O julgamento dos pedidos de habeas corpus impetrados pela defesa do ex-jogador Robinho no Supremo Tribunal Federal (STF) expõe uma teia de questões jurídicas entrelaçada com a inegável pressão da opinião pública pela punição de crimes de violência sexual. A condenação do ex-jogador por estupro coletivo na Itália, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), desencadeou um debate acalorado sobre a execução da pena no Brasil e os limites da jurisdição nacional. A votação, ainda em curso, revela a tendência da prevalência do anseio social por punição sobre a análise técnica da matéria.
Embora a repercussão midiática do caso e a comoção popular sejam totalmente compreensíveis dada a brutalidade e gravidade do crime, a atuação do Judiciário deve, impreterivelmente, pautar-se pela estrita observância da lei e das garantias constitucionais. Nesse sentido, o voto do Ministro Gilmar Mendes se destaca não pelo óbvio, que seria a tecnicidade, mas por ser, até o momento, a voz dissonante na Suprema Corte. Sua argumentação, fundamentada em princípios basilares do Direito Penal, expõe a fragilidade da decisão do STJ e a precipitação na execução da pena.
Com precisão, o ministro Mendes dissecou a inaplicabilidade retroativa da Lei de Migração ao caso, considerando o crime ocorrido em 2013. A Transferência de Execução da Pena (TEP), introduzida pela referida lei, não pode retroagir para prejudicar o réu. O Ministro ressaltou que a impossibilidade da TEP não implica impunidade, abrindo caminho para a persecução penal na jurisdição brasileira, com base no princípio da extraterritorialidade, garantindo assim a possibilidade de responsabilização sem atropelar as garantias fundamentais.
Outro ponto abordado pelo ministro foi a exigência do trânsito em julgado para o início do cumprimento da pena, conforme consolidada jurisprudência do próprio STF. A prisão de Robinho antes do esgotamento dos recursos configura flagrante violação desse princípio, corroborando a tese da defesa sobre a ilegalidade da execução provisória da pena.
Com o andamento do julgamento, percebe-se uma corrente no STF que parece se curvar à pressão popular. Fica evidente que os ministros temem ser “mal interpretados” e isso demonstra a influência do clamor social sobre a imparcialidade do julgamento. Essa tendência é extremamente perigosa e constitui uma ameaça à essência do Estado Democrático de Direito, que se funda na independência do Poder Judiciário e na aplicação isonômica da lei.
A gravidade do crime cometido por Robinho é inquestionável. A eventual confirmação da prisão de Robinho abre caminho para a flexibilização de garantias fundamentais em nome da comoção pública. O caso está se convertendo em um verdadeiro teste para a solidez das instituições democráticas brasileiras e sua capacidade de resistir à tentação do punitivismo. A prevalência da técnica jurídica sobre o clamor popular é essencial para a preservação do Estado de Direito e a construção de uma sociedade verdadeiramente justa para todos. Hoje acontece com o Robinho, amanhã pode acontecer com uma vítima ou com um inocente injustamente acusado.