Na última semana, foi sancionada a Lei 14.905/24, que alterou significativamente o Código Civil, especialmente no que tange às formas de atualização monetária e juros em caso de inadimplência.
O tema já vinha sendo abordado pelo Poder Judiciário, tendo como maior expressão o julgamento do Recurso Especial 1.795.982/SP, em março/2024, pelo Superior Tribunal de Justiça, onde os ministros, numa votação apertada, decidiram pela aplicação da taxa Selic para correção das dívidas civis cobradas judicialmente, em detrimento da correção monetária por índices inflacionários, acrescida de juros de mora de 1% ao mês.
As principais disposições da Lei 14.905/24 entrarão em vigor em 60 dias, mas já está valendo a regra que determina que a metodologia de cálculo da taxa legal e sua aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e publicadas pelo Banco Central do Brasil.
Agora, pela nova regra legal, ficou definido que as partes podem escolher livremente o índice de atualização monetária e os juros nos contratos, respeitando os limites legais. No mais, no caso de ausência de previsão contratual específica ou lei especial que o regulamente, a atualização monetária poderá ser:
A - calculada com base na variação do IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), medido e divulgado pelo IBGE, ou, em sua ausência, pelo índice que o substituir, nos termos do artigo 389 do Código Civil; e
B - os juros legais serão calculados com base na taxa referencial Selic, subtraindo-se o índice de atualização monetária (IPCA ou outro índice acordado entre as partes ou fixado por lei). Se o resultado dessa subtração for negativo, a taxa legal será considerada como zero para o cálculo dos juros legais no período de referência (artigo 406 do Código Civil).
Até então, antes da entrada em vigor da lei, o artigo 406 do Código Civil se limitava a dizer que os juros seriam calculados pela taxa que estivesse em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.
A Lei 14.905/24, ainda estabeleceu, em seu artigo 4º, que o Banco Central deverá disponibilizar uma ferramenta pública para simular a aplicação da taxa de juros legal mencionada.
É importante destacar que a nova legislação definiu que os juros não poderão ultrapassar a taxa legal mencionada, além de esclarecer que o Decreto 22.626 (Lei de Usura) não se aplicará a certas obrigações fora do Sistema Financeiro Nacional.
Muito embora o espírito do legislador tenha se dado numa tentativa de uniformizar a posição dos tribunais pátrios sobre a questão da correção monetária de débitos advindos de inadimplemento de contratos comerciais, os críticos da medida se preocupam pelo fato de a nova regra acabar gerando a ocorrência de juros zero.
Ora, se a função dos juros moratórios é remunerar o credor pelo período em que ele se viu privado de utilizar determinado valor, dar contornos legais para que essa remuneração seja zerada poderia acabar substituindo um problema por outro, no Poder Judiciário. Isso porque, de acordo com a nova regra, toda vez que a variação da Selic for menor que a do IPCA, os juros moratórios serão iguais a zero. Além disso, o IPCA geralmente é divulgado na segunda semana do mês seguinte ao período de inflação. Isso cria um lapso significativo na apuração do saldo do débito judicial.
De outro lado, a preocupação dos juristas e militantes na área é sobre a aplicabilidade das novas disposições a contratos antigos e às hipóteses de responsabilidade (contratual e extracontratual) em litígios em andamento.
Esta e outras questões precisarão ser resolvidas rapidamente para garantir segurança jurídica a todos aqueles que estejam prestes a ajuizar ações judiciais, tendo por objeto inadimplemento de contratos comerciais ou, até mesmo, para os que já se encontram em meio a litígios em andamento.