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Opinião|Carf: entenda os impactos jurídicos e econômicos


Por Everson Santana*
Everson Santana Foto: Arquivo pessoal

Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 2384/2023, que disciplina sobre o retorno do voto de qualidade para desempate na proclamação de resultados de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Para contextualizar, vale esclarecer que o CARF é um tribunal administrativo paritário que julga recursos fiscais, onde os contribuintes e o Governo Federal disputam sobre a exigência de tributos federais, e suas turmas julgadoras são compostas de representantes de ambas as partes. Em caso de empate nos julgamentos, o voto de desempate era do Presidente da Turma, cargo ocupado por um representante do governo, conforme previsão do artigo 25, § 9º do Decreto 70.235/72, o que obviamente resultava no julgamento da demanda a favor do Fisco, e não do contribuinte.

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A partir da publicação da Lei nº 13.988, em abril de 2020, o voto de qualidade em favor do Fisco foi revogado, e em caso de empate, o julgamento passou a ser resolvido de forma favorável aos contribuintes, extinguindo a exigência fiscal.

Entretanto, em janeiro de 2023, o Governo publicou a Medida Provisória nº 1.160/2023, e trouxe novamente o voto de qualidade para desempate em benefício do Fisco. Nessa ocasião, o CARF incluiu em pauta de julgamento os processos com valores econômicos mais expressivos, como, por exemplo, um caso de R$ 5,7 bilhões da Petrobras, no qual a 1ª Turma do CARF manteve a exigência fiscal contra a empresa (processos nº 16682.722511/2015-89 e 16682.722510/2015-34).

A Medida Provisória não foi convertida em lei definitiva dentro do prazo constitucional, e perdeu sua eficácia em junho de 2023. A partir dessa data, o critério de desempate em favor do contribuinte foi reestabelecido.

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O retorno do voto favorável ao contribuinte motivou o governo a encaminhar o Projeto de Lei nº 2.385 para a Câmara dos Deputados, em maio deste ano. A retomada do voto de qualidade para o representante do governo faz parte de uma das medidas do pacote de ajuste fiscal apresentado neste ano pelo Ministério da Economia, visando o aumento de arrecadação. O texto foi aprovado pela Câmara, retornando o voto de qualidade ao representante do governo – entretanto, com a novidade legislativa da previsão de exclusão das multas e juros na hipótese de empate de julgamento, ou seja, o contribuinte terá que pagar o débito principal autuado, mas não as multas e juros.

O voto de qualidade pró-fisco é um tema polêmico no âmbito tributário, e sempre levantou discussões sobre a sua constitucionalidade, já que coloca o Fisco em situação de superioridade contra o contribuinte. Historicamente, o Fisco tende a cometer excessos e ilegalidades na cobrança de tributos, considerando que o Estado é o elo mais forte da relação jurídica tributária, o que gera inúmeras disputas administrativas e judiciais sobre a legalidade das cobranças. Por essa razão, entende-se que o voto de qualidade em favor do governo compromete a imparcialidade dos julgamentos administrativos, pois se o credor está realizando um julgamento de seu próprio crédito e o voto de desempate é dado por seu representante, logicamente a tendência é que o julgamento seja favorável a ele.

Favorecer o Fisco com o voto de desempate tende a oprimir os contribuintes para saciar a fúria arrecadatória do governo, especialmente considerando o atual sistema tributário extremamente complexo do país, onde pequenos erros podem acarretar autuações graves. Além disso, os atos da Administração Pública já possuem presunção de legalidade, sendo um ônus do contribuinte comprovar a ilegalidade para afastar a exigência tributária, o que por si só já é uma situação de desvantagem contra o Estado.

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Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já possui maioria de votos favoráveis à constitucionalidade da Lei nº 13.988/2020 (ADI´S nº 6.399, 6.403 e 6.415), entendendo que o legislador possui a opção de revogar o voto de qualidade em favor do Fisco e estabelecer o critério de desempate pró-contribuinte. Os votos consideram a Constituição Federal, que prevê diversas garantias de proteção ao contribuinte contra os abusos do Estado na cobrança de tributos, como por exemplo o princípio da legalidade, a vedação do confisco, a anterioridade tributária, a irretroatividade tributária, etc.

A discussão do retorno do voto de qualidade está ligada diretamente com o objetivo de aumento de arrecadação de receitas, sendo provável a sanção do projeto de lei apresentado pelo governo. Entretanto, considerando o posicionamento do STF, a constitucionalidade do voto de qualidade e os recursos julgados pelo CARF sob essa sistemática poderão ser questionados no Poder Judiciário pelos contribuintes. Esse cenário infelizmente agrava o contencioso tributário no Brasil, contrariando os próprios programas de redução de litígio fiscal instituídos pelo Governo Federal em 2023.

A retomada do voto de qualidade favorável ao governo é prejudicial para a sociedade, pois o volume de processos tributários no Brasil já são altíssimos e vão continuar crescendo. O tempo e os custos envolvidos nestes processos consequentemente afetam o crescimento econômico do país, e tendem a desestimular a captação de investimentos estrangeiros.

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Considerando que até o momento permanece válido o critério de desempate pró-contribuinte, é importante acompanhar a votação do projeto de lei nº 2384/2023 no Senado Federal, e as futuras discussões que estão por vir em caso de aprovação definitiva do projeto pelo Congresso Nacional.

*Everson Santana é advogado tributarista no Mandaliti

Everson Santana Foto: Arquivo pessoal

Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 2384/2023, que disciplina sobre o retorno do voto de qualidade para desempate na proclamação de resultados de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Para contextualizar, vale esclarecer que o CARF é um tribunal administrativo paritário que julga recursos fiscais, onde os contribuintes e o Governo Federal disputam sobre a exigência de tributos federais, e suas turmas julgadoras são compostas de representantes de ambas as partes. Em caso de empate nos julgamentos, o voto de desempate era do Presidente da Turma, cargo ocupado por um representante do governo, conforme previsão do artigo 25, § 9º do Decreto 70.235/72, o que obviamente resultava no julgamento da demanda a favor do Fisco, e não do contribuinte.

A partir da publicação da Lei nº 13.988, em abril de 2020, o voto de qualidade em favor do Fisco foi revogado, e em caso de empate, o julgamento passou a ser resolvido de forma favorável aos contribuintes, extinguindo a exigência fiscal.

Entretanto, em janeiro de 2023, o Governo publicou a Medida Provisória nº 1.160/2023, e trouxe novamente o voto de qualidade para desempate em benefício do Fisco. Nessa ocasião, o CARF incluiu em pauta de julgamento os processos com valores econômicos mais expressivos, como, por exemplo, um caso de R$ 5,7 bilhões da Petrobras, no qual a 1ª Turma do CARF manteve a exigência fiscal contra a empresa (processos nº 16682.722511/2015-89 e 16682.722510/2015-34).

A Medida Provisória não foi convertida em lei definitiva dentro do prazo constitucional, e perdeu sua eficácia em junho de 2023. A partir dessa data, o critério de desempate em favor do contribuinte foi reestabelecido.

O retorno do voto favorável ao contribuinte motivou o governo a encaminhar o Projeto de Lei nº 2.385 para a Câmara dos Deputados, em maio deste ano. A retomada do voto de qualidade para o representante do governo faz parte de uma das medidas do pacote de ajuste fiscal apresentado neste ano pelo Ministério da Economia, visando o aumento de arrecadação. O texto foi aprovado pela Câmara, retornando o voto de qualidade ao representante do governo – entretanto, com a novidade legislativa da previsão de exclusão das multas e juros na hipótese de empate de julgamento, ou seja, o contribuinte terá que pagar o débito principal autuado, mas não as multas e juros.

O voto de qualidade pró-fisco é um tema polêmico no âmbito tributário, e sempre levantou discussões sobre a sua constitucionalidade, já que coloca o Fisco em situação de superioridade contra o contribuinte. Historicamente, o Fisco tende a cometer excessos e ilegalidades na cobrança de tributos, considerando que o Estado é o elo mais forte da relação jurídica tributária, o que gera inúmeras disputas administrativas e judiciais sobre a legalidade das cobranças. Por essa razão, entende-se que o voto de qualidade em favor do governo compromete a imparcialidade dos julgamentos administrativos, pois se o credor está realizando um julgamento de seu próprio crédito e o voto de desempate é dado por seu representante, logicamente a tendência é que o julgamento seja favorável a ele.

Favorecer o Fisco com o voto de desempate tende a oprimir os contribuintes para saciar a fúria arrecadatória do governo, especialmente considerando o atual sistema tributário extremamente complexo do país, onde pequenos erros podem acarretar autuações graves. Além disso, os atos da Administração Pública já possuem presunção de legalidade, sendo um ônus do contribuinte comprovar a ilegalidade para afastar a exigência tributária, o que por si só já é uma situação de desvantagem contra o Estado.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já possui maioria de votos favoráveis à constitucionalidade da Lei nº 13.988/2020 (ADI´S nº 6.399, 6.403 e 6.415), entendendo que o legislador possui a opção de revogar o voto de qualidade em favor do Fisco e estabelecer o critério de desempate pró-contribuinte. Os votos consideram a Constituição Federal, que prevê diversas garantias de proteção ao contribuinte contra os abusos do Estado na cobrança de tributos, como por exemplo o princípio da legalidade, a vedação do confisco, a anterioridade tributária, a irretroatividade tributária, etc.

A discussão do retorno do voto de qualidade está ligada diretamente com o objetivo de aumento de arrecadação de receitas, sendo provável a sanção do projeto de lei apresentado pelo governo. Entretanto, considerando o posicionamento do STF, a constitucionalidade do voto de qualidade e os recursos julgados pelo CARF sob essa sistemática poderão ser questionados no Poder Judiciário pelos contribuintes. Esse cenário infelizmente agrava o contencioso tributário no Brasil, contrariando os próprios programas de redução de litígio fiscal instituídos pelo Governo Federal em 2023.

A retomada do voto de qualidade favorável ao governo é prejudicial para a sociedade, pois o volume de processos tributários no Brasil já são altíssimos e vão continuar crescendo. O tempo e os custos envolvidos nestes processos consequentemente afetam o crescimento econômico do país, e tendem a desestimular a captação de investimentos estrangeiros.

Considerando que até o momento permanece válido o critério de desempate pró-contribuinte, é importante acompanhar a votação do projeto de lei nº 2384/2023 no Senado Federal, e as futuras discussões que estão por vir em caso de aprovação definitiva do projeto pelo Congresso Nacional.

*Everson Santana é advogado tributarista no Mandaliti

Everson Santana Foto: Arquivo pessoal

Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 2384/2023, que disciplina sobre o retorno do voto de qualidade para desempate na proclamação de resultados de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Para contextualizar, vale esclarecer que o CARF é um tribunal administrativo paritário que julga recursos fiscais, onde os contribuintes e o Governo Federal disputam sobre a exigência de tributos federais, e suas turmas julgadoras são compostas de representantes de ambas as partes. Em caso de empate nos julgamentos, o voto de desempate era do Presidente da Turma, cargo ocupado por um representante do governo, conforme previsão do artigo 25, § 9º do Decreto 70.235/72, o que obviamente resultava no julgamento da demanda a favor do Fisco, e não do contribuinte.

A partir da publicação da Lei nº 13.988, em abril de 2020, o voto de qualidade em favor do Fisco foi revogado, e em caso de empate, o julgamento passou a ser resolvido de forma favorável aos contribuintes, extinguindo a exigência fiscal.

Entretanto, em janeiro de 2023, o Governo publicou a Medida Provisória nº 1.160/2023, e trouxe novamente o voto de qualidade para desempate em benefício do Fisco. Nessa ocasião, o CARF incluiu em pauta de julgamento os processos com valores econômicos mais expressivos, como, por exemplo, um caso de R$ 5,7 bilhões da Petrobras, no qual a 1ª Turma do CARF manteve a exigência fiscal contra a empresa (processos nº 16682.722511/2015-89 e 16682.722510/2015-34).

A Medida Provisória não foi convertida em lei definitiva dentro do prazo constitucional, e perdeu sua eficácia em junho de 2023. A partir dessa data, o critério de desempate em favor do contribuinte foi reestabelecido.

O retorno do voto favorável ao contribuinte motivou o governo a encaminhar o Projeto de Lei nº 2.385 para a Câmara dos Deputados, em maio deste ano. A retomada do voto de qualidade para o representante do governo faz parte de uma das medidas do pacote de ajuste fiscal apresentado neste ano pelo Ministério da Economia, visando o aumento de arrecadação. O texto foi aprovado pela Câmara, retornando o voto de qualidade ao representante do governo – entretanto, com a novidade legislativa da previsão de exclusão das multas e juros na hipótese de empate de julgamento, ou seja, o contribuinte terá que pagar o débito principal autuado, mas não as multas e juros.

O voto de qualidade pró-fisco é um tema polêmico no âmbito tributário, e sempre levantou discussões sobre a sua constitucionalidade, já que coloca o Fisco em situação de superioridade contra o contribuinte. Historicamente, o Fisco tende a cometer excessos e ilegalidades na cobrança de tributos, considerando que o Estado é o elo mais forte da relação jurídica tributária, o que gera inúmeras disputas administrativas e judiciais sobre a legalidade das cobranças. Por essa razão, entende-se que o voto de qualidade em favor do governo compromete a imparcialidade dos julgamentos administrativos, pois se o credor está realizando um julgamento de seu próprio crédito e o voto de desempate é dado por seu representante, logicamente a tendência é que o julgamento seja favorável a ele.

Favorecer o Fisco com o voto de desempate tende a oprimir os contribuintes para saciar a fúria arrecadatória do governo, especialmente considerando o atual sistema tributário extremamente complexo do país, onde pequenos erros podem acarretar autuações graves. Além disso, os atos da Administração Pública já possuem presunção de legalidade, sendo um ônus do contribuinte comprovar a ilegalidade para afastar a exigência tributária, o que por si só já é uma situação de desvantagem contra o Estado.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já possui maioria de votos favoráveis à constitucionalidade da Lei nº 13.988/2020 (ADI´S nº 6.399, 6.403 e 6.415), entendendo que o legislador possui a opção de revogar o voto de qualidade em favor do Fisco e estabelecer o critério de desempate pró-contribuinte. Os votos consideram a Constituição Federal, que prevê diversas garantias de proteção ao contribuinte contra os abusos do Estado na cobrança de tributos, como por exemplo o princípio da legalidade, a vedação do confisco, a anterioridade tributária, a irretroatividade tributária, etc.

A discussão do retorno do voto de qualidade está ligada diretamente com o objetivo de aumento de arrecadação de receitas, sendo provável a sanção do projeto de lei apresentado pelo governo. Entretanto, considerando o posicionamento do STF, a constitucionalidade do voto de qualidade e os recursos julgados pelo CARF sob essa sistemática poderão ser questionados no Poder Judiciário pelos contribuintes. Esse cenário infelizmente agrava o contencioso tributário no Brasil, contrariando os próprios programas de redução de litígio fiscal instituídos pelo Governo Federal em 2023.

A retomada do voto de qualidade favorável ao governo é prejudicial para a sociedade, pois o volume de processos tributários no Brasil já são altíssimos e vão continuar crescendo. O tempo e os custos envolvidos nestes processos consequentemente afetam o crescimento econômico do país, e tendem a desestimular a captação de investimentos estrangeiros.

Considerando que até o momento permanece válido o critério de desempate pró-contribuinte, é importante acompanhar a votação do projeto de lei nº 2384/2023 no Senado Federal, e as futuras discussões que estão por vir em caso de aprovação definitiva do projeto pelo Congresso Nacional.

*Everson Santana é advogado tributarista no Mandaliti

Everson Santana Foto: Arquivo pessoal

Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 2384/2023, que disciplina sobre o retorno do voto de qualidade para desempate na proclamação de resultados de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Para contextualizar, vale esclarecer que o CARF é um tribunal administrativo paritário que julga recursos fiscais, onde os contribuintes e o Governo Federal disputam sobre a exigência de tributos federais, e suas turmas julgadoras são compostas de representantes de ambas as partes. Em caso de empate nos julgamentos, o voto de desempate era do Presidente da Turma, cargo ocupado por um representante do governo, conforme previsão do artigo 25, § 9º do Decreto 70.235/72, o que obviamente resultava no julgamento da demanda a favor do Fisco, e não do contribuinte.

A partir da publicação da Lei nº 13.988, em abril de 2020, o voto de qualidade em favor do Fisco foi revogado, e em caso de empate, o julgamento passou a ser resolvido de forma favorável aos contribuintes, extinguindo a exigência fiscal.

Entretanto, em janeiro de 2023, o Governo publicou a Medida Provisória nº 1.160/2023, e trouxe novamente o voto de qualidade para desempate em benefício do Fisco. Nessa ocasião, o CARF incluiu em pauta de julgamento os processos com valores econômicos mais expressivos, como, por exemplo, um caso de R$ 5,7 bilhões da Petrobras, no qual a 1ª Turma do CARF manteve a exigência fiscal contra a empresa (processos nº 16682.722511/2015-89 e 16682.722510/2015-34).

A Medida Provisória não foi convertida em lei definitiva dentro do prazo constitucional, e perdeu sua eficácia em junho de 2023. A partir dessa data, o critério de desempate em favor do contribuinte foi reestabelecido.

O retorno do voto favorável ao contribuinte motivou o governo a encaminhar o Projeto de Lei nº 2.385 para a Câmara dos Deputados, em maio deste ano. A retomada do voto de qualidade para o representante do governo faz parte de uma das medidas do pacote de ajuste fiscal apresentado neste ano pelo Ministério da Economia, visando o aumento de arrecadação. O texto foi aprovado pela Câmara, retornando o voto de qualidade ao representante do governo – entretanto, com a novidade legislativa da previsão de exclusão das multas e juros na hipótese de empate de julgamento, ou seja, o contribuinte terá que pagar o débito principal autuado, mas não as multas e juros.

O voto de qualidade pró-fisco é um tema polêmico no âmbito tributário, e sempre levantou discussões sobre a sua constitucionalidade, já que coloca o Fisco em situação de superioridade contra o contribuinte. Historicamente, o Fisco tende a cometer excessos e ilegalidades na cobrança de tributos, considerando que o Estado é o elo mais forte da relação jurídica tributária, o que gera inúmeras disputas administrativas e judiciais sobre a legalidade das cobranças. Por essa razão, entende-se que o voto de qualidade em favor do governo compromete a imparcialidade dos julgamentos administrativos, pois se o credor está realizando um julgamento de seu próprio crédito e o voto de desempate é dado por seu representante, logicamente a tendência é que o julgamento seja favorável a ele.

Favorecer o Fisco com o voto de desempate tende a oprimir os contribuintes para saciar a fúria arrecadatória do governo, especialmente considerando o atual sistema tributário extremamente complexo do país, onde pequenos erros podem acarretar autuações graves. Além disso, os atos da Administração Pública já possuem presunção de legalidade, sendo um ônus do contribuinte comprovar a ilegalidade para afastar a exigência tributária, o que por si só já é uma situação de desvantagem contra o Estado.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já possui maioria de votos favoráveis à constitucionalidade da Lei nº 13.988/2020 (ADI´S nº 6.399, 6.403 e 6.415), entendendo que o legislador possui a opção de revogar o voto de qualidade em favor do Fisco e estabelecer o critério de desempate pró-contribuinte. Os votos consideram a Constituição Federal, que prevê diversas garantias de proteção ao contribuinte contra os abusos do Estado na cobrança de tributos, como por exemplo o princípio da legalidade, a vedação do confisco, a anterioridade tributária, a irretroatividade tributária, etc.

A discussão do retorno do voto de qualidade está ligada diretamente com o objetivo de aumento de arrecadação de receitas, sendo provável a sanção do projeto de lei apresentado pelo governo. Entretanto, considerando o posicionamento do STF, a constitucionalidade do voto de qualidade e os recursos julgados pelo CARF sob essa sistemática poderão ser questionados no Poder Judiciário pelos contribuintes. Esse cenário infelizmente agrava o contencioso tributário no Brasil, contrariando os próprios programas de redução de litígio fiscal instituídos pelo Governo Federal em 2023.

A retomada do voto de qualidade favorável ao governo é prejudicial para a sociedade, pois o volume de processos tributários no Brasil já são altíssimos e vão continuar crescendo. O tempo e os custos envolvidos nestes processos consequentemente afetam o crescimento econômico do país, e tendem a desestimular a captação de investimentos estrangeiros.

Considerando que até o momento permanece válido o critério de desempate pró-contribuinte, é importante acompanhar a votação do projeto de lei nº 2384/2023 no Senado Federal, e as futuras discussões que estão por vir em caso de aprovação definitiva do projeto pelo Congresso Nacional.

*Everson Santana é advogado tributarista no Mandaliti

Everson Santana Foto: Arquivo pessoal

Em julho deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei nº 2384/2023, que disciplina sobre o retorno do voto de qualidade para desempate na proclamação de resultados de julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).

Para contextualizar, vale esclarecer que o CARF é um tribunal administrativo paritário que julga recursos fiscais, onde os contribuintes e o Governo Federal disputam sobre a exigência de tributos federais, e suas turmas julgadoras são compostas de representantes de ambas as partes. Em caso de empate nos julgamentos, o voto de desempate era do Presidente da Turma, cargo ocupado por um representante do governo, conforme previsão do artigo 25, § 9º do Decreto 70.235/72, o que obviamente resultava no julgamento da demanda a favor do Fisco, e não do contribuinte.

A partir da publicação da Lei nº 13.988, em abril de 2020, o voto de qualidade em favor do Fisco foi revogado, e em caso de empate, o julgamento passou a ser resolvido de forma favorável aos contribuintes, extinguindo a exigência fiscal.

Entretanto, em janeiro de 2023, o Governo publicou a Medida Provisória nº 1.160/2023, e trouxe novamente o voto de qualidade para desempate em benefício do Fisco. Nessa ocasião, o CARF incluiu em pauta de julgamento os processos com valores econômicos mais expressivos, como, por exemplo, um caso de R$ 5,7 bilhões da Petrobras, no qual a 1ª Turma do CARF manteve a exigência fiscal contra a empresa (processos nº 16682.722511/2015-89 e 16682.722510/2015-34).

A Medida Provisória não foi convertida em lei definitiva dentro do prazo constitucional, e perdeu sua eficácia em junho de 2023. A partir dessa data, o critério de desempate em favor do contribuinte foi reestabelecido.

O retorno do voto favorável ao contribuinte motivou o governo a encaminhar o Projeto de Lei nº 2.385 para a Câmara dos Deputados, em maio deste ano. A retomada do voto de qualidade para o representante do governo faz parte de uma das medidas do pacote de ajuste fiscal apresentado neste ano pelo Ministério da Economia, visando o aumento de arrecadação. O texto foi aprovado pela Câmara, retornando o voto de qualidade ao representante do governo – entretanto, com a novidade legislativa da previsão de exclusão das multas e juros na hipótese de empate de julgamento, ou seja, o contribuinte terá que pagar o débito principal autuado, mas não as multas e juros.

O voto de qualidade pró-fisco é um tema polêmico no âmbito tributário, e sempre levantou discussões sobre a sua constitucionalidade, já que coloca o Fisco em situação de superioridade contra o contribuinte. Historicamente, o Fisco tende a cometer excessos e ilegalidades na cobrança de tributos, considerando que o Estado é o elo mais forte da relação jurídica tributária, o que gera inúmeras disputas administrativas e judiciais sobre a legalidade das cobranças. Por essa razão, entende-se que o voto de qualidade em favor do governo compromete a imparcialidade dos julgamentos administrativos, pois se o credor está realizando um julgamento de seu próprio crédito e o voto de desempate é dado por seu representante, logicamente a tendência é que o julgamento seja favorável a ele.

Favorecer o Fisco com o voto de desempate tende a oprimir os contribuintes para saciar a fúria arrecadatória do governo, especialmente considerando o atual sistema tributário extremamente complexo do país, onde pequenos erros podem acarretar autuações graves. Além disso, os atos da Administração Pública já possuem presunção de legalidade, sendo um ônus do contribuinte comprovar a ilegalidade para afastar a exigência tributária, o que por si só já é uma situação de desvantagem contra o Estado.

Inclusive, o Supremo Tribunal Federal já possui maioria de votos favoráveis à constitucionalidade da Lei nº 13.988/2020 (ADI´S nº 6.399, 6.403 e 6.415), entendendo que o legislador possui a opção de revogar o voto de qualidade em favor do Fisco e estabelecer o critério de desempate pró-contribuinte. Os votos consideram a Constituição Federal, que prevê diversas garantias de proteção ao contribuinte contra os abusos do Estado na cobrança de tributos, como por exemplo o princípio da legalidade, a vedação do confisco, a anterioridade tributária, a irretroatividade tributária, etc.

A discussão do retorno do voto de qualidade está ligada diretamente com o objetivo de aumento de arrecadação de receitas, sendo provável a sanção do projeto de lei apresentado pelo governo. Entretanto, considerando o posicionamento do STF, a constitucionalidade do voto de qualidade e os recursos julgados pelo CARF sob essa sistemática poderão ser questionados no Poder Judiciário pelos contribuintes. Esse cenário infelizmente agrava o contencioso tributário no Brasil, contrariando os próprios programas de redução de litígio fiscal instituídos pelo Governo Federal em 2023.

A retomada do voto de qualidade favorável ao governo é prejudicial para a sociedade, pois o volume de processos tributários no Brasil já são altíssimos e vão continuar crescendo. O tempo e os custos envolvidos nestes processos consequentemente afetam o crescimento econômico do país, e tendem a desestimular a captação de investimentos estrangeiros.

Considerando que até o momento permanece válido o critério de desempate pró-contribuinte, é importante acompanhar a votação do projeto de lei nº 2384/2023 no Senado Federal, e as futuras discussões que estão por vir em caso de aprovação definitiva do projeto pelo Congresso Nacional.

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