O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, determinou a abertura de investigação sobre 'altas autoridades federais' do governo Jair Bolsonaro por suposto crime de genocídio de povos indígenas, assim como delitos ambientais relacionados à vida, à saúde e à segurança de tais comunidades. Também deverão ser instauradas apurações sobre desobediência de decisões judiciais e quebra de segredo de justiça. O ministro viu 'quadro de absoluta insegurança dos povos indígenas, bem como a ocorrência de ação ou omissão, parcial ou total, por parte de autoridades federais, agravando tal situação'.
A ordem de abertura de inquéritos é direcionada à Procuradoria-Geral da República, Ministério Público Militar, Ministério da Justiça e Segurança Pública e Superintendência Regional da Polícia Federal de Roraima. O ministro determinou o encaminhamento, aos órgãos, de uma série de documentos que, em sua avaliação, retratam situação 'gravíssima e preocupante, sugestiva de absoluta anomia' na proteção dos indígenas, 'bem como da prática de múltiplos ilícitos, com a participação de altas autoridades federais'.
Em despacho assinado nesta segunda-feira, 30, no âmbito de um processo sigiloso, Barroso chega a citar o teor dos documentos que lançam suspeitas sobre o governo Jair Bolsonaro. Entre eles está a publicação do Diário Oficial, feita pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Anderson Torres - hoje preso - com a data e local de uma operação sigilosa de intervenção em terra indígena. Também são citados indícios de alteração do planejamento da Operação Jacareacanga, 'resultando em alerta aos garimpeiros, quebra de sigilo e inefetividade da iniciativa'.
Outro ponto destacado pelo ministro é a 'aparente não execução ou simulação de execução' do Plano Sete Terras Indígenas, homologado pelo Supremo visando a desintrusão dos invasores das comunidades, 'com a prestação de informações inverossímeis'. O ministro ainda chegou a reforçar a ordem de retirada de todos os garimpos ilegais das Terras Indígenas Yanomami, Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Arariboia, Mundurucu e Trincheira Bacajá.
Tal determinação se deu em uma outra decisão, também dada nesta segunda, 30. No documento, Barroso diz que a estratégia anteriormente adotada para expulsar os invasores das terras indígenas, 'de "sufocamento" da logística dos garimpos, não produziu efeitos, se é que foi implementada'. O ministro determinou que o governo federal retire os garimpeiros ilegais das Sete Terras Indígenas, indicando que devem ser priorizadas as áreas em situação mais grave.
Segundo Barroso, devem ser adotadas, de imediato, 'todas as medidas emergenciais necessárias à proteção da vida, da saúde e da segurança das comunidades indígenas'. O ministro ainda determinou que o governo federal abra crédito extraordinário 'em montante suficiente ao adequado' para cumprir todas as medidas ordenadas para proteção de terras indígenas.
No âmbito da mesma ação, que trata da desintrusão das Sete Terras Indígenas, Barroso ainda determinou que a procuradoria-geral da República tenha acesso integral aos autos para investigar suposto crime de desobediência, em razão de descumprimento das determinações da Corte máxima. O ministro destacou que os fatos narrados no bojo do processo 'podem guardar parcial relação' com a crise humanitária na Terra Indígena Yanomami.
Na mesma linha, Barroso determinou que a Superintendência Regional da PF em Roraima seja informada sobre os mesmos fatos, 'em razão da possível existência de informações relevantes' para o inquérito que apura a prática de crime de genocídio e de omissão de socorro contra a população Yanomami. Já o governo Lula terá 30 dias corridos para apresentar à Corte um diagnóstico da situação das comunidades indígenas, planejamento e respectivo cronograma de execução de decisões pendentes de cumprimento.
Dados sobre saúde indígena
Em um quarto despacho também assinado nesta segunda, Barroso também determinou que informações sobre saúde indígena sejam disponibilizadas conforme orientação do Grupo Temático de Saúde Indígena, composto pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Os dados deverão ser organizados no Datasus, 'nos mesmos termos e padrões adotados para os demais cidadãos'.