ecológicos pena de até 20 anos de reclusão.
O que se observa no conjunto das respostas jurídicas à tragédia em Brumadinho neste último ano é uma forte reação contra os responsáveis por desastres socioambientais. Em alguns casos, propostas arbitrárias podem cometer o erro de se tornarem uma "vingança" institucionalizada contra todo o setor minerário, situação que, por bom senso, deve ser evitada pelo ordenamento jurídico - vingança e justiça, afinal, são coisas diferentes. Em outros, mudanças que buscam o aprimoramento da segurança na atividade minerária e reforçam a responsabilização de técnicos e executivos pelos seus atos são sinal de amadurecimento da produção legislativa regulatória e ambiental e estão alinhadas às melhores diretrizes anticorrupção e de conformidade legal.
*Rafael Aleixo, advogado em empresa do setor minerário e especialista em direito ambiental e empresarial; Letícia Yumi Marques, co-head de Direito Ambiental em KLA Advogados