O presidente Jair Bolsonaro indicou nesta quinta-feira, 5, o subprocurador Augusto Aras para o cargo de procurador-geral da República pelos próximos dois anos, ignorando a lista tríplice de nomes escolhidos em eleição pela classe. Crítico dos métodos da Lava Jato, classificados por ele como "personalistas", Aras lançou candidatura avulsa em abril para suceder a Raquel Dodge. Sua indicação enfrentou duras reações do Ministério Público, da base aliada e de seus apoiadores nas redes sociais, além de expor o desprestígio do ministro da Justiça, Sérgio Moro, que foi escanteado das discussões sobre o comando da Procuradoria-Geral da República e defendia a escolha a partir da lista tríplice.
Diante das críticas, Bolsonaro chegou a apelar para que os eleitores apagassem comentários negativos. "Peço a vocês, vá no Facebook, você fez um comentário pesado, retira. Dá uma chance para mim. Você acha que eu quero colocar alguém lá (na PGR) para atrapalhar a vida de vocês? Não é", disse o presidente, em transmissão ao vivo no Facebook nesta quinta. "Pessoal que votou em mim, tem pelo menos 20% falando que acabou a esperança dele, que vai votar no (Sérgio) Moro em 2022. Pessoal, atire a primeira pedra quem não cometeu um pecado. Eu tinha que escolher um nome", afirmou Bolsonaro.
O bombardeio mais pesado partiu de integrantes da chamada "rede jacobina", que costuma atacar sem piedade os críticos do presidente. Nos posts, eles definiram Aras como "esquerdopata", destacaram citações dele com elogios a Che Guevara, Leonardo Boff e associações da extrema-direita a uma política do medo. "O senhor está apanhando do seu eleitorado por ter perdido a oportunidade única de apontar alguém não alinhado ao establishment. Decepção", escreveu Leandro Ruschel, um dos influenciadores digitais pró-Bolsonaro, que tem 304 mil seguidores no Twitter.
É a primeira vez, em 16 anos, que um indicado para a Procuradoria-Geral não está na lista tríplice eleita pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). O nome de Aras ainda precisa passar por sabatina no Senado e ser aprovado pela Casa. O mandato de Raquel Dodge, que tentou ser reconduzida ao cargo e não conseguiu, se encerra no dia 17.
Aras pode assumir a Procuradoria em um momento de crise interna e fragilidade institucional. Nesta quarta, 4, Raquel sofreu a maior baixa de sua gestão, com a entrega coletiva de cargos de procuradores que atuam na Lava Jato.
Críticas. Em entrevista ao Estado em maio, Aras defendeu uma "disruptura" no Ministério Público e disse que o procurador-geral não pode ser personalista, "que se promove todos os dias como se a instituição tivesse de dar pão e circo para o povo, para a mídia, porque essa instituição deve submissão à Constituição e às leis do País".
Na avaliação dele, em alguns casos as delações premiadas - um dos pilares da Lava Jato - foram usadas para atingir adversários com "fins espúrios".
"O agente público não deve agir com a quebra da impessoalidade. Não precisamos criminalizar a política, não precisamos destruir o legado empresarial do brasileiro. Precisamos preservar os valores brasileiros", disse Aras, em entrevista à TV Bandeirantes, em maio.
Tradicionalmente, a escolha do procurador-geral é discutida com o ministro da Justiça, mas Aras não procurou Moro. Bateu em outras portas, como a do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que o avalizou. O ministro, por sua vez, comentou a indicação no Twitter de forma protocolar, deixando claro que a decisão foi do presidente.
O compartilhamento de dados da Receita, do Coaf e do Banco Central com o MP sem prévia autorização judicial será uma das principais questões que o novo procurador terá de enfrentar. A medida barrou investigação contra Flávio.
Em nota, a ANPR disse que a escolha de Aras representa "um retrocesso institucional e democrático" e convocou os procuradores para um protesto.