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Cenário legislativo 2022: o ano das emendas constitucionais


Por Andréa Seco
Andréa Seco. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Se durante o período pandêmico o governo federal se valeu como não se via há décadas de Medidas Provisórias (MP) para criar leis e financiar políticas públicas, o ano de 2022 foi marcado por um novo recorde legislativo: o de mudanças na Constituição Federal.

Segundo levantamentos do portal oficial do Senado Federal, até o final do primeiro semestre deste ano, somavam-se 11 alterações na Carta Magna das 26 aprovadas no período de Jair Bolsonaro à frente do Planalto, já incluídas neste número anual a PEC das "bondades" permitindo ao governo aumentar, entre outros, o Auxílio Brasil e a PEC do piso da Enfermagem.

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Vale lembrar que uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pode ser apresentada pelo presidente da República, por um terço dos deputados federais ou dos senadores ou por mais da metade das assembleias legislativas, desde que cada uma delas se manifeste pela maioria relativa de seus componentes. Não podem ser apresentadas PECs que visem suprimir as chamadas cláusulas pétreas da Constituição (forma federativa de Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos poderes e direitos e garantias individuais). A PEC é discutida e votada em dois turnos, em cada Casa do Congresso, e será aprovada se obtiver, na Câmara e no Senado, três quintos dos votos dos deputados e dos senadores.

A intensa atividade reformadora da Constituição produziu praticamente uma emenda por mês. Não é pouco e viu-se de tudo mesmo em um cenário em que se exige relevantes votações legislativas.

A primeira das emendas constitucionais de 2022 de destaque (EC 115/2022) tornou a proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, um direito fundamental, além de fixar a função de legislar sobre o tema como privativa da União, aumentando assim o rol dos direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos previstos no art. 5º da Carta Cidadã.

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Ato posterior, foi promulgada a emenda nº 116 que trouxe inovação importante a conceitos de direito tributário ao acrescentar dispositivo à Constituição para prever a não incidência do IPTU sobre templos de qualquer culto, ainda que as entidades abrangidas pela imunidade tributária sejam apenas locatárias do bem imóvel, ampliando o espectro de proteção da liberdade de culto religioso.

Duas outras emendas tiveram caráter bastante político social. A primeira girou em torno da inclusão de regras que impõe aos partidos políticos a aplicação de recursos do fundo partidário na promoção e difusão da participação política das mulheres, bem como a aplicação de recursos desse fundo e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e a divisão do tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão no percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas visando, assim, fomentar ações afirmativas de igualdade de gênero na política (EC 117/2022); já a segunda, diretamente vinculada à experiência da calamidade pública causada pela pandemia global do coronavírus, determinou a impossibilidade de responsabilização dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e dos agentes públicos desses entes federados pela não aplicação de percentuais mínimos de gastos em educação em 2020 e 2021, devido à interrupção das aulas durante a pandemia, com a consequente obrigação de investir o que não foi aplicado nesses dois anos até o final de 2023 (EC 119/2022).

Já no âmbito das emendas que influenciam diretamente o Poder Judiciário cite-se a EC 122/2022 que eleva de 65 para 70 anos a idade máxima para os nomeados aos cargos de juízes e ministros Tribunais Superiores, aí incluídos os ministros do STJ, Tribunais Regionais do Trabalho, Tribunais Regionais Federais e Tribunal de Contas da União. Vale lembrar que tal emenda decorreu do ajuste necessário em virtude do aumento da idade da aposentadoria compulsória, que passou de 70 para 75 anos.

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Por fim, chega-se a EC 125/2022 que cria o filtro de relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso a ser apreciado para que o STJ aceite a análise recursal, sendo que a própria alteração legislativa já traz certas hipóteses de presunção de relevância, a saber: ações penais, ações de improbidade administrativa, ações cujo valor ultrapasse 500 salários mínimos, ações que possam gerar inelegibilidade e hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça.

Embora o filtro de relevância tenha entre suas motivações dar maior efetividade ao exercício de competência do STJ, melhorando o seu bom funcionamento e descongestionando a pauta para que assim assuma seu papel de "corte de precedentes", uniformizando a interpretação da legislação federal e não mais uma instância revisora, a realidade é que sua exigência só ocorrerá após a vigência de futura lei regulamentadora, cujo texto deverá ser elaborado pelo próprio STJ e enviada ao Congresso Nacional para as devidas deliberações.

Como se vê, mesmo as alterações produzidas no mais importante dos textos legais do estado democrático de direito brasileiro, tendem ainda a gerar um amplo trabalho de rescaldo legislativo e dedicação de juristas e aplicadores do direto em geral para que muitas questões introduzidas atinjam a pacificação almejada em vários dos pontos tratados. O ano de 2023 certamente seguirá trazendo grandes desafios para equalização dos inúmeros entraves burocráticos e legislativos do país!

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*Andréa Seco, sócia do contencioso estratégico do escritório Almeida Advogados; especialista em matérias cíveis, demandas societárias e arbitragens

Andréa Seco. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Se durante o período pandêmico o governo federal se valeu como não se via há décadas de Medidas Provisórias (MP) para criar leis e financiar políticas públicas, o ano de 2022 foi marcado por um novo recorde legislativo: o de mudanças na Constituição Federal.

Segundo levantamentos do portal oficial do Senado Federal, até o final do primeiro semestre deste ano, somavam-se 11 alterações na Carta Magna das 26 aprovadas no período de Jair Bolsonaro à frente do Planalto, já incluídas neste número anual a PEC das "bondades" permitindo ao governo aumentar, entre outros, o Auxílio Brasil e a PEC do piso da Enfermagem.

Vale lembrar que uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pode ser apresentada pelo presidente da República, por um terço dos deputados federais ou dos senadores ou por mais da metade das assembleias legislativas, desde que cada uma delas se manifeste pela maioria relativa de seus componentes. Não podem ser apresentadas PECs que visem suprimir as chamadas cláusulas pétreas da Constituição (forma federativa de Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos poderes e direitos e garantias individuais). A PEC é discutida e votada em dois turnos, em cada Casa do Congresso, e será aprovada se obtiver, na Câmara e no Senado, três quintos dos votos dos deputados e dos senadores.

A intensa atividade reformadora da Constituição produziu praticamente uma emenda por mês. Não é pouco e viu-se de tudo mesmo em um cenário em que se exige relevantes votações legislativas.

A primeira das emendas constitucionais de 2022 de destaque (EC 115/2022) tornou a proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, um direito fundamental, além de fixar a função de legislar sobre o tema como privativa da União, aumentando assim o rol dos direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos previstos no art. 5º da Carta Cidadã.

Ato posterior, foi promulgada a emenda nº 116 que trouxe inovação importante a conceitos de direito tributário ao acrescentar dispositivo à Constituição para prever a não incidência do IPTU sobre templos de qualquer culto, ainda que as entidades abrangidas pela imunidade tributária sejam apenas locatárias do bem imóvel, ampliando o espectro de proteção da liberdade de culto religioso.

Duas outras emendas tiveram caráter bastante político social. A primeira girou em torno da inclusão de regras que impõe aos partidos políticos a aplicação de recursos do fundo partidário na promoção e difusão da participação política das mulheres, bem como a aplicação de recursos desse fundo e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e a divisão do tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão no percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas visando, assim, fomentar ações afirmativas de igualdade de gênero na política (EC 117/2022); já a segunda, diretamente vinculada à experiência da calamidade pública causada pela pandemia global do coronavírus, determinou a impossibilidade de responsabilização dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e dos agentes públicos desses entes federados pela não aplicação de percentuais mínimos de gastos em educação em 2020 e 2021, devido à interrupção das aulas durante a pandemia, com a consequente obrigação de investir o que não foi aplicado nesses dois anos até o final de 2023 (EC 119/2022).

Já no âmbito das emendas que influenciam diretamente o Poder Judiciário cite-se a EC 122/2022 que eleva de 65 para 70 anos a idade máxima para os nomeados aos cargos de juízes e ministros Tribunais Superiores, aí incluídos os ministros do STJ, Tribunais Regionais do Trabalho, Tribunais Regionais Federais e Tribunal de Contas da União. Vale lembrar que tal emenda decorreu do ajuste necessário em virtude do aumento da idade da aposentadoria compulsória, que passou de 70 para 75 anos.

Por fim, chega-se a EC 125/2022 que cria o filtro de relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso a ser apreciado para que o STJ aceite a análise recursal, sendo que a própria alteração legislativa já traz certas hipóteses de presunção de relevância, a saber: ações penais, ações de improbidade administrativa, ações cujo valor ultrapasse 500 salários mínimos, ações que possam gerar inelegibilidade e hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça.

Embora o filtro de relevância tenha entre suas motivações dar maior efetividade ao exercício de competência do STJ, melhorando o seu bom funcionamento e descongestionando a pauta para que assim assuma seu papel de "corte de precedentes", uniformizando a interpretação da legislação federal e não mais uma instância revisora, a realidade é que sua exigência só ocorrerá após a vigência de futura lei regulamentadora, cujo texto deverá ser elaborado pelo próprio STJ e enviada ao Congresso Nacional para as devidas deliberações.

Como se vê, mesmo as alterações produzidas no mais importante dos textos legais do estado democrático de direito brasileiro, tendem ainda a gerar um amplo trabalho de rescaldo legislativo e dedicação de juristas e aplicadores do direto em geral para que muitas questões introduzidas atinjam a pacificação almejada em vários dos pontos tratados. O ano de 2023 certamente seguirá trazendo grandes desafios para equalização dos inúmeros entraves burocráticos e legislativos do país!

*Andréa Seco, sócia do contencioso estratégico do escritório Almeida Advogados; especialista em matérias cíveis, demandas societárias e arbitragens

Andréa Seco. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Se durante o período pandêmico o governo federal se valeu como não se via há décadas de Medidas Provisórias (MP) para criar leis e financiar políticas públicas, o ano de 2022 foi marcado por um novo recorde legislativo: o de mudanças na Constituição Federal.

Segundo levantamentos do portal oficial do Senado Federal, até o final do primeiro semestre deste ano, somavam-se 11 alterações na Carta Magna das 26 aprovadas no período de Jair Bolsonaro à frente do Planalto, já incluídas neste número anual a PEC das "bondades" permitindo ao governo aumentar, entre outros, o Auxílio Brasil e a PEC do piso da Enfermagem.

Vale lembrar que uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) pode ser apresentada pelo presidente da República, por um terço dos deputados federais ou dos senadores ou por mais da metade das assembleias legislativas, desde que cada uma delas se manifeste pela maioria relativa de seus componentes. Não podem ser apresentadas PECs que visem suprimir as chamadas cláusulas pétreas da Constituição (forma federativa de Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos poderes e direitos e garantias individuais). A PEC é discutida e votada em dois turnos, em cada Casa do Congresso, e será aprovada se obtiver, na Câmara e no Senado, três quintos dos votos dos deputados e dos senadores.

A intensa atividade reformadora da Constituição produziu praticamente uma emenda por mês. Não é pouco e viu-se de tudo mesmo em um cenário em que se exige relevantes votações legislativas.

A primeira das emendas constitucionais de 2022 de destaque (EC 115/2022) tornou a proteção de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, um direito fundamental, além de fixar a função de legislar sobre o tema como privativa da União, aumentando assim o rol dos direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos previstos no art. 5º da Carta Cidadã.

Ato posterior, foi promulgada a emenda nº 116 que trouxe inovação importante a conceitos de direito tributário ao acrescentar dispositivo à Constituição para prever a não incidência do IPTU sobre templos de qualquer culto, ainda que as entidades abrangidas pela imunidade tributária sejam apenas locatárias do bem imóvel, ampliando o espectro de proteção da liberdade de culto religioso.

Duas outras emendas tiveram caráter bastante político social. A primeira girou em torno da inclusão de regras que impõe aos partidos políticos a aplicação de recursos do fundo partidário na promoção e difusão da participação política das mulheres, bem como a aplicação de recursos desse fundo e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha e a divisão do tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão no percentual mínimo de 30% para candidaturas femininas visando, assim, fomentar ações afirmativas de igualdade de gênero na política (EC 117/2022); já a segunda, diretamente vinculada à experiência da calamidade pública causada pela pandemia global do coronavírus, determinou a impossibilidade de responsabilização dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e dos agentes públicos desses entes federados pela não aplicação de percentuais mínimos de gastos em educação em 2020 e 2021, devido à interrupção das aulas durante a pandemia, com a consequente obrigação de investir o que não foi aplicado nesses dois anos até o final de 2023 (EC 119/2022).

Já no âmbito das emendas que influenciam diretamente o Poder Judiciário cite-se a EC 122/2022 que eleva de 65 para 70 anos a idade máxima para os nomeados aos cargos de juízes e ministros Tribunais Superiores, aí incluídos os ministros do STJ, Tribunais Regionais do Trabalho, Tribunais Regionais Federais e Tribunal de Contas da União. Vale lembrar que tal emenda decorreu do ajuste necessário em virtude do aumento da idade da aposentadoria compulsória, que passou de 70 para 75 anos.

Por fim, chega-se a EC 125/2022 que cria o filtro de relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso a ser apreciado para que o STJ aceite a análise recursal, sendo que a própria alteração legislativa já traz certas hipóteses de presunção de relevância, a saber: ações penais, ações de improbidade administrativa, ações cujo valor ultrapasse 500 salários mínimos, ações que possam gerar inelegibilidade e hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça.

Embora o filtro de relevância tenha entre suas motivações dar maior efetividade ao exercício de competência do STJ, melhorando o seu bom funcionamento e descongestionando a pauta para que assim assuma seu papel de "corte de precedentes", uniformizando a interpretação da legislação federal e não mais uma instância revisora, a realidade é que sua exigência só ocorrerá após a vigência de futura lei regulamentadora, cujo texto deverá ser elaborado pelo próprio STJ e enviada ao Congresso Nacional para as devidas deliberações.

Como se vê, mesmo as alterações produzidas no mais importante dos textos legais do estado democrático de direito brasileiro, tendem ainda a gerar um amplo trabalho de rescaldo legislativo e dedicação de juristas e aplicadores do direto em geral para que muitas questões introduzidas atinjam a pacificação almejada em vários dos pontos tratados. O ano de 2023 certamente seguirá trazendo grandes desafios para equalização dos inúmeros entraves burocráticos e legislativos do país!

*Andréa Seco, sócia do contencioso estratégico do escritório Almeida Advogados; especialista em matérias cíveis, demandas societárias e arbitragens

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