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Efeito Toffoli: anulação de provas gera corrida para derrubar multas e acordos


Um ano após invalidar provas do acordo de leniência da Odebrecht, antigos delatores e investigados na famosa operação buscam tanto diretamente com o ministro do STF, quanto em outros tribunais pelo País suspensão das colaborações feitas e a devolução do dinheiro pago quando os acordos foram firmados

Por Pepita Ortega
Atualização:
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Um ano após anular todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), acumula em seu gabinete mais de 20 processos derivados de sua decisão que abriu um ciclo de desconstrução de medidas tomadas no âmbito da Operação Lava Jato. Das 46 petições em tramitação no gabinete do ministro em Brasília, 24 são de investigados pela Lava Jato, em especial de delatores. Muitos deles integram a lista dos 77 ex-executivos da Odebrecht, e alguns pedem a suspensão das colaborações e a devolução de multas. Em um “efeito cascata”, a decisão de Toffoli – de setembro de 2023 – tem servido de base para sentenças e despachos em varas de primeira instância e tribunais que foram base da operação.

O primeiro resultado concreto foi registrado na última sexta-feira: o juiz Guilherme Roman Borges, da 13ª Vara Criminal de Curitiba – a vara original da Lava Jato –, anulou os acordos de colaboração premiada e não persecução penal firmados por Jorge Luiz Brusa e ordenou que sejam devolvidos a ele R$ 25 milhões pagos em multas.

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Apontado pela força-tarefa da operação como responsável por operações de lavagem de dinheiro, Brusa não chegou a ser denunciado justamente por causa do acordo de não persecução – instrumento pelo qual o réu confessa um crime e se compromete a cumprir uma série de cláusulas definidas pelo Ministério Público em troca do arquivamento da ação penal. Ele se tornou colaborador premiado, com acordo de delação homologado em janeiro de 2020.

Entre os que solicitam a extensão da decisão que anulou as provas da Odebrecht está o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, que teve sua prisão decretada em 18 de julho . Denunciado por corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro, Duque foi acusado de receber propinas em contratos da estatal com a Andrade Gutierrez e com a Odebrecht, incluindo obras como a Refinaria Getúlio Vargas, a Refinaria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro; ele foi condenado a 39 anos de detenção. Toffoli ainda não decidiu sobre a petição de Duque, impetrada logo após o mandado de prisão ter sido expedido.

Antes da prisão de Duque ser decretada, a defesa chegou a pedir que a medida não fosse determinada até que a Justiça Federal resolvesse “questões apuradas no âmbito da Operação Spoofing” - investigação sobre hackers que invadiram comunicações de procuradores e de Moro. Segundo os advogados do ex-chefe da Petrobras, tais questões poderiam “redundar na anulação de condenações” proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba, base da Lava Jato.

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Lobista e empreiteiro

Outro caso de tentativa de reaver valores pagos em multas é o de Adir Assad, empresário apontado como lobista e operador de propinas, que foi condenado e preso por operações de lavagem de dinheiro junto à Odebrecht. Ele pediu a suspensão da multa do acordo de R$ 50 milhões fechado com o Ministério Público Federal em 2017. A defesa de Assad alegou suposta “falta de voluntariedade” na celebração do pacto. Toffoli sinalizou à defesa que o TRF-4, em Porto Alegre, seria o foro adequado para analisar o pedido.

Indicação semelhante ocorreu com Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS – empresa integrante do chamado “clube vip” do cartel de empreiteiras que se associava para fraudar licitações e superfaturar contratos. O ministro do STF disse que a solicitação de suspensão da multa deveria ser apresentada a seu colega Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo.

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O próprio Jorge Luiz Brusa acionou Toffoli antes de recorrer à 13ª Vara Criminal de Curitiba. Em março, o ministro do STF negou o pedido e indicou que a defesa deveria acionar o “juízo natural do feito” – a vara que homologou os acordos –, que teria condições para analisar o caso “com a cautela e a verticalidade necessárias”.

Em sua decisão da última sexta-feira, o juiz da 13ª Vara de Curitiba concluiu que as provas que levaram à investigação de Brusa comprometeram os acordos. “Sendo as provas declaradas nulas, nulo também é o próprio acordo, a sua homologação e quaisquer efeitos dele decorrentes, como os pagamentos realizados”, escreveu.

O magistrado afirmou ainda que o caso está prescrito e, por isso, o Ministério Público nem sequer poderá buscar a assinatura de um novo acordo de colaboração com Brusa. Na semana anterior, com base na mesma decisão de Dias Toffoli, o juiz já havia trancado uma ação penal da Lava Jato contra dois executivos e um ex-advogado da petroquímica Braskem.

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‘Contaminadas’

De acordo com a lei brasileira, o acordo de leniência envolve uma pessoa jurídica (empresa) que entrega às autoridades informações e provas sobre atos de corrupção de que tenha conhecimento. Em troca, a empresa pode ter atenuadas e até suspensas todas as sanções e penas a que faria jus. Quando anulou as provas do acordo de leniência firmado com a Odebrecht, Toffoli determinou que os juízes responsáveis por processos que tinham usado essas provas fizessem uma análise caso a caso, para verificar se as ações se manteriam de pé.

Na prática, como o acordo de leniência da empreiteira foi o ponto de partida de dezenas de inquéritos derivados da Lava Jato, a decisão de Toffoli provoca o chamado “efeito cascata”: quando uma prova inicial é declarada nula, todas as demais são consideradas “contaminadas”. Esse é o argumento que está sendo empregado por todos os delatores interessados em receber de volta o dinheiro das multas.

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A lista de petições relacionadas à implosão da Lava Jato inclui o processo no qual Toffoli anulou todos os procedimentos e investigações envolvendo um dos principais delatores da operação, Marcelo Odebrecht. Conforme decisão da Segunda Turma do STF, caberá ao juiz responsável por cada procedimento analisar as provas do caso e avaliar se as ações ficam de pé mesmo com a exclusão das provas entregues pela empreiteira à Justiça.

A decisão que aniquilou as informações entregues pela empreiteira à Justiça ainda não tem data para passar pelo crivo da Segunda Turma do Supremo. Em fevereiro, o grupo suspendeu o julgamento de três recursos contra a decisão de Toffoli até a finalização da conciliação sobre os acordos de leniência da Operação Lava Jato. No final do mês passado, foi estendido prazo por mais 30 dias para que as autoridades e empresas cheguem a um consenso.

Alvos da operação também estão usando como argumento as decisões do ministro do STF sobre Beto Richa (PSDB), ex-governador do Paraná e atualmente deputado federal. Toffoli anulou todos os atos praticados pela antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e pelo ex-juiz Sérgio Moro (atual senador) envolvendo Richa nas Operações Rádio Patrulha, Piloto, Integração e Quadro Negro.

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Enquanto os alvos da operação usam Lula, Richa e Odebrecht como ímãs para direcionar pedidos a Toffoli e tentar anular seus processos na Operação já no STF, as respostas para os pedidos têm sido a mesma: o ministro destaca o efeito erga omnes da decisão que derrubou as provas da leniência da Odebrecht - a expressão tem relação com o caráter do despacho do ministro, ou seja, vale para todos.

Com isso, Toffoli sinaliza aos investigados que recorrem a seu gabinete que procurem os juízos competentes - os que cuidam de seus respectivos casos - para fazer as mais diversas solicitações: trancamento de processos, suspensão de investigações e até anulação de delações.

Em seus despachos, Toffoli repete: “Como tenho feito desde que assumi a relatoria da Reclamação 43.007, advirto que nos feitos, seja de que natureza for, em que houve a utilização de elementos de prova declarados imprestáveis, o exame a respeito do contágio de outras provas, bem como sobre a necessidade de se arquivar inquéritos ou ações judiciais deverá ser realizado pelo juízo natural do feito, consideradas as balizas fixadas naquela reclamação e as peculiaridades do caso concreto.”

Cronologia

As 24 petições que tramitam no gabinete de Toffoli estão ligadas à reclamação que presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajuizou em 2020 em busca da íntegra do acordo de leniência da Odebrecht.

O processo se agigantou, passou a abarcar os diálogos apreendidos na Operação Spoofing e culminou na decisão que anulou as provas da empreiteira nas ações contra o chefe do Executivo. Desde então, outros réus da Lava Jato passaram a pedir extensão da decisão que beneficiou Lula.

Toffoli herdou o processo do antigo relator, o ministro Ricardo Lewandowski - hoje ministro da Justiça - nessas condições com pedidos de uma série de personagens da Lava Jato, que já conseguiram decisões benéficas - os empresários Walter Faria e Paulo Skaf, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, o prefeito do Rio Eduardo Paes, o ex-presidente da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e o ex-ministro Edison Lobão.

Incomodado com o ‘tumulto do processo’, Toffoli assinou, no dia 6 de setembro do ano passado, o despacho que anulou as provas da leniência da Odebrecht. Se antes o ministro aplicava a decisão do STF sobre Lula a cada um dos réus que pediam a extensão do entendimento, agora a anulação valeria para todos os réus.

Assim, estes poderiam usar a decisão de Toffoli para dirigir os pedidos de anulação e trancamento de processos judiciais a juízos de primeiro grau. Um movimento semelhante aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar Lula e declarou Moro suspeito: coube aos juízos que cuidavam das ações do petista a avaliação e interpretação do impacto da decisão e a consequente anulação das ações.

O ministro tentou organizar a Reclamação. Começou a separar os novos pedidos de extensão em petições à parte, como ocorre até hoje. Antes disso todas as solicitações eram encaminhadas e decididas com o cabeçalho da Reclamação. As petições eram encaminhadas para Toffoli em razão da conexão com o processo principal. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o caso do empresário Marcelo Odebrecht, o “príncipe das empreiteiras”

Processos

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Um ano após anular todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), acumula em seu gabinete mais de 20 processos derivados de sua decisão que abriu um ciclo de desconstrução de medidas tomadas no âmbito da Operação Lava Jato. Das 46 petições em tramitação no gabinete do ministro em Brasília, 24 são de investigados pela Lava Jato, em especial de delatores. Muitos deles integram a lista dos 77 ex-executivos da Odebrecht, e alguns pedem a suspensão das colaborações e a devolução de multas. Em um “efeito cascata”, a decisão de Toffoli – de setembro de 2023 – tem servido de base para sentenças e despachos em varas de primeira instância e tribunais que foram base da operação.

O primeiro resultado concreto foi registrado na última sexta-feira: o juiz Guilherme Roman Borges, da 13ª Vara Criminal de Curitiba – a vara original da Lava Jato –, anulou os acordos de colaboração premiada e não persecução penal firmados por Jorge Luiz Brusa e ordenou que sejam devolvidos a ele R$ 25 milhões pagos em multas.

Apontado pela força-tarefa da operação como responsável por operações de lavagem de dinheiro, Brusa não chegou a ser denunciado justamente por causa do acordo de não persecução – instrumento pelo qual o réu confessa um crime e se compromete a cumprir uma série de cláusulas definidas pelo Ministério Público em troca do arquivamento da ação penal. Ele se tornou colaborador premiado, com acordo de delação homologado em janeiro de 2020.

Entre os que solicitam a extensão da decisão que anulou as provas da Odebrecht está o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, que teve sua prisão decretada em 18 de julho . Denunciado por corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro, Duque foi acusado de receber propinas em contratos da estatal com a Andrade Gutierrez e com a Odebrecht, incluindo obras como a Refinaria Getúlio Vargas, a Refinaria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro; ele foi condenado a 39 anos de detenção. Toffoli ainda não decidiu sobre a petição de Duque, impetrada logo após o mandado de prisão ter sido expedido.

Antes da prisão de Duque ser decretada, a defesa chegou a pedir que a medida não fosse determinada até que a Justiça Federal resolvesse “questões apuradas no âmbito da Operação Spoofing” - investigação sobre hackers que invadiram comunicações de procuradores e de Moro. Segundo os advogados do ex-chefe da Petrobras, tais questões poderiam “redundar na anulação de condenações” proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba, base da Lava Jato.

Lobista e empreiteiro

Outro caso de tentativa de reaver valores pagos em multas é o de Adir Assad, empresário apontado como lobista e operador de propinas, que foi condenado e preso por operações de lavagem de dinheiro junto à Odebrecht. Ele pediu a suspensão da multa do acordo de R$ 50 milhões fechado com o Ministério Público Federal em 2017. A defesa de Assad alegou suposta “falta de voluntariedade” na celebração do pacto. Toffoli sinalizou à defesa que o TRF-4, em Porto Alegre, seria o foro adequado para analisar o pedido.

Indicação semelhante ocorreu com Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS – empresa integrante do chamado “clube vip” do cartel de empreiteiras que se associava para fraudar licitações e superfaturar contratos. O ministro do STF disse que a solicitação de suspensão da multa deveria ser apresentada a seu colega Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo.

O próprio Jorge Luiz Brusa acionou Toffoli antes de recorrer à 13ª Vara Criminal de Curitiba. Em março, o ministro do STF negou o pedido e indicou que a defesa deveria acionar o “juízo natural do feito” – a vara que homologou os acordos –, que teria condições para analisar o caso “com a cautela e a verticalidade necessárias”.

Em sua decisão da última sexta-feira, o juiz da 13ª Vara de Curitiba concluiu que as provas que levaram à investigação de Brusa comprometeram os acordos. “Sendo as provas declaradas nulas, nulo também é o próprio acordo, a sua homologação e quaisquer efeitos dele decorrentes, como os pagamentos realizados”, escreveu.

O magistrado afirmou ainda que o caso está prescrito e, por isso, o Ministério Público nem sequer poderá buscar a assinatura de um novo acordo de colaboração com Brusa. Na semana anterior, com base na mesma decisão de Dias Toffoli, o juiz já havia trancado uma ação penal da Lava Jato contra dois executivos e um ex-advogado da petroquímica Braskem.

‘Contaminadas’

De acordo com a lei brasileira, o acordo de leniência envolve uma pessoa jurídica (empresa) que entrega às autoridades informações e provas sobre atos de corrupção de que tenha conhecimento. Em troca, a empresa pode ter atenuadas e até suspensas todas as sanções e penas a que faria jus. Quando anulou as provas do acordo de leniência firmado com a Odebrecht, Toffoli determinou que os juízes responsáveis por processos que tinham usado essas provas fizessem uma análise caso a caso, para verificar se as ações se manteriam de pé.

Na prática, como o acordo de leniência da empreiteira foi o ponto de partida de dezenas de inquéritos derivados da Lava Jato, a decisão de Toffoli provoca o chamado “efeito cascata”: quando uma prova inicial é declarada nula, todas as demais são consideradas “contaminadas”. Esse é o argumento que está sendo empregado por todos os delatores interessados em receber de volta o dinheiro das multas.

A lista de petições relacionadas à implosão da Lava Jato inclui o processo no qual Toffoli anulou todos os procedimentos e investigações envolvendo um dos principais delatores da operação, Marcelo Odebrecht. Conforme decisão da Segunda Turma do STF, caberá ao juiz responsável por cada procedimento analisar as provas do caso e avaliar se as ações ficam de pé mesmo com a exclusão das provas entregues pela empreiteira à Justiça.

A decisão que aniquilou as informações entregues pela empreiteira à Justiça ainda não tem data para passar pelo crivo da Segunda Turma do Supremo. Em fevereiro, o grupo suspendeu o julgamento de três recursos contra a decisão de Toffoli até a finalização da conciliação sobre os acordos de leniência da Operação Lava Jato. No final do mês passado, foi estendido prazo por mais 30 dias para que as autoridades e empresas cheguem a um consenso.

Alvos da operação também estão usando como argumento as decisões do ministro do STF sobre Beto Richa (PSDB), ex-governador do Paraná e atualmente deputado federal. Toffoli anulou todos os atos praticados pela antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e pelo ex-juiz Sérgio Moro (atual senador) envolvendo Richa nas Operações Rádio Patrulha, Piloto, Integração e Quadro Negro.

Enquanto os alvos da operação usam Lula, Richa e Odebrecht como ímãs para direcionar pedidos a Toffoli e tentar anular seus processos na Operação já no STF, as respostas para os pedidos têm sido a mesma: o ministro destaca o efeito erga omnes da decisão que derrubou as provas da leniência da Odebrecht - a expressão tem relação com o caráter do despacho do ministro, ou seja, vale para todos.

Com isso, Toffoli sinaliza aos investigados que recorrem a seu gabinete que procurem os juízos competentes - os que cuidam de seus respectivos casos - para fazer as mais diversas solicitações: trancamento de processos, suspensão de investigações e até anulação de delações.

Em seus despachos, Toffoli repete: “Como tenho feito desde que assumi a relatoria da Reclamação 43.007, advirto que nos feitos, seja de que natureza for, em que houve a utilização de elementos de prova declarados imprestáveis, o exame a respeito do contágio de outras provas, bem como sobre a necessidade de se arquivar inquéritos ou ações judiciais deverá ser realizado pelo juízo natural do feito, consideradas as balizas fixadas naquela reclamação e as peculiaridades do caso concreto.”

Cronologia

As 24 petições que tramitam no gabinete de Toffoli estão ligadas à reclamação que presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajuizou em 2020 em busca da íntegra do acordo de leniência da Odebrecht.

O processo se agigantou, passou a abarcar os diálogos apreendidos na Operação Spoofing e culminou na decisão que anulou as provas da empreiteira nas ações contra o chefe do Executivo. Desde então, outros réus da Lava Jato passaram a pedir extensão da decisão que beneficiou Lula.

Toffoli herdou o processo do antigo relator, o ministro Ricardo Lewandowski - hoje ministro da Justiça - nessas condições com pedidos de uma série de personagens da Lava Jato, que já conseguiram decisões benéficas - os empresários Walter Faria e Paulo Skaf, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, o prefeito do Rio Eduardo Paes, o ex-presidente da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e o ex-ministro Edison Lobão.

Incomodado com o ‘tumulto do processo’, Toffoli assinou, no dia 6 de setembro do ano passado, o despacho que anulou as provas da leniência da Odebrecht. Se antes o ministro aplicava a decisão do STF sobre Lula a cada um dos réus que pediam a extensão do entendimento, agora a anulação valeria para todos os réus.

Assim, estes poderiam usar a decisão de Toffoli para dirigir os pedidos de anulação e trancamento de processos judiciais a juízos de primeiro grau. Um movimento semelhante aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar Lula e declarou Moro suspeito: coube aos juízos que cuidavam das ações do petista a avaliação e interpretação do impacto da decisão e a consequente anulação das ações.

O ministro tentou organizar a Reclamação. Começou a separar os novos pedidos de extensão em petições à parte, como ocorre até hoje. Antes disso todas as solicitações eram encaminhadas e decididas com o cabeçalho da Reclamação. As petições eram encaminhadas para Toffoli em razão da conexão com o processo principal. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o caso do empresário Marcelo Odebrecht, o “príncipe das empreiteiras”

Processos

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Um ano após anular todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), acumula em seu gabinete mais de 20 processos derivados de sua decisão que abriu um ciclo de desconstrução de medidas tomadas no âmbito da Operação Lava Jato. Das 46 petições em tramitação no gabinete do ministro em Brasília, 24 são de investigados pela Lava Jato, em especial de delatores. Muitos deles integram a lista dos 77 ex-executivos da Odebrecht, e alguns pedem a suspensão das colaborações e a devolução de multas. Em um “efeito cascata”, a decisão de Toffoli – de setembro de 2023 – tem servido de base para sentenças e despachos em varas de primeira instância e tribunais que foram base da operação.

O primeiro resultado concreto foi registrado na última sexta-feira: o juiz Guilherme Roman Borges, da 13ª Vara Criminal de Curitiba – a vara original da Lava Jato –, anulou os acordos de colaboração premiada e não persecução penal firmados por Jorge Luiz Brusa e ordenou que sejam devolvidos a ele R$ 25 milhões pagos em multas.

Apontado pela força-tarefa da operação como responsável por operações de lavagem de dinheiro, Brusa não chegou a ser denunciado justamente por causa do acordo de não persecução – instrumento pelo qual o réu confessa um crime e se compromete a cumprir uma série de cláusulas definidas pelo Ministério Público em troca do arquivamento da ação penal. Ele se tornou colaborador premiado, com acordo de delação homologado em janeiro de 2020.

Entre os que solicitam a extensão da decisão que anulou as provas da Odebrecht está o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, que teve sua prisão decretada em 18 de julho . Denunciado por corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro, Duque foi acusado de receber propinas em contratos da estatal com a Andrade Gutierrez e com a Odebrecht, incluindo obras como a Refinaria Getúlio Vargas, a Refinaria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro; ele foi condenado a 39 anos de detenção. Toffoli ainda não decidiu sobre a petição de Duque, impetrada logo após o mandado de prisão ter sido expedido.

Antes da prisão de Duque ser decretada, a defesa chegou a pedir que a medida não fosse determinada até que a Justiça Federal resolvesse “questões apuradas no âmbito da Operação Spoofing” - investigação sobre hackers que invadiram comunicações de procuradores e de Moro. Segundo os advogados do ex-chefe da Petrobras, tais questões poderiam “redundar na anulação de condenações” proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba, base da Lava Jato.

Lobista e empreiteiro

Outro caso de tentativa de reaver valores pagos em multas é o de Adir Assad, empresário apontado como lobista e operador de propinas, que foi condenado e preso por operações de lavagem de dinheiro junto à Odebrecht. Ele pediu a suspensão da multa do acordo de R$ 50 milhões fechado com o Ministério Público Federal em 2017. A defesa de Assad alegou suposta “falta de voluntariedade” na celebração do pacto. Toffoli sinalizou à defesa que o TRF-4, em Porto Alegre, seria o foro adequado para analisar o pedido.

Indicação semelhante ocorreu com Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS – empresa integrante do chamado “clube vip” do cartel de empreiteiras que se associava para fraudar licitações e superfaturar contratos. O ministro do STF disse que a solicitação de suspensão da multa deveria ser apresentada a seu colega Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo.

O próprio Jorge Luiz Brusa acionou Toffoli antes de recorrer à 13ª Vara Criminal de Curitiba. Em março, o ministro do STF negou o pedido e indicou que a defesa deveria acionar o “juízo natural do feito” – a vara que homologou os acordos –, que teria condições para analisar o caso “com a cautela e a verticalidade necessárias”.

Em sua decisão da última sexta-feira, o juiz da 13ª Vara de Curitiba concluiu que as provas que levaram à investigação de Brusa comprometeram os acordos. “Sendo as provas declaradas nulas, nulo também é o próprio acordo, a sua homologação e quaisquer efeitos dele decorrentes, como os pagamentos realizados”, escreveu.

O magistrado afirmou ainda que o caso está prescrito e, por isso, o Ministério Público nem sequer poderá buscar a assinatura de um novo acordo de colaboração com Brusa. Na semana anterior, com base na mesma decisão de Dias Toffoli, o juiz já havia trancado uma ação penal da Lava Jato contra dois executivos e um ex-advogado da petroquímica Braskem.

‘Contaminadas’

De acordo com a lei brasileira, o acordo de leniência envolve uma pessoa jurídica (empresa) que entrega às autoridades informações e provas sobre atos de corrupção de que tenha conhecimento. Em troca, a empresa pode ter atenuadas e até suspensas todas as sanções e penas a que faria jus. Quando anulou as provas do acordo de leniência firmado com a Odebrecht, Toffoli determinou que os juízes responsáveis por processos que tinham usado essas provas fizessem uma análise caso a caso, para verificar se as ações se manteriam de pé.

Na prática, como o acordo de leniência da empreiteira foi o ponto de partida de dezenas de inquéritos derivados da Lava Jato, a decisão de Toffoli provoca o chamado “efeito cascata”: quando uma prova inicial é declarada nula, todas as demais são consideradas “contaminadas”. Esse é o argumento que está sendo empregado por todos os delatores interessados em receber de volta o dinheiro das multas.

A lista de petições relacionadas à implosão da Lava Jato inclui o processo no qual Toffoli anulou todos os procedimentos e investigações envolvendo um dos principais delatores da operação, Marcelo Odebrecht. Conforme decisão da Segunda Turma do STF, caberá ao juiz responsável por cada procedimento analisar as provas do caso e avaliar se as ações ficam de pé mesmo com a exclusão das provas entregues pela empreiteira à Justiça.

A decisão que aniquilou as informações entregues pela empreiteira à Justiça ainda não tem data para passar pelo crivo da Segunda Turma do Supremo. Em fevereiro, o grupo suspendeu o julgamento de três recursos contra a decisão de Toffoli até a finalização da conciliação sobre os acordos de leniência da Operação Lava Jato. No final do mês passado, foi estendido prazo por mais 30 dias para que as autoridades e empresas cheguem a um consenso.

Alvos da operação também estão usando como argumento as decisões do ministro do STF sobre Beto Richa (PSDB), ex-governador do Paraná e atualmente deputado federal. Toffoli anulou todos os atos praticados pela antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e pelo ex-juiz Sérgio Moro (atual senador) envolvendo Richa nas Operações Rádio Patrulha, Piloto, Integração e Quadro Negro.

Enquanto os alvos da operação usam Lula, Richa e Odebrecht como ímãs para direcionar pedidos a Toffoli e tentar anular seus processos na Operação já no STF, as respostas para os pedidos têm sido a mesma: o ministro destaca o efeito erga omnes da decisão que derrubou as provas da leniência da Odebrecht - a expressão tem relação com o caráter do despacho do ministro, ou seja, vale para todos.

Com isso, Toffoli sinaliza aos investigados que recorrem a seu gabinete que procurem os juízos competentes - os que cuidam de seus respectivos casos - para fazer as mais diversas solicitações: trancamento de processos, suspensão de investigações e até anulação de delações.

Em seus despachos, Toffoli repete: “Como tenho feito desde que assumi a relatoria da Reclamação 43.007, advirto que nos feitos, seja de que natureza for, em que houve a utilização de elementos de prova declarados imprestáveis, o exame a respeito do contágio de outras provas, bem como sobre a necessidade de se arquivar inquéritos ou ações judiciais deverá ser realizado pelo juízo natural do feito, consideradas as balizas fixadas naquela reclamação e as peculiaridades do caso concreto.”

Cronologia

As 24 petições que tramitam no gabinete de Toffoli estão ligadas à reclamação que presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajuizou em 2020 em busca da íntegra do acordo de leniência da Odebrecht.

O processo se agigantou, passou a abarcar os diálogos apreendidos na Operação Spoofing e culminou na decisão que anulou as provas da empreiteira nas ações contra o chefe do Executivo. Desde então, outros réus da Lava Jato passaram a pedir extensão da decisão que beneficiou Lula.

Toffoli herdou o processo do antigo relator, o ministro Ricardo Lewandowski - hoje ministro da Justiça - nessas condições com pedidos de uma série de personagens da Lava Jato, que já conseguiram decisões benéficas - os empresários Walter Faria e Paulo Skaf, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, o prefeito do Rio Eduardo Paes, o ex-presidente da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e o ex-ministro Edison Lobão.

Incomodado com o ‘tumulto do processo’, Toffoli assinou, no dia 6 de setembro do ano passado, o despacho que anulou as provas da leniência da Odebrecht. Se antes o ministro aplicava a decisão do STF sobre Lula a cada um dos réus que pediam a extensão do entendimento, agora a anulação valeria para todos os réus.

Assim, estes poderiam usar a decisão de Toffoli para dirigir os pedidos de anulação e trancamento de processos judiciais a juízos de primeiro grau. Um movimento semelhante aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar Lula e declarou Moro suspeito: coube aos juízos que cuidavam das ações do petista a avaliação e interpretação do impacto da decisão e a consequente anulação das ações.

O ministro tentou organizar a Reclamação. Começou a separar os novos pedidos de extensão em petições à parte, como ocorre até hoje. Antes disso todas as solicitações eram encaminhadas e decididas com o cabeçalho da Reclamação. As petições eram encaminhadas para Toffoli em razão da conexão com o processo principal. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o caso do empresário Marcelo Odebrecht, o “príncipe das empreiteiras”

Processos

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Um ano após anular todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), acumula em seu gabinete mais de 20 processos derivados de sua decisão que abriu um ciclo de desconstrução de medidas tomadas no âmbito da Operação Lava Jato. Das 46 petições em tramitação no gabinete do ministro em Brasília, 24 são de investigados pela Lava Jato, em especial de delatores. Muitos deles integram a lista dos 77 ex-executivos da Odebrecht, e alguns pedem a suspensão das colaborações e a devolução de multas. Em um “efeito cascata”, a decisão de Toffoli – de setembro de 2023 – tem servido de base para sentenças e despachos em varas de primeira instância e tribunais que foram base da operação.

O primeiro resultado concreto foi registrado na última sexta-feira: o juiz Guilherme Roman Borges, da 13ª Vara Criminal de Curitiba – a vara original da Lava Jato –, anulou os acordos de colaboração premiada e não persecução penal firmados por Jorge Luiz Brusa e ordenou que sejam devolvidos a ele R$ 25 milhões pagos em multas.

Apontado pela força-tarefa da operação como responsável por operações de lavagem de dinheiro, Brusa não chegou a ser denunciado justamente por causa do acordo de não persecução – instrumento pelo qual o réu confessa um crime e se compromete a cumprir uma série de cláusulas definidas pelo Ministério Público em troca do arquivamento da ação penal. Ele se tornou colaborador premiado, com acordo de delação homologado em janeiro de 2020.

Entre os que solicitam a extensão da decisão que anulou as provas da Odebrecht está o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, que teve sua prisão decretada em 18 de julho . Denunciado por corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro, Duque foi acusado de receber propinas em contratos da estatal com a Andrade Gutierrez e com a Odebrecht, incluindo obras como a Refinaria Getúlio Vargas, a Refinaria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro; ele foi condenado a 39 anos de detenção. Toffoli ainda não decidiu sobre a petição de Duque, impetrada logo após o mandado de prisão ter sido expedido.

Antes da prisão de Duque ser decretada, a defesa chegou a pedir que a medida não fosse determinada até que a Justiça Federal resolvesse “questões apuradas no âmbito da Operação Spoofing” - investigação sobre hackers que invadiram comunicações de procuradores e de Moro. Segundo os advogados do ex-chefe da Petrobras, tais questões poderiam “redundar na anulação de condenações” proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba, base da Lava Jato.

Lobista e empreiteiro

Outro caso de tentativa de reaver valores pagos em multas é o de Adir Assad, empresário apontado como lobista e operador de propinas, que foi condenado e preso por operações de lavagem de dinheiro junto à Odebrecht. Ele pediu a suspensão da multa do acordo de R$ 50 milhões fechado com o Ministério Público Federal em 2017. A defesa de Assad alegou suposta “falta de voluntariedade” na celebração do pacto. Toffoli sinalizou à defesa que o TRF-4, em Porto Alegre, seria o foro adequado para analisar o pedido.

Indicação semelhante ocorreu com Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS – empresa integrante do chamado “clube vip” do cartel de empreiteiras que se associava para fraudar licitações e superfaturar contratos. O ministro do STF disse que a solicitação de suspensão da multa deveria ser apresentada a seu colega Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo.

O próprio Jorge Luiz Brusa acionou Toffoli antes de recorrer à 13ª Vara Criminal de Curitiba. Em março, o ministro do STF negou o pedido e indicou que a defesa deveria acionar o “juízo natural do feito” – a vara que homologou os acordos –, que teria condições para analisar o caso “com a cautela e a verticalidade necessárias”.

Em sua decisão da última sexta-feira, o juiz da 13ª Vara de Curitiba concluiu que as provas que levaram à investigação de Brusa comprometeram os acordos. “Sendo as provas declaradas nulas, nulo também é o próprio acordo, a sua homologação e quaisquer efeitos dele decorrentes, como os pagamentos realizados”, escreveu.

O magistrado afirmou ainda que o caso está prescrito e, por isso, o Ministério Público nem sequer poderá buscar a assinatura de um novo acordo de colaboração com Brusa. Na semana anterior, com base na mesma decisão de Dias Toffoli, o juiz já havia trancado uma ação penal da Lava Jato contra dois executivos e um ex-advogado da petroquímica Braskem.

‘Contaminadas’

De acordo com a lei brasileira, o acordo de leniência envolve uma pessoa jurídica (empresa) que entrega às autoridades informações e provas sobre atos de corrupção de que tenha conhecimento. Em troca, a empresa pode ter atenuadas e até suspensas todas as sanções e penas a que faria jus. Quando anulou as provas do acordo de leniência firmado com a Odebrecht, Toffoli determinou que os juízes responsáveis por processos que tinham usado essas provas fizessem uma análise caso a caso, para verificar se as ações se manteriam de pé.

Na prática, como o acordo de leniência da empreiteira foi o ponto de partida de dezenas de inquéritos derivados da Lava Jato, a decisão de Toffoli provoca o chamado “efeito cascata”: quando uma prova inicial é declarada nula, todas as demais são consideradas “contaminadas”. Esse é o argumento que está sendo empregado por todos os delatores interessados em receber de volta o dinheiro das multas.

A lista de petições relacionadas à implosão da Lava Jato inclui o processo no qual Toffoli anulou todos os procedimentos e investigações envolvendo um dos principais delatores da operação, Marcelo Odebrecht. Conforme decisão da Segunda Turma do STF, caberá ao juiz responsável por cada procedimento analisar as provas do caso e avaliar se as ações ficam de pé mesmo com a exclusão das provas entregues pela empreiteira à Justiça.

A decisão que aniquilou as informações entregues pela empreiteira à Justiça ainda não tem data para passar pelo crivo da Segunda Turma do Supremo. Em fevereiro, o grupo suspendeu o julgamento de três recursos contra a decisão de Toffoli até a finalização da conciliação sobre os acordos de leniência da Operação Lava Jato. No final do mês passado, foi estendido prazo por mais 30 dias para que as autoridades e empresas cheguem a um consenso.

Alvos da operação também estão usando como argumento as decisões do ministro do STF sobre Beto Richa (PSDB), ex-governador do Paraná e atualmente deputado federal. Toffoli anulou todos os atos praticados pela antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e pelo ex-juiz Sérgio Moro (atual senador) envolvendo Richa nas Operações Rádio Patrulha, Piloto, Integração e Quadro Negro.

Enquanto os alvos da operação usam Lula, Richa e Odebrecht como ímãs para direcionar pedidos a Toffoli e tentar anular seus processos na Operação já no STF, as respostas para os pedidos têm sido a mesma: o ministro destaca o efeito erga omnes da decisão que derrubou as provas da leniência da Odebrecht - a expressão tem relação com o caráter do despacho do ministro, ou seja, vale para todos.

Com isso, Toffoli sinaliza aos investigados que recorrem a seu gabinete que procurem os juízos competentes - os que cuidam de seus respectivos casos - para fazer as mais diversas solicitações: trancamento de processos, suspensão de investigações e até anulação de delações.

Em seus despachos, Toffoli repete: “Como tenho feito desde que assumi a relatoria da Reclamação 43.007, advirto que nos feitos, seja de que natureza for, em que houve a utilização de elementos de prova declarados imprestáveis, o exame a respeito do contágio de outras provas, bem como sobre a necessidade de se arquivar inquéritos ou ações judiciais deverá ser realizado pelo juízo natural do feito, consideradas as balizas fixadas naquela reclamação e as peculiaridades do caso concreto.”

Cronologia

As 24 petições que tramitam no gabinete de Toffoli estão ligadas à reclamação que presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajuizou em 2020 em busca da íntegra do acordo de leniência da Odebrecht.

O processo se agigantou, passou a abarcar os diálogos apreendidos na Operação Spoofing e culminou na decisão que anulou as provas da empreiteira nas ações contra o chefe do Executivo. Desde então, outros réus da Lava Jato passaram a pedir extensão da decisão que beneficiou Lula.

Toffoli herdou o processo do antigo relator, o ministro Ricardo Lewandowski - hoje ministro da Justiça - nessas condições com pedidos de uma série de personagens da Lava Jato, que já conseguiram decisões benéficas - os empresários Walter Faria e Paulo Skaf, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, o prefeito do Rio Eduardo Paes, o ex-presidente da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e o ex-ministro Edison Lobão.

Incomodado com o ‘tumulto do processo’, Toffoli assinou, no dia 6 de setembro do ano passado, o despacho que anulou as provas da leniência da Odebrecht. Se antes o ministro aplicava a decisão do STF sobre Lula a cada um dos réus que pediam a extensão do entendimento, agora a anulação valeria para todos os réus.

Assim, estes poderiam usar a decisão de Toffoli para dirigir os pedidos de anulação e trancamento de processos judiciais a juízos de primeiro grau. Um movimento semelhante aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar Lula e declarou Moro suspeito: coube aos juízos que cuidavam das ações do petista a avaliação e interpretação do impacto da decisão e a consequente anulação das ações.

O ministro tentou organizar a Reclamação. Começou a separar os novos pedidos de extensão em petições à parte, como ocorre até hoje. Antes disso todas as solicitações eram encaminhadas e decididas com o cabeçalho da Reclamação. As petições eram encaminhadas para Toffoli em razão da conexão com o processo principal. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o caso do empresário Marcelo Odebrecht, o “príncipe das empreiteiras”

Processos

O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal Foto: WILTON JUNIOR/ESTADÃO

Um ano após anular todas as provas do acordo de leniência da Odebrecht (atual Novonor), o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), acumula em seu gabinete mais de 20 processos derivados de sua decisão que abriu um ciclo de desconstrução de medidas tomadas no âmbito da Operação Lava Jato. Das 46 petições em tramitação no gabinete do ministro em Brasília, 24 são de investigados pela Lava Jato, em especial de delatores. Muitos deles integram a lista dos 77 ex-executivos da Odebrecht, e alguns pedem a suspensão das colaborações e a devolução de multas. Em um “efeito cascata”, a decisão de Toffoli – de setembro de 2023 – tem servido de base para sentenças e despachos em varas de primeira instância e tribunais que foram base da operação.

O primeiro resultado concreto foi registrado na última sexta-feira: o juiz Guilherme Roman Borges, da 13ª Vara Criminal de Curitiba – a vara original da Lava Jato –, anulou os acordos de colaboração premiada e não persecução penal firmados por Jorge Luiz Brusa e ordenou que sejam devolvidos a ele R$ 25 milhões pagos em multas.

Apontado pela força-tarefa da operação como responsável por operações de lavagem de dinheiro, Brusa não chegou a ser denunciado justamente por causa do acordo de não persecução – instrumento pelo qual o réu confessa um crime e se compromete a cumprir uma série de cláusulas definidas pelo Ministério Público em troca do arquivamento da ação penal. Ele se tornou colaborador premiado, com acordo de delação homologado em janeiro de 2020.

Entre os que solicitam a extensão da decisão que anulou as provas da Odebrecht está o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque, que teve sua prisão decretada em 18 de julho . Denunciado por corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro, Duque foi acusado de receber propinas em contratos da estatal com a Andrade Gutierrez e com a Odebrecht, incluindo obras como a Refinaria Getúlio Vargas, a Refinaria Abreu e Lima e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro; ele foi condenado a 39 anos de detenção. Toffoli ainda não decidiu sobre a petição de Duque, impetrada logo após o mandado de prisão ter sido expedido.

Antes da prisão de Duque ser decretada, a defesa chegou a pedir que a medida não fosse determinada até que a Justiça Federal resolvesse “questões apuradas no âmbito da Operação Spoofing” - investigação sobre hackers que invadiram comunicações de procuradores e de Moro. Segundo os advogados do ex-chefe da Petrobras, tais questões poderiam “redundar na anulação de condenações” proferidas pela 13ª Vara Federal de Curitiba, base da Lava Jato.

Lobista e empreiteiro

Outro caso de tentativa de reaver valores pagos em multas é o de Adir Assad, empresário apontado como lobista e operador de propinas, que foi condenado e preso por operações de lavagem de dinheiro junto à Odebrecht. Ele pediu a suspensão da multa do acordo de R$ 50 milhões fechado com o Ministério Público Federal em 2017. A defesa de Assad alegou suposta “falta de voluntariedade” na celebração do pacto. Toffoli sinalizou à defesa que o TRF-4, em Porto Alegre, seria o foro adequado para analisar o pedido.

Indicação semelhante ocorreu com Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS – empresa integrante do chamado “clube vip” do cartel de empreiteiras que se associava para fraudar licitações e superfaturar contratos. O ministro do STF disse que a solicitação de suspensão da multa deveria ser apresentada a seu colega Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo.

O próprio Jorge Luiz Brusa acionou Toffoli antes de recorrer à 13ª Vara Criminal de Curitiba. Em março, o ministro do STF negou o pedido e indicou que a defesa deveria acionar o “juízo natural do feito” – a vara que homologou os acordos –, que teria condições para analisar o caso “com a cautela e a verticalidade necessárias”.

Em sua decisão da última sexta-feira, o juiz da 13ª Vara de Curitiba concluiu que as provas que levaram à investigação de Brusa comprometeram os acordos. “Sendo as provas declaradas nulas, nulo também é o próprio acordo, a sua homologação e quaisquer efeitos dele decorrentes, como os pagamentos realizados”, escreveu.

O magistrado afirmou ainda que o caso está prescrito e, por isso, o Ministério Público nem sequer poderá buscar a assinatura de um novo acordo de colaboração com Brusa. Na semana anterior, com base na mesma decisão de Dias Toffoli, o juiz já havia trancado uma ação penal da Lava Jato contra dois executivos e um ex-advogado da petroquímica Braskem.

‘Contaminadas’

De acordo com a lei brasileira, o acordo de leniência envolve uma pessoa jurídica (empresa) que entrega às autoridades informações e provas sobre atos de corrupção de que tenha conhecimento. Em troca, a empresa pode ter atenuadas e até suspensas todas as sanções e penas a que faria jus. Quando anulou as provas do acordo de leniência firmado com a Odebrecht, Toffoli determinou que os juízes responsáveis por processos que tinham usado essas provas fizessem uma análise caso a caso, para verificar se as ações se manteriam de pé.

Na prática, como o acordo de leniência da empreiteira foi o ponto de partida de dezenas de inquéritos derivados da Lava Jato, a decisão de Toffoli provoca o chamado “efeito cascata”: quando uma prova inicial é declarada nula, todas as demais são consideradas “contaminadas”. Esse é o argumento que está sendo empregado por todos os delatores interessados em receber de volta o dinheiro das multas.

A lista de petições relacionadas à implosão da Lava Jato inclui o processo no qual Toffoli anulou todos os procedimentos e investigações envolvendo um dos principais delatores da operação, Marcelo Odebrecht. Conforme decisão da Segunda Turma do STF, caberá ao juiz responsável por cada procedimento analisar as provas do caso e avaliar se as ações ficam de pé mesmo com a exclusão das provas entregues pela empreiteira à Justiça.

A decisão que aniquilou as informações entregues pela empreiteira à Justiça ainda não tem data para passar pelo crivo da Segunda Turma do Supremo. Em fevereiro, o grupo suspendeu o julgamento de três recursos contra a decisão de Toffoli até a finalização da conciliação sobre os acordos de leniência da Operação Lava Jato. No final do mês passado, foi estendido prazo por mais 30 dias para que as autoridades e empresas cheguem a um consenso.

Alvos da operação também estão usando como argumento as decisões do ministro do STF sobre Beto Richa (PSDB), ex-governador do Paraná e atualmente deputado federal. Toffoli anulou todos os atos praticados pela antiga força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e pelo ex-juiz Sérgio Moro (atual senador) envolvendo Richa nas Operações Rádio Patrulha, Piloto, Integração e Quadro Negro.

Enquanto os alvos da operação usam Lula, Richa e Odebrecht como ímãs para direcionar pedidos a Toffoli e tentar anular seus processos na Operação já no STF, as respostas para os pedidos têm sido a mesma: o ministro destaca o efeito erga omnes da decisão que derrubou as provas da leniência da Odebrecht - a expressão tem relação com o caráter do despacho do ministro, ou seja, vale para todos.

Com isso, Toffoli sinaliza aos investigados que recorrem a seu gabinete que procurem os juízos competentes - os que cuidam de seus respectivos casos - para fazer as mais diversas solicitações: trancamento de processos, suspensão de investigações e até anulação de delações.

Em seus despachos, Toffoli repete: “Como tenho feito desde que assumi a relatoria da Reclamação 43.007, advirto que nos feitos, seja de que natureza for, em que houve a utilização de elementos de prova declarados imprestáveis, o exame a respeito do contágio de outras provas, bem como sobre a necessidade de se arquivar inquéritos ou ações judiciais deverá ser realizado pelo juízo natural do feito, consideradas as balizas fixadas naquela reclamação e as peculiaridades do caso concreto.”

Cronologia

As 24 petições que tramitam no gabinete de Toffoli estão ligadas à reclamação que presidente Luiz Inácio Lula da Silva ajuizou em 2020 em busca da íntegra do acordo de leniência da Odebrecht.

O processo se agigantou, passou a abarcar os diálogos apreendidos na Operação Spoofing e culminou na decisão que anulou as provas da empreiteira nas ações contra o chefe do Executivo. Desde então, outros réus da Lava Jato passaram a pedir extensão da decisão que beneficiou Lula.

Toffoli herdou o processo do antigo relator, o ministro Ricardo Lewandowski - hoje ministro da Justiça - nessas condições com pedidos de uma série de personagens da Lava Jato, que já conseguiram decisões benéficas - os empresários Walter Faria e Paulo Skaf, o ex-ministro Paulo Bernardo Silva, o prefeito do Rio Eduardo Paes, o ex-presidente da Eletronuclear, almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, e o ex-ministro Edison Lobão.

Incomodado com o ‘tumulto do processo’, Toffoli assinou, no dia 6 de setembro do ano passado, o despacho que anulou as provas da leniência da Odebrecht. Se antes o ministro aplicava a decisão do STF sobre Lula a cada um dos réus que pediam a extensão do entendimento, agora a anulação valeria para todos os réus.

Assim, estes poderiam usar a decisão de Toffoli para dirigir os pedidos de anulação e trancamento de processos judiciais a juízos de primeiro grau. Um movimento semelhante aconteceu quando o Supremo Tribunal Federal declarou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar Lula e declarou Moro suspeito: coube aos juízos que cuidavam das ações do petista a avaliação e interpretação do impacto da decisão e a consequente anulação das ações.

O ministro tentou organizar a Reclamação. Começou a separar os novos pedidos de extensão em petições à parte, como ocorre até hoje. Antes disso todas as solicitações eram encaminhadas e decididas com o cabeçalho da Reclamação. As petições eram encaminhadas para Toffoli em razão da conexão com o processo principal. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o caso do empresário Marcelo Odebrecht, o “príncipe das empreiteiras”

Processos

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