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Contrato em blocos


Por Renato Opice Blum e Camila Rioja Arantes
Renato Opice Blum e Camila Rioja Arantes. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O conceito de smart contract como contrato auto exequível permeia discussões em alguns escritórios, um número relevante de faculdades e dezenas (se não centenas) de grupos e comunidades em plataformas como WhatsApp e o Telegram. O assunto também é pauta em eventos nacionais (1) e internacionais (2), e do próprio governo brasileiro (3). Inegável, pois, a relevância do tema. Instigante, também, pensar sobre as profundas transformações que os smart contracts vão trazer aos indivíduos, negócios, serviços jurídicos e, por consequência, à prestação jurisdicional.

Muito além do hype

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Nick Szabo, jurista e cientista da computação, pioneiro em criptomoedas, cunhou o conceito de smart contract em 1994. No trabalho intitulado Smart Contracts (4), ou Contratos Inteligentes em tradução livre, estabelece que o smart contract seria um protocolo de transação computadorizado, para o objetivo de adimplir obrigações contratuais reduzindo a necessidade de intermediários de confiança além de possíveis inadimplências ou problemas relacionados, sejam acidentais ou maliciosos.

Um exemplo famoso de Szabo compara os smart contracts a uma máquina de vendas (àquelas de refrigerante e lanches rápidos). De forma extremamente simples, a ideia seria transpor a simplicidade da execução deste simples contrato de compra e venda. Uma vez que o sujeito insere na máquina ou sistema a contrapartida (dado ou dinheiro), recebe de imediato, e sem a necessidade de qualquer intermediário, determinado produto que escolheu.

Em estudo datado de 1997, intitulado "Formalizing and Securing Relationships on Public Networks" ou Formalizando e Assegurando Relações em Redes Públicas em tradução livre, Szabo ratifica, e de forma pormenorizada, o objetivo de assegurar a confiança nas relações em rede através dos smart contracts, afirmando que estes derivam de princípios legais, teoria econômica e de protocolos seguros e confiáveis (5). Smart contracts, para além de contratos auto exequíveis, podem ser entendidos como programação - ou lógica computacional - que opera em um Blockchain e executa ações pré-determinadas de acordo com gatilhos contratuais.

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O bloco que alicerça o novo direito

Como sabemos, o paper do Satoshi sobre o Blockchain surge em meio a um cenário de crise econômica mundial, bolhas imobiliárias e falência de bancos (6). A confiança na economia, nas instituições - e por que não dos indivíduos entre si - está extremamente abalada. O Blockchain, tecnologia mais conhecida por suportar o Bitcoin e outras criptomoedas, além de ser o assunto mais cobiçado do mundo tecnológico do momento, surge como uma promessa de um futuro mais confiável e transparente uma vez que funciona como um livro-razão distribuído que registra todas as transações ocorridas em sua rede.

Alguns pontos notáveis da tecnologia incluem:

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(i) conceito de banco de dados distribuído: apesar de das informações (ou blocos) não estarem em nenhum servidor, todo usuário (ou node) tem acesso a fotografia completa das informações registradas. Os nodes participam na administração do Blockchain através dos mecanismos de consenso -- que variam entre os Blockchains e consubstanciam quesito central da segurança.

(ii) imutabilidade ou impossibilidade de falsificação: conceito está relacionado ao fato de que cada nova informação (ou bloco) é associado ao bloco anterior de forma verificável, o que gera uma ordem única distribuída através de todos os usuários da rede - garantindo, portanto, inviolabilidade.

(iii) Criptografia: do grego "kryptós" escondido" e "graphein" escrita, é a ciência que transforma informações em números e letras ininteligíveis para aqueles que não possuem a chamada "chave", ou fórmula, para leitura da mensagem.

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Juntos, esses três pilares - ainda que questionáveis -- alimentam diversas especulações sobre como a tecnologia pode ser utilizada para além das criptomoedas - inclusive, por consectário lógico, como meio de facilitar e acelerar obrigações de pagamento em contratos que importem nesse tipo de obrigação. A arquitetura do Blockchain do Ethereum faz com que esta seja a rede mais difundida para fins de smart contracts, ainda que Crypti, Ripple, Mastercoin sejam exemplos de outros Blockchains que suportam smart contracts.

E quem faz um Smart Contract?

Os smart contracts, ainda que escritos em linguagem de programação, refletem as informações - e especialmente as obrigações e condições -- previstas em contratos tradicionais, lastreado em uma lógica if/then, ou se/então em tradução livre. Em hipótese: se a condição x for adimplida (e.g. confirmação de transferência em Ether para pagamento de aluguel no Airbnb), então a consequência y (e.g. liberação de senha para fechadura digital do apartamento) será executada de forma automática.

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Da mesma forma, no caso de o pagamento ser incompleto ou inexistente, ou não satisfeitas determinadas condições de renovação, o smart contract acionaria a resposta correspondente, avençada pelas partes. A lógica pode ser replicada para uma miríade de hipóteses e contextos legais, de forma integrada ou não a outras tecnologias e sistemas.

Em linha com o exposto acima, os smart contracts indicam ser uma renovação no campo dos negócios, que ante sua natureza trazem implicações e questões inovadoras ao mundo jurídico. A tecnologia inicia um processo de impacto às relações negociais e transacionais, e é certo que litígios serão originados por questões técnicas ora alheias ao cotidiano dos advogados mais experientes. No Brasil e no mundo instituições se preparam para fornecer aos estudantes de direito e profissionais o novo conjunto de habilidades necessárias para tratar diretamente com as novas tecnologias. Cursos de graduação, pós, LL.M e de menor duração oferecem uma variedade de disciplinas como programação para advogados e design thinking, além de outros temas relacionados ao mundo cibernético como cyber crimes, que abrem um novo leque de opções para a atuação dos jovens profissionais, e também para àqueles que buscam atualizar suas práticas.

*Renato Opice Blum é economista e advogado de direito digital. Professor e coordenador do curso de proteção de dados e direito digital do Insper; Camila Rioja Arantes é advogada e Head de Legal Tech em Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados

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(1) Seminário "O Blockchain na Indústria: Na Direção de uma Economia Digital" realizado na Fiesp, em São Paulo, dia 31 de agosto de 2018

(2) Como por exemplo: (i) Seminário internacional em Londres, Reino Unido, dia 25 de Setembro de 2018 "Technology Law: legal and Regulatory Challenges"

(3) Nesse último ponto vale, inclusive, citar a Consulta Pública n.º 5/2018 no BNDES , datada de 4/9/2018, a qual objetiva "Obter informações e realizar demonstrações de soluções para (i) gestão de contas; (ii) acompanhamento de transações; e (iii) associação de contas a CNPJs e/ou CPFs, que sejam compatíveis com uma Blockchain que utilize smart contracts e integráveis à solução BNDESToken".

(4) Íntegra do trabalho disponível aqui.

(5) "Smart contracts combine protocols with user interfaces to formalize and secure relationships over computer networks. Objectives and principles for the design of these systems are derived from legal principles, economic theory, and theories of reliable and secure protocols. Similarities and differences between smart contracts and traditional business procedures based on written contracts, controls, and static forms are discussed." Íntegra disponível no link acima.

(6) Referências sobre o assunto disponíveis em: (i) https://en.wikipedia.org/wiki/Financial_crisis_of_2007%E2%80%932008; (ii) https://www.investopedia.com/articles/economics/09/financial-crisis-review.asp; (iii) https://www.theguardian.com/business/2011/aug/07/global-financial-crisis-key-stages; (iv) https://www.theguardian.com/business/2008/dec/28/markets-credit-crunch-banking-2008 ; (v) https://www.economist.com/schools-brief/2013/09/07/crash-course e (vi) https://economictimes.indiatimes.com/news/international/business/ten-years-of-the-us-financial-crisis-the-days-that-roiled-the-world-markets/articleshow/64990945.cms , por exemplo.

Renato Opice Blum e Camila Rioja Arantes. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O conceito de smart contract como contrato auto exequível permeia discussões em alguns escritórios, um número relevante de faculdades e dezenas (se não centenas) de grupos e comunidades em plataformas como WhatsApp e o Telegram. O assunto também é pauta em eventos nacionais (1) e internacionais (2), e do próprio governo brasileiro (3). Inegável, pois, a relevância do tema. Instigante, também, pensar sobre as profundas transformações que os smart contracts vão trazer aos indivíduos, negócios, serviços jurídicos e, por consequência, à prestação jurisdicional.

Muito além do hype

Nick Szabo, jurista e cientista da computação, pioneiro em criptomoedas, cunhou o conceito de smart contract em 1994. No trabalho intitulado Smart Contracts (4), ou Contratos Inteligentes em tradução livre, estabelece que o smart contract seria um protocolo de transação computadorizado, para o objetivo de adimplir obrigações contratuais reduzindo a necessidade de intermediários de confiança além de possíveis inadimplências ou problemas relacionados, sejam acidentais ou maliciosos.

Um exemplo famoso de Szabo compara os smart contracts a uma máquina de vendas (àquelas de refrigerante e lanches rápidos). De forma extremamente simples, a ideia seria transpor a simplicidade da execução deste simples contrato de compra e venda. Uma vez que o sujeito insere na máquina ou sistema a contrapartida (dado ou dinheiro), recebe de imediato, e sem a necessidade de qualquer intermediário, determinado produto que escolheu.

Em estudo datado de 1997, intitulado "Formalizing and Securing Relationships on Public Networks" ou Formalizando e Assegurando Relações em Redes Públicas em tradução livre, Szabo ratifica, e de forma pormenorizada, o objetivo de assegurar a confiança nas relações em rede através dos smart contracts, afirmando que estes derivam de princípios legais, teoria econômica e de protocolos seguros e confiáveis (5). Smart contracts, para além de contratos auto exequíveis, podem ser entendidos como programação - ou lógica computacional - que opera em um Blockchain e executa ações pré-determinadas de acordo com gatilhos contratuais.

O bloco que alicerça o novo direito

Como sabemos, o paper do Satoshi sobre o Blockchain surge em meio a um cenário de crise econômica mundial, bolhas imobiliárias e falência de bancos (6). A confiança na economia, nas instituições - e por que não dos indivíduos entre si - está extremamente abalada. O Blockchain, tecnologia mais conhecida por suportar o Bitcoin e outras criptomoedas, além de ser o assunto mais cobiçado do mundo tecnológico do momento, surge como uma promessa de um futuro mais confiável e transparente uma vez que funciona como um livro-razão distribuído que registra todas as transações ocorridas em sua rede.

Alguns pontos notáveis da tecnologia incluem:

(i) conceito de banco de dados distribuído: apesar de das informações (ou blocos) não estarem em nenhum servidor, todo usuário (ou node) tem acesso a fotografia completa das informações registradas. Os nodes participam na administração do Blockchain através dos mecanismos de consenso -- que variam entre os Blockchains e consubstanciam quesito central da segurança.

(ii) imutabilidade ou impossibilidade de falsificação: conceito está relacionado ao fato de que cada nova informação (ou bloco) é associado ao bloco anterior de forma verificável, o que gera uma ordem única distribuída através de todos os usuários da rede - garantindo, portanto, inviolabilidade.

(iii) Criptografia: do grego "kryptós" escondido" e "graphein" escrita, é a ciência que transforma informações em números e letras ininteligíveis para aqueles que não possuem a chamada "chave", ou fórmula, para leitura da mensagem.

Juntos, esses três pilares - ainda que questionáveis -- alimentam diversas especulações sobre como a tecnologia pode ser utilizada para além das criptomoedas - inclusive, por consectário lógico, como meio de facilitar e acelerar obrigações de pagamento em contratos que importem nesse tipo de obrigação. A arquitetura do Blockchain do Ethereum faz com que esta seja a rede mais difundida para fins de smart contracts, ainda que Crypti, Ripple, Mastercoin sejam exemplos de outros Blockchains que suportam smart contracts.

E quem faz um Smart Contract?

Os smart contracts, ainda que escritos em linguagem de programação, refletem as informações - e especialmente as obrigações e condições -- previstas em contratos tradicionais, lastreado em uma lógica if/then, ou se/então em tradução livre. Em hipótese: se a condição x for adimplida (e.g. confirmação de transferência em Ether para pagamento de aluguel no Airbnb), então a consequência y (e.g. liberação de senha para fechadura digital do apartamento) será executada de forma automática.

Da mesma forma, no caso de o pagamento ser incompleto ou inexistente, ou não satisfeitas determinadas condições de renovação, o smart contract acionaria a resposta correspondente, avençada pelas partes. A lógica pode ser replicada para uma miríade de hipóteses e contextos legais, de forma integrada ou não a outras tecnologias e sistemas.

Em linha com o exposto acima, os smart contracts indicam ser uma renovação no campo dos negócios, que ante sua natureza trazem implicações e questões inovadoras ao mundo jurídico. A tecnologia inicia um processo de impacto às relações negociais e transacionais, e é certo que litígios serão originados por questões técnicas ora alheias ao cotidiano dos advogados mais experientes. No Brasil e no mundo instituições se preparam para fornecer aos estudantes de direito e profissionais o novo conjunto de habilidades necessárias para tratar diretamente com as novas tecnologias. Cursos de graduação, pós, LL.M e de menor duração oferecem uma variedade de disciplinas como programação para advogados e design thinking, além de outros temas relacionados ao mundo cibernético como cyber crimes, que abrem um novo leque de opções para a atuação dos jovens profissionais, e também para àqueles que buscam atualizar suas práticas.

*Renato Opice Blum é economista e advogado de direito digital. Professor e coordenador do curso de proteção de dados e direito digital do Insper; Camila Rioja Arantes é advogada e Head de Legal Tech em Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados

(1) Seminário "O Blockchain na Indústria: Na Direção de uma Economia Digital" realizado na Fiesp, em São Paulo, dia 31 de agosto de 2018

(2) Como por exemplo: (i) Seminário internacional em Londres, Reino Unido, dia 25 de Setembro de 2018 "Technology Law: legal and Regulatory Challenges"

(3) Nesse último ponto vale, inclusive, citar a Consulta Pública n.º 5/2018 no BNDES , datada de 4/9/2018, a qual objetiva "Obter informações e realizar demonstrações de soluções para (i) gestão de contas; (ii) acompanhamento de transações; e (iii) associação de contas a CNPJs e/ou CPFs, que sejam compatíveis com uma Blockchain que utilize smart contracts e integráveis à solução BNDESToken".

(4) Íntegra do trabalho disponível aqui.

(5) "Smart contracts combine protocols with user interfaces to formalize and secure relationships over computer networks. Objectives and principles for the design of these systems are derived from legal principles, economic theory, and theories of reliable and secure protocols. Similarities and differences between smart contracts and traditional business procedures based on written contracts, controls, and static forms are discussed." Íntegra disponível no link acima.

(6) Referências sobre o assunto disponíveis em: (i) https://en.wikipedia.org/wiki/Financial_crisis_of_2007%E2%80%932008; (ii) https://www.investopedia.com/articles/economics/09/financial-crisis-review.asp; (iii) https://www.theguardian.com/business/2011/aug/07/global-financial-crisis-key-stages; (iv) https://www.theguardian.com/business/2008/dec/28/markets-credit-crunch-banking-2008 ; (v) https://www.economist.com/schools-brief/2013/09/07/crash-course e (vi) https://economictimes.indiatimes.com/news/international/business/ten-years-of-the-us-financial-crisis-the-days-that-roiled-the-world-markets/articleshow/64990945.cms , por exemplo.

Renato Opice Blum e Camila Rioja Arantes. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O conceito de smart contract como contrato auto exequível permeia discussões em alguns escritórios, um número relevante de faculdades e dezenas (se não centenas) de grupos e comunidades em plataformas como WhatsApp e o Telegram. O assunto também é pauta em eventos nacionais (1) e internacionais (2), e do próprio governo brasileiro (3). Inegável, pois, a relevância do tema. Instigante, também, pensar sobre as profundas transformações que os smart contracts vão trazer aos indivíduos, negócios, serviços jurídicos e, por consequência, à prestação jurisdicional.

Muito além do hype

Nick Szabo, jurista e cientista da computação, pioneiro em criptomoedas, cunhou o conceito de smart contract em 1994. No trabalho intitulado Smart Contracts (4), ou Contratos Inteligentes em tradução livre, estabelece que o smart contract seria um protocolo de transação computadorizado, para o objetivo de adimplir obrigações contratuais reduzindo a necessidade de intermediários de confiança além de possíveis inadimplências ou problemas relacionados, sejam acidentais ou maliciosos.

Um exemplo famoso de Szabo compara os smart contracts a uma máquina de vendas (àquelas de refrigerante e lanches rápidos). De forma extremamente simples, a ideia seria transpor a simplicidade da execução deste simples contrato de compra e venda. Uma vez que o sujeito insere na máquina ou sistema a contrapartida (dado ou dinheiro), recebe de imediato, e sem a necessidade de qualquer intermediário, determinado produto que escolheu.

Em estudo datado de 1997, intitulado "Formalizing and Securing Relationships on Public Networks" ou Formalizando e Assegurando Relações em Redes Públicas em tradução livre, Szabo ratifica, e de forma pormenorizada, o objetivo de assegurar a confiança nas relações em rede através dos smart contracts, afirmando que estes derivam de princípios legais, teoria econômica e de protocolos seguros e confiáveis (5). Smart contracts, para além de contratos auto exequíveis, podem ser entendidos como programação - ou lógica computacional - que opera em um Blockchain e executa ações pré-determinadas de acordo com gatilhos contratuais.

O bloco que alicerça o novo direito

Como sabemos, o paper do Satoshi sobre o Blockchain surge em meio a um cenário de crise econômica mundial, bolhas imobiliárias e falência de bancos (6). A confiança na economia, nas instituições - e por que não dos indivíduos entre si - está extremamente abalada. O Blockchain, tecnologia mais conhecida por suportar o Bitcoin e outras criptomoedas, além de ser o assunto mais cobiçado do mundo tecnológico do momento, surge como uma promessa de um futuro mais confiável e transparente uma vez que funciona como um livro-razão distribuído que registra todas as transações ocorridas em sua rede.

Alguns pontos notáveis da tecnologia incluem:

(i) conceito de banco de dados distribuído: apesar de das informações (ou blocos) não estarem em nenhum servidor, todo usuário (ou node) tem acesso a fotografia completa das informações registradas. Os nodes participam na administração do Blockchain através dos mecanismos de consenso -- que variam entre os Blockchains e consubstanciam quesito central da segurança.

(ii) imutabilidade ou impossibilidade de falsificação: conceito está relacionado ao fato de que cada nova informação (ou bloco) é associado ao bloco anterior de forma verificável, o que gera uma ordem única distribuída através de todos os usuários da rede - garantindo, portanto, inviolabilidade.

(iii) Criptografia: do grego "kryptós" escondido" e "graphein" escrita, é a ciência que transforma informações em números e letras ininteligíveis para aqueles que não possuem a chamada "chave", ou fórmula, para leitura da mensagem.

Juntos, esses três pilares - ainda que questionáveis -- alimentam diversas especulações sobre como a tecnologia pode ser utilizada para além das criptomoedas - inclusive, por consectário lógico, como meio de facilitar e acelerar obrigações de pagamento em contratos que importem nesse tipo de obrigação. A arquitetura do Blockchain do Ethereum faz com que esta seja a rede mais difundida para fins de smart contracts, ainda que Crypti, Ripple, Mastercoin sejam exemplos de outros Blockchains que suportam smart contracts.

E quem faz um Smart Contract?

Os smart contracts, ainda que escritos em linguagem de programação, refletem as informações - e especialmente as obrigações e condições -- previstas em contratos tradicionais, lastreado em uma lógica if/then, ou se/então em tradução livre. Em hipótese: se a condição x for adimplida (e.g. confirmação de transferência em Ether para pagamento de aluguel no Airbnb), então a consequência y (e.g. liberação de senha para fechadura digital do apartamento) será executada de forma automática.

Da mesma forma, no caso de o pagamento ser incompleto ou inexistente, ou não satisfeitas determinadas condições de renovação, o smart contract acionaria a resposta correspondente, avençada pelas partes. A lógica pode ser replicada para uma miríade de hipóteses e contextos legais, de forma integrada ou não a outras tecnologias e sistemas.

Em linha com o exposto acima, os smart contracts indicam ser uma renovação no campo dos negócios, que ante sua natureza trazem implicações e questões inovadoras ao mundo jurídico. A tecnologia inicia um processo de impacto às relações negociais e transacionais, e é certo que litígios serão originados por questões técnicas ora alheias ao cotidiano dos advogados mais experientes. No Brasil e no mundo instituições se preparam para fornecer aos estudantes de direito e profissionais o novo conjunto de habilidades necessárias para tratar diretamente com as novas tecnologias. Cursos de graduação, pós, LL.M e de menor duração oferecem uma variedade de disciplinas como programação para advogados e design thinking, além de outros temas relacionados ao mundo cibernético como cyber crimes, que abrem um novo leque de opções para a atuação dos jovens profissionais, e também para àqueles que buscam atualizar suas práticas.

*Renato Opice Blum é economista e advogado de direito digital. Professor e coordenador do curso de proteção de dados e direito digital do Insper; Camila Rioja Arantes é advogada e Head de Legal Tech em Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados

(1) Seminário "O Blockchain na Indústria: Na Direção de uma Economia Digital" realizado na Fiesp, em São Paulo, dia 31 de agosto de 2018

(2) Como por exemplo: (i) Seminário internacional em Londres, Reino Unido, dia 25 de Setembro de 2018 "Technology Law: legal and Regulatory Challenges"

(3) Nesse último ponto vale, inclusive, citar a Consulta Pública n.º 5/2018 no BNDES , datada de 4/9/2018, a qual objetiva "Obter informações e realizar demonstrações de soluções para (i) gestão de contas; (ii) acompanhamento de transações; e (iii) associação de contas a CNPJs e/ou CPFs, que sejam compatíveis com uma Blockchain que utilize smart contracts e integráveis à solução BNDESToken".

(4) Íntegra do trabalho disponível aqui.

(5) "Smart contracts combine protocols with user interfaces to formalize and secure relationships over computer networks. Objectives and principles for the design of these systems are derived from legal principles, economic theory, and theories of reliable and secure protocols. Similarities and differences between smart contracts and traditional business procedures based on written contracts, controls, and static forms are discussed." Íntegra disponível no link acima.

(6) Referências sobre o assunto disponíveis em: (i) https://en.wikipedia.org/wiki/Financial_crisis_of_2007%E2%80%932008; (ii) https://www.investopedia.com/articles/economics/09/financial-crisis-review.asp; (iii) https://www.theguardian.com/business/2011/aug/07/global-financial-crisis-key-stages; (iv) https://www.theguardian.com/business/2008/dec/28/markets-credit-crunch-banking-2008 ; (v) https://www.economist.com/schools-brief/2013/09/07/crash-course e (vi) https://economictimes.indiatimes.com/news/international/business/ten-years-of-the-us-financial-crisis-the-days-that-roiled-the-world-markets/articleshow/64990945.cms , por exemplo.

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