O julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 2943, 3309 e 3318 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) reabriu um debate crucial para o sistema jurídico e investigativo brasileiro: a autonomia e a independência da perícia criminal.
A importância desse debate transcende as salas de audiências e os laboratórios de criminalística, atingindo o cerne da justiça e das garantias individuais e do direito de ter uma prova justa e equânime.
O voto do ministro Edson Fachin, relator das ADIs, destaca uma proposta crucial: a necessidade de assegurar, por meio de medidas legislativas, a plena autonomia dos órgãos oficiais de perícias. Isso, invariavelmente, passa pela segregação funcional desses órgãos das polícias, garantindo que não haja ascendência ou ingerência externa sobre o trabalho dos peritos criminais em sua atividade técnica-científica.
A autonomia não é meramente um capricho burocrático; ela é uma demanda baseada em recomendações internacionais e em uma necessidade urgente identificada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos e pelo próprio Ministério de Direitos Humanos.
Recentemente, o Brasil foi condenado no caso da Favela Nova Brasília, que destacou a necessidade de reforma estrutural para assegurar a independência das investigações criminais, incluindo a criação de um corpo pericial externo à Polícia Civil.
Contradizendo a realidade, há quem argumente que a independência da perícia já é uma realidade. No entanto, a prática diária e as pressões enfrentadas pelos peritos criminais em campo contam uma história diferente.
Sem a expressa e robusta previsão legal e uma garantia constitucional, a verdadeira independência pericial permanece um ideal, e não uma realidade. A independência da perícia é uma questão de direito fundamental. Nossa Carta Magna, em seu artigo 5º, assegura o direito à ampla defesa, que é intrinsecamente ligado à qualidade e isenção das provas utilizadas nos processos.
A perícia independente não é apenas um suporte técnico à investigação, é uma garantia de que as decisões judiciais sejam baseada em evidências confiáveis e não contaminadas por influências externas ou viéses, por vezes punitivos.
Portanto, conforme o STF deliberou sobre as ADIs 2943, 3309 e 3318, faz-se essencial refletir sobre o papel da perícia dentro do sistema de justiça criminal. Assegurar sua “plena autonomia” - palavras do ministro Fachin em seu voto - não é apenas uma resposta a um mandato internacional ou uma premissa legal, mas um compromisso com a justiça, a equidade e a segurança jurídica, fundamental para a construção de um sistema de justiça criminal que respeite os direitos garantidos pela nossa Constituição.
Esta independência é essencial para que possamos assegurar uma persecução penal justa e efetiva, baseada na verdade e no rigor científico na atuação e produção da prova pericial.
A Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF) reafirma seu compromisso em trabalhar por uma perícia verdadeiramente independente e autônoma. Estamos prontos para dialogar e contribuir com o STF, com o Ministério da Justiça e com os legisladores para que a perícia criminal no Brasil seja fortalecida, livre de qualquer subordinação que possa comprometer a justiça e a verdade.